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Resolução ou Modificação do Contrato de Mútuo Bancário por alteração das

IV. Resolução ou Modificação do Contrato de Mútuo Bancário por Alteração das

5. Resolução ou Modificação do Contrato de Mútuo Bancário por alteração das

alteração das circunstâncias

O contrato de mútuo bancário pode ser resolvido ou modificado quando as circunstâncias, em que as partes fundaram a sua decisão de contratar, tenham sofrido uma alteração anormal, isto é, uma alteração que as partes, no momento em que celebraram o contrato, não pudessem prever.

Atualmente, como é do conhecimento comum, o país confronta-se com imensas dificuldades financeiras, económicas e sociais que têm impacto na vida de todos nós – a crise desde há muito que deixou de ser apenas financeira sendo, também, uma crise social

e económica123.

Todos os sectores da sociedade foram gravemente afetados, sendo os particulares aqueles que suportam os principais efeitos negativos da crise. Os agregados familiares veem os seus rendimentos diminuírem (ou porque os salários são reduzidos, ou porque algum (ou alguns) dos membros que constituem o agregado familiar perdeu o seu emprego) e, consequentemente, veem aumentar as suas dificuldades para fazer face aos compromissos assumidos (nomeadamente perante instituições de crédito, maxime os Bancos).

De acordo com CARNEIRO DA FRADA “as “grandes” alterações das circunstâncias,

enquanto alterações globais dos parâmetros fundamentais da coexistência social, são na realidade um risco de todos, a que todos estão sujeitos, a cujos danos ninguém pode pretender eximir-se à custa de outrem e que não devem conduzir a permitir benefícios

integrais a uma das partes com prejuízo da outra”124. Todavia, segundo este autor, tendo

em conta “a natureza, a dimensão, as causas e os efeitos globais da atual crise financeira,

123 BARBOSA, Mafalda Miranda e CAMPOS, Diogo Duarte, A decisão do Tribunal de Portalegre, 4 de

Janeiro de 2012, Boletim da Faculdade de Direito, Universidade de Coimbra, Vol. I, LXXXVII, Tomo I, p. 379.

35 ao transcender em muito a esfera de atuação e de controlo dos agentes económicos, pode perfeitamente representar uma alteração anormal das circunstâncias presentes ao tempo

da conclusão dos diversos contratos celebrados pelos sujeitos”125. Estamos perante uma

crise que surgiu de forma inesperada, surpreendendo todos ou quase todos,

nomeadamente especialistas126.

A jurisprudência, mormente o recente Acórdão de 10 de Janeiro de 2013 do Supremo Tribunal de Justiça, também reconhece que a crise económico-financeira pode causar desequilíbrios económicos suscetíveis de provocarem alterações anormais das circunstâncias. Salienta que, para isso, é necessário que haja uma correlação direta e demonstrada factualmente nos autos entre a crise económica geral e a atividade económica concreta de determinado agente para que se possa falar de uma alteração

anormal das circunstâncias127128.

Concordamos com a doutrina e a jurisprudência analisada. A crise financeira que assombra o país é “grande alteração das circunstâncias”, uma vez que interferiu “com a

generalidade das variáveis económico-sociais que caraterizam a sociedade”129.

Consubstanciando a crise uma verdadeira alteração das circunstâncias é, ainda necessário, que as obrigações assumidas pela parte lesada (que, neste caso, será o particular que celebrou um contrato de mútuo (de escopo ou não) com o Banco e que, com a crise, viu as circunstâncias, que fundaram a sua decisão de contratar, a alterarem- se de forma imprevisível) afetem gravemente os princípios da boa fé e que não estejam cobertas pelos riscos próprios do contrato.

Verificados os requisitos, que legitimam o recurso ao instituto da alteração das circunstâncias, o mutuário pode optar pela resolução ou pela modificação do contrato. Na nossa opinião, o mutuário deverá requerer a modificação, segundo juízos de equidade.

125 FRADA, Manuel A. Carneiro da Frada, Crise Financeira Mundial … op. cit., p.494. 126 FRADA, Manuel A. Carneiro da Frada, Crise Financeira Mundial … op. cit., p.493.

127http://www.gde.mj.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/684735e67848b64980257b240050

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128 No mesmo sentido vide BARBOSA, Mafalda Miranda e CAMPOS, Diogo Duarte, A decisão do

Tribunal de Portalegre, 4 de Janeiro de 2012, Boletim da Faculdade de Direito, Universidade de Coimbra, Vol. I, LXXXVII, Tomo I, p.399.

36 Por um lado, esta é a solução que se demonstra como a mais vantajosa para o mutuário. É que se este optar pela resolução, para além de ficar desvinculado do contrato, terá de restituir ao mutuante a totalidade da quantia mutuada que ainda não foi restituída. Ora, se o mutuário enfrenta dificuldades em restituir em prestações a quantia mutuada, devolver num só momento o valor que falta restituir, representa para ele uma verdadeira missão impossível. Por outro lado, sendo a modificação suficiente para corrigir a injustiça objetiva do contrato, será injusto e excessivo que a parte lesada possa, pura e

simplesmente, resolver o contrato. Como afirma VAZ SERRA, “a resolução não deve ser

um efeito automático e forçoso da alteração das circunstâncias, pois importa salvaguardar

a estabilidade dos contratos, só os inutilizando quando tiver de ser”130.

Por fim, esta solução é a mais coerente com a nova legislação que surgiu para as

situações de incumprimento, como é o caso do DL 227/2012 de 25 de Outubro. Este DL, ao lado de outras normas que visam prevenir o incumprimento, estipula um conjunto de normas que visam gerir situações de incumprimento. Estas últimas são vocacionadas para uma renegociação das condições contratuais.

Com a modificação do contrato por alteração das circunstâncias, as partes podem estipular um novo prazo para pagamento do montante mutuado (assim, por exemplo, em vez de pagar em 12 prestações, poderão pagar em 24) ou uma nova taxa de juro (em regra, mais baixa) de forma a suavizar as obrigações contraídas, facilitando ao devedor o seu cumprimento.

Estamos no campo da autonomia privada, em que salvo as situações em que o juiz é chamado a intervir, caberá às partes negociar e chegar a um consenso quanto a eventuais alterações do contrato. Perante estas situações, pensamos que as Instituições Bancárias, apesar de serem a parte “mais forte” do contrato, têm todo o interesse em chegar a um consenso e ajudar o cliente a cumprir o que assumiu. Mais vale alterar o contrato e verem o que foi emprestado voltar aos seus cofres, do que manterem um contrato cuja parte contrária não conseguirá cumprir, nem mediante um processo de execução, pois na maioria das vezes, o mutuário, já nada tem ou o pouco que tem não é suficiente para restituir a quantia mutuada.

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