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2.10. Antibióticos em cirurgia, necessidade e realidade

2.10.1. Recomendações para antibioticoprofilaxia na medicina veterinária

Na medicina veterinária, a administração profilática de antimicrobianos durante o procedimento cirúrgico é claramente aceita e divulgada, como uma importante medida da redução e controle da incidência de infecção do sítio cirúrgico (WHITTEM et al., 1999: ROUSH, 1999; JOHNSON, 2002; HEDLUND, 2005; SIEM e FOSSUM, 2005; DUNNING, 2007), entretanto, as recomendações e restrições são inúmeras e não divergem das empregadas na medicina humana.

A antibioticoprofilaxia tem o objetivo de evitar a contaminação do ferimento cirúrgico após exposição a algum microorganismo e antes da instalação do processo de

infecção, devendo alcançar e manter concentrações antimicrobianas inibitórias no local da incisão durante todo o procedimento cirúrgico, a fim de evitar o crescimento de patógenos contaminantes, no momento de uma potencial contaminação da ferida cirúrgica, devendo a administração ser realizada entre 30 e 60 minutos antes da cirurgia (ROUSH, 1999; WHITTEM et al., 1999; VIANA, 2001; HARARI, 2004; HEDLUND, 2005; SIEM e FOSSUM, 2005).

Vários autores apontaram a não padronização da antibioticoprofilaxia e seu uso indiscriminado como fatores potenciais da: elevação da incidência de infecção, dos altos custos dos tratamentos para a instituição e proprietários e do risco crescente do surgimento de resistência antimicrobiana às drogas empregadas (BROWN et al., 1997; HARARI, 2004; DUNNING, 2007).

O CDC aponta que a antibioticoprofilaxia padronizada realizada até 2 horas antes da incisão em cirurgias limpas ou potencialmente contaminadas leva a uma redução das taxas de infecção do sítio cirúrgico se comparado ao emprego da antibioticoprofilaxia realizada mais cedo ou após o procedimento cirúrgico (CDC, 1998). Whittem et al. (1999) em literatura veterinária indicaram a antibioticoprofilaxia administrada por via intravenosa, pré-operatória, minutos antes da incisão cirúrgica como forma de prevenção da ISC.

Brown et al. (1997), em um estudo sobre as taxas de infecção de ferida cirúrgica de cães e gatos, verificaram que animais que receberam profilaxia antibiótica pré- operatória apropriada (padronizada de acordo com seu estudo, definidos previamente quanto ao antibiótico e dosagem de acordo com os procedimentos a serem realizados) para cirurgias limpas e animais que não receberam nenhuma profilaxia antibiótica não apresentaram taxas de infecção significativamente diferentes. Entretanto animais que receberam antibioticoprofilaxia não-padronizada (sem definição prévia ao procedimento) apresentaram taxas de infecção maiores do que aquelas que não fizeram uso de antibióticos profiláticos.

Siem e Fossum (2005) e Dunning (2007) afirmaram que a antibioticoprofilaxia deve ser indicada de acordo com o potencial de contaminação da ferida cirúrgica e o potencial de dano de uma infecção, se instalada, devendo ser administrada em dosagens simples (única), a fim de se evitarem efeitos colaterais, alta toxicidade e a seleção de bactérias multirresistentes (ROUSH, 1999).

De modo geral, não há indicação de uso profilático de antibióticos em cirurgias limpas, devido ao baixo nível de contaminação bacteriana no local cirúrgico

(DUNNING, 2007). Seu uso é indicado em procedimentos limpos específicos como implantes ósseos, prótese total de quadril, marca passo, neurocirurgias, cirurgias cardiopulmonares, cirurgias com risco de infecção superior a 5 %, procedimentos com duração superior a 90 minutos e procedimentos em que uma infecção causaria graves danos ao paciente com possível perda do mesmo (ROUSH, 1999; VIANA, 2001; HARARI, 2004; DUNNING, 2007).

A antibioticoprofilaxia também é indicada em procedimentos potencialmente contaminados de pacientes idosos com doenças crônicas, procedimentos experimentais envolvendo material exógeno, pacientes imunossuprimidos ou em terapia imunossupressora (quimioterapia, radioterapia), técnicas de assepsia pouco rigorosas, no pré-operatório de cirurgias potencialmente contaminadas (trato digestivo, geniturinário e respiratório), em pacientes com prótese pré-existentes (prótese total de quadril, marca-passo e cimento ósseo) e em pacientes submetidos a procedimentos cirúrgicos anteriores (odontológicos, ferimentos traumáticos, cirurgia coloretal) (ROUSH, 1999; VIANA, 2001; HARARI, 2004; SIEM e FOSSUM, 2005).

A escolha do antimicrobiano a ser empregado deve ser baseada nos microorganismos contaminantes com maior probabilidade de causar infecção no sítio cirúrgico, de conhecimento (identificação) prévio da equipe cirúrgica e que apresentem padrão de sensibilidade ao antibiótico escolhido (ROUSH, 1999; SIEM e FOSSUM, 2005; DUNNING, 2007).

A continuidade da profilaxia pós-cirúrgica em procedimentos com boas condições de anti-sepsia e em áreas não contaminadas é desaconselhada, devido à falta de dados conclusivos de seu beneficio (ROUSH, 1999; VIANA, 2001; DUNNING, 2007). Em humanos, estudos demonstraram que não existe essa necessidade. Dunning, (2007) contra-indicou sua manutenção após o período operatório, devendo a antibioticoprofilaxia ser descontinuada após 24 horas.

Couto et al. (1996) e Machado et al. (2001) recomendaram que a profilaxia antibiótica não deve ultrapassar o período da cirurgia, mesmo em situações de risco ou contaminações acidentais e que uma duração superior a 48 horas é inapropriada, Dunning (2007) e Siem e Fossum (2005) indicam a antibioticoprofilaxia em conjunto com altos padrões de técnica asséptica, manipulação meticulosa e atraumática dos tecidos, hemostasia cuidadosa, uso criteriosos de suturas, prevenção de suprimentos sanguíneo, eliminação de espaço morto, aproximação anatômica dos tecidos e cuidados pós-operatórios adequados.

Roush (1999) e Viana (2001) relataram que não há evidências científicas da redução da incidência de infecção com a continuação do tratamento com antibióticos por períodos mais longos que a cirurgia. Segundo Whittem et al. (1999), a administração pré-operatória, 30 minutos antes da cirurgia, e a não-continuidade da administração de antibióticos profiláticos após o procedimento são capazes de reduzir efetivamente a taxa de infecção pós operatória em cães submetidos a cirurgia ortopédica eletiva. A mesma indicação é feita por Soontornvipart et al. (2003) que verificou a eficiência da antibioticoprofilaxia no pré-operatório de 60 cães com fraturas em ossos longos.

Johnson (2002) exemplificou a utilização de antimicrobianos não-padronizada como um das causas da resistência antimicrobiana e do aumento dos custos das intervenções médicas veterinárias, salientando que apesar dos vários estudos no assunto, o uso de terapia antibiótica empírica (não-padronizada) e profilática ainda é muito difundido na medicina veterinária.