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PARTE II – A ESTRUTURA LÓGICO-NORMATIVA DA PROPORCIONALIDADE

3.3 As três (sub-)regras da regra de proporcionalidade: a adequação (idoneidade), a

3.3.2 A regra da necessidade

No mesmo item em que se comentou brevemente acerca da (sub-)regra da adequação, também se comentou acerca da (sub-)regra da necessidade e se afirmou que “uma vez que o meio escolhido é considerado adequado, cabe ainda avaliar se esse é o único meio adequado disponível, e, no caso de haver mais de um meio adequado, qual dos meios (igualmente

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É importante notar que essa medida só é inadequada caso haja outras medidas que realizem pelo menos ou com maior intensidade, ou com maior qualidade, ou em maior quantidade o fim em questão. O que proponho aqui é que seja realizado já na adequação um exame de “pré-necessidade”, pois isso facilita a análise quando da aplicação da regra da necessidade propriamente dita.

95 Ávila ainda reconhece a possibilidade de análise da adequação a partir de três dimensões:

abstração/concretude, generalidade/particularidade e antecedência/particularidade. Essa observação é muito interessante, mas extrapolaria o objeto de estudo. Portanto, ela não é considerada aqui. Para uma visão dessa tridimensionalidade, veja: ÁVILA, Humberto (2007): pp. 167 e seguintes.

adequados) promove na maior medida possível o conteúdo ideal de ambos os princípios, ou seja, qual dos meios interfere menos intensamente na não-realização de um princípio em detrimento da realização do outro (dever de necessidade)”96. Como se viu no item anterior, a

regra da adequação pode ser definida de pelo menos três maneiras distintas (quantidade, qualidade e probabilidade) e que um meio para ser considerado adequado precisa ser pelo menos ou mais intenso ou melhor ou mais certo para promover um certo princípio Pi do que

pelo menos um de todos os outros meios em questão. É importante ressaltar que, no modelo aqui defendido para a regra da adequação (o da realização de uma espécie de exame de “pré- necessidade”), ela envolve a avaliação do meio a partir de um baixo grau de relatividade97, pois, para que um meio seja considerado adequado, basta que ele não seja o meio menos intenso, pior e menos certo dentre os meios em questão. Já a regra da necessidade envolve um alto grau de relatividade, pois o objetivo aqui é o de definir quais meios, dentre aqueles considerados “adequados”, são os mais adequados, porquanto necessários. Esse alto grau de relatividade se deve ao fato de que os meios não são mais determinados somente a partir do grau de realização de um certo princípio Pi, mas também a partir do grau de não-interferência

em um outro princípio Pj. Com efeito, na regra de necessidade se exige que o(s) meio(s)

escolhido(s) seja(m) aquele(s) que menos interfere(m) na realização do princípio Pj, mesmo

que, para isso, o princípio Pi tenha de ser realizado em uma menor medida.

No exemplo do item anterior, já foram dados indícios da regra da necessidade na seguinte passagem: “Isso porque M3, ao obrigar a empresa a fazer uso de instrumentos de controle da produção de material poluente, promove em certa medida tanto P1 como P2, e acarreta um ônus menor para a empresa do que a medida M2. Suponha que M3 seja também capaz de realizar mais intensamente a preservação do meio ambiente do que M2, ou seja, suponha que, quantitativamente, há uma maior diminuição do montante de material poluente a partir do uso de filtros dentro da própria empresa, do que a partir da suspensão permanente das atividades de produção da empresa durante uma quantidade X de dias sem obrigá-la a, nos dias restantes aos da proibição, controlar a emissão de material poluente no rio. No exemplo, M3 é mais intensa, mais certa e melhor para promover tanto o princípio P1 como o princípio P2, sendo, portanto, a medida mais adequada”98. Grifei, propositadamente, as expressões “menor ônus” e “mais adequada”, pois elas se referem diretamente à idéia da necessidade. No

96 Conforme página 44 deste estudo.

97 O conceito fornecido por Alexy para a adequação aponta para um conceito absoluto, no sentido de que para

ser adequado o meio não precisa entrar em confronto com outros meios. O conceito defendido aqui é que pode ser importante já fazer um confronto prévio dentre os meios, para diminuir a complexidade da avaliação em fases posteriores.

caso do exemplo, M2, apesar de promover em grande medida o princípio da preservação do meio ambiente (P2), gera uma grande restrição no princípio da livre iniciativa das empresas (P1). M2 é mais intenso e melhor do que M3 para promover P2, embora M3 seja mais certo; M2 é ainda menos intenso e pior do que M3 para promover P1, e é mais certo do que M3 para não promover (ou para interferir em um alto grau na realização de) P1. Nesse caso, estão em jogo duas medidas (M2 e M3) que restringem e realizam tanto o princípio P1, como o princípio P2. Uma contribui mais para a realização de P1, e, assim, para a restrição de P2, e outra contribui mais para a situação inversa, isto é, para a realização de P2, e, assim, para a restrição de P1. Ambas seriam consideradas necessárias se originassem, no caso concreto, resultados idênticos ou pelo menos equivalentes para ambos os princípios. Como se viu, porém, M2 acarretaria um grande ônus para a empresa, pois interferiria seriamente em outros direitos fundamentais envolvidos (causando, por exemplo, o desemprego de vários trabalhadores). E essa interferência séria, indiretamente, acabaria por piorar a situação da comunidade. M3, por outro lado, gera um menor ônus para a empresa, e não oferece o risco sério de interferência que M2 oferece, embora se possa supor, ao contrário do que está expresso na passagem, que M3 realize em menor medida a preservação do meio ambiente. No caso expresso na passagem, como M3, além de oferecer um menor ônus para a empresa, ainda preserva mais o meio ambiente do que M2, M3, sem dúvida, é a medida necessária, e, portanto, M3 deve ser determinada e M2 deve ser afastada. Se se supõe que, ao contrário, M3, apesar de oferecer um menor ônus para a empresa, preserva menos o meio ambiente do que M2, nenhuma das medidas pode ser considerada como a mais adequada, i.e., como a medida necessária. Essa última situação é a que configura um caso difícil, e que não pode ser resolvido nem ao nível da regra da adequação, nem ao nível da regra da necessidade. Deve-se, assim, recorrer à terceira (sub-)regra, a da proporcionalidade em sentido estrito, para que se decida qual princípio deve prevalecer sobre o outro no caso concreto99.

99 O exemplo dado, compreendido a partir da colisão entre o princípio da livre iniciativa das empresas (P1) e o

princípio da preservação do meio ambiente (P2), serve para notar que, no caso de M1, a questão já é resolvida com a aplicação da regra de adequação, e, no caso de M2 e M3, dependendo de alguns aspectos que somente são possíveis de serem reconhecidos no caso concreto, pode ser que a questão já seja resolvida na própria aplicação da regra da necessidade, ou pode ser que a questão tenha de ser resolvida mediante a aplicação da regra da proporcionalidade em sentido estrito.

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