• Nenhum resultado encontrado

Procurando mostrar o trabalho realizado na sala de recursos, vou relatar o caso de um aluno com 17 anos de idade com diagnóstico de Déficit intelectual, atendido por mim, que frequenta o 6º ano de uma Escola de Ensino Fundamental da Rede Estadual.

Até o ano de 2008, frequentou classe especial, sendo, no final desse ano, transferido para o 2º ano regular do Ensino Fundamental de nossa escola. Na ocasião tinha 13 anos, não era alfabetizado e também não sabia escrever seu próprio nome.

C A P ÍT U LO 3

Avançou ano após ano, sendo que, aos poucos, foi estabelecendo as relações de escrita e leitura. Atualmente, consegue ler, decodificando, o que ainda lhe causa dificuldades de compreensão do que foi lido. Sua escrita contém diversos erros ortográficos, omitindo letras, muitas vezes invertendo-as, mas é possível de se compreender o que escreve. Percebe- -se que ele tem vergonha de ler. É necessário insistir para que realize a atividade. Quando escreve, sempre pede que eu confirme se está certo ou errado, se é esta ou aquela letra. Quanto ao raciocínio lógico, necessita utilizar materiais concretos para efetuar cálculos de adição e subtração. Não domina conceitos de divisão e multiplicação.

Sua interação social é um tanto complexa, visto que não gosta de se relacionar com os colegas e expressa isso claramente. Impõe respeito pelo medo, o que pode ser caracterizado como forma de autoproteção, embora não seja agressivo fisicamente, só verbalmente. É um aluno que diz não gostar da escola, não ter amizades e somente no ano de 2012 conseguiu estabelecer um vínculo real comigo, sendo que frequenta esses atendi- mentos desde o ano de 2008.

No ensino regular, realiza a maioria das atividades. Não gosta de traba- lhar em grupo e raramente pede auxílio para realizar tarefas. Também não se manifesta verbalmente, somente o essencial. As atividades de trabalhos e avaliações são feitas em Sala de Recursos, onde leio as questões, explico as atividades e ele realiza aquilo que consegue.

O plano de atendimento trata-se da confecção de um livro de nomes femininos, temática proposta pelo aluno. A ideia surgiu quando o aluno trouxe para o AEE um caderno (Figura 4) que havia ganho no ano ante- rior de sua professora do ensino regular. Nesse caderno, o aluno havia escrito alguns nomes de meninas. Mostrou interesse em descobrir novos nomes. A partir disso, foram direcionados os demais atendimentos para a pesquisa de outros nomes. Foi utilizada como fonte de pesquisa jornais, revistas e internet. Na internet, a pesquisa teve início utilizando um buscador para localizar sites que apresentavam conteúdos relacionados a nomes. Com a orientação, selecionou-se alguns sites, identificando os nomes femininos e, a partir disso, o aluno decidia quais desses nomes queria que constasse em seu livro.

Com essa atividade buscou-se trabalhar com o aluno diferentes elementos de pesquisa, escrita, leitura, sequencialização, além de se tra- balhar com os aspectos emocionais envolvidos na temática, bem como a autoestima e confiança desse aluno.

Num primeiro momento, se começou escrevendo os nomes nesse caderno. Depois de alguns atendimentos questionou-se o aluno se ele não gostaria de digitar esses nomes pesquisados colocando-os em or- dem alfabética, para que depois fizéssemos a impressão e encadernação do material, como se fosse um livro. O aluno gostou da ideia e mostrou entusiasmo. E assim fizemos. O computador mostrou-se um elemento motivador para o desenvolvimento da proposta com o aluno. Sabemos que o uso das tecnologias tem papel fundamental na aprendizagem, pois se mostram como fortes aliadas nesse processo. O computador pode ser utilizado como facilitador da aprendizagem, através da utilização de diferentes softwares ou mesmo como recurso para escrita, e também como motivador e lúdico, pois, segundo relato dos próprios alunos, é mais gostoso e divertido escrever no computador.

Esse processo de construção do livro de nomes femininos levou praticamente um trimestre. Como apontei, procurei explorar a atividade, mediando os processos de leitura e escrita. Ao final do trabalho, o aluno demonstrava maior segurança, tanto na leitura como na escrita.

Durante todo o processo de pesquisa, escrita e confecção do material, o aluno foi estreitando seus vínculos comigo, passando a relatar algumas situações de sua realidade social. Com esses relatos, consegui compreender um pouco mais o seu dia a dia. É um aluno que quando não está na escola trabalha como catador de material reciclável, ou seja, tem responsabilida- des de auxiliar na renda da casa. Ressalto que ele vem de uma família de nove irmãos e todos moram na mesma casa. É uma casa pequena, com precária infraestrutura (Figura 5).

Expressou alguns aspectos de sua intimidade. Relato isso porque, desde o ano de 2008, quando iniciei os atendimentos com o aluno, nun- ca havia conseguido uma proximidade com ele. Ele se mostrava muito fechado, normalmente era mal-humorado, muitas vezes indelicado, o que tornou o trabalho difícil por muito tempo. Mas, o que me motivava

C A P ÍT U LO 3

era que ele jamais faltava aos atendimentos, então, de alguma forma, ele gostava de frequentar o AEE, embora não admitisse isso, pois sempre negava que gostava de ir aos atendimentos. Além disso, pode-se depre- ender desse processo, que o vínculo entre o aluno e professor do AEE, pode ser essencial para as novas aprendizagens, em especial quando se trata dos casos de deficiência intelectual, que por vezes são equivoca- damente compreendidos.

O processo de inclusão desse aluno ainda não está efetivado, tendo em vista as diversas dificuldades encontradas tanto no ambiente escolar como na resistência por parte do aluno em frequentar a escola e reconhecer-se dentro dela como sujeito. Aos poucos, em parceria com toda a escola vem se tentando modificar essa realidade, que desde a chegada desse aluno já evoluiu em vários aspectos, mas ainda encontra-se longe do ideal.

a relação com equipe diretiva e os professores