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Capítulo 3 – Hospital da Irmandade dos Clérigos

3.1. Requerimento para ser admitido no Hospital

Os Irmãos que padecessem de moléstias e necessitassem de recorrer a tratamento necessitavam de dirigir um ofício ao Presidente da Mesa, relatando o mais minuciosamente possível a enfermidade de que sofriam. O Presidente da Mesa ordenava que fosse averiguada a situação em questão e após análise era deliberada a decisão para o pedido realizado. Na Figura 1, que corresponde ao primeiro ofício de pedido, temos acesso ao modo como um Irmão descrevia a sua moléstia. Este documento61 faz parte do fundo Entradas de Irmaons Acceitaçoens de Cappelaens Licenças dos mesmos Varias cartas que nada valem, que possui uma enorme quantidade de documentos sobre os mais diversos assuntos. Contudo, os documentos não estão numerados (nem rubricados no canto superior direito) a maior parte das vezes. Poderia, eventualmente, estar ordenado através de uma ordem cronológica o que poderia simplificar a tarefa. A falta de ordem encontrada talvez corresponda a algum período de tempo, mais recente, em que pessoas externas à Irmandade “desorganizaram”, na tentativa de pesquisa, a ordem original. Quando iniciei o meu trabalho académico considerava que um documento relacionado com a Enfermaria estaria na Secção relativa ao Hospital da Irmandade dos Clérigos do Porto. Contudo, vários documentos relativos à Enfermaria estão distribuídos por várias secções. Este pedido de admissão é relevante porque este mesmo ofício continuará a ser utilizado durante um largo período de tempo, designadamente ao longo do final do século XVIII e ao longo do século XIX, pelos Irmãos, que tivessem necessidade de recorrer à ajuda da Irmandade, por motivos de enfermidade ou escassez de recursos económicos. Como o ofício devia ser endereçado à Mesa para apreciação e recolha de informação posterior, a pesquisa destes dados teve que ser feita na informação produzida pela Mesa. Este mesmo ofício era utilizado pelos Irmãos que tivessem de receber tratamento e internamento no Hospital da Irmandade dos Clérigos ou nas suas próprias

61 ICP, IC, Mesa da Irmandade dos Clérigos do Porto, Requerimentos, Entradas de Irmaons Acceitaçoens de

Cappelaens Licenças dos mesmos Varias cartas que nada valem, fólio não numerado nem rubricado (PT ICPRT

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habitações. Se tivessem necessidade de receber ajuda pecuniária para aquisição de medicamentos ou na realização de tratamentos, designadamente, ir a banhos de mar, era este o documento que deviam utilizar para oficializar o seu pedido junto do Presidente da Irmandade, ou quando este não estivesse disponível, perante o Secretário da Irmandade dos Clérigos do Porto. Neste ofício, em específico, o Irmão Luís Soares António de Albergaria em 1767, no corpo do texto, refere que se: ”encontra impossibilitado de levantar.”62 No canto superior esquerdo o Presidente da Irmandade ordena que “o Nosso Irmão Enfermeiro com o Nosso Irmão Doutor Médico” inquiram sobre a qualidade da moléstia”63 Na Figura 2 pode-se verificar o diagnóstico que o Médico realizou sobre o estado de saúde do Irmão64 Luís António Soares de Albergaria. Após a Mesa receber o parecer médico, no canto inferior esquerdo da Figura 1 é possível ler-se que foi deliberado oferecer-se 4800$000 réis ao Enfermeiro-Mor para tratar deste enfermo e está assinada com a assinatura de Albuquerque, que desempenhava a função Secretário da Irmandade naquela época. O doente deu efetivamente entrada, no Hospital da Irmandade dos Clérigos em 19 de maio de 1768, de onde saiu a 31 de agosto de 1768. Este procedimento era o utilizado tanto por Irmãos pobres como por Irmãos mais notáveis, como se pode verificar no capítulo seguinte.

62 ICP, IC, Mesa da Irmandade dos Clérigos do Porto, Requerimentos, Entradas de Irmaons Acceitaçoens de

Cappelaens Licenças dos mesmos Varias cartas que nada valem, fólio não numerado nem rubricado (PT ICPRT

IC/A/018/0001).

63 ICP, IC, Mesa da Irmandade dos Clérigos do Porto, Requerimentos, Entradas de Irmaons Acceitaçoens de

Cappelaens Licenças dos mesmos Varias cartas que nada valem, fólio não numerado nem rubricado (PT ICPRT

IC/A/018/0001).

64O Irmão Luís António Soares Albergaria é um dos 26 Irmãos que se encontram registados em Enfermaria Entradas,

e Óbitos para o período de tempo compreendido entre 1754 e 1828. Durante este período foram registadas 31 entradas,

porque alguns Irmãos deram entrada mais do que uma vez, sendo que nesta análise tem de se ter em consideração que o Irmão António José Pereira de Souza foi registado duas vezes para o mesmo período de internamento.

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Figura 1: Pedido de assistência do Irmão Luís António Soares de Albergaria em 1767.

Fonte: ICP, IC, Mesa da Irmandade dos Clérigos do Porto, Requerimentos, Entradas de Irmaons

Acceitaçoens de Cappelaens Licenças dos mesmos Varias cartas que nada valem, fólio não numerado (PT

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Figura 2: Diagnóstico do Médico ao Irmão Luís António Soares de Albergaria em 1767.

Fonte: ICP, IC, Mesa da Irmandade dos Clérigos do Porto, Requerimentos, Entradas de Irmaons

Acceitaçoens de Cappelaens Licenças dos mesmos Varias cartas que nada valem, fólio não numerado (PT

ICPRT IC/A/018/0001).

A consulta desta informação permitiu reconstituir o processo especificado dentro da Instituição para o acolhimento de doentes. Há diferentes responsáveis pela informação que a Mesa exige para deliberar.Este fluxo de informação pressupõe um diálogo entre os diversos e diferentes agentes sociais que compõem a Irmandade dos Clérigos. Esta informação de múltiplos produtores evidencia um sistema complexo de recolha de dados que permitem à Irmandade fazer uma avaliação da necessidade de apoio, por um lado, e do preenchimento das condições estipuladas nos Estatutos para receber esse apoio, por parte de um candidato. É possível, a partir destes dados, avaliar o número de doentes que pediram o apoio da Instituição, assim como traçar o perfil das doenças de que se queixam e dos Médicos e Enfermeiros chamados a emitir opinião. Esta análise permite vislumbrar que a orgânica de funcionamento desta instituição assemelha-se a um organismo vivo que evolui através das relações que estabelece entre os diferentes agentes.

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