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Os resultados apresentados no presente trabalho mostram que a organização ambi- entada de um controlador plástico é de fato capaz de produzir um acoplamento íntimo entre o um personagem e o seu meio. Como consequência da abordagem adotada, foram obtidos comportamentos bastante coerentes com as capacidades dos agentes e as condições ambientais, com ou sem descrição de objetivos. Essa característica é claramente ilustrada com a estratégia desenvolvida pelos robôs virtuais para compensar um aparato visual primitivo e ser capaz de encontrar a direção a um objeto, mesmo não sendo essa informação originalmente provida pelos sensores. É importante destacar que, quando dotado de visão baseada em uma câmera virtual, o agente também foi capaz de “enxergar”, extraindo dos pixels informações sobre posição e tipo de objeto visualizado, característica determinada pela cor. Essa visão também permitiu um comportamento mais sensível, refletindo o fato do robô estar sempre vendo algo e poder utilizar isso para uma locomoção mais efetiva pelo ambiente, tomando como guia os elementos distribuídos no mundo. A estrutura cerebral responsável por realizar tal tarefa também emergiu naturalmente, não havendo necessidade de qualquer tipo de “projeto de córtex visual”.

A fim de prover alguma capacidade de autoadaptação durante o tempo de vida, tam- bém foram realizados experimentos com redes dotadas de neuromodulação, aumentando o nível de plasticidade neural e possibilitando ao controlador novas maneiras de acoplamento ao corpo e ao ambiente. Tal aspecto, entretanto, não se mostrou necessário para a solução dos problemas enfrentados pelos robôs durante as simulações, não exibindo grandes vantagens evolucionárias. Como consequência, raramente observou-se atividade de modulação nos cérebros evoluídos. Ainda assim, quando presente, foi possível demonstrar a emergência de comportamentos interes- santes e mais complexos. Vale salientar, entretanto, que as estratégias explícitas exibidas pelos robôs dotados de redes neuromoduladas nos experimentos envolvendo visão simplificada, foram simples mudanças comportamentais baseadas em condições ambientais “previstas” pelo processo evolucionário (por exemplo, região com fruta versus região sem fruta), não sendo possível dizer que houve uma adaptação da dinâmica baseada na experiência do personagem em tempo de vida. No caso dos robôs baseados em visão de câmera virtual, observou-se um comportamento

geral mais complexo, menos monótono, e uma leve melhora nos valores de avaliações (quando comparados com controladores evoluídos sem modulação), mas não apresentaram uma estratégia explícita que pudesse ser atribuída à dinâmica moduladora.

Nos experimentos com reprodução simulada, não foram descritos quaisquer obje- tivos para os robôs, sendo eles internos ao sistema como um todo. Pode-se dizer, inclusive, que os objetivos também são características emergentes nesses experimentos. Esse fato é evi- denciado pelas mudanças comportamentais apresentadas pelos robôs em uma mesma execução de simulação. Entretanto, sem autonomia de constituição, os agentes não se desenvolvem, havendo a necessidade de um controle central acompanhando os elementos do sistema (por exemplo, inserindo um novo personagem no ambiente proveniente de um cruzamento). Sem desenvolvimento, não há surgimento de novos comportamentos e, portanto, os personagens não demonstram aprendizado durante a vida. É importante ainda notar que, da forma como os experimentos foram conduzidos, baseado em reprodução sexuada dos personagens, foi possível observar diferentes comportamentos de acordo com o gênero do robô, mesmo sendo todos eles dotados exatamente do mesmo tipo de controlador.

De modo geral, o avanço nos experimentos mostram que quanto maior a capacidade do personagem de se acoplar ao mundo, através de dinâmicas neurais e sensores mais complexos, de fato há a emergência de comportamentos mais naturais e interessantes sem qualquer necessi- dade de pré-definição, conforme esperado pela hipótese sugerida. Isso é facilmente observado, principalmente, nos movimentos dos robôs dotados de câmeras quando comparados aos dotados de sensores de distância.

Na Seção 2.3.3, discutiu-se o conceito de agência. Foi argumentado que um agente genuíno é definido pela regulação ativa de seu acoplamento ao ambiente a fim de manter suas condições de viabilidade. Nos experimentos realizados, o personagem não é capaz de se constituir, isto é, não é dotado de “autonomia constitutiva”, uma vez que sua constituição (corpo, sensores e cérebro) é fornecida pronta, não precisando ser construída e não sofrendo desconstrução, ou seja, é viável independente das condições. Apesar disso, foi possível demonstrar a obtenção de algum tipo de “autonomia comportamental” ao simular uma condição de precariedade do agente, ameaçando sua existência através da variável de energia. Descrito dessa forma, o sistema mostrou capacidade de se reorganizar e exibir a emergência de dinâmicas para sua automanutenção. Entretanto, apenas foi possível modificar estruturas (e, portanto, dinâmicas) por evolução, através das gerações, enquanto cada indivíduo se comportava de modo constante durante seu tempo de vida. Essa característica se deve à incapacidade de constituição de novas estruturas como resultado dos comportamentos, de tal forma que esses também sejam causados

pelas estruturas, em conformidade com o conceito de agência representado pela Figura 2.1. De fato, a criação de tal ciclo é o problema difícil da vida artificial ainda não resolvido.

Entretanto, é interessante observar a população de robôs no experimento de reprodu- ção simulada como unidade. Ao iniciar a simulação, os robôs se movem desordenadamente e a população não consegue se manter, indo à extinção, havendo então a necessidade de criação de uma nova aleatoriamente. Ou seja, pode-se afirmar que, nesse momento, não há uma população de fato, pois não é possível identificar uma unidade na dinâmica dos indivíduos. Durante o processo, contudo, há uma auto-organização dos indivíduos dentro do ambiente no qual vivem, onde eles passam a se comportar para manter a existência do sistema populacional. Esse sistema, portanto, pode-se dizer autoconstituído, pois em nenhum momento, sua organização, como fêmeas preferindo frutas, machos preferindo fêmeas, formas de movimentos, entre outros, foi predefinida por fora. Importante ainda enfatizar a mudança no comportamento dos indivíduos de acordo com o estado do ambiente (escassez ou fartura de energia). Logo, em tal organização, não é mais necessário, ou mesmo correto, falar em convergência para um determinado com- portamento que “resolve” um problema, mas sim que há um equilíbrio. Se esse equilíbrio for quebrado, é esperado que haja uma nova recomposição do sistema para continuar sua existência. Para um ambiente complexo e dinâmico, poderia então ser dito que a população aprende a viver em seu meio, pois se reorganiza para resistir às novas condições.