internacional. Também exercem esta função pessoas de confiança das vítimas como parentes e supostos amigos.
O perfil das vítimas e dos aliciadores seguem as características determinadas pelo mercado, atendendo desse modo à demanda exigida pelos seus clientes.
A partir do fenômeno tecnológico que engloba a população mundial os criminosos adotaram a internet como ferramenta essencial e facilitadora na prática do delito. Maria Lúcia Leal e Maria de Fátima Leal (2004, p.276) afirmam que a tecnologia facilita “o aliciamento, o transporte, o alojamento, a vigilância e o controle de suas ações”. Dessa forma as quadrilhas podem “estruturar-se e desmobilizar-se com agilidade”.
Segundo Cláudia Cardozo (2011, s.p.) muitas modelos são recrutadas em sites com propósito distinto do almejado, aliciando-se à redes nacionais e internacionais de prostituição. As agências utilizam a expressão “ficha-rosa”24 nas ofertas de emprego como modelo, recepcionista de congressos, feiras e demais eventos, oferecendo salários mais vantajosos e oportunidades singulares, ante ao qual há inegável interesse por parte das jovens que desconhecem o sentido do termo.
Os anúncios são vastamente encontrados no meio eletrônico, recrutando pessoas para exploração sexual e possíveis futuras vítimas do tráfico, a exemplo da epígrafe “Oportunidade ficha rosa” (2011, s.p.) em site de agência de modelos:
Você que quer ganhar dinheiro rápido e fácil. (Solução é FICHA ROSA). . Estamos à procura de modelos femininas, para fazer FICHA ROSA, e
castings sensuais voltado a ficha Rosa!
Trabalhos desde fotos, Acompanhantes, Hostes, Gogogirls e Gogoboys, Dançarinas, Strips (completo), Filmes e etc.
Do mesmo modo empresas renomadas e eventos mundiais selecionam mulheres para “divertir” seus clientes, com a expressa determinação de serem modelos “ficha-rosa”, como na oferta de “Vagas Fórmula Indy” (2010, s.p.):
Fórmula Indy – Ficha Rosa MODELOS FICHA ROSA.
1. O evento ocorrerá no dia 01/05/10, em São Paulo, sendo os trabalhos nos dias 29-30/04 e 01/05 (05 horas p/dia – mais presença em festas da Indy);
2. Produção, roupas, transportes, alimentação, estadia, por conta do evento;
24 A expressão refere-se a modelos que aceitam realizar trabalhos sexuais, conhecidas como
“prostitutas de luxo”.
3. A partir de 18 anos, ser bela, sensual, extrovertida e simpática;
4. Possível contato posterior para ensaios fotográficos, se for do interesse
da modelo e da produtora;
5.Cachê acima do mercado e participação nas festas da Indy. Novamente informando que somente para modelos que façam ficha rosa.
Há evidente disparidade entre os salários de modelos “ficha-rosa” e
“ficha-branca”25, evidenciando a tendência das mulheres a optar pelo primeiro tipo, por ser mais rentável e garantido. Neste sentido o anúncio do “27° Salão Internacional do Automóvel de São Paulo” (2012, s.p.):
FICHA BRANCA R$ 400,00 por dia (10 horas por dia).
FICHA ROSA 1500,00 por dia (horário especial).
Relata-se mais de 700 páginas de agências de modelos e de casamentos denunciadas na Central Nacional de Denúncias de Crimes Cibernéticos por serem consideradas falsas, com propósito de exploração sexual. Ademais, a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) disponibilizou um site para que as pessoas denunciem, ainda que de forma anônima, o tráfico de pessoas pela internet (CARDOZO, 2011, s.p.).
As agências oferecem discrição em seus anúncios, motivo pelo qual é de suma importância que vítimas ou pessoas que tenham conhecimento dessas falsas empresas, que atuam no meio eletrônico ou não, denunciem a prática de tal delito.
25 Trata-se de modelos que não realizam trabalhos sexuais.
5 ORDENAMENTO JURÍDICO-PENAL BRASILEIRO
Os bens jurídicos fundamentais e pertinentes para o convívio em sociedade são objeto de tutela penal, através da cominação e aplicação de sanções punitivas aos indivíduos que transgridam as normas contidas no Código Penal e leis especiais. Destarte, as penas previstas neste codex são um importante mecanismo de coerção para o amparo de bens e valores sociais.
Os delitos englobados pelo tráfico de pessoas para fins de lenocínio encontram-se tipificados no Título VI26, Capítulo V, do vigente Código Penal27 de 1940, sob o título “Do Lenocínio e do Tráfico de Pessoa Para Fim de Prostituição ou outra Forma de Exploração Sexual”. Estes se ordenam em seis principais dispositivos legais, do artigo 227 ao 231-A.
Destaca-se que o Código Penal brasileiro sofreu inúmeras modificações ao longo de sua vigência. Entre estas, a alteração através da Lei nº 12.015/2009 que, de acordo com Luiz Regis Prado (2011, p. 880), modificou o nomen juris do crime descrito em seu artigo 23128 para “tráfico internacional de pessoa para fim de exploração sexual”. No mesmo contexto, também foi alterada a denominação do Capítulo V pela referida lei, anteriormente intitulada como “Do Lenocínio e do Tráfico de Pessoas”.
Observa-se, de acordo com Ela Wiecko V. de Castilho (2006, p.5-7), que a lei penal brasileira tende a se adequar ao estabelecido nos Protocolos Adicionais à Convenção de Palermo, no entanto há diversas inconsonâncias entre estas. Inicialmente, ressalta-se que os Protocolos aplicam-se às condutas praticadas por organizações criminosas, contudo no Brasil o delito configura-se independentemente destes, pois se trata de delito comum quanto ao sujeito ativo.
Ademais, os Protocolos preveem que o consentimento dado pela vítima quanto à prática do delito só será irrelevante se obtido por meio de força, coação, engano ou
26 Trata-se “Dos Crimes contra a Dignidade Sexual”.
27 Aprovado pelo Decreto-Lei n° 2.848, de 7 de dezembro de 1940.
28 Artigo 231: Promover ou facilitar a entrada, no território nacional, de alguém que nele venha exercer a prostituição ou outra forma de exploração sexual, ou a saída de alguém que vá exercê-la no estrangeiro.
Pena – reclusão, de 3 (três) a 8 (oito) anos.
fraude, nesse sentido a lei brasileira reconhece que qualquer consentimento dado pela vítima será ineficaz.
As diversas alterações pertinentes ao dispositivo em análise tornaram-no mais abrangente, tanto relativo ao gênero dos sujeitos ativo e passivo quanto à extensão da criminalização do delito, sendo este tipificado interna e externamente ao território brasileiro. Desse modo o tipo penal atende de forma mais eficaz seu propósito coercitivo.