• Nenhum resultado encontrado

No processo de análise das 150 interações, encontramos, também, respostas não- conformativas do tipo indiretas, que se assemelham às respostas indiretas estudadas por Walker, Drew e Local (2011). Contudo, como acontece com as respostas transformativas, as características das respostas não-conformativas indiretas encontradas no português brasileiro não são idênticas às encontradas no estudo mencionado. Por meio da análise sequencial da interação, concluímos que os excertos apresentados a seguir, são casos de respostas não- conformativas indiretas do tipo que tratam a pergunta como inapropriada.

No Excerto 17, temos uma ecografia morfológica envolvendo a médica residente Deise, a gestante Joana, que tem 16 anos e está com 22 semanas de gestação, e seu acompanhante (que não participa verbalmente desse momento da interação). A sequência apresentada a seguir ocorre aos 10 minutos do exame.

Excerto 17: HMF_ECOMORFO_joana_DEISE_20_11_13A 22 DEI: >não quer me deixá ver o ros↓to< 23 (1.8)

24 DEI: <não QUER me deixá> 25 (3.3)

26 JOA:→ e vocês sabem pelo ro:sto: o:: sexo da crian↓ça

27 (.)

28 DEI:→ o sexo é nas ↑pernas ↓né

29 JOA: si:m, não, aí não dá pra que que ↑é 30 (0.5)

31 DEI: nã:o eu tô vendo- a morfológica na (ecografia) é 32 pra ver malformação não é pra ver se[xo]

33 JOA: [a ]:::h 34 DEI: tá não interessa se é menino, menina,

35 (0.7)

36 DEI: então pra mim tanto faz.

37 (.)

38 DEI: eu quero ver se esse nenê é bem formado. 39 JOA: a::[:h]

40 DEI: [en]tão eu tem que ver tudo. 41 (0.7)

42 DEI: cabe- o:: sexo é lá embai↓xo 43 (2.9)

44 DEI: interessa se o menino ou menina tem malformação 45 né então:: (.) tem que ser bem formadinho. 46 (19min07seg)((médica faz o exame))

A médica realiza o exame por 5 minutos e não ocorre interação verbal nesse período. Após esse tempo, a médica residente Deise informa à gestante que não consegue ver o rosto do feto, que ele (o feto) não quer deixar ver (linhas 22 e 24). Após informar à gestante sobre a dificuldade de ver o rosto do feto, ocorre uma pausa de 3.3 segundos, e, então, na linha 26, a gestante inicia um pedido de informação por meio de uma pergunta polar em formato afirmativo (e vocês sabem pelo rosto o sexo da criança). Esse turno é caracterizado por conter hesitações e alongamento de som. Após uma micropausa, a médica residente fornece uma resposta não-conformativa caracterizada como indireta que trata a pergunta como inapropriada, pois sua resposta é fornecida através de uma correção, um desafio (o sexo é nas pernas né), já que a informação requerida pela gestante é de senso comum, algo sobre o que ela deveria saber: o sexo se vê nas pernas.

As respostas indiretas que tratam a pergunta como inapropriada têm como característica a utilização de termos que se opõem, não respondem à pergunta com “sim” ou “não” e, na maioria dos casos, não possuem ligação com o turno anterior, a não ser pela sequencialidade. No caso do Excerto 17, a resposta da médica na linha 28 poderia ser formulada com um “não”, porém, a médica responde com uma explicação (o sexo é nas pernas) e finaliza seu turno com o marcador discursivo “né”, que corrige e desafia a gestante a repensar sua pergunta. Na linha 29, então, a gestante inicia o turno confirmando que entende que o sexo se vê nas pernas (sim) e expande seu turno reformulando o pedido de informação sobre o sexo do feto (aí não dá pra que que é). Na linha 31, a médica inicia o turno negando provimento da informação solicitada pela gestante e o expande informando que ela está realizando a ecografia morfológica e que esse exame serve para ver as malformações do feto e não o sexo. Na linha 33, a gestante produz um item lexical que indica mudança de estado cognitivo (ah), ou seja, a gestante passou de não conhecedora para conhecedora da informação (que o exame serve para ver as malformações). A médica, então, justifica que a informação sobre o sexo é irrelevante nesse exame e faz o fechamento da pauta ao informar que essa informação não faz diferença para ela (a médica), nas linhas 34-36. Após uma micropausa, em que a gestante não toma o turno, a médica informa o objetivo dela e do exame: ver se o feto é bem formado. Na linha 39, a gestante produz, novamente, um item lexical que demonstra mudança de estado cognitivo (ah). Após, a médica repete a informação de que o sexo é lá embaixo (nas pernas) e continua sua justificativa de que o importante é saber se o feto está bem formado.

Nessa interação, é possível observar que, ao contrário dos casos de respostas indiretas apresentadas em estudos anteriores, o par adjacente pergunta-resposta está relacionado não só pela sequencialidade, mas também pelos itens lexicais que o compõem. Isto é, no Excerto 17,

a gestante se refere à possibilidade de ver o sexo do bebê pelo rosto e, no turno seguinte, a médica repete o termo “sexo” (da criança – isso está subentendido no turno) ao dizer que o sexo é nas pernas né. Além disso, observamos vários turnos da médica justificando a resposta fornecida, ou seja, novamente, após uma resposta não-conformativa, a respondente fornece justificativas que corroboram e/ou reforçam sua resposta inicial. No caso do Excerto 17, podemos especular que as justificativas da médica podem estar relacionadas à ação de sua resposta inicial (correção/desafio), pois, após seu desafio, a gestante se “defende”, justificando que tem conhecimento de que o sexo é nas pernas.

No Excerto 18, a seguir, observa-se mais uma ocorrência de resposta não-conformativa indireta que trata a pergunta como inapropriada. A interação ocorre durante o exame de ecografia obstétrica que envolve a médica residente Deise, a gestante Glaucia, que está com 24 semanas de gestação, e a médica preceptora Rosângela (que não participa verbalmente nesse momento da interação). A sequência ocorre após a médica realizar uma avaliação de que o feto está “danado” (no sentido de se mover frequentemente) e, por isso, dificultando sua visualização.

Excerto 18: HMF_ECOOBST_glaucia_DEISE_15_10_13

158 GLA:→ ele tá perto do:: do ossinho da gente >que 159 a gente tem aqui?<

160 (1.7)

161 DEI:→ tem vários ossos aí, (.) não sei qual tu tá 162 falando.

163 GLA: ↑não <do meu> >o osso< o ↑osso dessa aqui 164 que eu não ↓se-

165 DEI: a: ainda não é ↑hora dele [tá te incomodando] 166 GLA: [não tá perto? ] 167 (0.5)

168 DEI: não vai te incomodá bem mais daqui a pouco, 169 (0.6)

Nas linhas 158 e 159, a gestante realiza um pedido de informação por meio de uma pergunta polar. Após ausência de fala por 1.7 segundos, a médica produz uma resposta indireta que trata a pergunta como inapropriada ou incompleta. Isso ocorre devido ao formato da resposta (tem vários ossos aí, não sei qual tu tá falando) e ao uso do item lexical “aí”, o que nos faz especular que a gestante possa ter indicado gestualmente a qual parte se refere. Além disso, a médica não responde à pergunta de forma direta, mas lida com ela ao justificar que há vários ossos naquela região e ao pedir um esclarecimento, ao informar que não sabe a qual osso a gestante se refere. O turno da gestante (linha 163) evidencia que ela toma o

turno da médica como um pedido de esclarecimento, ao que atende, pois, apesar de não saber dizer o nome do osso, ela explica a qual osso se refere: do meu [...] o osso dessa aqui que eu não se-.

Podemos especular que é possível que a gestante tenha feito algum gesto apontando para o osso a que se refere. A médica inicia seu turno, na linha 165, com o item lexical a::, o que indica mudança de estado cognitivo e continua o turno concluindo que ainda não é hora de o feto estar incomodando, ou seja, percebemos que nesse momento a médica demonstra entender a qual osso e incômodo a gestante se refere. Na linha 166, a gestante realiza uma formulação e um pedido de confirmação sobre as informações recebidas até o momento e recebe, na sequência, uma resposta conformativa da médica residente.

No Excerto 18, percebemos que a resposta indireta pede por uma especificação por parte de quem realizou a pergunta, e essa especificação é realizada no turno seguinte pela gestante. Nesse caso, observamos que a resposta indireta foi suficiente, pois pediu por uma outra ação por parte do perguntador e não promoveu justificativas por parte de quem fornece a resposta.

O Excerto 19, a seguir, é uma ecocardiografia que envolve a médica Luana, a gestante Ema, e seu acompanhante. Ema tem dois outros filhos (um menino de 10 anos de idade e uma menina de 3 anos) e está esperando mais um menino. Ela está na 23ª semana de gestação. Excerto 19: HMF_ECOCARDIO_ema_LUANA_29_01_14

181 EMA:→ tem como saber quantas gramas ele tá (.) 182 agora

183 (0.8) 184 EMA:→ não?

185 LUA:→ eu não sei calculá 186 (.)

187 LUA: eu sou cardiolo↓gista 188 EMA: ãrrã

189 (2.3)

190 LUA: faz duas semanas né da outra eco? 191 (0.6)

192 EMA: i:sto 193 (7.8)

194 LUA: °é° a minha impressão é que ele é um bebê 195 bem adequado né

196 (.) 197 EMA: mhm 198 (.)

199 LUA: pelo tamanho dele tá bem ó é bem tranquilo de 200 ver se o nenê é muito miudinho a gente não 201 consegue vê né porque o coração é peque↑ninho 202 entã:o é proporcional ao tamanho do nenê

203 (0.6)

No momento anterior ao excerto aqui apresentado, a médica pergunta sobre o peso com que os outros filhos da gestante nasceram. Após a gestante fornecer a informação, a médica conclui que está tudo bem com o feto. Então, nas linhas 181 e 182 a gestante realiza uma pergunta polar que pede por informação (tem como saber quantas gramas ele tá (.) agora). Após 0.8 segundos, em que a médica não toma o turno, a gestante reformula seu pedido de informação com a partícula negativa “não”, o que indica que a gestante toma o silêncio como prefácio de uma possível resposta despreferida por parte da médica.

Após a reformulação do pedido da gestante (linha 184), a médica fornece uma resposta não-conformativa indireta que trata a pergunta como inapropriada (eu não sei calculá), na linha 185, e justifica (eu sou cardiologista), na linha 187. Ou seja, sendo ela uma cardiologista, avalia o coração do feto, não as medidas. Após a confirmação de entendimento da gestante na linha 188 (arrã), ocorre mais uma pausa de 2.3 segundos e, então, a médica toma o turno novamente e realiza uma pergunta polar que pede por confirmação sobre a data da última ecografia da gestante (faz duas semanas né da outra eco?), e a gestante confirma (isto). Após mais uma pausa de 7.8 segundos, a médica, nas linhas 194 e 195, fornece uma informação próxima da solicitada pela gestante (a minha impressão é que ele é um bebê bem adequado né). Após um recibo de informação da gestante (mhm), a médica expande seu turno, complementando as informações providas (linhas 199-202).

Apresentamos, nessa seção, excertos que representam os achados sobre as respostas não-conformativas indiretas que tratam a pergunta como inapropriada. Observamos que essas respostas estão relacionadas ao turno anterior não somente pela sequencialidade, mas também pelo formato dos turnos: há repetição de palavras (isto é, termos que estão na pergunta são repetidos na resposta) e a pauta levantada na pergunta se mantém na resposta. Além disso, em alguns casos, como nos Excertos 18 e 19, apesar de tratar a pergunta como inapropriada, o respondente fornece uma informação próxima à que foi solicitada.

Passaremos agora a tratar de mais um tipo de resposta não-conformativa que, de acordo com nossa análise, apresenta características de resposta transformativa, porém, de natureza ainda não descrita na literatura.

4.6 RESPOSTAS NÃO-CONFORMATIVAS QUE POSTERGAM O PROVIMENTO DA INFORMAÇÃO

Ao analisar os dados, encontramos respostas não-conformativas que nos parecem, também, transformativas, porém, de natureza ainda não descrita na literatura: respostas que postergam o provimento da informação. Detalharemos suas características e implicações a seguir.

O Excerto 20 apresenta uma consulta de aconselhamento genético envolvendo o médico geneticista Jeferson e a gestante Fernanda, que está com 27 semanas de gestação. O feto apresenta malformação nos rins, no pé, e o resultado da amniocentese, exame para a retirada de líquido amniótico do abdome materno, ainda não chegara no dia dessa consulta.

Excerto 20: HMF_ACONGEN_fernanda_JEFERSON_07_01_14 139 FER: [e- esse] rim pode tá atrás 140 do outro né

141 JEF: pode tá escondido num lugar que a gente 142 não tá vendo (.) até o a ressonância né= 143 FER: =foi o 144 que a doutora acha

145 JEF: isso

146 FER: a a minha de de((nome da cidade omitido)) 147 JEF: a: a de ((nome da cidade omitido)) mas ã 148 a ressonância vai ajudá a tentá entendê 149 porque ele vê de um outro jeito o bebê 150 FER: sim

151 JEF: né então,

152 FER: ela acha que tá atrás que pode tá atrás desse 153 que que ele tá muito inchado né

154 JEF: ãrrã (.) é e a gente: e- pode tá em algum 155 outro lugar (.) ã: que a gente não tá 156 visualizando né então a ressonância ela 157 ajuda, ã: a tentá até localizá e vê, 158 >realmente< se isso é verdadeiro ou não 159 (2.0)

160 FER:→ mas ele pode sobrevivê né doutor 161 (1.7)

162 JEF:→ .hh o:lha a prin[cípio]

163 FER: [ningu]ém diz nada 164 ((telefone do médico toca))

165 JEF:→ é a gente não tem certeza do que que exatamente 166 tá acontecendo né (.) como a gente não

167 tem um diagnóstico muito definido, a gente 168 não tem como prevê, exatamente o que que vai 169 acontecê né >a senhora me desculpe eu

171 alô? (.) °caiu° ((médico desliga o telefone)) 172 ã mas o que que acontece, ã parece não

173 ter nenhuma alteração maior que possa pôr em 174 risco ele né=

175 FER: =a vida

176 JEF: isso (.) uma preocupação que a gente pode 177 ter um pouco que a gente é mais um

178 cuidado na verdade .hh é que realmente se

179 °se confirmá° que ele tem a falta de um rim de 180 um lado e essa hidronefrose do outro esse 181 aumento a obstrução (.) .hh a gente tem que 182 tomá muito cuidado é que a pessoa- (.) o- o 183 ser humano né ele pode viver até com um 184 só=

185 FER: =sim.=

186 JEF: =né mas sem rim daí teria que fazer 187 transplante, e tem outros tratamentos né= 188 FER: =tá

No Excerto 20, entre as linhas 139-158, o médico geneticista explica para a gestante que o rim que está “faltando” pode não ter sido visualizado ainda. Por esse motivo, é necessário que seja feita uma ressonância, pois esse exame pode ajudar a identificar o rim. Após, a gestante realiza uma pergunta polar que pede por confirmação na linha 160 (mas ele pode sobrevivê né doutor). Ao final do turno, a paciente utiliza o marcador discursivo “né” e o termo de endereçamento “doutor”. O uso de “né” torna preferida, como resposta, uma confirmação, e “doutor” é a forma como a gestante seleciona o próximo falante. É interessante chamar a atenção para o uso da conjunção adversativa “mas” no início do turno da gestante, o que parece indicar uma ideia oposta sua referente aos turnos anteriores, ou seja, apesar dos problemas relatados, o feto pode sobreviver.

Após uma pausa de 1.7 segundos, o que indica despreferência, o médico inicia seu turno (linha 162) com inspiração (.hh) e com a expressão “olha a princípio”. Nesse turno, o médico não confirma nem desconfirma o pedido da gestante, o que indica resistência em relação à pergunta. Esse turno, portanto, inicia a pré-sequência de uma resposta despreferida. É possível ver que a gestante se orienta para esses sinais de despreferência: a pausa, a inspiração, e a não- confirmação do seu pedido como uma indicação de alguma coisa negativa, ao reclamar que ninguém diz nada (linha 163). O médico retoma seu turno na linha 165 e faz uso do plural “a gente” para atender à reclamação e, também, justificar a não possibilidade de confirmar ou desconfirmar o pedido da gestante (a gente não tem certeza do que que exatamente tá acontecendo). Nas linhas 166-169, o médico continua sua justificativa (como a gente não tem um diagnóstico a gente não tem como prevê o que vai acontecê). Contudo, ao

final do seu turno (linhas 172-174), o médico informa que nada indica que o feto corra risco, ou seja, o médico confirma o pedido da gestante realizado na linha 160, sobre se o feto pode vir a sobreviver.

Apesar de a resposta se caracterizar como uma resposta não-conformativa transformativa, acreditamos que não se alinha a nenhum dos tipos de transformativas identificadas por Stivers e Hayashi (2010). Analisando suas características, parece-nos ser uma resposta transformativa que posterga o provimento da informação, já que a confirmação do pedido da gestante é fornecida ao final do turno, nas linhas 172-174 (parece não ter nenhuma alteração maior que possa pôr em risco ele né), após justificativas sobre a situação do feto que indicam não-provimento da confirmação solicitada.

Apesar da confirmação do médico, a partir da linha 176 (até a linha 187), ele alerta sobre os riscos que o feto pode ter, caso seja confirmado que existe a falta de um dos rins. Mais especificamente, o médico explica que o ser humano [...] pode até viver com um só, mas sem rim daí teria que fazer transplante, e tem outros tratamentos, ou seja, após indicar incerteza quanto ao diagnóstico do feto e incerteza quanto ao que pode acontecer, o médico conclui que parece não haver alterações que ponham o feto em risco. Porém, o médico alerta sobre os perigos que o ser humano corre ao viver com somente um rim. Podemos observar também que não há alterações que indiquem que o feto corre risco, quando o médico diz que parece nãoter nenhuma alteração maior que possa pôr em risco ele, utilizando o pronome “ele” (linha 174) para se referir diretamente ao feto. Porém, ao falar dos riscos de se viver com somente um rim, o médico utiliza o sujeito “ser humano” (linha 183), referindo-se às pessoas em geral e não somente ao feto, ou seja, nesse momento, ao alertar sobre os riscos, o médico utiliza como referente o ser humano de uma forma generalizada. Isso pode indicar um cuidado do médico ao entregar uma má notícia sobre o diagnóstico, levando em consideração quem recebe a má notícia (nesse caso, os pais).

O Excerto 21 é, também, uma consulta de aconselhamento genético envolvendo a gestante Catarina e o médico geneticista Jeferson. O acompanhante da gestante e a psicóloga do hospital também participam dessa consulta, porém, não participam verbalmente dessa sequência. A gestante está na 19ª semana de gestação e o feto fora diagnosticado com Síndrome de Down. A sequência apresentada a seguir ocorre após o médico explicar sobre o acompanhamento que a gestante e o feto terão até o final da gravidez.

Excerto 21: HMF_ACONGEN_catarina_JEFERSON_09_01_14 777 CAT:→ [.h é bem ] provável que eu não

778 vá ganhá esse bebê de parto normal ↑né 779 (.)

780 JEF:→ ↓é: a gente tenta [↑dentro-]

781 CAT: [pelo pro]blema do coração.= 782 JEF:→ =.h i:sso, a gente tenta ↑dentro do possível 783 planejá tu:do (bem).

784 (.)

785 JEF: tipo então planejando ↑tudo a ideia é tentá 786 fazê: parto cesáreo, marcá o di:a,=

No Excerto 21, a gestante realiza uma pergunta polar que pede por confirmação, nas linhas 777 e 778. Essa pergunta é realizada em formato negativo, caracteriza-se pelo uso do advérbio de modo “provável”, o que indica alguma assertividade da gestante em relação à confirmação solicitada, além do uso do marcador discursivo “né”, que é característico em pedidos de confirmação. Após uma micropausa, o médico inicia seu turno com uma resposta não-conformativa transformativa que posterga a confirmação, isto é, o médico não confirma nem desconfirma o pedido da gestante. Contudo, ele inicia uma pré-sequência que diminui o grau de certeza do pedido da gestante (a gente tenta dentro), na linha 780. Ao final do seu turno, o médico tem a fala sobreposta pelo turno da gestante, que justifica seu pedido de confirmação (pelo problema do coração), na linha 781.

O médico toma o turno novamente e confirma entendimento sobre o que a gestante acabara de justificar (linha 782), e expande: a gente tentadentro do possível planejá tudo. Após uma micropausa, em que a gestante não toma o turno, o médico confirma o pedido realizado pela gestante (a ideia é tenta fazê parto cesáreo). Contudo, essa confirmação é feita por meio do uso de palavras que indicam, novamente, incerteza: a ideia é tentá. Observamos, então, no Excerto 21, que a resposta não-conformativa transformativa apenas posterga o provimento da informação e/ou confirmação, mas essa resposta acontece na sequencialidade. Além disso, assim como no excerto anterior (Excerto 20), o médico utiliza termos que diminuem a certeza embutida no pedido realizado pela gestante e fornece justificativas para essa incerteza.

No Excerto 22, a seguir, temos uma consulta de aconselhamento genético que envolve o médico geneticista Jeferson, a gestante Dara, 26 anos, que está na 27ª semana de gestação, e sua mãe. É a primeira consulta da gestante com o médico geneticista. O feto apresenta rins policísticos e, consequentemente, falta de líquido amniótico. Com isso, os pulmões do feto ficam comprometidos, gerando um quadro grave. Essa sequência ocorre aos 46 minutos de interação, quase ao final da consulta.

Excerto 22: HMF_ACONGEN_dara_JEFERSON_04_02_14 1976 ACO:→ ↑tá então >assim se a gente< querê fazê 1977 o enxovalzi:nho, do nenê [isso aí ↑tu]do= 1978 JEF: [.hhhh ] 1979 ACO: =↑é::

1980 JEF: é: [infelizmente- ] 1981 ACO:→ [descartado então?] 1982 (0.4)

1983 JEF:→ é: infelizmente >pelo menos-< pelo o que 1984 a gente tá vendo ho:je .h (.) ã:

1985 ↑leva a gente a crer que realmente se- 1986 seja um quadro (.) bastante grave 1987 né: e que- (.) ↑muito provavelmente 1988 (.) .h [que vá:]

1989 ACO: [°o nenê] não sobrevive°. 1990 JEF: °não sobrevive°.

1991 (.) ((A acompanhante deixa os braços cair 1992 como se fosse desmaiar.))

1993 ACO: hh

1994 JEF: infelizmente °tá° 1995 (.)

Nos turnos anteriores (não reproduzidos aqui) o médico geneticista explica para a gestante e sua mãe sobre a gravidade do quadro, pois os dois rins do feto estão comprometidos. Nesse momento, nas linhas 1976 e 1977, a mãe da gestante inicia uma formulação (tá então assim se a gente querê fazê o enxovalzinho do nenê isso aí tudo), e, em fala sobreposta, o médico produz uma inspiração (.hhh), na linha 1978. A acompanhante termina seu turno realizando uma pergunta polar que pede por confirmação, na linha 1981 (descartado então?). Esse turno ocorre, novamente, em sobreposição ao turno do médico (é infelizmente), na linha 1980. Após 0.4 segundos, o médico fornece, então uma resposta não- conformativa transformativa que posterga o provimento da informação. Essa resposta inicia com a repetição do turno anterior do médico (é infelizmente), que é expandido com autorreparo (pelo menos- pelo que a gente tá vendo hoje), inspirações, hesitações e pausas (.h, ã::, (.)), mudança de foco, ao falar sobre a gravidade do problema (leva a gente a crer que seja um quadro bastante grave), e o início de uma conclusão (e que muito provavelmente que vá), nas linhas 1983-1988. O último turno da fala do médico é sobreposto pela conclusão realizada pela acompanhante (que realizara a pergunta): o nenê não sobrevive (linha 1989). A confirmação do médico para o turno da linha 1989 e também para o pedido de confirmação realizado na linha 1981 ocorre na linha 1990: não sobrevive, ou seja, o enxoval do bebê está, sim, descartado. Essa informação é confirmada por meio de um