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CAPÍTULO 1 ESPAÇO POLÍTICO E REPRESENTAÇÃO DA ESQUERDA

1.3 Representações dos Partidos Políticos brasileiros

O Partido político está definido em Bobbio, Matteucci e Pasquino (2000) como uma associação que visa a um fim deliberado, seja ele objetivo (...), seja pessoal (...) ou então voltado para todos esses objetivos conjuntamente (p. 898). O trabalho: "Partidos Políticos Brasileiros: Conteúdos representacionais e suas respectivas ancoragens" de Torres, Pereira, Álvaro, & Albernaz (2009), descreve a maneira que a sociedade percebe a organização dos partidos políticos na atualidade. Eles são importantes veículos da

participação popular na democracia brasileira. Através deles, são escolhidos os governantes com o voto obrigatório no modelo liberal-democrático que tem convivido historicamente com práticas autoritárias.

No Brasil, o processo histórico do universo partidário é bastante complexo. A atual configuração partidária teve origem no final dos anos 1970 e início dos anos 1980 com a abertura política. Surgiram cinco novos partidos para substituir os únicos partidos políticos que vigoraram após o Golpe Militar de 1964. Ao lado do governo, surgiu o Partido Democrático Social (PDS) para substituir a ARENA (Aliança da Renovação Nacional). A oposição acabou com o MDB (Movimento Democrático Brasileiro), e se organizou no Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB), no Partido Democrático Trabalhista (PDT), no Partido Trabalhista Brasileiro (PTB) e no Partido dos Trabalhadores (PT) que acolhia políticos procedentes das lideranças sindicais, intelectuais e militantes populares ligados à Pastoral da Igreja Católica. Na seqüência do processo de liberação partidária, o (PCdoB) - Partido Comunista do Brasil - e (PCB) - Partido Comunista Brasileiro, retornaram à legalidade. Dissidentes do PDS formaram o PFL (Partido da Frente Liberal). Dissidentes do PMDB constituíram o PSDB (Partido da Social Democracia Brasileira) e, os dissidentes do PCB fundaram o PPS (Partido Popular Socialista). Nestas duas últimas décadas foram fundados outros partidos tais como o PRONA - (Partido da Reedificação da Ordem Nacional) e outros desapareceram tais como o PRN - (Partido da Renovação Nacional) (Fausto, 2001).

Situar o eleitor brasileiro diante dessa abundância de siglas partidárias levou a indagação de como ele percebe a dicotomia direita-esquerda e como organiza esta profusão partidária. A pesquisa foi relacionada com a análise das ancoragens dos conteúdos representacionais em sistema de valores de Doise, Clémence e Lorenzi-Cioldi (1993). Analisou três aspectos: a organização do campo representacional; os princípios

organizadores das diferenças individuais e a ancoragem social desses princípios. São destacados três níveis nos estudos da ancoragem. O psicológico, relacionado com as posições individuais nas atitudes e nos valores dos indivíduos. O sociológico referente ao papel das pertenças sociais sobre as representações. Por último, o nível psicossociológico que revela a ancoragem nas teorias do senso comum que as pessoas usam na explicação da natureza dos grupos sociais. A pesquisa visou ainda três objetivos específicos. O primeiro foi analisar a organização do campo representacional sobre os partidos políticos brasileiros. O segundo foi investigar quais os princípios organizadores desse campo representacional. O terceiro foi analisar a ancoragem social desses princípios organizadores na adesão aos sistemas de valores, nos diferentes graus de identificação partidária e em características sócio demográficas (Torres et al., 2009).

Com o objetivo de verificar as representações partidárias, foram realizadas duas investigações com estudantes universitários de Goiânia (Goiás). Na primeira (N=312), eles responderam a um questionário no qual era solicitado que posicionassem os partidos políticos brasileiros no espectro direita-esquerda e, logo após, citassem livremente suas respectivas características. Também responderam questões sociodemográficas (sexo, renda, situação nos cursos, idade e se trabalhava). Por último, indagavam se ele tinha algum tipo de identificação partidária e, em caso afirmativo, perguntavam qual o partido. O questionário utilizado na segunda investigação (N= 248) era idêntico, só que agora os participantes também responderam ao Questionário de Valores Psicossociais (Pereira, Lima & Camino, 2001). Em ambos os estudos os questionários foram respondidos individualmente, em aplicação coletiva que durava, em média, 35 minutos (Torres et al., 2009).

No primeiro estudo, a análise da representação que os estudantes têm dos partidos políticos que constituem o campo representacional de esquerda e da direita,

revelou que o PMDB, o PSDB e o PFL aparecem como partidos de direita. O PT, o PCdoB, o PSTU e o PV estão na esquerda. O PTB e o PDT são classificados tanto como partidos de direita quanto de esquerda. O segundo estudo revelou as características da representação. Para os partidos de direita foram atribuídas às seguintes características: ricos, liberdade, conservador, apoio, capitalismo, ditador, corrupto e moderado. Os partidos de esquerda foram relacionados com as seguintes características: povo, social, revolução, contra, radical, igualdade, comunismo e idealista. Democracia foi uma característica comum atribuída aos partidos de direita e de esquerda. Em relação à representação dos partidos de direita, foi realizada uma Análise de Aglomerados que indicou a direita como conservadora e descreveu os partidos com as palavras: conservador, ricos, corruptos, apoio ao governo/situação e ditador. O outro agrupamento indicou uma representação da direita como liberal e descreveu os partidos com as palavras: capitalismo, liberdade, democracia e moderado. Em referência aos partidos de esquerda, foram evocadas as palavras: Concreta e Socialista. (Torres et al., 2009).

No geral os estudos analisaram as Representações Sociais a respeito dos partidos políticos e suas ancoragens em sistemas de valores e nos diversos graus de identificação partidária. Os resultados demonstraram que os estudantes universitários pesquisados possuem uma organização cognitiva do espaço social ocupado pelos atuais partidos políticos brasileiros. Eles ao serem questionados, classificaram os partidos de direita e de esquerda sem que fosse apresentada nenhuma lista de partidos e respondendo as perguntas a partir de associações livres. Em síntese, os resultados expressaram que os partidos considerados de direita foram associados ao capitalismo, apoio ao governo, à corrupção e a um determinado grupo social, o dos ricos. Os partidos considerados de esquerda foram associados à oposição ao governo, à representatividade política de um determinado grupo social, ao povo, ao comunismo e à igualdade. A utilização da técnica da

multidimensional scaling (MDS) nos dois estudos demonstrou que as duas categorias da esquerda como as da direita são independentes entre si, uma vez que a evocação de uma palavra contida numa das categorias da direita ou da esquerda, não evocava nenhuma palavra contida na outra categoria. Isto também é um indicador da existência de diferenças individuais. A análise das ancoragens revelou as relações das características sociodemográficas dos participantes com sua identificação partidária e a adesão a determinados determinado tipos de valores. Principalmente no que diz respeito à esfera político-partidária, as pertenças sociais concretas (renda, sexo, idade etc.) têm um papel fundamental. No final, os autores questionam o fato de o eleitor votar em partidos de direita mesmo considerando que eles são corruptos. Também abrem a reflexão para o aprofundamento do estudo das representações sociais do sistema partidário brasileiro através do que é comum no pluripartidarismo: a democracia (Torres et al., 2009).