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Rose é uma menina de 14 anos, mora no Coque desde o seu nascimento Diz ter a

pele branca e religiosa praticante do protestantismo. Ela é estudante do 9º ano do Ensino Fundamental da Escola Joaquim Nabuco.

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Rose é uma menina de lembranças marcadas pela violência. Quando iniciamos nossa conversa, perguntamos sobre as suas lembranças e ela foi enfática relatando um assassinato ocorrido dentro da sua casa: “[...] mataram o namorado da minha tia dentro

de casa, isso não dá pra esquecer não!”

Além dessa morte, Rose presenciou o assassinato de outro rapaz na rua da sua casa, na época ela tinha aproximadamente dez anos.

A estudante Rose tem dificuldades em diferenciar os fatos positivos e negativos ocorridos na favela do Coque, ela relata que as lembranças negativas são as mortes e as positivas são as prisões dos seus amigos, pois, segundo Rose, a prisão evitou as mortes dos mesmos. “[...] a lembrança boa é que os meninos de lá, que viviam tudo com a

gente, agora tá tudo preso”.

A prisão para alguns jovens, não é vista como algo negativo, destrutivo para o futuro deles, antes disso, é um estágio para aqueles jovens que decidiram enveredar pelo caminho da criminalidade.

A menina Rose mora com seus pais, cinco irmãos e uma prima numa casa simples, mas aconchegante, legal, como ela afirma: “[...] só não é mais legal, porque é

um lugar violento e porque em frente de casa é um nojeira”.

As ruas do Coque, segundo Rose, são envoltas de violência e sujeira, o lixo é reflexo da “falta de cuidado e educação” de alguns moradores.

Rose mora em uma parte do Coque que é conhecido como Vila, ela diz que o Coque para ela é ruim e bom. Ela explica: “apesar de ter muitos fatos violentos, eu gosto

do Coque! E, nunca pensei em sair de lá, mas, tenho vontade de combater a violência”.

A respeito da violência, ela expôs sua opinião trazendo em suas falas os dois tipos de violência, a verbal e a física. Com ênfase sobre a violência verbal disse: “O

desrespeito pra mim é um tipo de violência que eu não suporto”.

Durante a entrevista observamos que Rose não tinha a mínima dificuldade em relatar os fatos violentos ocorridos em sua configuração social, contudo, mostrava vários entraves para falar de si, da sua infância, das questões mais íntimas.

O discurso acerca da violência aparece como algo “familiar”, até mesmo a maneira como Rose fica sabendo dos fatos violentos da favela, tem um tom corriqueiro. Ela relata que fica sabendo da maior parte dos crimes da favela através das “fofoqueiras da rua”.

Os comentários sobre as vidas alheias circulam rapidamente por toda vizinhança, os fatos criminosos dos jovens da favela por muitas vezes, servem de entretenimento para algumas senhoras do entorno que nas horas vagas do dia, se agrupam de fronte às suas casas para comentar as “ocorrências da favela”.

Rose diz: “[...] as fofoqueiras da rua ficam lá sentadas falando das vidas dos

outros, aí lá em casa tem uma cadeira no terraço e eu fico lá lavando os pratos, arrumando a casa, aí pronto fico escutando tudinho”.

Os atos criminosos que ocorrem nesta favela são observados pelos moradores com uma “falsa banalização” que é estratificada através de algumas falas e comportamentos dos próprios moradores. “Lá ninguém corre da bala, mas, corre pra

cima da bala”.

Parecer conformado não é estar conformado, muitos moradores cultivam o

medo, a indignação, a vontade de mudar, uma mistura de sentimentos em relação ao fenômeno da violência.

A configuração da favela do Coque esta emaranhada com os problemas sociais que, em determinados momentos, são as causas e, em outros, consequências das atitudes delinquentes de uma parcela dos jovens que lá vivem.

Rose ao mesmo tempo em que identifica o Coque como violento demonstra, em alguns momentos da entrevista, o seu grande envolvimento com esse lugar. O lugar onde ela nasceu e até hoje vive.

Ela discorda da maneira não apropriada das pessoas retratarem a favela do Coque. “falam que a favela do Coque é pior do que todas as outras favelas, mas falam

sem conhecer”.

Neste momento da entrevista, Rose se entusiasmou em relatar os pontos positivos de ser morador da favela do Coque, diz ela: “[...] no Coque tem o posto de saúde, lá tem

uma pracinha, tem escola, tem policiamento, tem policiais na praça”.

Perguntamos se ela gostava de morar no Coque, Rose foi enfática: “Gosto. Mas,

se tivesse menos violência seria melhor”.

Rose é uma menina religiosa e frequenta a igreja evangélica. Em determinados momentos das nossas conversas, ela deixou claro que acredita no amor entre as pessoas

e, nesse sentido, só a compaixão pode modificar o estado de violência que permeia o Coque.

A religião é utilizada como um instrumento de controle das emoções, muitos buscam curar suas dores das inúmeras perdas e as ausências. Alguns moradores do Coque são colecionadores de perdas. São muitos os jovens mortos e são muitas as mães que choram as ausências.

Buscamos entender como Rose percebia a educação na sua história de vida. Ela relata que sua mãe a educou juntamente com seus irmãos.

Sua mãe não aceitava os xingamentos entre irmãos. Nesse sentido, a mesma evitava essas agressões entre os mesmos, utilizando uma colher de pau para bater na boca daqueles que insistissem em falar agressivamente. “[...] quando ela escutava a

gente falando alguma coisa de xingamento, aí agente apanhava na boca com essa colher”.

Rose afirma que sua mãe ao utilizar a colher de pau para reprimir as atitudes violentas, buscava educar os seus filhos. “toda vez que eu olho pra aquela colher, eu

lembro que foi essa colher que me ensinou a não ser tão violenta verbalmente”.

A educação é vista por Rose a partir dos comportamentos corriqueiros dos indivíduos e a grande responsável pelo desenvolvimento da educação, é a família.

Questionamos se Rose tinha informações sobre a quantidade de escolas localizadas nas proximidades do Coque. Ela disse: “São muitas. Aqui na Comunidade

tem Joaquim Nabuco, Monsenhor, Municipal do Coque, Costa Porto, Josué de Castro e fora essas outras de cursos”.

Ela explica que essas “escolas de curso” funcionam da seguinte maneira, algumas pessoas que tem o ensino médio completo, utilizam partes da sua casa para ensinar as pessoas com dificuldades na aprendizagem e também aquelas mais carentes economicamente. “[...] eles selecionam umas vinte pessoas pra passar o ano ali

estudando”. As pessoas não pagam por essas aulas.

Indagamos sobre o fato de nas proximidades do Coque ter várias escolas e Rose ter escolhido estudar na Escola Joaquim Nabuco, haja vista não ser no entorno da sua residência.

Ela explicou que a Escola Costa Porto é a mais próxima à sua casa, porém, nessa escola tem muitos casos de violência. Segundo a estudante, essa escola é frequentada por pessoas integrantes dos grupos rivais existentes na favela do Coque.

Rose afirma que esses grupos rivais são formados por alguns jovens envolvidos com a delinquência, moradores da Vila e da Realeza, são pessoas divididas por ruas.

As ruas e becos da favela do Coque são divididas e sitiadas por chefes das gangues. Esses têm o “poder” de decisão sobre quem pode transitar nas ruas.

Os caminhos de muitos jovens são restritos, pois o medo de serem confundidos com os “olheiros rivais23” faz desses meninos e meninas, “prisioneiros do medo”.

Contudo, Rose lembra que na escola em que ela estuda também tem fatos violentos, agressões verbais e físicas, utilização de drogas, entre outros.

Prevalecem, no entanto, os pontos positivos da escola, segundo a mesma: “[...]

na escola, os professores ensinam a gente a ser mais educados, a parar mais com o preconceito e saber que todo mundo é igual [...] a ser alguém na vida”. A educação para

Rose é resumida em uma só palavra: Respeito.

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