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Roberto Schwarz

No documento O circuito da crítica machadiana (páginas 51-54)

2 REVENDO MACHADO DE ASSIS

2.2 CRÍTICAS PÓSTUMAS A MACHADO DE ASSIS

2.2.13 Roberto Schwarz

É lugar-comum nos estudos críticos sobre Machado de Assis afirmar que, com a publicação de Ao vencedor as batatas (1977), de Roberto Schwarz, cria-se novo ponto de ruptura nos estudos críticos literários no Brasil.

Schwarz (1977), ao observar a pirâmide social brasileira do Segundo Reinado constata que a sociedade era composta por latifundiários, homens livres e escravos, estrutura que se contrapõe ao pensamento do liberalismo europeu.

Para as artes, Nabuco expressa um sentimento comparável quando protesta contra o assunto escravidão no teatro de Alencar: “Se isso ofende o estrangeiro, como não humilha o brasileiro!” (In: Schwarz, 1977, p. 13).

Pautado em Joaquim Nabuco, em Sérgio Buarque de Holanda e em jornais da época, que aludiam ao paradoxo da escravidão por oposição ao liberalismo, Schwarz (1977) infere que os sistemas políticos da Europa e do Brasil são antagônicos, por isso se dava a impropriedade na importação das ideais liberais em um contexto em que elas não têm o mesmo sentido da origem.

A partir dessa perspectiva teórica da disparidade entre o liberalismo europeu e a sociedade escravagista brasileira, no ensaio seguinte, Schwarz (1977) realiza a análise do romance Senhora, de José de Alencar, fazendo alusão às contradições da ficção do escritor.

O autor afirma que:

[...] Onde Alencar alinhara pelo Realismo, pelas questões do individualismo e do dinheiro, vivas e críticas ainda em nossos dias, Machado se filiava à estreiteza apologética da Reação europeia, de fundo católico, e insistia na santidade das

famílias e na dignidade da pessoa (por oposição ao seu direito). (SCHWARZ, 1977,

p. 63).

Schwarz (1977) conclui a obra concentrando-se sobre a prática do favor, relacionada nos primeiros romances de Machado de Assis: A mão e a luva, Helena e Iaiá Garcia.

Em A mão e a luva mostra a presença do paternalismo entre a madrinha rica e Guiomar; em Helena apresenta como Machado de Assis aperfeiçoa o paternalismo e de que modo a protagonista, embasada pelo sentimento cristão mostra-se dignamente diante da temporalidade dos bens materiais. Apesar da alternância entre a família pobre e a rica, mantêm-se os valores familiares. Em Iaiá Garcia, através da descrença, a protagonista se protege da ilusão do paternalismo e preserva a dignidade humana.

Realizando um contraponto com Um lírico no auge do capitalismo, Roberto Schwarz (2000) escreve Um mestre na periferia do capitalismo, obra na qual encontra no romance machadiano da segunda fase um escritor que compunha uma expressão da sociedade real, pela ousadia de sua forma literária, onde lucidez social, insolência e despistamento são definidos, na dominação de classe no Brasil, por estratégias artísticas e obscurecimento dos fatos.

Schwarz (2000) observa que os artifícios e a vontade de chamar atenção dominam o começo das Memórias Póstumas de Brás Cubas, observando também que Brás Cubas é um narrador que invade a cena, as intromissões representando o recurso machadiano mais proeminente.

Segundo Schwarz (2000, p. 14), a crítica tratou essas intromissões como traço psicológico machadiano, deficiência narrativa, superioridade de espírito, empréstimo inglês, metalinguagem, porém do ponto de vista de Schwarz, neste estudo, ele considera esses aspectos como “regra de composição da narrativa”, e como estilização de uma propriedade inerente à classe dominante brasileira, sendo esse narrador um representante da desfaçatez dessa classe.

Quanto ao princípio formal da obra de Machado de Assis, segundo Schwarz (1977) convergem a volubilidade do narrador e o desrespeito à norma, sendo que a volubilidade é o princípio formal do livro, dissolvido na variação dos pontos de vista.

Quanto à matriz prática, Schwarz (2000, p. 25) busca um referente para as Memórias póstumas e, não encontrando no campo da realidade, situa a obra num “espaço imaginário estranho ao balizamento nacional”. O estudioso vai fundamentando a pesquisa “na volubilidade do narrador e na série dos abusos” que são reiterados por Brás Cubas na trajetória do romance.

Ao dialogar com Antonio Candido, através da Dialética da malandragem, deduz que a “redução estrutural” ocorre por via das circunstâncias históricas que teriam sido impostas à camada dominante brasileira.

Quanto ao capítulo a “implicação da prosa”, Schwarz (2000, p. 33), declara que a volubilidade do narrador que pauta toda a narrativa, apresenta três justificativas: um “gosto pela novidade”; “abandono seco do ‘modo-de-ser prévio’”; e “inferiorização do leitor” que é incapaz de se ater à realidade e está pronto a fugir para o imaginário - lugar onde Schwarz (2000, p. 25) situa a narrativa de Machado de Assis.

No capítulo sobre a Sorte dos pobres, Schwarz (2000, p. 55) elenca três pontos para explicar essas relações de poder postuladas na narrativa: a) a questão de classe, pois, no que se refere a Eugênia, o defeito físico, seria apenas um de álibi; b) a dominação de classe, a

partir da qual os trunfos humanos dos inferiores são vistos; c) a conveniência momentânea de uma personagem volúvel, que é Brás Cubas, sempre mudando de opinião e usando defesas para minimizar suas atitudes diante do outro (mas, da perspectiva de Schwarz (2000), deixando entrever as relações entre as classes sociais).

Em se tratando dos ricos, Schwarz (2000) constata que o narrador é especialista em observar e inventar sequências de formas modernas que atendam aos interesses locais, e o narrador ironiza a pretensão de adiantamento cultural. Através do recurso da ironia, Machado teria inserido as formas da conduta humana, exploradas através do aspecto risível.

Schwarz é da linhagem de Antonio Candido, como ele mesmo afirma no prefácio e é visível que inova nos estudos machadianos, adota uma visão lukacsiana do romance, apresentando ponto de vista marxista e realizando uma análise da “diversidade estilística” da prosa.

No documento O circuito da crítica machadiana (páginas 51-54)

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