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1 INTRODUÇÃO

1.3 PATOGENIA DA INFECÇÃO VIRAL

1.3.3 Resposta imune à infecção viral

A interação entre o sistema imune e o SNC constitui a atividade mais complexa e interativa em mamíferos (BECHER et al., 2000; BERGMANN et al., 2006). O SNC regula o sistema imune pela resposta hormonal e pelo sistema nervoso autônomo; enquanto que o sistema imune pode regular o SNC pela produção de citocinas, as quais exercem efeitos autócrinos e parácrinos que influenciam na secreção de hormônios e proliferação celular. Uma ruptura na comunicação e propriedade regenerativa do SNC torna o indivíduo vulnerável a doenças infecciosas, bem como a injúrias físicas (BERGMANN et al., 2006; ESKANDARI et al., 2003).

Os organismos vivos desenvolveram diversos tipos de defesas contra a invasão de microrganismos patogênicos, inclusive para agentes virais. A ativação do sistema imune no SNC é uma característica clássica em lesões isquêmicas, doenças neurodegenerativas, desordens mediadas por imunidade, infecções e traumas, que resultam em lesão neuronal. Em casos de doenças causadas por agentes virais, essa ativação é crucial para estabelecer um estado antiviral no SNC que é capaz de limitar a replicação e disseminação dos vírus e induzir a produção de citocinas pró-inflamatórias e quimiocinas necessárias para atrair e ativar as células do sistema imune ao local da infecção (ABBAS et al., 2012; AMOR et al., 2010; NEUMANN et al., 2009; SCHWARTZ et al., 2009; SOUCY-FAULKNER et al., 2010).

Em um nível mais básico, o sistema imune pode ser visto em dois ramos interconectados. A resposta imune inata é o ramo mais antigo, sendo descrito nos ancestrais mais primitivos. Ela evoluiu juntamente com os microrganismos de modo a proteger de infecções todos os seres multicelulares. As células da imunidade inata usam diversos receptores para detectar e sinalizar a ocorrência de uma invasão microbiana, tendo essa sinalização duas funções principais: iniciar uma cascata inflamatória que ajuda a conter o processo infeccioso e ativar a resposta imune adaptativa, o segundo ramo do sistema imune (ABBAS et al., 2012; BARTON, 2008; GUIDOTTI et al., 2001; ZAISS et al., 2002).

A imunidade inata desempenha três funções importantes: é a primeira resposta aos microrganismos que previne, controla e elimina a infecção do hospedeiro causada por diversos agentes patogênicos ou injúrias no tecido; seus mecanismos reconhecem os produtos de células danificadas e mortas do hospedeiro, eliminando-os e iniciando o processo de reparo tecidual; e sua ativação estimula o desenvolvimento da resposta imune adaptativa e pode influenciar a natureza dessa resposta, tornando-a mais eficaz contra diferentes tipos de agentes patogênicos (ABBAS et al., 2012).

O mecanismo que ativa o sistema imune inato é o reconhecimento de microrganismos invasores por receptores denominados de RRP e podem ser encontrados na membrana ou em forma de proteínas solúveis. Esses receptores reconhecem estruturas moleculares denominadas padrões moleculares associados a patógenos (PAMPs), que são características de patógenos microbianos, mas não estão presentes em células de mamíferos, e incluem RNAs de fita dupla, sequências CpG não metiladas de DNA, proteínas, lipídeos, carboidratos complexos, dentre outros (ABBAS et al., 2012; BARTON, 2008; CARPENTIER et al., 2007; GUIDOTTI et al., 2001; KAWAI; AKIRA 2006; KUMAR et al., 2006, 2009; SOUCY- FAULKNER et al., 2010; WAKEFIELD et al., 2010; ZAISS et al., 2002).

A maioria dos tipos celulares expressa os RRP e, por isso, é capaz de participar de respostas imunes inatas, reconhecendo os componentes essenciais a sobrevivência dos patógenos e produzindo citocinas inflamatórias. Células fagocíticas, incluindo ne utrófilos e macrófagos, e células dendríticas expressam as maiores variedades e quantidades desses receptores, o que contribui para a realização das funções de detecção dos microrganismos, ingestão e eliminação dos mesmos e indução do processo inflamatório, com consequente ativação da resposta imune adaptativa (ABBAS et al., 2012; WAKEFIELD et al., 2010).

Em infecções virais, vários tipos de TLR – um dos RRP mais estudados –, tais como TLR3, TLR7, TLR8 e TLR9, expressos na membrana de endossomos de células dendríticas plasmocitóides (pDCs), participam do reconhecimento de componentes virais, como DNA e

RNA genômicos, por meio de mecanismos independentes de replicação. Além disso, algumas células expressam helicases de RNA que funcionam como RRP para os componentes virais, sendo também essenciais no estabelecimento da imunidade antiviral juntamente com os IFNs do tipo I (ANUKUMAR; SHAHIR 2012; HEIL et al., 2004; KAWAI; AKIRA 2006; KUMAR et al., 2006; LUND et al., 2006).

Os principais mecanismos da resposta imune inata contra agentes virais são a inibição do processo infeccioso por interferons do tipo I – IFN-α e IFN-β –, pois tem efeito direto sobre agentes virais e células vizinhas não infectadas, enquanto ativa a resposta imune adaptativa contra vírus. Estão associados à regulação dos mecanismos de apoptose e morte de células infectadas mediada por células natural killer (NK), um mecanismo importante no início da infecção, antes do desenvolvimento da imunidade adaptativa. A rápida indução desses mecanismos de apoptose em células ho spedeiras infectadas com vírus é um componente crítico da resposta imune inata antiviral (ABBAS et al., 2012; EVERETT; MAC FADDEN 1999; KAWAI; AKIRA 2006; PARRONCHI et al., 1992; WARK et al., 2005).

A resposta imune adaptativa, por sua vez, é reconhec ida apenas em vertebrados e consiste, basicamente, na proliferação de linfócitos específicos para o agente patogênico, um processo altamente efetivo e específico, mas que leva dias para se desenvolver por completo. A imunidade adaptativa contribui para exacerba r o efeito da resposta imune inata. Muitos microrganismos patogênicos evoluíram tornando-se resistentes à imunidade inata, e a proteção contra essas infecções passa a depender fundamentalmente da resposta imune adaptativa (ABBAS et al., 2012; BARTON, 2008).

A imunidade adaptativa contra infecções virais é mediada por anticorpos que bloqueiam a ligação do vírus e a sua entrada nas células hospedeiras, podendo também provocar a destruição das células infectadas para eliminar o agente viral (ABBAS et al., 2012; SANTOS et al., 2009). Os anticorpos antivirais ligam-se ao envoltório ou aos antígenos do capsídeo do vírus e desempenham funções principalmente neutralizantes, prevenindo tanto a infecção inicial como a disseminação do vírus entre as células. Além disso, os anticorpos podem opsonizar partículas virais e ativar o sistema complemento, promovendo a eliminação do patógeno por meio de fagocitose (ABBAS et al., 2012; KAWAI; AKIRA 2006).

A eliminação dos agentes virais do interior das células hospedeiras é mediada por linfócitos T citotóxicos (LTC) que destroem células infectadas. A maioria dos LTC específicos para vírus são chamados de células T CD8+, que sofrem processos de proliferação e diferenciação maciços mediante a presença de citocinas liberadas pelas células T CD4+. São capazes de reconhecer peptídeos virais citosólicos específicos apresentados pelas moléculas

do MHC de classe I, destruindo qualquer célula infectada, ativando nucleases que degradam o genoma viral e secretando citocinas, como IFN-γ, para o controle da infecção (ABBAS et al., 2012; JACOBSON 2002; KAWAI; AKIRA 2006; MURRAY et al., 2006; SANTOS et al., 2009).

Alguns estudos demonstraram que doenças causadas pelo vírus da coriomeningite linfocítica (VCML) (FISCHER et al., 2006; BARTON et al., 2002) e pelo vírus da hepatite B infectam células específicas sem provocar lesão direta. Nesses casos, a destruição das células infectadas é provocada pela ativação dos LTC específicos a esses vírus, na tentativa de erradicar a infecção (ABBAS et al., 2012).

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