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2.2 Reforma de Estado

2.2.3 Reforma de Estado no Brasil

Em relação ao caso brasileiro é de se referir que este país tem vindo a empreender alterações no modo de estruturação do Estado, já a partir do

51 século passado. Para o contexto desta tese, tomaremos como referência os movimentos reformistas das duas últimas décadas desse século e deter-nos- emos no modelo de Estado gerencial, cujas características foram apresentadas anteriormente.

A concepção liberal, que era predominante na década de 1990, caracterizada pela adoção de um estado com uma postura de mero guardião da ordem e segurança nacionais, entendia que o Estado havia-se desviado de suas funções básicas para ampliar sua presença no setor produtivo, o que acarretou, além da gradual deterioração dos serviços públicos, o agravamento da crise fiscal e, por consequência, a inflação - dois fenómenos que vêm impondo, em todo mundo, a redefinição das próprias funções do Estado e da sua burocracia.

Nesse sentido entendeu-se que a reforma do Estado seria o único instrumento para consolidar a estabilização e assegurar o crescimento sustentado da economia brasileira. Para o efeito, a partir de 1995, começou a se defender um processo abrangente de uma nova Reforma da administração pública brasileira.

Essa reforma baseia-se, fundamentalmente, na introdução da cultura e de princípios gerenciais modernos, na administração pública, designadamente, i) desburocratização por meio de flexibilização administrativa e eliminação de procedimentos operacionais desnecessários; ii) descentralização (delegação de competências dentro da estrutura do Estado e estabelecimento de parcerias com a sociedade); iii) transparência, que permite uma maior publicidade das ações governamentais, possibilitando o controle social; iv) accountability; v) ética; vi) profissionalismo; vii) competitividade; e viii) enfoque no cidadão como principal usuário dos serviços públicos (JUCÁ, 2003, p. 10); princípios esses que viriam, posteriormente, a consolidar-se num Plano Diretor da Reforma do Estado, publicado e enviado para o Congresso Nacional no mesmo ano de 1995, e três anos depois, em 1998, se transformaria na Emenda 19.

52 Na verdade, a ideia da administração pública gerencial no Brasil começou a ser delineada ainda na primeira reforma administrativa, nos anos 193023, cujo

princípio orientador era o de que os serviços públicos deveriam ser descentralizados e não obedecer a todos os requisitos burocráticos da administração central.

Segundo Bresser Pereira (1998), o que motivou e acerelou, no Brasil, a transição da administração pública burocrática para a gerencial foi a assunção, pelo Estado, de um número crescente de serviços sociais, designadamente, educação, saúde, cultura, previdência, assistência social, entre outros, e isso exigiu do Estado maior e melhor resposta perante as demandas da cidadania.

Paula identifica alguns elementos que influenciaram o processo de reforma no Brasil:

i) A questão das características patrimoniais e autoritárias do Estado e da administração pública no Brasil;

ii) A crise do nacional-desenvolvimentismo e a ascensão do desenvolvimento dependente e associado;

iii) A visão dos organismos financeiros internacionais e o Consenso de Washington. (PAULA, 2005, p.105)

Laia (2009, p. 62), baseando-se em Bresser Pereira (1998), apresenta três aspetos fundamentais inerentes aos movimentos de reforma do Estado no Brasil:

1- Aspeto técnico, orientado para a gestão fiscal e redução dos custos do setor público;

2- Referente a gestão privada, admitindo-se que os “[...] mecanismos de

gestão estratégica, planejamento de recursos humanos,

administração de sistemas de informação que funcionam nas organizações privadas podem ser incorporados, não sem adaptação, à gestão de organizações públicas”;

3- Aspeto político, que apregoa o fortalecimento dos princípios democráticos.

Quanto ao próprio processo de implementação cabe referir que, nos primeiros quatro anos, 1995-1999, a reforma é executada ao nível federal pelo Ministério da Administração Federal e Reforma do Estado- MARE. Com a extinção do MARE, a gestão do processo passa para o Ministério do Planejamento e

23 O Estado brasileiro passou por duas grandes reformas administrativas: A burocrática,

53 Gestão, ao mesmo tempo em que Estados e Municípios passam também a fazer suas próprias reformas. (MARTINUZZO, 2007)

Vale destacar, segundo Bresser Pereira (1998) que o Brasil, ao iniciar essa reforma da gestão pública, em 1995, foi o primeiro país em desenvolvimento que tomou tal iniciativa24, menos de dez anos depois que Inglaterra, Austrália e

Nova Zelândia iniciaram suas reformas. O objetivo da Reforma é de contribuir para a formação, no Brasil, de um aparelho de Estado “forte e eficiente” e compreende, assim, três dimensões: i) uma dimensão institucional-legal, voltada à descentralização da estrutura organizacional do aparelho do Estado, através da criação de novos formatos organizacionais, como as agências executivas, regulatórias, e as organizações sociais; ii) uma dimensão gestão, definida pela maior autonomia e a introdução de três novas formas de responsabilização dos gestores- a administração por resultados, a competição administrada por excelência, e o controle social- em substituição parcial dos regulamentos rígidos, da supervisão e da auditoria, que caracterizam a administração burocrática; e iii) uma dimensão cultural, de mudança de mentalidade, visando passar da desconfiança generalizada que caracteriza a administração burocrática para uma confiança maior, ainda que limitada, própria da administração gerencial. (BRESSER PEREIRA, 1998)

Um dos princípios fundamentais da Reforma de Estado brasileiro, segundo o Plano Diretor da Reforma do Aparelho do Estado (1995) é o de que o Estado,

[...] embora conservando e, se possível, ampliando sua ação na área social, só deve executar diretamente as tarefas que são exclusivas de Estado, que envolvem o emprego do poder de Estado, ou que apliquem os recursos do Estado. Entre as tarefas exclusivas de Estado devem-se distinguir as centralizadas de formulação e controle das políticas públicas e da lei, a serem executadas por secretarias ou departamentos do Estado, das tarefas de execução, que devem ser descentralizadas para agências executivas e agências reguladoras autônomas. Todos os demais serviços que a sociedade decide prover com os recursos dos impostos não devem ser realizados no âmbito da organização do Estado, por servidores públicos, mas devem ser

24 Diferentemente de Moçambique, que somente em 2001 iniciou a reforma de Estado

contemplando algumas políticas sociais. Antes dessa data, não se podia falar de políticas públicas, nem mesmo em menor escala como no caso do Brasil, que o tema é contemplado já a partir de 1995, conforme apontado por Jardim (1999). Desde então, a Reforma da Gestão Pública vem avançando no país, principalmente ao nível de Estados e Municípios.

54 contratados com terceiros. Os serviços sociais e científicos, para os quais os respectivos mercados são particularmente imperfeitos, já que neles impera a assimetria de informações, devem ser contratados com organizações públicas não-estatais de serviço, as ‘organizações sociais’, enquanto que os demais podem ser contratados com empresas privadas. As três formas gerenciais de controle - controle social, controle de resultados e competição administrada - devem ser aplicadas tanto às agências, quanto às organizações sociais.” (BRASIL- PLANO DIRETOR DA REFORMA DO APARELHO DO ESTADO, 1995)

As estratégias da Reforma do Estado mudaram a forma de governar no Brasil para uma perspetiva de eficiência na prestação de serviço público pela descentralização dos recursos e decisões, num privilégio de mecanismos de participação do usuário em serviços públicos onde este, “não mais é um simples sujeito passivo, mas sim um cidadão”. (JURUÁ, 2005, p. 12)

Apesar dessa eficiência, imposta pelos princípios da reforma de 1995, é pertinente observar que a reforma do setor público no Brasil, por si só, mostra- se um processo lento, delicado e complexo, o que faz com que a maior parte da população no país não tenha percebido, ainda, o “sentido da trajetória que vem sendo feita, razão pela qual manifeste desconforto com os parcos resultados obtidos até aqui.” (JURUÁ, 2005, p. 14)

Diniz (1996) já havia observado que, a partir de meados dos anos 90, na era do governo Fernando Henrique Cardoso, a reforma de Estado Brasileiro revelou- se incapaz de realizar a ruptura preconizada por seus idealizadores. A reforma “ficou muito aquém das metas estabelecidas e mostrou-se inócua para atacar, em sua complexidade, os problemas responsáveis pela crônica ineficácia da ação estatal”. (DINIZ, 1996)

Por sua vez, Souza (1999, p. 201) observa que, apesar da reforma ter enfatizado a descentralização de Estado e municípios, ela não considerou as complexidades regionais envolvidas na sua implementação.

O próprio Bresser Pereira, considerado mentor desta reforma, admite ter ocorrido no processo, algumas falhas de implementação, contudo defende argumentando que, “uma reforma desse tipo leva 30 a 40 anos para poder ser julgada relativamente completa.” (BRESSER PEREIRA, 2010, p. 174)

55 É ainda pertinente observar que as três formas de administração no Brasil, patrimonialista, burocrática e gerencial, sucederam-se no tempo, mas nenhuma delas foi totalmente abandonada.

De uma forma geral, os debates sobre os programas da reforma do Estado trazem, inevitavelmente à tona, discussões sobre a ação e papel informacional do Estado no mundo contemporâneo e suas implicações na relação com os diversos atores da sociedade centrada no paradigma técnico e económico das TIC.

Orientados por esse princípio, e porque muito interessará para a compreensão do tema da presente tese, propõe-se à seguir, abordar o Estado que passa a informacional ao ter na informação o elemento fundamental de controle sobre a sociedade.

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