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Neste capítulo, o trabalho discorre sobre as principais particularidades de investimentos Cleantech identificadas a partir das entrevistas realizadas com gestores de PE/VC. Procurou- se seguir a mesma estrutura adotada no roteiro de entrevistas: (i) Captação; (ii) Originação; (iii) Investimento; (iv) Monitoramento e Gestão; e (v) Desinvestimento. Uma série de particularidades inerentes aos projetos de tecnologias limpas foram identificadas. Algumas comuns aos três casos estudados, outras particulares e limitadas ao setor em que a empresa está inserida.

No que se refere a diferenças na fase de captação de recursos junto a investidores, a maioria dos entrevistados apontou que existe um bom nível de interesse em Cleantech no atual momento, específicamente no contexto brasileiro. Nos EUA e Europa, os LPs estão um pouco pessimistas com Cleantech, por conta do momento econômico mundial não favorável. No Brasil, veem-se investidores institucionais e organismos multilaterais apoiando iniciativas específicas em Cleantech. Foi citado, por exemplo, o “Programa BNDES Fundo de Inovação em Meio Ambiente”, uma chamada para fundos de Venture Capital especializados em Cleantech. Dois gestores já foram qualificados: INSEED Investimentos e Performa Investimentos, com fundos na ordem de R$ 150 a 200 milhões de reais em captação.

De forma geral, os gestores entrevistados não acreditam numa diferenciação em termos de retorno entre os fundos Cleantech comparados aos fundos tradicionais. Os retornos esperados são iguais aos fundos de PE/VC tradicionais, nem mais nem menos. Os fundos Cleantech são tidos pelos investidores como mais uma opção de ativos para compor sua carteira de investimentos. Os fundos Cleantech gozam sim, no momento atual, de uma maior simpatia e interesse, primeiro, por serem uma classe relativamente nova de ativos, segundo, porque os fundos e alguns familly offices têm buscado inserir componentes éticos em seu portfolio.

Quando perguntados sobre a fase de originação de oportunidades, a maioria dos respondentes considera abundante o número de oportunidades em Cleantech, seguindo os padrões da indústria de 100:1, isto é, de cada 100 oportunidades identificadas, uma é investida. Para alguns, projetos early stage são mais abundantes que projetos late stage. Provavelmente pelo

119 estágio de maturidade das oportunidades em Cleantech e por se tratar de uma classe de ativos relativamente nova. Na avaliação de alguns, existem boas oportunidades para transferência de tecnologia (tech transfer) de países mais avançados na aplicação de tecnologias limpas como Reino Unido, Alemanha e França para o Brasil. Agência bi-laterais como o USAID-FEWS (The United States Agency for International Development – Famine Early Warning System) ou UN FAO – ARTEMIS (Africa Real-Time Environmental Monitoring System) já detém know-how e experiência na transferência de tecnologia para países em desenvolvimento, especialmente aquelas relacionadas a previsão de secas e enchentes. Tais organizações em parceria com gestores de PE/VC poderiam atuar em conjunto para transferência de outras tecnologias relacionadas a mudanças climáticas.

Alguns entrevistados apontaram que os empreendedores em Cleantech são mais técnicos, assim como as oportunidades. Mas talvez esta impressão venha da miríade de diferentes setores que estes gestores são obrigados a analisar. Com algumas exceções, não se nota ainda um alto grau de especialização dos gestores de investimentos de PE/VC em Cleantech no Brasil. Energia limpa é uma dessas exceções, onde se veem gestores especializados em investimentos de energia eólica ou solar, por exemplo. Nos Estados Unidos é possível verificar gestores de Venture Capital especializados em aquicultura como o Aquacopia (www.aquacopia.com).

Na opinião de um dos gestores de Venture Capital early stage entrevistados, o empreendedor brasileiro em Cleantech é bastante técnico. Em boa parte são acadêmicos com um alto grau de especialização técnica, mas ainda pouco capacitado do ponto de vista gerencial, no que se refere às outras áreas de conhecimento (finanças, estratégia, recursos humanos, etc.) dentro de uma organização necessárias para a criação de uma empresa vencedora. Por consequência, a qualidade dos Business Plans em Cleantech ainda peca por expressar estas deficiências.

A intensidade de capital (CAPEX) nos investimentos em Cleantech foi apontada pelos gestores como uma realidade, principalmente àqueles relacionados a projetos de infraestrutura. Os investimentos atuais em energia limpa, por exemplo, somam quantias maiores do que R$ 500 milhões. Segundo um dos entrevistados, o desafio é comprovar a eficiência tecnológica e econômica da inovação antes do investimento. Soluções modulares,

120 como projetos pilotos, pode ser uma forma de se reduzir o montante de capital envolvido nos primeiros estágios.

Os entrevistados disseram que os mercados alvo da maior parte das tecnologias limpas são grandes, em muitos casos maiores do que R$ 1 bilhão, e um dos entrevistados acredita que tendem a ficarem mais atrativos na medida em que novos marcos regulatórios forem estabelecidos. Citou como exemplo a Lei dos Resíduos Sólidos aprovada recentemente no Brasil que obriga as empresas de alguns setores darem a devida destinação ao produto pós- consumo. No setor de energias limpas, por exemplo, um dos entrevistados acredita que o apoio governamental via regulamentação do setor é positivo e favorece a estruturação de um mercado cuja demanda é garantida justamente por esta intervenção governamental.

Na opinião deste, o interesse de investidores por energia limpa no Brasil e no mundo se dá por três razões. A sociedade percebe que o desenvolvimento econômico tem que se dar de forma mais sustentável. As fontes “sujas”, oriundas de petróleo, dependem de um fator incontrolável: seu custo. Qual será o preço do petróleo daqui a 20 anos? Boa parte das políticas públicas adotadas endereça esta variável, travando o preço via leilões, como é o caso brasileiro. E a terceira razão é justamente esta. Os governos realizaram que não podem ter uma matriz energética totalmente dependente de outros países, principalmente, de regiões politicamente instáveis. À medida que esta percepção aumenta, passam a desenvolver mecanismos e políticas que favoreçam outras fontes de energia. No Brasil e no mundo, este entrevistado acredita que o posicionamento do Estado é essencial, cria novos mercados e oportunidades para investidores.

Quanto maior o mercado, maiores as chances de ganho de escala rapidamente. Neste sentido, os investidores de PE/VC de forma geral miram tecnologias que tenham potencial para atender o mercado global. Quando questionados sobre a possibilidade de internacionalização dos produtos Cleantech, ficou aparente que muitos casos de Cleantech apresentam limitações geográficas tanto do ponto de vista de seus insumos quanto do ponto de vista dos mercados que visam atender. A vocação geográfica de insumos de determinado país influencia o desenvolvimento de algumas tecnologias em detrimento de outras. Para um dos entrevistados, o Brasil é muito “rico” em alternativas e apresenta vocação geográfica para

121 a implantação de diferentes tecnologias. Diferentemente de alguns países da Europa cuja limitação os força a desenvolver determinados projetos como o de energia solar, por exemplo.

No momento do investimento, os entrevistados dizem não haver diferença entre projetos Cleantech e outros. Não se paga mais pelo projeto pelo fato de ser uma empresa com objetivo e consciência ambiental. Os contratos e acordos entre sócios não expressam nada diferente do que se vê no mercado para outros tipos de tecnologia. O que um dos entrevistados aponta é que no momento os projetos ligados à energia limpa estão sobrevalorizados. Outro entrevistado destaca no contexto brasileiro certo grau de politização do setor. Regulamentação não incomoda investidores desde que seja fundamentada tecnicamente. O que incomoda e pesa na decisão de investimento é quando o setor passa a receber muita influência política. Na opinião deste investidor, que também investe em outros setores de infraestrutura, o setor de energia no Brasil é o que apresenta regulamentação mais complexa, mas ao mesmo tempo, é o melhor regulamentado.

No que se refere ao processo de monitoramento e gestão, as entrevistas realizadas também mostraram ser prática da indústria de PE/VC implementarem indicadores de performance (KPIs) para acompanhamento de questões ambientais em seus investimentos Cleantech. De certa forma, este conjunto de indicadores serve para corroborar a tese de investimento dos fundos de PE/VC no sentido de demonstrar o efeito ambiental positivo prometido.

Quanto ao desinvestimento, os respondentes disseram que não existe prêmio no momento da saída do investimento em Cleantech. Não se paga mais por se tratar de tecnologia limpa. Um dos entrevistados acredita que num horizonte de 5 a 10 anos, os efeitos acentuados das mudanças climáticas e a tendência de alta nos preços do petróleo deverão favorecer as empresas que atuam com tecnologias limpas, podendo-se aí sim haver prêmio sobre estas. Em contrapartida, outro entrevistado chama à atenção que os LPs não toleram retornos inferiores, ainda que para este entrevistado, os múltiplos em Cleantech sejam hoje inferiores aos encontrados em empresas de internet. Os investimentos realizados em Cleantech começam a maturar e devem-se ver novos IPOs num futuro próximo.

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