5. O que podemos aprender do passado: o impacto do trecho oeste no preço da terra
5.4 Resultados
A Tabela 5.4 apresenta os resultados das estimações (que denominamos por “modelos”).
O Modelo 1 é a estimação base e os demais modelos são especificações alternativas que
buscam explorar a robustez dos resultados, conforme explicamos a seguir.
O primeiro aspecto a ser observado é que todas as variáveis de controle adotadas
mantiveram o mesmo sinal, independentemente de qual especificação adotada. Este é um
bom sinal de robustez e da escolha adequada dessas variáveis como controle:
Características dos imóveis e condomínios:
o LN DA ÁREA UTIL (LN OF USEFUL AREA), NÚMERO DE QUARTOS
(# OF BEDROOMS), NÚMERO DE BANHEIROS (# OF BATHROOMS),
NÚMERO DE VAGAS NA GARAGEM (# OF PARKING PLACES),
NÚMERO DE ELEVADORES (# OF ELEVATORS), NÚMERO DE
ANDARES (# OF FLOORS), EXISTÊNCIA DE COBERTURA
(PENTHOUSE), DUMMY LOCALIZAÇÃO NO MUNICÍPIO DE SÃO
PAULO (MUNICIPALITY OF SAO PAULO), LN DA DISTÂNCIA AO
CENTRO DE SÃO PAULO (LN OF DISTANCE FROM SAO PAULO
DOWNTOWN).
Características do setor censitário:
o PERCENTUAL DE RESIDENCIAIS SEM CONEXÃO À REDE DE
ESGOTO (PERCENTAGE OF DWELLINGS WITH SEWAGE
COVERAGE), PERCENTAGEM DE RESIDÊNCIAS SEM SANITÁRIO
(PERCENTAGE OF DWELLINGS WITHOUT BATHROOMS),
PERCENTAGEM DE RESIDENCIAS SEM COLETA DE LIXO
(PERCENTAGE OF DWELLINGS WITH GARBAGE SERVICES
COVERAGE), PERCENTAGEM DE RESIDENCIAS COM ACESSO AO
SISTEMA DE DISTRIBUIÇÃO DE ÁGUA (PERCENTAGE OF
DWELLINGS WITH WATER SYSTEM COVERAGE), RENDA MÉDIA DO
RESPONSÁVEL PELA FAMÍLIA (AVERAGE INCOME FROM HEADS
OF HOUSEHOLDS OF THE SECTOR), LN DA DENSIDADE
POPULACIONAL DO SETOR (LN OF POPULATION DENSITY IN THE
SECTOR).
Dessas variáveis, boa parte delas mantém-se significantes nas diferentes especificações.
Há alterações na magnitude de seus coeficientes, como fruto do viés de omissão de
variável nos modelos de 2 a 7, porém a direção do efeito delas sobre o LN do preço do
solo se mantém.
De outro lado, algumas dessas variáveis, mesmo com a manutenção dos sinais ao longo
das especificações, mostram coeficientes diferentes do que se esperaria num primeiro
momento. Por exemplo, ÁREA ÚTIL e QUARTOS têm sinais negativos e no Modelo 1
seus coeficientes implicam que, na média, 10% a mais no tamanho útil do imóvel e um
quarto adicional resultam em redução do preço em 6,2% e 17,1% respectivamente.
Boarnet e Charlempong (2001) encontram a mesma situação para o coeficiente de
QUARTOS. Segundo eles, isso seria um indicativo de um mercado local composto de
imóveis de alto valor, compostos de imóveis de tamanho relativamente elevado e poucos
quartos proporcionalmente. Não acreditamos que essa explicação seja muito aderente à
RMSP, mas ela é plausível para a base da Embraesp, que não cobre o mercado informal
ou o mercado formal que não seja publicamente anunciado.
Os coeficientes dos PERCENTUAIS DE RESIDENCIAIS SEM SANITÁRIO E COM
ACESSO AO SISTEMA DE DISTRIBUIÇÃO DE ÁGUA apresentam sinais contrários à
intuição (positivo no primeiro e negativo no segundo). Suspeitamos que essas variáveis
estejam absorvendo o efeito dos condomínios fechados situados nos subúrbios, que em
muitos casos não possuem esgotamento conectado à rede, assim como captação de água
independente.
A densidade populacional do setor censitário, LN DA DENSIDADE POPULACIONAL
DO SETOR, é significativa nas três primeiras especificações e nelas e nas demais
apresenta sinal negativo. Ou seja, essa variável pode estar captando alguma
desamenidade urbana que é maior nas grandes aglomerações verticais das áreas mais
centrais (externalidades negativas como poluição sonora, atmosférica e visual). No
Modelo 1 a sua elasticidade é -0,035.
A variável de distância ao centro, LN DA DISTÂNCIA AO CENTRO DE SÃO PAULO,
crucial na teoria do uso do solo urbano, apresenta-se com coeficiente significativo e com
sinal negativo. Isto implica que o preço do solo se reduz na medida em que nos afastamos
das áreas centrais. No Modelo 1, cada 10% que nos afastamos do CBD o preço da terra se
reduz em 1,14%.
A última variável de controle que destacamos antes de analisar as variáveis
independentes principais é a dummy LOCALIZAÇÃO NO MUNICÍPIO DE SÃO PAULO.
O seu coeficiente é significativo e positivo, resultando na interpretação de que imóveis
lançados no município de São Paulo têm, no Modelo 1 por exemplo, 8,2% a mais de
valorização (tudo o mais constante). Dado que controlamos para outras variáveis
locacionais, esta dummy pode estar captando as vantagens de acessibilidade a serviços de
lazer e consumo que há por se localizar no município paulistano.
No Modelo 1 usamos todas as observações e todas as interações. Este é a especificação
base. Conforme observamos na tabela 5.5, os efeitos sobre o preço passam a ser
significativos a partir da construção. É o que Boarnet e Charlempong (2001) discutem. A
capitalização dos efeitos da obra de infra-estrutura de transportes se dá ao longo do
tempo, pois grandes obras que envolvam grandes montantes de recursos são, em geral, de
difícil execução, com muitas questões de licenciamento ambiental e outras incertezas
envolvidas. O mercado imobiliário, portanto, antecipa paulatinamente eventuais ganhos e
perdas na medida em que a implantação vai avançando, até que se concretize a fase
operacional.
Tabela 5.5 – Coeficientes e erros-padrões estimados das variáveis de interesse do
Modelo 1
Dummies Interativas
Período de
anúncio e de
estudos
Período de
construção
Período de
entrega e
operação
Até 2,5 km da saída mais próxima
(lado esquerdo do traçado) –
Grupo 1
0
0
1.1284***
‐0.2622
0.5851***
‐0.2135
Mais do que 2,5 km da saída mais
próxima (lado esquerdo do
traçado) – Grupo 2
0
0
‐0.5136
‐0.4174
‐0.2364
‐0.2508
Até 2,5 km da saída mais próxima
(lado direito do traçado) – Grupo
3
0.3735
‐0.3193
‐1.082
‐0.8018
0.1328
‐0.2552
Entre 2,5 e 5 km da saída mais
próxima (lado direito do traçado)
– Grupo 4
0.2187
‐0.2581
‐0.4412
‐0.4033
‐0.5401***
‐0.1995
Erros-padrões robustos abaixo dos coeficientes. * p<0.10, ** p<0.05, *** p<0.01
Os efeitos positivos ocorrem para aquelas residências situadas num raio de até 2,5km da
saída mais próxima do Rodoanel Oeste, localizadas no lado esquerdo do traçado. Os
ganhos de acessibilidade são incorporados nos preços a partir da fase de construção e se
consolidam com a operação do Trecho Oeste, respectivamente 113% e 59%. É
interessante notar que o efeito do período de construção é maior do que o de operação.
Pode-se especular se os ganhos de acessibilidade esperados eram maiores do que os
ganhos que de fato ocorreram mas é mais possível que a capitalização ocorreu com o
início das obras e que depois se consolidou.
Os efeitos do lado direito, isto é, do lado “interno” do traçado foram não significativos
em sua maioria. Vale destacar que na fase de maior incerteza (inclusive sobre o traçado
definitivo), o anúncio do Rodoanel Oeste tem coeficiente positivo, ou seja, um efeito
esperado de ganho de acessibilidade ou outras vantagens. Na medida em que a obra
ocorre e é entregue, o que era ganho torna-se perda – sinal negativo dos coeficientes.
Particularmente para os imóveis entre 2,5 e 5 km dos acessos ao lado direito das pistas,
durante a fase de operação, o efeito é negativo em 54% sobre o preço e significativo
estatisticamente.
No Modelo 2 colapsamos as dummies temporais em duas fases: implantação (anúncio,
estudos e construção) e operação (a partir da entrega). Os resultados são destacados na
Tabela 5.6 e transmitem basicamente a mesma mensagem do Modelo 1: valorização da
terra residencial situada no lado oeste em até 2,5 km da saída mais próxima do Rodoanel,
desvalorização da terra localizada entre 2,5 e 5 km das saídas ao lado leste do traçado. As
magnitudes dos efeitos significativos foram quase semelhantes e mostram que durante a
implantação os ganhos foram superestimados e as perdas subestimadas em relação ao que
ocorreu na fase de operação.
Tabela 5.6 – Coeficientes e erros-padrões estimados das variáveis de interesse do
Modelo 2
Dummies Interativas
Implantação Operação
Até 2,5 km da saída mais próxima (lado esquerdo do
traçado) – Grupo 1
1.1329***
‐0.2613
0.5862***
‐0.2135
Mais do que 2,5 km da saída mais próxima (lado esquerdo
do traçado) – Grupo 2
‐0.5079
‐0.4169
‐0.2344
‐0.2507
Até 2,5 km da saída mais próxima (lado direito do traçado) –
Grupo 3
‐0.1119
‐0.4134
0.1333
‐0.2553
Entre 2,5 e 5 km da saída mais próxima (lado direito do
traçado) – Grupo 4
‐0.056
‐0.2489
‐
0.5395***
‐0.1995
Erros-padrões robustos abaixo dos coeficientes. * p<0.10, ** p<0.05, *** p<0.01
O Modelo 3 é uma especificação em que colapsamos as dummies temporais como no
Modelo 2 e também as dummies espaciais (em apenas duas: oeste e leste definindo uma
única distância apenas – até 2,5 km da saída do Rodoanel mais próxima). O que se
depreende da Tabela 5.7 é o efeito positivo e significativo do Rodoanel para os imóveis
que estão do lado esquerdo do traçado.
Tabela 5.7 – Coeficientes e erros-padrões estimados das variáveis de interesse do
Modelo 3
Dummies Interativas
Implantação Operação
Até 2,5 km da saída mais próxima (lado esquerdo do
traçado) – Grupo 1
1.1457***
‐0.2589
0.6200***
‐0.2128
Até 2,5 km da saída mais próxima (lado direito do traçado) –
Grupo 3
‐0.1033
‐0.4128
0.1577
‐0.2557
Erros-padrões robustos abaixo dos coeficientes. * p<0.10, ** p<0.05, *** p<0.01
No Modelo 4 colapsamos as dummies espaciais, como nas duas especificações anteriores,
e as dummies temporais em apenas uma: operação (a partir da entrega do Trecho Oeste).
A Tabela 5.8 mostra que ao adotar tal procedimento, perdem-se todas as significâncias
das variáveis independentes. O motivo é justamente a perda do processo de capitalização
dos efeitos da obra do Rodoanel ao longo do tempo. De fato, esta especificação pressupõe
que os efeitos positivos ou negativos do Trecho Oeste somente se fariam sentir após sua
entrega.
Tabela 5.8 – Coeficientes e erros-padrões estimados das variáveis de interesse do
Modelo 4
Dummies Interativas
Operação
Até 2,5 km da saída mais próxima (lado esquerdo do traçado) – Grupo 1
0.041
‐0.2885
Até 2,5 km da saída mais próxima (lado direito do traçado) – Grupo 3
0.3958
‐0.2603
Erros-padrões robustos abaixo dos coeficientes. * p<0.10, ** p<0.05, *** p<0.01
O Modelo 5 segue colapsando as dummies temporais e espaciais como na especificação
anterior, mas utilizamos como controle apenas os imóveis que estão à mesma distância do
centro que o grupo de tratamento. Ou seja, comparamos os efeitos sobre os preços apenas
com os imóveis que estão numa mesma faixa de distância em relação ao CBD (o número
de observações cai, portanto, de 9.093 para 1.090). Apesar dessa alteração, como visto na
Tabela 5.9, os coeficientes pouco diferem daqueles estimados no Modelo 4 e mantêm-se
não significativos.
Tabela 5.9 – Coeficientes e erros-padrões estimados das variáveis de interesse do
Modelo 5
Dummies Interativas
Operação
Até 2,5 km da saída mais próxima (lado esquerdo do traçado) – Grupo 1
0.061
‐0.2849
Até 2,5 km da saída mais próxima (lado direito do traçado) – Grupo 3
0.4141
‐0.2732
Erros-padrões robustos abaixo dos coeficientes. * p<0.10, ** p<0.05, *** p<0.01
O Modelo 6 segue idem ao Modelo 5, porém eliminando do controle os imóveis que
estejam a menos de 1 km das pistas do Rodoanel. A idéia seria a de lidar com as
externalidades negativas de ruído e poluição atmosférica trazidas pela proximidade das
pistas, como comentado em Boarnet e Charlempong (2001). A redução da amostra não
altera significativamente os resultados em relação à especificação anterior. Os
coeficientes continuam não significativos estatisticamente, embora as magnitudes tenham
se alterado (redução do ganho para os imóveis do lado esquerdo e ligeiro aumento dos
benefícios daqueles que estão do lado direito).
Tabela 5.10 – Coeficientes e erros-padrões estimados das variáveis de interesse do
Modelo 6
Dummies Interativas
Operação
Até 2,5 km da saída mais próxima (lado esquerdo do traçado) – Grupo 1
0.0322
‐0.2978
Até 2,5 km da saída mais próxima (lado direito do traçado) – Grupo 3
0.4335
‐0.3246
Erros-padrões robustos abaixo dos coeficientes. * p<0.10, ** p<0.05, *** p<0.01
Por fim, o Modelo 7 é idem à especificação Modelo 6, porém eliminamos do controle os
imóveis que estejam a menos de 1 km das obras de transporte significativas que
ocorreram no período, 119 observações num total de 2594 possíveis (ver Figura 5.7):
Extensão da Linha Verde do Metrô, que alcança os bairros de Sumaré e de Vila
Madalena;
Nova Linha Lilás do Metrô na zona sul do município de São Paulo.
Nova Faria Lima (Operação Urbana) e extensão da Avenida Hélio Pelegrino.
Construção das pistas do Fura-Fila (atual “Expresso Tiradentes”) na área central.
Construção da nova Avenida Águas Espraiadas.
Complexo Maria Maluf de conexão da Avenida dos Bandeirantes com a Rodovia
Anchieta.
Prolongamento da Avenida Jacú-Pêssego.
Tabela 5.11 – Coeficientes e erros-padrões estimados das variáveis de interesse do
Modelo 7
Dummies Interativas
Operação
Até 2,5 km da saída mais próxima (lado esquerdo do traçado) – Grupo 1
‐0.0077
‐0.301
Até 2,5 km da saída mais próxima (lado direito do traçado) – Grupo 3
0.3246
‐0.3177
Erros-padrões robustos abaixo dos coeficientes. * p<0.10, ** p<0.05, *** p<0.01
Feito isto, conforme mostra a Tabela 5.11, observamos que os efeitos do Rodoanel
continuam não significativos, porém, há uma reversão de sinal no Grupo 1. Ou seja,
comparando apenas com imóveis de mesma distância em relação ao CBD e fora da área
de influência de outras grandes obras de transporte, a entrega e a operação do Rodoanel
traz uma ligeira queda nos preços dos imóveis situados a oeste do seu traçado.
Figura 5.8 – Rodoanel Trecho Oeste e áreas de influência das principais obras de
transporte ocorrida no período 1995-2006.
Fonte: elaboração própria
O que se depreende da análise realizada é que o Trecho Oeste do Rodoanel teve efeitos
sobre o preço do solo residencial, que confirmaram a primeira das três hipóteses
levantadas na seção 5 e negaram as outras duas.
Esses efeitos não foram uniformes, mas variaram de acordo com o lado do traçado e com
a distância às suas saídas para as rodovias. Se representarmos de forma esquemática e
estilizada como na Figura 5.9, vemos que os imóveis do lado esquerdo das pistas e
distantes em até 2,5 km da saída mais próxima do Rodoanel tiveram valorização por
eventuais ganhos de acessibilidade. Residências para além dessa distância não se
beneficiaram.
Do outro lado do traçado, imóveis em até 2,5 km dos acessos ao Trecho Oeste não se
beneficiaram e o efeito sobre os preços foi estatisticamente insignificante. Já os imóveis
compreendidos entre 2,5 e 5 km sofreram redução de preços.
A conjugação desses efeitos resulta numa figura que se assemelharia à letra N (em
vermelho na Figura 5.9). Ou seja, em relação ao gradiente inicial de preços, os impactos
de curto prazo mostram uma espécie de “demanda quebrada” em relação ao solo urbano
no lado oeste da RMSP.
Distância Oeste Preço da Terra Preço da Terra Rural Distância Leste Gradiente de Preço da Terra 15km 22,5km 20km Traçado do Rodoanel OesteFigura 5.9 – Representação estilizada do principal resultado de curto prazo
Fonte: elaboração própria
O que parece ter acontecido, conforme os resultados, é uma alteração do preço do solo
quando se compara com os demais imóveis lançados em outras áreas da RMSP. No
entanto, quando se compara apenas com os imóveis eqüidistantes ao centro de São Paulo
e restringindo-se ao período de operação do Trecho Oeste, não há diferença significante.
O efeito sobre preço se dá paulatinamente ao longo do tempo. As vantagens e
desvantagens passam ser percebidas quando da construção da obra, ou seja, quando o
investimento sai do campo do projeto para da execução. Como discutido, na fase de
construção o efeito esperado tem maior magnitude do que na fase de operação, ou seja, as
pessoas só conseguem avaliar os ganhos na medida em que podem usufruir da obra, testar
rotas alternativas e efetuar seus cálculos de custos e benefícios com base em informações
“vivenciadas”.
Quem mora do lado externo ao traçado vê vantagens no uso do Rodoanel Oeste para fins
de deslocamento se não se encontra distante dos acessos. Embora não seja uma via radial,
o Rodoanel pode ser rota alternativa para chegar a diferentes regiões do CBD,
principalmente para evitar as avenidas marginais. Porém, para aquele que reside mais
distante, essa vantagem passa a inexistir, porque tem que se percorrer quase o mesmo
trecho de rodovia que antes nos deslocamentos diários.
Do lado interno do traçado, os ganhos são nulos ou até negativos. Para os residentes em
até 2,5 km do acesso mais próximo, não se vê vantagens. Parece que percorrer a rodovia
mais próxima no sentido oposto para acessar o Rodoanel e a partir daí desenvolver rotas
alternativas não é percebido como ganho de acessibilidade. Os moradores da faixa de
distância entre 2,5 e 5 km enfrentam redução dos preços, não havendo benefício líquido
de acessibilidade e, provavelmente, ficando apenas com os efeitos negativos. Isto porque
é preciso circular por algum dos trechos das rodovias interligadas pelo Rodoanel para se
atingir o CBD.
Devemos ressaltar que pela forma como se deram os efeitos, o raio de alcance do
Rodoanel Oeste é baixo em termos do preço da terra. Isto é, os benefícios de
acessibilidade se estendem até 2,5 km das saídas e não mais do que isso. Ademais, há o
efeito de redução de preços das terras residenciais do lado interno do traçado. Isto tudo
indica que o Rodoanel Oeste não tem força suficiente para induzir espraiamento urbano
para além de suas pistas. O máximo que pode acontecer é adensamento das áreas já
destinadas ao uso residencial nas proximidades. Não que isso seja “pouca coisa”, mas é
muito menos polêmico e difícil de lidar do ponto de vista urbanístico.
É muito complicado, do ponto de vista fiscal, acessar esses benefícios para fins de
financiamento das obras restantes do Rodoanel. Como o efeito se dá sobre o preço da
terra, o Estado de São Paulo não possui competência tributária para captá-lo. São as
prefeituras dos municípios de Barueri, Carapicuíba, Osasco, Cotia e Embu que por meio
do Imposto Territorial e Predial Urbano (IPTU) poderiam acessar a valorização induzida
pelo Trecho Oeste. O município de São Paulo, neste caso, sofreria uma redução da
arrecadação do IPTU na região oeste, pois grande parte das localidades que sofreram
queda de preço lá se encontra.
Neste sentido, a melhor forma de capturar os ganhos é a imposição de pedágio sobre os
veículos individuais de transporte para rodarem pelo Trecho Oeste. Particularmente, neste
caso atinge-se exatamente aquele que se beneficia do Rodoanel como rota alternativa de
suas comutações.
No longo prazo esse tipo de equilíbrio do tipo “demanda quebrada” tende a desaparecer,
na medida em que o mercado imobiliário se ajusta em termos de adensamento e
ocupação. A valorização das terras próximas aos acessos do Rodoanel Oeste aponta para
uso mais intensivo do solo para compensar a elevação do preço ou uma redução do ritmo
de lançamentos. Já a redução dos preços do lado interno ao traçado mostra potencial para
aumento do uso residencial face à redução dos preços da terra. Ao longo do tempo,
portanto, o equilíbrio se dará através do reposicionamento do gradiente de preços à sua
inclinação “pré-existência do Rodoanel Oeste” (pressupondo que as preferências e o nível
médio de renda não se alterem).
Todavia, o ajuste de longo prazo descrito pode não seguir exatamente essa trajetória,
dado que a conclusão de todo o circuito do Rodoanel Metropolitano pode trazer outros
benefícios e custos que não fazem hoje parte das decisões cotidianas de comutação e
moradia.
No documento
Migração de empresas, pessoas e preço da terra na RMSP: impactos líquidos do Rodoanel
(páginas 61-70)