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CAPÍTULO IV – O ESTÁGIO: DESAFIOS DAS

4.5. A Revisão de todo o Processo: Sistematizando

4.5.2. Relações Individuais de Elisangela

4.5.2.a) A Família e as Práticas de Alfabetizar e Letrar

Elisangela demonstrou, em seus depoimentos, uma relação de carinho e respeito pela figura do pai. Seus relatos em relação ao ambiente familiar, dizem respeito a seu interesse precoce pela leitura que aconteceu em casa, junto aos jornais, aos gibis e à televisão. Lembrou do quanto gostava de ler e que o fazia muito bem, antes mesmo de entrar para a escola. Os encontros com a pré-escola e a primeira série foram relembrados como momentos agradáveis, em vista da relação de afeto oferecida pelas professoras com as quais Elisangela manteve contato. Os anos posteriores foram difíceis, na medida que Elisangela teve que lidar com a ausência da primeira professora e criar suas próprias estratégias de sobrevivência diante de uma escolarização marcada pelo autoritarismo e pela ineficiência de professores despreparados. As referências feitas ao pai foram significativas, pois, na figura paterna, a colaboradora encontrou o apoio que necessitava para enfrentar os obstáculos durante o período escolar. Elisangela não fez maiores referências aos familiares além das que já estão relatadas no conjunto da dissertação.

Uma das significações do período de infância que Elisangela refletiu em suas práticas de alfabetizar e letrar foi a oportunidade que ofereceu aos alunos de manterem um contato mais aproximado com situações de leitura e escrita, especialmente nos espaços da escola com recursos – em especial, a biblioteca – pois ela relembrou o quanto essa interação inicial com a escrita e a leitura, desde muito cedo lhe foi significativa. Em muitas situações, o professor estabelece relações entre suas práticas e as lembranças que lhe são importantes e agradáveis em determinado momento de sua vida. Neste sentido, Orlandi (1996) afirma que, não há como fugirmos da subjetividade e dos simbolismos em todas as nossas escolhas, e isso inclui, como professoras, também, nossas práticas pedagógicas.

4.5.2.b) A Escola e as Práticas de Alfabetizar e Letrar

O primeiro ano do Ensino Fundamental foi para Elisangela o momento em se descobriu leitora ávida de tudo o que encontrava. Conforme um de seus relatos, procurou aproveitar os espaços escolares, principalmente a biblioteca, quando possível, para ‘ler tudo o que via pela frente’. A escola, para a colaboradora, também foi o ambiente onde perdeu sua identidade como criança. As brincadeiras, os sonhos da infância deram lugar à rigidez dos professores, as regras impostas, às exigências absurdas. Elisangela deixou transparecer sua revolta nos depoimentos em relação a esses momentos. Comentou em um dos relatos que perdeu ‘o gosto pela leitura’ e não soube explicar como isso aconteceu. Afastou-se da escola, porque esta instituição, em suas diferentes estratégias, também passou a excluí-la.

O Ensino Médio não foi menos ‘desafiante’ para Elisangela. Marcado por algumas reprovações, desistências, e pela presença constante de ‘maus’ professores, a colaboradora precisou usar de toda a sua persistência para seguir em frente. Tentou, após esse período, fazer um Curso de Auxiliar de Enfermagem, em Santa Maria, mas não se sentiu bem no curso, desistindo logo a seguir. Por fim, definiu-se por fazer Pedagogia, contrariando o teste vocacional realizado no Ensino Médio, que lhe indicava cursos mais direcionados à Administração, às Ciências Contábeis e ao Direito. Com isso, Elisangela fez o vestibular, sem prévia preparação, ‘indo cair de pára-quedas’ no Curso, como ela mesma comentou em um dos relatos.

A trajetória escolar desta colaboradora relacionou-se com suas práticas de alfabetizar e letrar, na medida que Elisangela sentiu-se em conflito diante dos valores instituídos da escola em que realizou seu Estágio, reconhecendo-os como presentes desde seu período de infância e adolescência. Tentou valorizar, durante o Estágio, uma nova postura pedagógica, refletindo sobre o valor da educação e a importância do ser professor em uma escola que necessita corresponder às exigências cada vez maiores da sociedade atual. Segundo Antunes (2001), essa tentativa de ressignificar o papel do professor perante a sociedade é uma forma de resistência ao que é instituído, demonstrando o potencial de criação e transformação que nos é inerente e que nos torna singulares e autônomos.

Suas práticas, conforme os relatos autobiográficos orais e escritos, tiveram um diferencial no sentido de explorar os espaços e as possibilidades de criação da instituição escola através de atividades tais como passeios, elaboração de cartazes, convivência com os espaços ‘letrados’ da escola, atividades de produção coletiva de textos, jogos e brincadeiras

entre outros. Enfim, atividades de valorização da criticidade e autonomia no meio escolar contrapõe-se a postura que seus professores adotaram em sua trajetória escolar – segundo seus relatos ela –, indicando uma ressignificação do professor-autoritário para o professor- mediador.

4.5.2.c) A Formação Inicial e as Práticas de Alfabetizar e Letrar

Também o processo de formação inicial de Elisangela teve influência em suas práticas de alfabetizar e letrar durante o período de estágio. Esta formação foi permeada, conforme os relatos autobiográficos da colaboradora, pela possibilidade de ampliação de sua visão de mundo. Livre das pressões sentidas durante sua trajetória escolar, ela encontrou na Universidade o espaço que necessitava para expressar-se como ser humano e como profissional. Acreditou na validade da Universidade a partir do momento que ressignificou o “ser professor” através da possibilidade de incentivar mais jovens a realizarem uma formação superior, não importando, especificamente, qual.

A sua Formação Inicial foi caracterizada pela ênfase ao ensino teórico do Curso, sendo que a estrutura curricular do mesmo não contemplava atividades práticas de forma a ambientar as acadêmicas com a realidade escolar desde os primeiros semestres. Entretanto, considero que o apoio dado pela Orientação do Estágio em momentos de maior dificuldade, comuns a todas às acadêmicas, nesse período, tenha sido encorajador para que desse continuidade e superasse os mesmos, interagindo com habilidade e reflexão, entre as dimensões prática e teórica que constituíram seu estágio. Antunes (2001) afirma que o estabelecimento de uma prática reflexiva é um processo que surge na formação inicial desde que haja a consideração dos professores formadores em relação às trajetórias individuais de cada acadêmico.

A Formação Inicial de Elisangela, portanto, relacionou-se com suas práticas de alfabetizar e letrar, na medida que acadêmica conseguiu ampliar seus conhecimentos, em relação à alfabetização e ao letramento, percebeu o valor da dimensão teórica aliada à prática, no momento do Estágio e, desenvolveu atividades de acordo com suas concepções sobre o alfabetizar e o letrar.

4.5.2.d) Os Condicionantes Pessoais e as Práticas de Alfabetizar e Letrar

As práticas de alfabetizar e letrar de Elisangela foram influenciadas em maior ou menor escala pelo condicionante pessoal de residir em outro município vizinho a Santa Maria – Restinga Seca –, necessitando viajar, diariamente, até a escola em que realizou o Estágio Supervisionado. Nesse caso específico, acabou por gerar conflitos pessoais e stress pelo esforço em assumir variados papéis de alta responsabilidade em um mesmo período. Cabe lembrar que esse condicionante não impediu Elisangela de desenvolver suas práticas de alfabetizar e letrar com qualidade, mas lhe exigiu um esforço físico e mental maior durante aquele período.