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2. CURVA DE LAFFER DINÂMICA: EVIDÊNCIAS PARA O BRASIL

2.5. Resultados

Inicialmente, utilizou-se o método de mínimos quadrados de dois estágios (2SLS) para se investigar os possíveis efeitos decorrentes de quebras estruturais no modelo por meio do teste de Chow e a presença de heterocedasticidade e de autocorrelação nas estimativas. Observou-se que todos esses efeitos foram significativos, exigindo a reespecificação do modelo original para incorporar essas características. A partir dessa perspectiva, estimou-se a função de produtividade marginal do capital por meio do método generalizado de momentos (GMM), já incorporando as variáveis dummy e os efeitos da presença de heterocedasticidade e de autocorrelação nas estimativas utilizando-se a matriz de pesos HAC de Newey-West. Os resultados são apresentados na Tabela 1.

Os instrumentos utilizados para estimar a função de produção no modelo GMM foram as variáveis originais do modelo mais as dummies de quebra estrutural defasadas em dois períodos e uma constante. Na mesma linha que Dalamagas (1998b) optou-se por acrescentar mais uma variável exógena – juros reais – ao modelo para servir como instrumento. Para ajudar a decidir se tal inclusão é relevante para o conjunto de instrumentos utilizados na estimação do modelo GMM, utilizou-se também o critério de seleção de momentos relevantes proposto por Hall et al. (2007). O resultado do teste mostrou-se favorável a incorporação da variável “juros reais” ao conjunto de instrumentos.

Nessa perspectiva, já adiantando os resultados apresentados pelos testes de validação do modelo GMM descritos na Tabela 1, o conjunto de instrumentos foi validado pela quadra de testes – estatística J, teste C de ortogonalidade dos instrumentos, relevância instrumental e endogeneidade dos regressores. Os resultados indicam uma probabilidade de 73,91% associada à estatística J – uma vez que a hipótese nula do teste é a de validade dos instrumentos – concluindo-se a favor dos instrumentos utilizados; o segundo teste aponta para não correlação dos instrumentos, tomados individualmente, com o termo de erro – a hipótese nula do teste é que os instrumentos são ortogonais. O teste de endogeneidade3, cuja hipótese nula de que os regressores endógenos são tratados como exógenos, conclui a favor da validade do modelo GMM, já que se aceita a hipótese nula em relação ao capital por trabalhador e

3 O “não” descrito nos resultados indica que os regressores, após a estimação do modelo GMM, não permanecem como endógenos no modelo.

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os gastos públicos. Por fim, o teste de relevância instrumental concluiu que os instrumentos utilizados não são considerados “fracos”, ou seja, não causam má especificação ao modelo.

Tabela 1 – Estimativas da equação (32) por 2SLS e GMM.

Modelo 2SLS GMM 1,597000 *** 1,647282 *** (0,088120) (0,064481) -0,005992 ns -0,007113 *** (0,007538) (0,002707) 0,063985 *** 0,058251 *** (0,011311) (0,007644) -0,003204 * -0,003138 *** (0,001829) (0,000632) -0,000031 ns -0,000027 *** (0,000022) (0,000008) 0,271497 *** 0,242954 *** (0,056985) (0,040148) 0,338891 *** 0,322565 *** (0,064217) (0,037063) -0,189513 0,113966 ** (0,038371) (0,045501) 0,704651 - P(J) 0,029544 0,739112 DW 1,126255 - White Sim - BPG Sim - BG Sim -

Chow Sim Sim

Endogeneidade - Não

Ortogonalidade - Sim

Relevância Inst. - Sim

Fonte: Resultado da pesquisa.

Nota: *** estatisticamente significativo em nível de 1%; ** estatisticamente significativo em nível de 5%; * estatisticamente significativo em nível de 10%; ns não significativo. P(J) é a probabilidade da estatística J; DW é a estatística Durbin-Watson; BPG é o teste Breusch-Pagan-Godfrey; White é o teste de White; BG é o teste Breusch-Godfrey; Chow é o teste de Chow. As estimativas de OLS foram corrigidas pela matriz de Newey-West (autocorrelação e heterocedasticidade). As variáveis dummy representam as quebras estruturais do modelo, sendo que: d1 assume o valor 1 para o período de 1999Q1 a 2002Q3 e 0, caso contrário; d2 assume o valor 1 para o período de 2002Q4 a 2008Q2 e 0, caso contrário; e d3 assume o valor 1 para o período de 2008Q3 a 2009Q4 e 0, caso contrário.

Devido a não consistência das estimativas de 2SLS, a análise a seguir se concentrará apenas nas estimativas de GMM. Observa-se pelos resultados da Tabela 1 que o coeficiente relativo à carga tributária é significativo e negativo. Isso indica que reduções tributárias aumentam a produtividade marginal do capital. À medida que a carga tributária se reduz, o nível da produtividade marginal do capital se eleva em

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0,007113 pontos-base. Tafner (2006) alega que o nível atual da carga tributária brasileira reduz sensivelmente a rentabilidade e os lucros das empresas, após essas efetuarem o pagamento dos impostos. Por sua vez, essa característica diminui os incentivos privados a investir, além de induzir diferentes formas de elisão fiscal e sonegação de impostos.

Observa-se também pela Tabela 1 que a produtividade marginal do capital responde negativamente a variações no estoque líquido de capital por trabalhador. À medida que o estoque líquido de capital por trabalhador aumenta, o nível da produtividade marginal do capital se reduz em 0,003138 pontos-base. Esse resultado coaduna amplamente com a suposição de que os insumos de produção possuem retornos decrescentes, ou seja, o aumento da quantidade utilizada de capital por trabalhador aumenta o crescimento econômico a taxas decrescentes, até atingir o estado estacionário no longo prazo.

De forma similar, a produtividade marginal do capital também responde negativamente a variações na composição dos gastos públicos. À medida que os gastos públicos aumentam, o nível da produtividade marginal do capital se reduz em 0,000027 pontos-base. Se por um lado, relações positivas em relação ao parâmetro dos gastos públicos estão associadas à hipótese de que o capital privado e o capital público são insumos complementares na função de produção, por outro lado relações negativas deste parâmetro estão associadas ao efeito crownding-out. Uma vez que o aumento nos investimentos públicos por parte do governo libera recursos no setor privado que seriam destinados a fins específicos, tais recursos excedentes podem, então, vir a serem utilizados em outras atividades, expandindo, assim, a capacidade de financiamento do próprio setor com significativos efeitos sobre a rentabilidade dos estoques de capital privado.

Contudo, para Aschauer (1989), uma questão chave em relação aos gastos do governo refere-se à distinção social destes, já que existem modalidades de gastos públicos que podem ser substituídos ou complementados pelo setor privado, assim como existe outros tipos de gastos que dificilmente podem ser substituídos entre os setores. Por exemplo, os investimentos públicos em transporte, educação, infraestrutura e pesquisa podem aumentar a produtividade do setor privado e estimular os investimentos deste setor nessas áreas, numa típica estratégia complementar. Outros gastos públicos como, por exemplo, em alimentação ou em saúde podem ser

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completamente substituídos pelo setor privado. Em contrastes, investimentos públicos nos setores de comunicações e energia, dificilmente são completamente substituídos pelo setor privado. Enfim, a determinação da interatividade entre gastos privados e dos gastos públicos depende intrinsecamente da definição dos mesmos, já que é essa dimensão determina a direção dos investimentos públicos ou privados.

No Brasil, Castro et al. (2006) avaliaram a composição dos gastos sociais federais no âmbito macroeconômico para a economia brasileira no período de 1995 a 2001 e concluíram que os três principais setores em que se concentram os gastos do governo são a previdência social (incluindo os programas de assistência), a saúde e a educação, respectivamente nessa ordem. Num trabalho mais recente, Beghin, Chaves e Ribeiro (2010) examinaram os gastos sociais do governo para o ano de 2010 e chegaram a mesma conclusão que Castro et al. (2006). Os gastos com previdência social e assistência representavam 30,41% do total enquanto os gastos com saúde exigiam 22,04% e os com educação exauriam 12,69% de todos os recursos.

Por fim, pode-se observar pelos resultados que o sinal positivo e estatisticamente significativo do coeficiente do déficit orçamentário em proporção do PIB sugere fortemente que a relação entre déficit e PIB está intrinsecamente relacionada à contribuição negativa dos gastos públicos sobre a produtividade marginal do capital, analisada previamente e ao efeito crownding-out na concepção neoclássica. Nessa perspectiva, à medida que o déficit público aumenta, o nível da produtividade marginal do capital se eleva em 0,058251 pontos-base.

A teoria neoclássica sugere dois possíveis caminhos no qual o déficit orçamentário pode afetar a produtividade marginal do capital por meio da taxa real de juros. O primeiro enfoque refere-se à análise neoclássica do ponto de vista do modelo IS-LM, no qual a ligação se faz por meio do mercado de bens e serviços e, o segundo enfoque concentra-se na abordagem dos mercados de ativos em que a oferta e a demanda de títulos públicos determinam a dimensão do mercado. Incrementos positivos na relação déficit/PIB sustentados por aumentos na oferta de títulos, ceteris paribus, acabam por reduzir o preço destes no mercado e, consequentemente, aumentando as taxas de juros de mercado. Por sua vez, taxas de juros maiores desincentivam a formação de capital por parte do setor privado pressionando, assim, a produtividade marginal do estoque disponível de capital.

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Dadas essas considerações, as evidências mostram que a economia brasileira está sujeita a uma curva de Laffer dinâmica. Dado que a produtividade marginal do capital responde negativamente a variações na carga tributária e positivamente a variações na composição do déficit é possível eliminar alguns tributos desnecessários da economia brasileira por dívida pública. Adicionalmente, pode-se inferir que a economia brasileira não está sujeira a equivalência ricardiana, uma vez que os agentes não são míopes às mudanças fiscais determinadas pelo governo. Dessa forma, a produtividade marginal do capital se elevaria via dois caminhos, ou seja, a taxa de crescimento de longo prazo pode ser influenciada pela política fiscal, na medida em que essa política alterará os retornos privados, e, portanto, os investimentos nos setores tecnológicos.

Porém, é preciso atentar para o fato de que a produtividade marginal do capital responde negativamente aos gastos do governo. Esse indicativo é um sinal de que os gastos por parte do governo não podem alterar se substancialmente, uma vez que a economia brasileira está sujeita ao efeito crownding-out. Nessa perspectiva, o debate a cerca da condução fiscal brasileira refere-se não somente a uma melhor alocação tributária como também na manutenção e melhora dos gastos públicos.

Um dos principais argumentos a favor da curva de Laffer diz respeito ao aumento de receitas tributárias propiciadas pela troca de tributos por dívida pública, uma vez que o aumento da base de incidência tributária mais do que compensaria a redução das alíquotas. De acordo com esses argumentos e com base nos resultados, o governo brasileiro pode reduzir o volume de impostos existentes no presente e, uma vez que se mantenha o seu nível de gastos, o mesmo conseguirá manter em equilíbrio o valor presente de sua limitada restrição orçamentária sem recorrer a aumentos tributários no futuro.

Levy (2010) argumenta que o arcabouço da política fiscal no Brasil tem três componentes principais: os acordos de renegociação da dívida dos estados, a Lei de Responsabilidade Fiscal e o processo orçamentário, incluindo as regras para sua execução. Basicamente, o ajuste fiscal adotado pelo Brasil desde 1999 tem sido essencial para a manutenção da estabilidade macroeconômica. O fato de o governo brasileiro ter conseguido manter elevados superávits primários ao longo de quase uma década e a consequente redução da relação dívida líquida/PIB, ampliou o espaço para que o mesmo pudesse praticar políticas contracíclicas sem colocar em risco a meta de longo prazo de trazer a dívida/PIB para níveis mais baixos.

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Entretanto, tal ajuste foi o responsável, ao mesmo tempo, tanto pelo extraordinário aumento da carga tributária quanto pela crescente dificuldade de manter o nível dos gastos públicos. Mesmo que nos anos 2000 tenham sido feitas mudanças visando a reduzir os problemas imediatistas, o alcance de tais ajustes demonstrou-se limitado, uma vez que as distorções ainda persistem, ou seja, a condução fiscal brasileira ainda necessita de ajustes para expandir o ritmo de crescimento econômico, como a ampliação dos investimentos públicos em infraestrutura.

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