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3.2 Pengi: uma implementação da teoria da atividade

3.2.1 A RM do tipo[Y] em Pengi

Conforme foi possível averiguar na seção anterior, a RM não se fez necessária para a agência em Pengi. Poder-se-ia assim supor que o objetivo número 1 desta tese – que os autores antirrepresentacionalistas advogam de fato programas afinal representacionalistas – sofre de fato uma forte objeção171. Contudo, um olhar mais

criterioso na arquitetura da atividade do jogo, mostrará que este modelo também está

168 Agre e Chapman, 270.

169 « Currently, Pengi has a network of several hundred gates and a VRP with about thirty operators. »;

VRP – acrônimo do termo inglês Virtual Routines Processor, traduzido nesta tese para PVR, processador virtual de rotinas.

170 Agre e Chapman, “Pengi”, 1987, 272.

fundamentado em RM, conforme a Figura 11 – Modelo da teoria da atividade em Pengi, logo abaixo.

Figura 11 – Modelo da teoria da atividade em Pengi

A partir desta figura, nota-se que o componente PVR tem como uma de suas atribuições, o armazenamento das cópias das circunstâncias vivenciadas pelos sistemas periféricos (ET2). Como resultado deste processo (ET3), o PVR envia as aspectos que serão tratados pela rede combinacional (ET4).

Por conseguinte, segundo a noção de RM definida nesta tese, tem-se o seguinte: I. RM possuem intencionalidade, são tipicamente direcionadas para

objetos;

II. RM são encenações do mundo na mente de um agente; III. RM fazem parte de estados cognitivos internos.172

À vista disto, a tese aponta duas objeções à posição antirrepresentacionalista em

Pengi:

1. As utilizações imediatas dos aspectos pela rede combinacional para as situações já ativadas pela agência caracterizam-se como estados cognitivos internos do sistema (III). Logo, os aspectos são RM.173

2. As cópias das circunstâncias mantidas pelo componente PVR caracterizam-se como representações, encenações e reproduções (II) das situações vividas pelos sistemas periféricos. Portanto, as cópias das circunstâncias, ou esboços 2D são RM.

Em relação à objeção 1, os aspetos já tratados estarão automaticamente disponíveis na rede combinacional (ET4) para os sistemas periféricos. Contudo, este automatismo é sempre precedido por uma interação (ET2) e respectivo processamento (ET3) de modo a estar disponível para a agência. Dito de outra forma, o imediatismo da ação somente é possível porque houve um processamento anterior (ET3) da situação, no qual o aspecto, já processado e acessível na rede (ET4), é o estado cognitivo interno do sistema (III).

Com relação a objeção 2, o fato do componente PVR armazenar cópias das circunstâncias vividas pelos agentes (ET2), já constitui um forte argumento a favor do uso de RM, conforme (II). Afinal, uma cópia de uma situação na qual o pinguim foge de uma abelha, nada mais é do que uma representação de um fato que já ocorreu. Por isso, operar sobre a cópia é ainda representar e encenar uma realidade externa (ET2) no PVR. Desta forma, pode-se dizer que a atividade em Pengi é síncrona, o que significa que existe um fluxo de operações necessárias antes da atuação das unidades lógicas. É impossível ao pinguim fugir da abelha, antes do registro do aspecto e da operação sobre a cópia da circunstância – que é uma imagem – referente ao aspecto.

A ação é, em geral, sempre resultado do processamento prévio das circunstâncias. Desse modo, Chapman e Agre constroem uma teoria que realmente contorna a complexidade de representação de modelos e planos na mente dos agentes –

173 Esta objeção poderia levantar a hipótese de a emergência no conexionismo também ser caracterizado

como estado cognitivo interno da mente. Contudo, no Pengi é explicito que o estado cognitivo é uma combinação booleana, ou seja, sabe–se a natureza do estado. O mesmo não se pode dizer da emergência no cognitivismo. Logo, que a emergência é um estado cognitivo parece não haver dúvida, não se pode dizer o mesmo sobre sua natureza.

Planejamento «P» –, permitindo que a atuação possa ser realizada de forma imediata pela agência – planejamento «p». Contudo, este imediatismo somente é possível após o processamento das circunstâncias, ou em outras palavras, de RM referentes aos aspetos. À vista disto, a questão que se apresenta sobre a cognição neste modelo é a seguinte: O que tem mais relevância na cognição em Pengi – o registrar e ativar os aspectos das circunstâncias ou o ser capaz de processá-las? Não teriam os autores descoberto que o ponto nevrálgico da cognição não é possuir modelos complexos de mundo ou atuar via aspectos, mas sim processar as circunstâncias enquanto RM?

Posto isto, nota-se também uma semelhança entre a estrutura cognitiva presente em Pengi com aquela encontrada para a solução do experimento do bastão: o conexionismo implementacional174. Voltando ao contexto do experimento, Hayy

possuía RM das experiências amargas vividas pela disputa das frutas com os outros animais da ilha. Desprovido de garras, chifres e outras características que lhe permitissem conquistar o almejado alimento, resolve, depois de um certo tempo de reflexão, construir um bastão – o que lhe permitiu contornar o problema.

Este exemplo quando comparado a um evento rotineiro em Pengi, como acompanhar o trajeto de um bloco chutado175, revela que ambas as dinâmicas são

semelhantes. Pois, para acompanhar o trajeto do bloco que o pinguim acabou de chutar, impressa no aspecto the-block-that-the-block-I-just-kicked-will-colide-with176, será

necessário que o componente PVR processe através da cópia da imagem da situação vivenciada, ou seja, da RM, os pontos entre o bloco chutado e o seu trajeto até o próximo ponto fixo, para que então a saída – o resultado do processamento – seja tratado na rede combinacional.

174 Cfr. 2.2 O experimento do bastão, 45.

175 Cfr. Figura 12 – PVR processando o aspecto the-block-that-the-block-I-just-kicked-will-collide-with,

84.

Figura 12 – PVR processando o aspecto the-block-that-the-block-I-just-kicked-will-collide-with Deste modo, tanto planejamentos «P» – construção do bastão defensivo – quanto planejamentos «p» – chutar blocos de gelo – dependerão do processamento de RM para serem executados pelos agentes.

Assim, com base na teoria da atividade em Pengi, a tese definirá como estrutura para as RM do tipo [5], ou indexical implementacional177, as seguintes ideias:

I. Os agentes atuam com base em aspectos de circunstâncias e não possuem procedimentos, planos ou teorias;

II. Cognição é o registro e a ativação dos aspectos das circunstâncias provenientes do ambiente pelo sistema;

III. Os aspectos são registrados no processador de rotinas visuais (PRV), através de rotinas visuais operantes entre os sistemas periféricos e PRV; IV. As atividades são exercidas de forma distribuída, parte pelo sistema

central e parte pelos sistemas periféricos;

V. Os aspectos são representações indexicais e funcionais, pois dependem das circunstâncias vividas e dos propósitos da agência, respectivamente.

177 Esta tese sempre usará o termo «implementacional» para designar as implementações particulares das

RM do tipo [Y] propostas pelos autores antirrepresentacionalistas. Logo, uma RM do tipo [Y] implementacional é uma variante particular dos principais programas cognitivistas que apresentam RM em sua estrutura. Neste caso específico, como a estrutura em Pengi apresenta muitos dos princípios indexicais, este tipo de RM será designado como RM indexical implementacional.

VI. Por apresentar processamento de imagem e manter estados cognitivos no sistema, o tipo indexical implementacional se caracteriza como um tipo de RM.

Por fim, definida as condições de RM do tipo [5] ou indexical implementacional, resta verificar se este tipo atende as condições do experimento do bastão.