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Esta pluralidade e multidisciplinaridade de opções em projecto, estabelecidas nas diferentes categorias, não se limitam apenas à sua explicação singular, mas também, à relação sequencial de causas e efeitos entre os distintos tipos de acções e processos de intervenção. O projecto não se limita numa definição mas à sequência de casualidades que orientam e determinam o percurso do projecto na resolução do seu caso específico. Assim, pretende-se demonstrar de que modo se articulam as categorias nos diferentes casos de estudo propostos.

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42 Projecto foi integrado na ‘Porto, capital europeia da cultura, 2001’ com o objectivo de requalificar a ‘Baixa’

portuense – Zona Leste A –, sob coordenação do arquitecto Adalberto Dias, no qual foi desenvolvido o estudo para o largo de Santo Ildefonso e Praça da Batalha. Actualmente unificadas no espaço e na toponímia – Praça da Batalha

Representativo de uma demolição de parte do tecido urbano, no sentido de valorizar o monumento, é a intervenção na envolvente da Sé do Porto e do Paço Episcopal. O esquema 1 pretende expressar as acções então desencadeadas e quais as consequências para o espaço público.

Esquema 1 Deslocação Valorização do Lugar Demolição Tecido Urbano Construção Consolidação

Espaço Público Texturas

Paisagem

Edifício

Analisando o esquema 1, no centro, como acção principal, a ‘demolição’ em que ‘tecido urbano’ agrupa as intervenções nas quais as alterações na relação entre monumento e a envolvente resultaram da destruição de uma parte considerável da estrutura urbana. As demolições efectuadas nos anos 40 na Sé do Porto, integradas nas Comemorações do Centenário, tinham como intenção o desafrontamento da Catedral, a criação de um espaço público voltado para a cidade e a introdução de novas acessibilidades com a reestruturação das ruas circundantes. A intervenção tem como sequelas a descontextualização do lugar por perda de parte do seu património físico, cultural e social.

Numa posição aleatória, a acção ‘deslocação’ representa a valorização do espaço urbano como consequência da descontextualização imposta pela ‘demolição’, ‘deslocação’ e ‘construção’ do monumento. Exemplo é a Capela de Nossa Senhora de Agosto ou dos Alfaiates que, antes da reconstrução, tinha como contexto a frente da Sé. A sua deslocação permitiu a salvaguarda do edifício, mas retirou-lhe parte da sua identidade visto que a nova localização nem lhe restitui a imagem primitiva nem lhe confere novas valências, apenas se valoriza o espaço que recebe uma nova referência.

Contextualizando: na realização do ‘Arranjo da zona histórica da Sé e dos paços do Concelho’, em 1939, a Avenida da Ponte a Este da Sé, a execução de um arruamento a nascente (Rua Chã e Largo do Corpo da Guarda) e a abertura de um percurso a eixo da fachada principal, constituem-se como acções de reorganização das acessibilidades da Área Metropolitana do Porto. O arranjo evidencia a falta de flexibilidade do tecido de origem medieval na adaptação às exigências do desenvolvimento da urbe.

Também intenção programática da intervenção foi a regularização do espaço envolvente ao templo, inserindo-se na acção de ‘construção’ do ‘espaço público’. Esta subcategoria abrange todas as intervenções cujo objectivo seja a recontextualização do monumento através da definição e construção de espaço público. Ora, não sendo propriamente um reconhecimento do valor como seria na subcategoria ‘texturas’, é o uso de um novo espaço público como instrumento de redefinição da relação da Sé com a envolvente.

Em relação à subcategoria ‘paisagem’ a definição cinge-se ás intervenções em que tenham sido regularizados e redefinidos a implantação dos monumentos no intuito de os repor a níveis e conceitos primitivos, de o integrar, potenciar e valorizar o espaço público. Neste caso da Sé do Porto a alteração da paisagem construída resulta na desintegração do monumento e não na necessária integração. A última derivação é o edifício e o uso de nova estrutura como forma de reposicionamento e valorização do conjunto, do monumento e espaço público no seu contexto: A construção da ‘Casa dos 24’ do arquitecto Fernando Távora recontextualizou ou reenquadrou o conjunto monumental da Sé à imagem e escala primitiva antes da demolição.

O esquema 1.1, ainda incluído na categoria ‘demolição’, diferencia-se do primeiro na orientação e escala de intervenção. No esquema 1, analisa-se a influência do território sobre o monumento, na subcategoria ‘partes’, as intervenções que envolvam a reposição ou a modificação do desenho original do monumento e que directamente influenciem uma alteração na leitura do espaço público contíguo, ou seja, muda-se o sentido.

Alguns dos exemplos aqui analisados documentam deslocações de pequenos elementos urbanos contíguos aos monumentos como pelourinhos, fontanários e cemitérios, mas de igual valor histórico, cultural e social

Esquema 1.1 Deslocação

Valorização do Lugar e Monumento

Demolição

Partes

Construção Consolidação

Espaço Público Texturas

Paisagem

Entre outras, a Igreja Matriz de Lourosa em Oliveira do Hospital, Coimbra, constitui um exemplo eficaz para expressar na prática o que este esquema sugere. Em 1931 foi elaborado pelo arquitecto José da Costa Vilaça, com colaboração do Cónego Aguiar Barreiros43 e supervisão do arquitecto Baltazar de Castro, o ‘Projecto de restauração da Igreja de São Pedro de Lourosa’, no qual foi modificado o desenho do corpo central, removidas as construções adoçadas ao monumento e deslocado o campanário.

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43 José da Costa Vilaça, ‘memória justificativa do projecto de restauro da Igreja de São Pedro de Lourosa’ p.1-10,

[s.d.].

A propósito da autoria do projecto é possível ler-se num texto publicado na revista ‘Ilustração Moderna’ nº 55, revista dirigida pelo arquitecto Vilaça, que a este e ao cónego Aguiar Branco se deve atribuir a autoria do projecto de restauro. No entanto nele também se depreende a influência do arquitecto Baltazar de Castro (Director dos Monumentos Nacionais), inclusive existem duas memórias descritivas assinadas por este, na realização da obra e na deslocação do campanário. ‘Igreja de Lourosa – Ainda a visita do Sr. Professor Gomez Moreno – Esclarecimento oportuno’. Revista ‘Ilustração moderna’, nº55, 7ºano. (PT DGEMN:DSID-001/006-0596/2)

Igreja da Matriz de Lourosa cerca de 1928 + 1932

IHRU

O processo de deslocação foi definido no ‘Projecto para a mudança do campanário da Egreja Matriz de Lourosa’ pelo arquitecto Baltazar de Castro, com o objectivo de desafrontar a igreja e salvaguardar o campanário44. Segundo o boletim da DGEMN, esta deslocação foi justificada por ‘além de ocultar45, como um remendo grosseiro, cerca de um terço da fachada do nártex, tinha características que não podiam harmonizar-se, de modo algum, quer estética, quer cronologicamente, com a feição da venerável “orada” novecentista’46. Pode-se facilmente construir um discurso credível para justificar a remoção de anexos recentes, que descaracterizem ou mutilem a estrutura do monumento. Mais difícil é justificar a amputação do contexto histórico, territorial e local de um campanário medieval, relegando-o para uma posição secundária. Em suma, trata-se de uma descontextualização que nem valoriza o lugar nem dignifica o monumento. A ‘construção’, tanto do espaço público como de paisagem, estão relacionados com a transformação por ‘demolição’ de ‘partes’, contudo é evidente a construção de um novo espaço público sobre as ruínas dos anexos numa atitude igualmente díspar às hipóteses levantadas na subcategoria de ‘texturas’. Com a paisagem, o desenho materializa vicissitudes históricas e locais na redefinição, regularização do adro e terrenos circundantes.

Reiterando os casos da Capela de Nossa Senhora de Agosto ou dos Alfaiates como no campanário da Igreja Matriz de Lourosa, a deslocação resulta da descontextualização devido à

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44 A memória justificativa do projecto esclarecia que esta solução para a deslocação do campanário permitia que o

monumento ‘ficasse bem visível por todos os lados’, economicamente uma mais-valia (sem recurso a expropriações), e definia a torre sineira como ‘uma nota de interesse no terreno circundante, perfeitamente isolado e oferecendo cómoda acessibilidade’. Baltazar de Castro ‘memória justificativa referente ao projecto para a mudança do campanário da Egreja Matriz de Lourosa’. Porto, 19 de Julho de 1931. (PT DGEMN:DSARH-010/181-0006)

45 De acordo com a memória descritiva do arquitecto Baltazar de Castro, o campanário, ‘d’época mais recente’,

afrontava ‘quasi todo o conjunto’, justificando-se assim o projecto da ‘sua mudança para o lado fronteiro’. Baltazar de Castro, ‘memória descritiva e justificativa do ‘Projecto de reestruturação da Igreja Matriz de Lourosa’. Porto, 15 de Fevereiro de 1931. (PT DGEMN:DSARH-010/181-0006)

demolição de parte ou do conjunto dos respectivos monumentos (ver esquema 2). Confirma-se que, para estes casos, a acção de ‘demolição’, ‘deslocação’ e ‘construção’ culmina na valorização do espaço urbano e não do monumento.

Esquema 2

Descontextualização Recontextualização

Deslocação

Demolições Lugar Consolidação

Tecido Urbano Monumento Texturas Partes

As ‘Portas da Cidade’ de Ponta Delgada exemplificam a acção em que a intenção principal da ‘deslocação’ é a reintegração do monumento no intuito de o preservar e valorizar. Neste caso, a intervenção reconhece o valor/qualidade do monumento e apoia-se no desenho e espaço público como instrumento de dignificação ou para atribuição de novas valias tanto ao lugar como ao monumento.

A descontextualização no esquema 3 representa a degradação dos monumentos devido a causas naturais ou à inacção/acção do Homem. Exemplos representativos são o Promontório de Sagres e a Cava Viriato. Para o primeiro, o estado de deterioração foi resultado do abandono e, para o segundo, do amontoar de construções que turvam a sua leitura e pouco dignificam o espaço envolvente.

A recontextualização dessas ‘ruínas’ envolve processos de reabilitação e construção de novas estruturas e novos espaços públicos no intuito de valorizar e enquadrar os monumentos no território. Na subcategoria ‘paisagem’ a integração envolve a regularização e redefinição da implantação do monumento no intuito de o repor a níveis e conceitos primitivos a fim de integrar, potenciar e construir espaço público.

A ‘construção’ e a dinâmica do desenho e gestão do território funcionam paralelamente e complementam-se no desenvolvimento das suas acções. Um, porque lhe reconhece o valor e o enquadra do mesmo modo que a construção do espaço público. Outro, porque aproxima o monumento à cidade com o intuito de o adaptar ao desenvolvimento, interacção e modificação do tempo, infra-estruturas, circulações viárias e pedonais, política e económicas e vivência social.

Esquema 3

Descontextualização Recontextualização

Construção

Demolições Edifício Consolidação

Espaço Público Texturas

Paisagem

O esquema 4 pretende esquematizar as intervenções de recontextualização dos monumentos antes e pós Estado Novo.

Esta nova filosofia de intervenções contemporâneas são o resultado de uma diferenciação cultural na abordagem às questões do património arquitectónico e, sobretudo, na alteração da noção de conjunto patrimonial. Este conjunto revê-se nos valores de paisagem transformada ou a transformar, na perda de monumentalidade ‘estática’ dos monumentos, na inclusão de edifícios de menor escala e na redefinição dos conceitos de património.

A influência do monumento deixa de ser sentida isoladamente do seu contexto físico, histórico e social e surge como parte integrante da paisagem, um marco num landscape de lugares e territórios, compondo e transformando as vivências e memórias do homem. Compõe-se em definitivo a importância do património como um legado cultural entre gerações e potencializa-se

o espaço público como um instrumento de reabilitação e aproximação do monumento com a cidade.

A Intervenção pretende ser sinónimo da ‘obra mínima’, em que o resultado é o reconhecimento do valor do monumento e do seu enquadramento e, que através do espaço público, reforcem e dignifiquem essas valias na sua adaptação aos novos desígnios e conceitos urbanos e sociais. Os exemplos propostos na subcategoria de ‘texturas’ são a ‘Requalificação da Zona Envolvente à Abadia de Santa Maria de Alcobaça’, o ‘Projecto de arranjo da praça de São Tiago’ em Guimarães e o ‘Plano de requalificação da Baixa Portuense’ no Porto.

Esquema 4 Consolidação Deslocação Texturas Construção Edifício Paisagem

Demolições Espaço Público

O esquema apresenta três categorias de relação: a ‘demolição’, por acção de projecto e desenho resulta em processos de redefinição do tecido urbano envolvente ao monumento, numa referência às intervenções ainda no Estado Novo, como as da Sé do Porto, Vila Viçosa e as circundantes às muralhas dos castelos de Guimarães, Lagos ou Guarda; a categoria ‘deslocação’ para enquadrar alguns elementos simbólicos, como os pelourinhos e fontanários; e a constante interacção com a ‘construção’ de ‘obra nova’ no intuito de preservar, valorizar e, sobretudo, dar uso ao património. O exemplo é a intervenção de Idanha-a-Velha – ‘Projecto de Recuperação Patrimonial e Valorização de Idanha-a-Velha’ –, que para além do restauro da muralha (Porta Norte) e da Basílica (interior e exterior), introduziu o conceito de ‘obra nova’ com a construção do expositor de epigrafia e do ‘Plano de Pormenor para a zona envolvente da Capela do Espírito Santo e zona de expansão Norte’.

3

Demolição

3.1. Criação de uma praça como exaltação do monumento