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RESPOSTAS SINTÔNICAS MENINOS % MENINAS %

b) A Teoria histórico-cultural de L S Vygotsky e a construção do conhecimento: o papel da escola e da cultura

RESPOSTAS SINTÔNICAS MENINOS % MENINAS %

ADMOESTAÇÃO 52 74.29 16 72,73

DESVIO DA ATENÇÃO DO(A) ALUNO(A) 12 17.14 04 18,18

CRÍTICA BRANDA 03 4.29 01 4,55 TROCA DE IDÉIAS 03 4.29 01 4,55 SUBTOTAL 70 100.00 22 100,00 CRÍTICA ACERBA 06 13.33 01 16,67 RECLAMAÇÃO 15 33,33 01 16,67 TROCA DE LUGAR 05 11,11 02 33,33 OLHAR INTIMIDATIVO 02 4,44 01 16,67 AMEAÇA 16 35,56 01 16,67 NEGAÇÃO DE ATENÇÃO 01 2,22 00 0,00 SUBTOTAL 45 100 06 100,00 TOTAL 115 --- 28 ---

Ao observarmos a Tabela 3, podemos notar, no que diz respeito às respostas sintônicas, que as admoestações eram predominantes tanto para as meninas quanto para os meninos. Ora, entendemos por “admoestação” atos ou palavras de advertência, avisos, conselhos ou leves repreensões. Assim, sobejavam as respostas verbais “leves” ou “brandas” aos atos de indisciplina, podendo-se afirmar que as professoras observadas eram predominantemente sintônicas ao reagirem à transgressão em sala de aula, havendo um maior número de respostas para os meninos em função do maior número de ocorrências de indisciplina entre eles.

Com relação às respostas não-sintônicas, observamos que a ameaça era mais freqüentemente dirigida aos meninos. “Ameaça”, no nosso entender, implica no uso de palavras ou gestos intimidativos, em promessas de castigo ou em prenúncio de coisa desagradável /temível.

Constatamos que a ameaça – no contexto estudado – sempre assumia um tom agressivo (palavra ou gesto intimidativo ou promessa de castigo), atingindo os alunos em sua capacidade de aprender ou em sua competência para mostrar conhecimento. Deste modo, os alunos (meninos) considerados indisciplinados eram desqualificados pelas professoras, mesmo em suas tentativas de participação nas tarefas escolares (quando aconteciam em momentos impróprios), como mostram os acontecimentos reproduzidos a seguir:

A Professora trabalha com a turma números antecessores e sucessores. Leo fala um número, mas não é a sua vez de falar. A professora diz: “se você continuar falando eu, eu, eu vou tirar os pontos que você fez. Só basta levantar o braço, eu tenho dois olhos prá ver”.

Sandro reclama que Marcelino lhe chama de doente mental. A professora diz: “acho bom, ao invés de chamar o colega de doente mental [...] ajudar [...] a ler isso aqui [...] tá? A gente está aqui prá fazer alguma coisa [...] aí conversa eu, você, Zélia, seu pai prá gente ver qual é o caso, o que é mesmo que você tá querendo [...] Olha só, eu tô interrompendo a leitura dessa brincadeira aqui só prá dar atenção a vocês dois [...] vamos respeitar, vai depender de vocês, então combinado.”

Professora para Danilo: "você perturbou o tempo inteiro, não vou deixar sair sem terminar."

A professora diz para a observadora: “Leo é um caso de psicopedagogo. Ó prá ali ó” [Leo pega nas trancinhas da colega, diz não à professora]. A professora diz: “será que vai ser preciso seu pai voltar aqui de novo e fazer o que ele fez? Será que você só fica bem assim?” [A professora fala que o pai de Leo o espanca e que por isso ele só obedece com pancada].

Professora: “Leo, você vai ficar na secretaria até você decidir estudar.”

A professora se irrita e toma o crachá das mãos de Leo. Olha para a observadora e diz: “crianças assim tem que chamar o CENAP, não é com o professor, não... Vou falar com Zélia [diretora] para escrever, se ela não escrever, escrevo eu.”

Leo está com um chapéu de papel na mão. A professora diz: “você com este chapéu na mão até eu tomar ... não vai passar disso, é? Chegam as férias de junho e você nada fez!"

Através dessas intervenções, as professoras ratificavam uma posição ambivalente em relação à capacidade intelectual masculina. Os meninos eram considerados dispersos e pouco atentos às tarefas propostas, mas também mentalmente ágeis, práticos e capazes, como demonstram as falas seguintes:

“Uma coisa que eu tava observando também... é as brincadeiras, né, como eles conseguem [...] trazer prá sala, e ali, se deixar, o espaço é deles, eles querem jogar até bola de gude, aviãozinho e as meninas não trazem isso prá sala [...] a brincadeira mesmo e assim, eles trazem, eles trazem, eles se agarram aqui, eles querem... se eu permitir eles ali, eles tomam conta e não se faz mais nada, e é só aquilo, tá, o tempo todo, só aquilo desde a discussão, de discutir o futebol, ah, jogar bolinha de papel, ah, jogar aviãozinho de papel, a bola de gude, a bola mesmo, né, de futebol, as figurinhas de futebol, então assim, se abrir espaço prá isso eles não querem mais nada, é... assumir mesmo o ritmo, com orientação, né” (Professora Elaine).

“Os meninos são mais inquietos, têm maior dificuldade de concentração, dificuldade de aprendizagem; as meninas se interessam mais. É mais difícil você manter a concentração deles, mantê-los atentos por mais tempo [...] o menino, não é que ele tenha dificuldade, não é isso que eu quero colocar, não é dificuldade de conhecimento, mas acho que é o tempo de maturação [...]” (Professora Lígia).

“O homem é aquela coisa mais bruta, ele pode ser excelente aluno, mas ele não tem aquele cuidadinho que a menina tem [...]” (Professora Silvia).

Nestas falas, as professoras Elaine, Lígia e Silvia imputaram aos meninos imaturidade, indisciplina, dispersão e movimento, características que dificultariam a pretensa missão educativa de propiciar às crianças a construção de conhecimentos.

Contudo, estas mesmas falas atribuíram aos meninos vivacidade, criatividade, ludicidade e excelência intelectual, repetindo discursos milenares e ainda correntes (SCHOTT, 1996), que separam caminhos diferenciados de conhecimento do mundo para homens e mulheres.

Voltando à Tabela 3, observamos que, dentre as respostas não sintônicas ao comportamento transgressor das meninas, predominava a “troca de lugar”. Esta forma de intervenção se mostrava mais branda, menos incisiva e agressiva que as ameaças lançadas aos meninos indisciplinados, como podemos constatar nas duas ocorrências verificadas durante as observações:

Paula diz: “Pró ô pró, não vou fazer, não [desenhar lagarta no papel], não vou fazer 'largata', não.” Leo olha o caderno de Paula, a professora separa os dois, Paula chora.

Léo, José e Regina estão desenhando no quadro negro. A professora manda primeiramente Leo sair, depois o faz com os outros dois.

O tom mais brando das intervenções das professoras em relação às meninas marca uma diferenciação no tratamento das transgressões aos mandatos escolares e reforça a hipótese de que as alunas vêm construindo – em função dos discursos correntes sobre a relação entre a feminilidade, a masculinidade e o conhecimento – um modo mais adaptável e mais afeito à recepção pacífica e ordeira do conhecimento escolar. Através da análise da subcategoria “demonstração de competência”, a seguir, pretendemos confirmar e ampliar a discussão desses resultados.

2 . 2 . 2 D e m o n s t r a ç ã o d e C o m p e t ê n c i a

A discussão dos dados organizados através da análise da categoria “indisciplina” confirma o discurso das professoras acerca das diferenças de gênero na apreensão do conhecimento. Ao analisarmos a categoria “demonstração de competência”, intentamos uma maior compreensão da performance dos meninos e meninas das turmas estudadas ao lidarem com o conhecimento trabalhado em sala,

bem como do ideário docente acerca da relação entre gênero e conhecimento escolar.

Entendemos por “demonstração de competência”: responder às solicitações da professora, manifestar-se espontaneamente, mostrar tarefa escolar à professora, ajudar colega a resolver tarefa escolar, tomar a iniciativa de ir ao quadro, duvidar da competência do(a) colega. Selecionamos mais uma subcategoria que, apesar não significar "demonstração de competência", pode nos trazer importantes informações acerca da atitude dos alunos(as) ao lidarem com o conhecimento, qual seja: "duvidar da própria competência".

A Tabela 4, a seguir, mostra, numa perspectiva geral, o número e o percentual das ocorrências de demonstração de competência, visando a introduzir a discussão dos dados coletados.

TABELA 4 – NÚMEROEPORCENTAGEMDEOCORRÊNCIASDEDEMONSTRAÇÃODE COMPETÊNCIA,