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Síntese da Campanha

A campanha da Etiópia de 1541-154359, surgiu de uma forma inesperada. Em mais

um périplo pelo Mar Vermelho, a fim de conquistar pontos geoestratégicos para negar o acesso ao oceano Indico aos turcos Otomanos, houve necessidade de aportar em Máçua, na Abissínia. Aqui, um emissário do Preste João estabeleceu contato com os portugueses. O seu objetivo foi de pedir auxílio na luta contra os muçulmanos e turcos, que pretendiam erradicar o reino cristão daquela região. D. Estevão da Gama, o então governador do Estado da Índia, decidiu aceitar o pedido, pois representava ser um “grande serviço a Deus e ao rei de Ethiopia, e cumprir os desejos d´el Rei de Portugal”60. Para tal desígnio, escolhe

o seu irmão mais novo, D. Cristóvão da Gama como comandante da força. Concede-lhe um contingente de “quatrocentos homens, que eram os melhores da armada, e se foram oferecer; e lhe deu oito peças de artilharia, cem mosquetes, e muitas munições; e além das armas que os soldados levavam lhe mandou dar outras tantas de sobrecellentes”61. Após

uma viagem da Índia até à Abissínia, em 9 de Julho 1541, e após as devidas despedidas, a força inicia o deslocamento para o interior deste território. Este é o meio de transporte que vai predominar em toda a campanha, o pedestre. A partir deste momento, estão condicionados ao que o território tem para oferecer e à carga que transporta. Inicia-se o deslocamento, indo a força portuguesa e duzentos abexins [naturais], num território com um terreno e condições meteorológicas agrestes. Caminharam durante seis dias até chegarem a Debarwa62. Uma vez que o inverno se iniciava, decidiu esperar que este

acabasse por duas razões. Uma delas, é que o inverno é rigoroso e a outra justificação é a de que aproveitou para treinar a sua força [articulação e composição desta; treino operacional, treino de tarefas críticas (…)] e obter informações sobre a região e o adversário. Entretanto, determinou juntar a rainha Sabla Vangel ao arraial. Uma vez terminado o inverno, em 15 de Dezembro, inicia novamente a marcha durante oito dias até Salava, onde descansaram e festejaram o Natal. Depois de comemorado, em 25 de       

59 Ver Anexo A: A Campanha da Etiópia. 60 (Castanhoso, 1898, p. XXX).

61 (Castanhoso, 1898, p. XXX).

Dezembro de 1541, reiniciam a marcha durante mais cinco dias até alcançarem Agame. Aproveitou para fazer descansar a força e, sabendo de uma força adversária ali perto, decidiu assaltar a sua posição em Amba Sanayt. Neste assalto, aproveitou para sistematizar os procedimentos que haviam treinado. Uma vez conquistada a serra [Amba Sanayt], aproveitou para descansar e permanecer naquele local até ao final de Fevereiro. Retemperadas as forças, retoma a marcha mas logo assentou o arraial, ao saber da proximidade do Rei de Zeila.63 Neste momento encontra-se Sahart64, onde por duas

ocasiões vão defrontar os muçulmanos. Nestas batalhas, os portugueses e os duzentos abexins vão alcançar o sucesso perante os muçulmanos [os naturais e os turcos que apoiavam estes.]. Apesar de um efetivo muito maior e de ter nas suas fileiras os aguerridos combatentes turcos, do outro lado, a forma de combater organizada, o apoio da artilharia móvel (entre outros aspetos), revelou que o confronto podia ser equilibrado. Findo estes dois combates, D. Cristóvão leva a força para a serra de Ofla, onde passou o inverno de 1542. Concluído este, novo confronto ocorreu. Durante todo este interregno, Ahmad, tendo ficado furioso e desiludo com o que anteriormente acontecera, pediu “socorro ao báxa de Zabid, que lhe mandou novecentos Turcos espingardeiros, e dez bombardas”65. Em 28 de

Agosto de 1542, neste novo confronto, o potencial de combate de cada uma das forças era teoricamente desequilibrado. E foi isso, que na prática aconteceu no terreno. Com o reforço do Ahmad e os portugueses sem qualquer tipo de abastecimento [recursos humanos ou materiais], o resultado do combate foi uma estrondosa derrota portuguesa [e abexin]. Originou a fuga de D. Cristóvão, devido a ter sido gravemente ferido, tendo sido capturado pelos muçulmanos e levado a Ahmad, onde o próprio acabou por lhe cortar a cabeça. Os restantes, de forma desorganizada fugiram do campo de batalha.

Terminada a batalha, e com a morte de D. Cristóvão, Ahmad pensou que os portugueses faziam parte do passado e que seria uma questão de tempo até eliminar os restantes abexins. Contudo, após um período de alguma acalmia, que serviu para recuperar e reorganizar, em ”seis de Fevereiro de 1543, com oito mil homens de pee frecheyros e adargueyros, e quinhentos de cavallo, e todos mui boa gente e luzida, e cento e vinte Portugueses” estavam pronto para a vingança. Sob o comando do Preste João [imperador Cláudio II], ofereceram novo combate a Ahmad, que não esperava tal reação. Uma vez, ambos os dispositivos organizados no terreno, inicia-se a batalha. Uma curiosidade desta       

63 Rei de Zeila, ou o comandante das forças de Adal,; ou o granhe, são a mesma pessoa, o Ahmad bin

Ibrahim el-Ghazi (Ahmad Gran).

64 Sahart ou “campos de Iarte”, significam o mesmo. 65 (Castanhoso, 1898, p. XXXII) .

batalha é a presença de portugueses a cavalo. Esta batalha vai ter um resultado bastante relevante para o futuro da região. Nesta, Ahmad é morto; originando a debandada da sua força do terreno. O mais importante a reter, é que com esta morte, os muçulmanos nunca mais voltaram a ter um líder unanimemente aceite e capaz de importunar o reino cristão do Preste João. Com a missão cumprida após mais de dois anos, era tempo de os portugueses regressarem a casa, no entanto, tal não se sucedeu. Permaneceram na Etiópia e não mais voltaram a servir em nome do rei de Portugal.

 

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