• Nenhum resultado encontrado

REFORMA PREVIDENCIÁRIA: UMA REALIDADE NA AMÉRICA LATINA DOS ANOS

REFORMA PREVIDÊNCIARIO PÚBLICO PRIVADO MISTO

Chile estrutural 1991 privado 96% 4% x

Peru estrutural 1992 privado 76% 24% x

Colômbia estrutural 1999 público 40% 60% x

Argentina estrutural 1999 misto 22% x 78%

Uruguai estrutural 1996 misto x 51% 49%

México estrutural 1997 privado 100% x x

El Salvador estrutural 1999 privado 90% 10% x

Bolívia estrutural 1999 privado 100% x x

Costa Rica estrutural 2000 misto x x 100%

Como se pode observar nesta tabela, o Brasil foi o único país, dentre os citados, que adotou um modelo diferenciado de reforma previdenciária. O governo brasileiro, a

priori, objetivava seguir os mesmos padrões adotados pelos outros países da América Latina, mas depois de três anos de discussões e várias oposições quanto ao posicionamento do governo vigente, a reforma se processou no modelo incremental, reduzindo os privilégios anteriormente adquiridos pelos trabalhadores e aumentando os anos de contribuição para se adquirir a aposentadoria.

Enfim, a diferença básica entre os dois modelos é que, no estrutural, o Estado repassa a responsabilidade da garantia pela aposentadoria aos sistemas previdenciários privados, em alguns casos chegando a 100%, como no México e na Bolívia.

Havia um incentivo por parte do Estado no sentido de que os trabalhadores aderissem aos sistemas privados ou mistos, na tentativa de reestruturar e solucionar os problemas acarretados com o pagamento das aposentadorias.

O sistema incremental não visa à substituição do sistema previdenciário público pelo privado. Ele não impede que o trabalhador busque um sistema privado, mas assume toda a responsabilidade do pagamento da aposentadoria. Sua reestruturação implica basicamente o aumento do tempo de serviço e de idade do trabalhador para requerer a aposentadoria.

Evolução histórica do sistema previdenciário brasileiro

Para um maior entendimento do sistema previdenciário brasileiro, torna-se mister um esclarecimento de todo o processo histórico e cronológico até se chegar ao modelo previdenciário adotado em 1998.

No Brasil, o sistema previdenciário idealizado na década de 1920 e colocado em ação na década de 1930 promoveu a inclusão das classes assalariadas urbanas do setor privado. Era feito sob a forma de seguro social, sustentado pela contribuição mensal assumida pelo assalariado.

O Estado instituiu um regime de capitalização, investindo em empreendimentos para garantir a receita decorrente do crescimento das despesas com benefícios pagos. A previdência recolhia a contribuição do filiado como meio de garantir uma poupança, ao mesmo tempo em que administrava os dividendos para o pagamento de benefícios e serviços, que cresciam sucessivamente.

A partir da Lei Elói Chaves, de 24 de janeiro de 1923, que criava a Caixa de Aposentadoria e Pensões, beneficiando os empregados das empresas de estradas de

ferro e seus familiares, começa um debate com relação à previdência social, apontando para a incontestável necessidade da previdência nos vários segmentos trabalhistas da sociedade brasileira. (SIMÕES: 1999)

Esse sistema previdenciário surgiu fragmentado: cada setor estabeleceu as regras de seu próprio sistema, não havendo uma unificação e uma normatização que enquadrasse todos os trabalhadores brasileiros, independentemente de suas respectivas profissões.

A importância fundamental da lei Elói Chaves está no fato de ela ter suscitado outros setores a buscarem esse tipo de benefício para os seus funcionários, aumentando o leque de beneficiados, apesar de não abranger todos os empregados.

Segundo Simões, 1999:

A importância atribuída à lei Elói Chaves sustenta-se principalmente em dois argumentos: o de que ela marca uma guinada na postura liberal do Estado brasileiro diante dos problemas trabalhistas e sociais, e de que seus princípios serviram de base para grande parte do conjunto de normas previdenciárias criadas posteriormente. (SIMÕES, 1999: 89)

Não há dúvidas de que essa lei foi um marco na história da previdência social brasileira. E tal modelo gestado nos anos 20 deu grande impulso à estruturação paulatina de um sistema previdenciário.

A partir da Lei Elói Chaves, muitas outras CAPs (Caixa de Aposentadoria e Pensões) foram criadas, chegando, nos anos 30, à existência de 183 modelos diferentes.

A partir de 1930 o contrato de seguro entre empregador e empregado característico da CAPs começa a ser substituído por dispositivos legais que colocam a previdência sob a égide direta do Estado, criando os Institutos de Aposentadoria e Pensões (IAPs). Com a criação destes institutos, instauram-se um vinculo por categoria profissional de abrangência nacional em substituição ao vinculo por empresa. Todos os trabalhadores incluídos em determinada categoria profissional oficialmente definida como tal, estavam vinculados ao seu respectivo IAP. (SIMÔES, 1999:93- 94)

Nos anos 30, Getúlio Vargas reestrutura a Previdência Social, incorporando praticamente todas as categorias de trabalhadores urbanos. Iniciado de maneira fragmentada, o sistema atinge a sua unificação em 1966.

Com a promulgação da Lei Orgânica da Previdência Social em 1960, esta é organizada em cinco grandes institutos e uma caixa, elevada também à condição de instituto e passa a abranger a quase totalidade dos trabalhadores urbanos brasileiros. Em 1966, todas as instituições previdenciárias foram unificadas no Instituto Nacional de Previdência Social (INPS). Em 1974, o Ministério do Trabalho e Previdência Social foi desdobrado e criou-se o Ministério da Previdência e Assistência Social, que passou a ter todas as atribuições referentes à previdência social. O INPS ficou responsável pela concessão de benefícios, assim como pela readaptação profissional e amparo aos idosos. (site (www.renascebrasil.com.br)

Mesmo com todas as melhorias ocorridas no período, a unificação do sistema, englobando todas as categorias de trabalhadores, aconteceu somente em 1966, com a Lei nº. 5.107, de 13 de setembro do mesmo ano, que instituiu o Fundo de Garantia por Tempo de Serviço – FGTS e o Decreto Lei nº 5.316, de 14 de setembro de 1967, que reuniu os seis Institutos de Aposentadorias e Pensões existentes no Instituto Nacional de Previdência Social - INPS. (COELHO: 2003)

As melhorias processadas na previdência em 1966 caminharam com certa tranqüilidade até 1998. Segundo SIMOES,

No caso do Brasil, as mudanças a partir da Reforma da Previdência podem ter rompido tradições que estavam inseridas no âmbito da sociedade brasileira desde a consolidação das leis trabalhistas processadas na década de 30 no governo de Getúlio Dornelas Vargas. Tal legislação tinha duas características marcantes: promover a inclusão aos direitos sociais mediante o critério de inserção formal de trabalho e buscar apoio de acordo com a importância estratégica dos setores econômicos envolvidos e com capacidade diferenciada de mobilização e reivindicação das categorias de trabalhadores. (SIMÕES, 1999:87)

Com relação ao novo sistema, pode-se afirmar, conforme o site da Previdência Social que “A Previdência Social é o seguro social para a pessoa que contribui. É uma instituição pública que tem como objetivo reconhecer e conceder direitos aos seus segurados. A renda transferida pela Previdência Social é utilizada para substituir a renda do trabalhador contribuinte, quando ele perde a capacidade de trabalho, seja por doença, invalidez, idade avançada, morte e desemprego involuntário, ou mesmo pela maternidade e a reclusão.” (www.previdenciasocial.org.br).

Somente a partir dos 16 anos é que o brasileiro pode começar a contribuir com a previdência social, mas muitas pessoas acabam não fazendo essa contribuição, o que acarreta sérios problemas no momento da aposentadoria.

No Brasil, estima-se que 40,2 milhões de pessoas possuem algum tipo de renda, mas não contribuem para a Previdência. Todo cidadão que trabalhe por conta própria, como cabeleireiro (a), costureiro (a), profissional liberal e ambulante, pode contribuir individualmente.(www.previdenciasocial.org.br) A Previdência Social estabelece e rege um contrato que o trabalhador faz com o governo federal, comprometendo-se a pagar, mensalmente, uma quantia previamente calculada ao Ministério da Previdência e Assistência Social (MPAS).

Surge uma unificação previdenciária com a criação do Ministério da Previdência e Assistência Social, aparecendo um perfil diferente de aposentados com esse modelo de unificação, englobando aposentados de todas as categorias trabalhistas, independentemente da hierarquização salarial, que eles tenham adquirido com o cargo desempenhado em suas atividades de trabalho.

A constituição de 1988 introduziu o conceito de “seguridade social”, entendido como “um conjunto de iniciativas dos poderes públicos e da sociedade destinado a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social.” (SIMÕES, 1999:106).

As reformas ocorridas no sistema previdenciário brasileiro têm causado várias polêmicas e dividido opiniões quanto ao melhor caminho a ser seguido.

A Emenda Constitucional nº. 20 modificou as regras que estavam em vigor, passando a entrar em ação a aposentadoria por tempo de contribuição e não por tempo de serviço, como era de costume.

Os trabalhadores podem se aposentar por período de contribuição (mínimo de 35 anos para homens e de 30 para mulheres) ou por idade (os homens aos 65, as mulheres aos 60). Esses limites são reduzidos em cinco anos para os trabalhadores rurais de ambos os sexos. (Emenda Constitucional nº. 20)

Esse item suscita algumas contradições quanto ao requerimento da aposentadoria na prática. Quando a lei diz que a aposentadoria pode ser “por período de contribuição’ ou “por idade”, não fica claro teoricamente se uma pessoa que jamais contribuiu com a previdência, conseguiria automaticamente se aposentar ao completar 65 anos (sendo homem) ou 60 (caso seja mulher). Mas não é bem isso o que acontece. Somente tem

direito à aposentadoria por idade e sem tempo de contribuição a pessoa que comprovar carência econômica. Após a comprovação e a aprovação da aposentadoria, o valor estipulado será de um salário.

Pessoas que possuem renda e não contribuíram com a previdência não têm direito ao benefício. Essa questão não fica clara na emenda nº 20, que menciona ser possível a aposentadoria por idade.

“O trabalhador é obrigado a comprovar o tempo de contribuição à Previdência, e não mais o tempo de serviço. Deixa de existir a aposentadoria proporcional por tempo de serviço.

O limite máximo para o valor das aposentadorias do setor privado é de R$1.200,00, reajustáveis de forma a preservar seu valor real. Nenhum benefício poderá ser inferior a um salário mínimo (correspondente a R$120,00 em maio de 1998). (E.C no. 20/98)

Os trabalhadores do setor público só podem se aposentar com salário integral se ganharem até R$1.200,00. Para as faixas salariais mais altas, é aplicado um redutor que pode atingir até 30% do salário”. (SIMÔES,1999:109)

Essa Emenda, ao estabelecer o teto de benefícios do Regime Geral de Previdência Social, no valor equivalente a 10 salários mínimos em dezembro de 1998 (R$1.200,00), e corrigi-lo apenas pelo INPC (não garantindo a restauração do valor real), efetiva o rebaixamento do benefício máximo pago pelo sistema. (ANDRADE, 2003: 113)

Por um lado, a Emenda Constitucional nº. 20 traz benefícios; mas por outro, traz prejuízos, principalmente quando coloca um teto menor que o existente, fazendo que os trabalhadores busquem uma complementação previdenciária por meio privado.

Além dessas medidas, as aposentadorias especiais (por 30 anos de contribuição, para os homens, e 25, para as mulheres) “são mantidas para professores do ensino fundamental e médio e para os trabalhadores cujas atividades são consideradas insalubres”. (SIMÔES,1999:109)

Magistrados e militares deixam de ter aposentadoria especial e, com um desconforto significativo, ameaçados e amedrontados, são compelidos a seguir as regras vigentes para os demais trabalhadores do setor público. (SIMÕES: 1999)

Aposentadoria precoce: efeitos da Emenda Constitucional no. 20?

Anteriormente à reforma, por volta de 1995, vivenciou-se uma verdadeira corrida rumo à aposentadoria, por pessoas de níveis sociais diversificados. Trabalhadores que estavam na ativa e que ainda tinham potencial físico preferiram buscar uma aposentadoria “precoce”, em virtude do receio de perder os benefícios garantidos pela legislação a ser modificada. Sendo assim, optaram pelo pedido de aposentadoria, aumentando o fluxo de aposentados nos anos de 1994 a 1998.

Esses aposentados se encontraram em situação distinta daquela dos trabalhadores que se aposentaram antes de 1994 e que haviam gozado da tranqüilidade necessária para esperar o tempo previsto para a aposentadoria, podendo planejá-la calmamente. Já os do período 94-98, tomados de surpresa pelas mudanças e pelo contexto de imprevisibilidade a que se submeteram, foram afetados em sua identidade como trabalhadores. No próximo capítulo, serão feitas reflexões sobre essas mudanças na Identidade dos recém-aposentados a partir de 1994.

O súbito aumento de pedidos para a aposentadoria nos anos 90 favoreceu um desequilíbrio financeiro da previdência social. “em 1997, fechou o ano com um desequilíbrio de R$2,5 bilhões, e as projeções para 1998, caso as reformas não se concretizassem, nem outras medidas possam ser adotadas, indicam que o déficit deverá situar-se na casa dos R$5 bilhões” (STEPHANES, 1998: 131). O déficit previdenciário acumulado até novembro de 1999 chegou a R$ 8,1 bilhões.

Antes mesmo da promulgação da Reforma Previdenciária, em dezembro de 1998, cresce o fluxo de concessão de aposentadorias por tempo de contribuição, tendo reflexo direto no aumento do déficit previdenciário, como mostra a tabela a seguir.

Tabela 3 – Previdência Social: Arrecadação x benefícios (1993 – 1997)

ANO ARRECADAÇÃO BENEFÍCIOS

1993 31 bilhões 30 bilhões

1994 32 bilhões 32 bilhões

1995 40 bilhões 41 bilhões

1996 45 bilhões 46 bilhões

1997 46 bilhões 48,5 bilhões

Fonte: elaboração a partir de dados do IBGE

Até 1993, a arrecadação da Previdência era maior do que os pagamentos com os benefícios. A partir de 1994, houve uma inversão desse quadro, gerando um déficit na

A questão do déficit da Previdência está intimamente relacionada à questão demográfica. Quando o sistema previdenciário foi fundado, a população brasileira era jovem. Na década de 40, por exemplo, a expectativa de vida era de 50 anos. Atualmente, a expectativa de vida gira em torno de 72 anos.

Tabela 4 - Expectativa de vida

ANOS DE REF. AMBOS OS SEXOS HOMENS MULHERES

1991 66 62,6 69,8

1998 68,1 64,4 72

2000 68,6 64,8 72,6

Fonte: IBGE

Atualmente, com o crescimento populacional, tem-se um número maior de pessoas em idade de se aposentar, e em contrapartida o número de pessoas em atividade tem diminuído. A sociedade brasileira conta, ainda, com trabalhadores que vivem na informalidade e não contribuem com a Previdência.

Em 1990, 19,3% dos trabalhadores trabalhavam sem carteira assinada. No decorrer desta década, este índice cresceu de acordo com dados da pesquisa mensal de emprego para 27,8%. Além destes trabalhadores, outros que trabalhavam na informalidade aumentavam ainda mais este índice de trabalhadores que não contribuíam com a Previdência Social, favorecendo a que o déficit

da previdência alcançasse índices alarmantes (PIMENTEL, 2003: 63)

As mudanças em decorrência do déficit previdenciário transformaram o perfil do trabalhador, afetando sua identidade, inclusive.

E, para se chegar à nova identidade do aposentado, principalmente no período escolhido para o desenvolvimento da pesquisa, foi preciso, antes de mais nada, estabelecer o que é velhice e principalmente verificar se o conceito de aposentadoria está atrelado à senilidade.

O próximo capítulo tem como objetivo primordial trazer uma discussão conceitual do que vem a ser velhice, terceira idade, idoso e aposentadoria, ressaltando a figura do velho e do aposentado, em contraste com o perfil dos jovens aposentados, categoria surgida com a Reforma Previdenciária de 1998, constituindo-se nos atores principais dessa dissertação. A categoria dos jovens aposentados é que é discutida no próximo capítulo.

Documentos relacionados