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Relação entre o nível de incapacidade, o optimismo e a qualidade de vida

A nossa segunda e terceira hipóteses de trabalho prendiam-se com o facto de compreender qual o efeito que o nível de incapacidade tem na avaliação que o doente faz da sua qualidade

de vida e do seu nível de optimismo. Neste sentido, prevíamos que os doentes que tivessem

uma maior incapacidade seriam também aqueles que apresentariam um menor nível de

qualidade de vida e optimismo.

Analisando em primeiro lugar o optimismo, verificámos que o mesmo não era influenciado pelo nível de incapacidade que os doentes apresentavam. Desta forma a hipótese por nós lançada não se confirma.

A nível mediano o grupo que mais se destacou pela positiva, foi o grupo de doentes com maior nível de incapacidade, isto apesar de tal facto não se apresentar como um dado estatisticamente significativo. O oposto ocorre em relação ao grupo incapacidade moderada.

Comparando os 3 diferentes níveis de incapacidade (incapacidade fraca, incapacidade

moderada e incapacidade severa), aferimos que no que toca à qualidade de vida, o nível de incapacidade apresentado pelo doente não influenciava a avaliação que o mesmo fazia em

relação a esta componente, ou por outras palavras, os doentes que apresentaram um nível mais elevado de incapacidade não registaram níveis mais baixos de qualidade de vida. Sendo assim a nossa segunda hipótese em estudo não se confirma.

Se observarmos mais em concreto cada uma das diferentes sub escalas que compõem a avaliação da qualidade de vida, verificámos que das 6 sub escalas existentes, somente na sub

escala mobilidade e na sub escala bem-estar emocional é que se verificou a existência de uma

diferença de medianas (estatisticamente significativa) entre os três níveis de incapacidade. Estes resultados reforçam os resultados obtidos por Santos, Trindade & Teixeira (1997), já que segundo os mesmos, a incapacidade também se apresentou como um factor relacionado com a mobilidade, sintomas e bem-estar emocional.

Em relação à sub escala mobilidade, a relação da mesma com o nível de incapacidade foi aqui comprovada e era previsível, uma vez que uma das componentes avaliadas na escala de incapacidade (EDSS) é precisamente o nível de mobilidade que o doente apresenta. Apesar de não se ter assinalado uma relação entre a qualidade de vida e o nível de incapacidade, podemos observar que quer nas sub escalas de qualidade de vida quer na qualidade de vida

geral, o grupo de doentes com incapacidade moderada, foi o grupo que registou sempre os

valores medianos mais baixos, apesar desses valores não terem sido estatisticamente significativos. Ou seja, vemos aqui a mesma tendência anteriormente registada no optimismo.

Tal facto indica-nos que existe uma possível tendência para este grupo em especifico possuir algumas características que levem a que tal ocorra. Em relação a esta circunstância poderemos especular que, enquanto o grupo de incapacidade fraca não apresenta défices muito notórios ou que dificultem grandemente o seu dia-a-dia, quando esse mesmo grupo de doentes evolui para um quadro clínico mais grave no qual as incapacidades começam a ser mais evidentes, tal facto pode eventualmente causar no doente uma postura menos optimista face à sua situação, o que levaria por sua vez, ao decréscimo da avaliação que o mesmo faria da sua vida de um modo geral. Por sua vez, a passagem de uma incapacidade moderada para uma incapacidade severa, embora englobe transformações muito rigorosas, poderá não se tornará tanto um factor de choque para o doente uma vez que o mesmo já havia adquirido uma maior capacidade e estratégias para lidar com a doença, ao longo do evoluir da mesma. Capacidades essas, que talvez não estivessem tão desenvolvidas na passagem da incapacidade

fraca para a incapacidade moderada, uma vez que na incapacidade fraca o doente encontra-

se debilitado porém o seu estado de saúde pode ser considerado quase normal em alguns casos.

É precisamente neste ponto de análise, e tendo como base a reflexão anteriormente exposta, que fazemos a ligação com o facto da sub escala de bem-estar emocional apresentar correlação positiva com o nível de incapacidade. Apoiamos esta constatação no facto de que é precisamente o grupo incapacidade moderada que regista o valor mediano mais baixo na sub

escala bem-estar emocional e é o grupo incapacidade severa que apresenta um maior nível de optimismo.

Relativamente aos aspectos anteriormente mencionados, temos algumas bases teóricas que vão a favor e contra os nossos resultados, senão vejamos, segundo Benito-León, Morales & Rivera- Navarro (2002), os doentes que apresentam nos seus resultados de qualidade de vida uma redução no que diz respeito aos factores cognitivos apresentam por outro lado um incremento nas componentes emocionais, isto acontece tanto quanto maior for a severidade da doença. O mesmo autor, chega ainda a afirmar que os doentes de EM têm uma maior preocupação no que toca aos problemas como a saúde mental, os problemas emocionais e a sua vitalidade de um modo geral, do que propriamente com a sua incapacidade física.

No que diz respeito à qualidade de vida e numa perspectiva de análise oposta, o mesmo autor afirma ainda que em alguns casos, a melhoria da qualidade de vida em especifico, não será reflexo de uma adaptação à patologia, mas antes a existência de um défice na memória autobiográfica (que ocorre em muitos casos de EM) que levaria a que o doente não tivesse uma completa noção da sua qualidade de vida passada, fazendo com que o mesmo ficasse incapaz de realizar uma avaliação válida acerca da sua qualidade de vida presente. Contrariamente à fundamentação exposta, também podemos pensar que o doente apresentaria uma melhor qualidade de vida e optimismo com o aumento da incapacidade, tendo em conta “The Loss Theory”, a qual explica que o aparecimento da doença crónica, faz com que o doente reorganize as suas prioridades e valores de vida, levando a que por vezes o mesmo apresente uma melhor qualidade de vida e optimismo, apesar de possuir níveis de

incapacidade elevados (Dembo, Leviton and Wright, 1956, citado por Bishop et al, 2005).

Ayatollahi et al, (2007), reforça igualmente as ideias anteriormente expostas ao afirmar que a progressão da doença parece afectar mais a qualidade de vida nas fases mais iniciais da doença do que nas subsequentes.

A não linearidade da relação qualidade de vida e incapacidade, sugere que a pesquisa realizada nesta área não pode acolher os doentes de EM como uma população homogénea.

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