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Resposta imunológica do hospedeiro e aspectos clínicos

O contato com M. leprae ocorre principalmente pelas vias aéreas superiores acarretando infecções subclínicas em um grande número de pessoas expostas (Gallo et al., 2005).

A demonstração da presença de DNA do bacilo em mucosa de pacientes e de seus contactantes, corroborou com a ideia de que a infecção latente ocorre freqüentemente e de que o nariz é a principal porta de entrada e saída de M. leprae (Almeida et al., 2004).

Investigações preliminares também indicaram a presença de DNA de

M. leprae em amostras de sangue de pacientes e contactantes (Araújo et al.,

2006). A presença de DNA de M. leprae no sangue de pessoas sadias fornece adicionais evidências epidemiológicas que o caminho da transmissão do M. leprae pode não ser apenas pelas vias aéreas superiores, podendo indicar possível transmissão através do sangue. Esta hipótese foi corroborada por relatos de casos, em áreas não endêmicas em que a hanseníase foi adquirida após transplante de órgãos (Modi et al., 2003; Launius et al., 2004).

Algumas estratégias foram descritas com o objetivo de elucidar as bases moleculares do controle da susceptibilidade do hospedeiro ao M.

leprae. Aceita-se atualmente que conjuntos diferentes de genes modificam a

susceptibilidade à doença em pelo menos dois momentos distintos, a saber: (i) no controle da infecção per se, isto é, a doença independentemente de

sua forma de manifestação clínica; e (ii), uma vez o indivíduo infectado, na definição da diferentes formas clínicas da doença (Prevedello & Mira, 2007).

A maioria das pessoas infectadas não desenvolvem a doença. Após o contato, o período de incubação pode variar de meses a 30 anos, sendo a média estimada em 4 anos para as formas tuberculóides e 10 anos para as formas lepromatosas da doença (Noordeen, 1994). Este longo período de incubação contribui para a transmissão da hanseníase, pois antes mesmo da manifestação clínica dos sintomas, o indivíduo já é um transmissor potencial (Martins, 2006).

Vários mecanismos têm sido propostos para a ligação do bacilo com as células humanas (células de Schwann) podendo ser de forma direta, entre adesinas bacterianas, antígenos micobacterianos de superfície (PGL-1 e MLLBP21 - Mycobacterium leprae – Laminin binding protein 21) e

receptores da célula hospedeira, especialmente o componente proteico presente na lâmina basal que cobre a célula de Shcwann (SC) denominado α-distroglicano (Rambukkana, 1998; Ng et al., 2000; Scollard et al., 2006; Spencer & Brenann, 2011).

A ligação pode ser também de forma indireta, identificou-se uma glicoproteína que se liga por opsonização à superfície do M. leprae, a qual, por sua vez, se liga a um receptor da superfície da célula de Schwann, promovendo a penetração do bacilo no interior da célula (Rambukkana et al., 1997; Rambukkana, 1998).

A resposta imunológica ao M. leprae determina a evolução da infecção e, também, a forma clínica da hanseníase (Lockwood & Brycesson,

1998; Sieling & Modlin, 1994; Rodrigues & Lockwood, 2011). Os linfócitos T e macrófagos têm um papel importante na identificação e resposta aos antígenos do M. leprae. Esta reação é desencadeada quando os macrófagos fagocitam o M. leprae, passando a produzir as citocinas (Interferon gama e IL-12) que atuam sobre os linfócitos T, particularmente CD4+, ativando-os para a produção de suas próprias citocinas, como a interleucina-2 (IL-2) (Sarno & Sampaio, 1996; Modlin, 1995). Os macrófagos, os linfócitos CD4+ e as células Natural Killer produzem o INF-, a principal citocina responsável pelo mecanismo bactericida dentro do macrófago parasitado.

Foi demonstrado em modelos murinos de infecção intracelular, que a resposta imune é regulada pelas subpopulações de células T (Th1 e Th2), tendo função imuno-reguladora especificamente mediada por citocinas (Mosmann et al., 1986; Goulart et al., 2002).

Quando as células T produziam interleucina 2 (IL-2) e IFN-, perfil Th1,aumentavam a imunidade mediada por células. No entanto, quando as citocinas IL-4, IL-5 e IL-10, perfil Th2, eram produzidas, contribuíam para uma ineficácia da resposta imune celular, com falha na ativação do macrófago e aumento da resposta humoral (Goulart et al., 2002).

O balanço entre os dois padrões de resposta Th1 e Th2 determina a forma clínica da doença e sua patogênese (Goulart et al., 2002; Sieling & Modlin, 1994). A partir da liberação das citocinas (IL-2 e IFN-) as células Th1 aumentam a imunidade celular, ativam macrófagos, promovem auto- ativação e estimulam a expansão clonal da célula T - antígeno específico, resultando na doença menos agressiva ou cura espontânea.

Ao contrário, as células Th2 ativam a resposta humoral, produzem as interleucinas IL-4, IL-5 e IL-10, as quais inibem os macrófagos, formando as células de Virchow (Weir, 2000). A IL-4 possui papel na diferenciação e mudança de classe de imunoglobulinas de células B, bem como habilidade para estimular proliferação da resposta Th2. Como consequência, nesses indivíduos ocorreria uma infecção progressiva e o aparecimento das formas mais graves da doença (Sieling et al., 1993).

Há evidências de que os macrófagos dos doentes com a forma lepromatosa possuem uma deficiência específica na lise dos bacilos quando comparados com os macrófagos dos doentes com hanseníase tuberculóide e de indivíduos sadios. Experimentos com culturas de macrófagos demonstraram que componentes da estrutura do M. leprae, destacando-se o PGL-1, deprimiam a produção de TNF- α nas células dos indivíduos sadios, suprimindo a imunidade celular (Birdi & Antia, 1989; Britton, 1993; Goulart et al., 2002).

Além disso, a disfunção dos linfócitos T e macrófagos pode ser decorrente de uma anergia clonal ou supressão ativa (Modlin & Bloom, 1993; Nations et al., 1998), como também, o bacilo parece ter mecanismos para escapar da resposta imunológica do hospedeiro.

A manifestação inicial da doença pode ser a forma clínica indeterminada (I), onde a resposta do hospedeiro é insuficiente. Neste caso, pode evoluir para cura espontânea (75% dos casos) ou desenvolver a doença.

A imunidade celular, expressa na resistência à infecção pelo M.

leprae, tem como método básico na sua avaliação o teste de Mitsuda.

Apesar dos progressos nas pesquisas, o teste de Mitsuda ainda permanece como método importante na avaliação imunológica da doença (Foss, 1999; Goulart et al., 2002).

As características imunológicas das formas espectrais da hanseníase incluem pacientes tuberculóides paucibacilares caracterizados por elevada resposta imune celular (RIC) do Tipo Th1 com produção IFN- e baixos títulos de anticorpos. As formas lepromatosas multibacilares apresentam altos títulos de anticorpos e RIC específica baixa ou ausente (Scollard et al., 2006).

O teste cutâneo de Mitsuda é positivo em pacientes com a forma clínica tuberculóide (TT), doença localizada caracterizada por poucos bacilos e lesões limitadas, as citocinas produzidas protegem o hospedeiro da doença e contra a disseminação do bacilo (Goulart et al., 2002).

O teste de Mitsuda é negativo nos pacientes com a forma clínica lepromatosa (LL), considerada o pólo de extrema suscetibilidade ao M.

leprae, no qual ocorre proliferação disseminada do bacilo resultando em

lesões de pele difusamente distribuídas e está associada a uma potente resposta humoralsem proteção significativa (Souza, 1997; Goulart et al., 2002).

Entre as formas polares situam-se as formas instáveis da doença, com amplo espectro de manifestações clínicas denominada de borderline (Foss, 1999).

Entre as diferentes classificações existentes, a classificação de Madri (1953), considerou características clínicas da doença, aspectos bacteriológicos, histológicos e imunológicos definindo grupos polares e estáveis, tuberculóide (T) e lepromatoso (L); grupo transitório e inicial, a forma indeterminada (I); e grupo instável e intermediário, a forma borderline (B) (Sousa, 1997; Araújo, 2003). A classificação espectral proposta por Ridley - Joplling (1966), levou em consideração os critérios já descritos, adotando subgrupos espectrais, tuberculóide-tuberculóide (TT), boderline- tuberculóide (BT), bordeline-bordeline (BB), boderline-lepromatoso (BL) e lepromatoso-lepromatoso (LL).

O critério de classificação operacional (CO) recomendado pela Organização Mundial de Saúde (2000) para fins de terapêutica, levou em consideração o número de lesões cutâneas e se disponível, o resultado da baciloscopia do esfregaço de raspado intradérmico. Pacientes com até cinco lesões são classificados como paucibacilares (PB) e pacientes que apresentem seis ou mais lesões, são classificados como multibacilares (MB) (WHO, 1994; WHO, 1997).

Na Tabela 1, mostramos a correlação entre a classificação de Madri e a classificação de Ridley-Jopling e Operacional.

TABELA 01 - Correlação entre a classificação de Madri e a de Ridley & Jopling e da OMS.

MADRI Indeterminada Tuberculóide Boderline Virchoviana

Ridley & Jopling TT BT* BB BL LL

OMS PAUCIBACILARES MULTIBACILARES

TT: Tuberculóide-tuberculóide; *BT: Borderline-tuberculóide, embora apresente características da forma paucibacilar,

operacionalmente tem sido classificada como multibacilar; BB: Borderline-borderline; Borderline-lepromatoso e LL: Lepromatoso-lepromatoso

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