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Capítulo 2 – Modelo de Análise Proposto

2.2 Reflexões Sobre o Modelo Proposto

O enquadramento proposto não será, certamente, imune a críticas. Por esse motivo, salientam-se de seguida três assunções não consensuais que, da forma como se encontra construído, quem utilize este instrumento de análise se deparará. Estas assunções, surgem da necessidade de responder, em primeiro lugar, à definição de atores internacionais como atores relevantes para as Relações Internacionais pelo seu âmbito de atuação impactante no SI, em segundo, à necessidade de restringir o estatuto de ator às entidades que possuam capacidade de ação unilateral ou incluir as que atuam via influência sobre atores com essa capacidade, e por último, qual a diversidade em “áreas de atuação” da entidade para ser considerada um ator internacional.

A primeira, que resulta na distinção entre atores relevantes e não relevantes para as Relações Internacionais, prende-se com a necessidade de selecionar objetos de estudo de um universo lato de possíveis candidatos e, desta forma, colocar toda e qualquer entidade numa

10 Não referimos o impacto nos Estados-Membros de que também falam Cosgrove e Titchett (no caso da

entidade estudada ser uma organização internacional) pelo mesmo motivo que aglomeramos a Autoridade na Autonomia. Ou seja, trataremos os Estados-Membros, quando verificada Autonomia na organização internacional, como “plano interno”, e, portanto, algo secundário para a questão da actorness.

posição de igualdade inicial, antes da aplicação da ferramenta de análise proposta, para vir a ser, ou não, reconhecida como ator internacional. A forma como aqui se propõe fazer essa diferenciação, como acima descrito, parte do âmbito de atuação da entidade e se este tem, ou não, a intenção de ser impactante no SI. Distinguir o que é “impactante” no SI, é determinável pelo Reconhecimento. Se a entidade demonstra ter objetivos cuja persecução e/ou concretização é intencionalmente impactante no SI (logo, tem o SI como âmbito de atuação), apenas a reação (expressa ou tácita) de outros atores do SI a esta Vontade o pode comprovar.

A segunda é a resultante da convivência entre atores internacionais num espectro de capacidades extenso e de disparidades acentuadas, nomeadamente entre atores verdadeiramente capazes de alterar as normas do SI e atores apenas capazes de influenciar os primeiros a fazê-lo. Este problema é bastante pertinente quando procuramos definir um ator internacional.

A solução aqui apresentada deriva da conjugação do pressuposto comumente aceite de reconhecer aos Estados, independentemente de serem grandes ou pequenas potências, o estatuto de ator internacional, com as conclusões de estudos relacionados com a política externa das pequenas potências, que demonstram como a incapacidade de agir unilateralmente se materializa numa linha orientadora de política externa focada na influência junto de grandes potências, para que, através da ação destas, possam atingir os seus objetivos (Hey, 2003).

Se vemos em reconhecidos atores internacionais esta estratégia, e nestas reconhecemos atitude de ator, então é possível reconhecer como atores entidades cuja verdadeira capacidade de atuação no SI resulta desta forma de influência, por não o conseguirem fazer diretamente, não sendo, portanto, a capacidade de ação unilateral um pressuposto necessário para o reconhecimento do estatuto de ator.

A terceira, está também relacionada com a relação entre o estatuto de ator e o âmbito de atuação da entidade, mas numa perspetiva quantitativa e não qualitativa.

Se na revisita dos principais autores do conceito de actorness verificámos a hipótese de “vários níveis de actorness”, com a qual o enquadramento aqui proposto discorda, não encontrámos, no entanto, uma definição, quantitativa ou qualitativa, de “áreas de atuação de

ator” onde as capacidades devam ser necessariamente empregues para que exista um reconhecimento de actorness.

Para reconhecer uma entidade como ator, através da capacidade de agir como tal, quais são as capacidades que contabilizamos? Quais e quantas são as áreas de atuação que reconhecemos como atributivas do estatuto de ator, que sendo a entidade estudada capaz de desempenhar, nos permite classificá-la como tal?

Esta questão não é posta com frequência, cremos, pela influência dos Estados como figura de referência para o estatuto de ator internacional, sendo que os Estados desempenham um leque de tarefas internacionais que nos habituámos a relacionar com esse estatuto. No entanto, a limitação de atuação de Estados é visível quando falamos dos chamados “novos desafios” como as alterações climáticas ou as migrações internacionais, cuja capacidade, mesmo de grandes potências, se encontra aquém da necessária para a sua resolução, sem que tal “destrone” o Estado como ator internacional.

No lado oposto do espectro, se uma entidade é exclusivamente focada numa destas “áreas de atuação”, seja ela, por exemplo, económica ou de segurança, exclusivamente, mas nesse âmbito é capaz de mostrar capacidade de ator, será tal suficiente para lhe atribuir o estatuto de ator, ainda que só ator internacional, respetivamente, económico ou de segurança?

Escolhemos um enquadramento que possibilite qualquer atuação, em uma ou mais áreas, desde que se comprove Vontade e Reconhecimento, justificando que, tal abordagem, permite melhorar a aplicabilidade desta ferramenta, por possibilitar a análise de atuação de uma entidade sem obrigar a uma análise exaustiva de todas as atuações da mesma, descobrindo se esta se comporta como um ator internacional, pelo menos, numa determinada área de atuação.

Tal permitirá que, com recurso ao modelo proposto, uma determinada entidade possa ser classificada como um ator de segurança internacional, provando que demonstra security actorness, mesmo que, ainda com recurso a este modelo, se verifique que a mesma entidade não é um ator económico internacional. Neste exemplo, a entidade em causa seria, todavia, um ator internacional, ainda que especificamente de segurança. Desta forma, cremos, este modelo permitir-nos-á responder à questão de se a UE é um ator internacional de segurança.

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