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Atualmente, o direito à acessibilidade está em pauta em diversas regiões do mundo. No Brasil, esse direito está previsto na Lei nº 10.098, de dezembro de 2000, que estabelece normas gerais e os critérios básicos para a promoção da acessibilidade das pessoas com deficiência ou com mobilidade reduzida, por meio da eliminação de barreiras e de obstáculos nos espaços públicos, no mobiliário e no equipamento urbano, nas edificações e nos meios de transporte e de comunicação.

Direcionando para uma abordagem educacional em uma perspectiva da educação inclusiva, Motta (2016, p. 15) ressalta que

A diversidade obriga escolas e professores a repensar a dinâmica de sala de aula, a introduzir novas ferramentas que possam colaborar para o sucesso de tarefas, dentre elas a tarefa de promover o acesso a esse

universo repleto de imagens para todos os alunos, incluindo alunos com deficiência visual, alunos com dificuldades de aprendizagem, alunos que não conseguem compreender aquilo que leem, para despertar a curiosidade e ampliar sua visão de mundo. Aprender a ler imagens pode colaborar para a formação de alunos mais críticos, mais capazes de compreender os aspectos culturais, históricos e sociais contidos nas informações visuais. Aprender a ler imagens terá um impacto na leitura do próprio texto.

Dessa forma, a audiodescrição é um recurso de acessibilidade que possibilita tornar eventos culturais e produtos audiovisuais (filmes, filmes publicitários, vídeos educativos, outros) acessíveis para pessoas com deficiência visual. É transformar a linguagem visual em linguagem falada. Assim, de acordo com Franco e Silva (2010, p. 23)

A audiodescrição consiste na transformação de imagens em palavras para que informações-chave transmitidas visualmente não passem despercebidas e possam também ser acessadas por pessoas cegas ou com baixa visão. O recurso, cujo objetivo é tornar os mais variados tipos de materiais audiovisuais (peças de teatro, filmes, programas de TV, espetáculos de dança, etc.) acessíveis a pessoas não-videntes, conta com pouco mais de trinta anos de existência.

A audiodescrição, portanto, pode ser classificada como uma modalidade de tradução intersemiótica, que transforma o texto visual (imagem) em verbal. Essa definição é amparada nos estudos de Jakobson (1995), que define três tipos de tradução: interlinguística (tradução de um texto de uma língua para outra); intralinguística (reescrita na mesma língua); intersemiótica ou transmutação (é a transformação de um signo em outro, ou seja, do visual para o verbal ou do verbal para o visual). Isso leva a uma maior compreensão das pessoas com deficiência visual, fomentando a inclusão, a participação e a autonomia em condições de igualdade, projetando mais possibilidades de acesso à cultura e à informação.

No contexto escolar, assegurar acessibilidade comunicacional às crianças com deficiência visual é garantir-lhes ingresso no mundo imagético, sua participação plena nas atividades escolares com o acesso aos conteúdos curriculares, como, por exemplo, utilização do livro didático; culminâncias de trabalhos; apresentações teatrais, apresentações de dança, agenciamento de filme; processo de contação de histórias; aulas de campo, entre outros eventos no âmbito educacional. Para Alves (2012, p. 9-10),

A utilização da audiodescrição, também, em contextos educacionais possa contribuir com o processo de autonomia interpretativa dos alunos com deficiência visual soma-se aos desafios da prática escolar no sentido de

construir uma abordagem curricular face às múltiplas mídias e às múltiplas manifestações culturais das visualidades. Tal abordagem curricular deve contribuir para a efetivação de interações pedagógicas que concorram para a constituição de experiências de leituras e de produções imagéticas por parte de todos os alunos, com vistas ao desenvolvimento estético-crítico, a partir da problematização dos temas veiculados e da apropriação e mobilização das linguagens e dos seus códigos.

A audiodescrição, quando usada com objetivos educativos, contribuirá grandemente para a participação efetiva do aluno com deficiência visual na compreensão e na construção do espaço imagético do próprio ambiente escolar, na construção de sentidos e na equiparação de oportunidades assegurando o acesso ao mundo das imagens e a eliminação de barreiras comunicacionais. Lívia Motta, estudiosa na área, reflete sobre a importância de o próprio professor na escola descrever o universo imagético presente em sala de aula como ilustrações nos livros didáticos e livros de história, gráficos, mapas, vídeos, fotografias, experimentos científicos, desenhos, peças teatrais, passeios, feiras de ciências, visitas culturais, objetos, entre outros, sem precisar de equipamentos para tal procedimento, mas ciente da importância de verbalizar aquilo que é visual, o que certamente irá contribuir para a aprendizagem de todos os alunos, pois além de ampliar o espaço imagético, aumenta o repertório, a fluência verbal e as habilidades perceptivas.

Em conformidade com o exposto sobre o agenciamento da audiodescrição no contexto escolar, a autora acrescenta que:

Na escola, o conhecimento sobre o recurso e sobre seus benefícios, aplicabilidade e técnicas permitirá que possa ser utilizado como ferramenta, o que sem dúvida poderá contribuir para o enriquecimento do agir pedagógico e para a abertura de mais oportunidades de aprendizagem para os alunos cegos e com baixa visão, além de alunos com deficiência intelectual, alunos com dislexia, com déficit de atenção, autistas e, mesmo, alunos sem deficiência (MOTTA, 2016, p. 6-7).

A audiodescrição, por fazer uso expressamente da palavra como reveladora das imagens e das ações não visualizadas pelas pessoas com deficiência visual (cega e com baixa visão), no contexto escolar, quando empregada numa perspectiva educativa, dissemina uma relação dialógica entre os envolvidos no processo de ensino-aprendizagem. Para Bakhtin (2015, p. 55-56), “o falante abre caminho para o horizonte alheio do ouvinte, constrói sua enunciação em território alheio, no campo aperceptivo do ouvinte”.

Nesse contexto, essa relação dialógica estará apoiada nas ideias de Bakhtin que realçam o caráter alteritário e tensionado das práticas enunciativas. O diálogo estabelecido pelo processo de audiodescrição no contexto ensino-aprendizagem estabelece uma relação de concordância e discordância, um juízo frente ao tema proposto gerando interação entre os sujeitos envolvidos.

As relações dialógicas são relações (semânticas) entre toda a espécie de enunciados na comunicação discursiva. Dois enunciados, quaisquer que sejam, se confrontam em um plano de sentido (não como objetos e não como exemplos linguísticos), acabam em relação dialógica (BAKHTIN, 2011, p. 323).

Alves (2012) corrobora essa ideia ao enunciar que a audiodescrição atua como agente mediador pela revelação das imagens e dos acontecimentos por meio da palavra. É, portanto, uma modalidade de tradução audiovisual acessível, que tem a palavra como reveladora do que não é acessível às pessoas com deficiência visual (cega e com baixa visão). Seu agenciamento no contexto escolar inclusivo precisa ser incorporado em uma prática pedagógica que utilize a palavra como mediadora no desenvolvimento do processo de ensino-aprendizagem, implicando uma interação de dimensão dialógica entre os sujeitos envolvidos. Nesse sentido, o movimento de dialogar permite a troca de experiência e saberes em uma permanente construção do conhecimento de forma coletiva.

Logo, levando em consideração que o ambiente escolar é um universo rico em imagens estáticas e dinâmicas, deve-se refletir sobre a prática docente nesse contexto, pois o uso de imagens é constante e intenso, e, nessa perspectiva, a audiodescrição é um importante recurso didático no desenvolvimento do processo ensino-aprendizagem. No contexto escolar, segundo Nunes, Fontana e Vanzin (2011), “a audiodescrição é uma tecnologia assistiva que propicia às pessoas cegas ou com deficiência intelectual o acesso a obras diversas com conteúdos visuais”. Dessa forma, todas as imagens consideradas importantes para o entendimento do conteúdo estudado precisam ser transformadas em palavras.

Utilizar a audiodescrição no contexto escolar pode potencializar a inclusão dos alunos com e sem deficiência visual garantindo-lhes mais autonomia. Seguindo esse viés, Alves (2012, p. 96) declara que a “audiodescrição, ou pelo menos, seus fundamentos e diretrizes, converte-se em matriz procedimental para o

desenvolvimento de atividades pedagógicas que promovam a acessibilidade curricular”, e assim torne a aprendizagem acessível a quem dela precise.