• Nenhum resultado encontrado

1. INTRODUÇÃO

1.4. Métodos de Síntese do Biodiesel

1.4.1. Síntese do Biodiesel em Meio Homogêneo

Industrialmente, o processo tradicional de produção do biodiesel é baseado na catálise alcalina em meio homogêneo, utilizando KOH ou NaOH como coadjuvante de catálise e variando-se o tipo de óleo vegetal de acordo com a região (Carvalho et al., 2003). Estas bases de Brönsted-Lowry produzem o íon alcóxido in situ, que é responsável pelo ataque nucleofílico à carbonila do acilglicerol. As quantidades usualmente empregadas em processos industriais variam de 0,4 % (Kucek, 2005;

Domingos et al., 2007) a 1,0 % (Cordeiro, 2003).

A Figura 6 mostra o mecanismo de transesterificação em meio alcalino de um triacilglicerol, em que uma base B reage com o álcool utilizado como agente de transesterificação, produzindo o ácido conjugado BH+ e um alcóxido nucleofílo que ataca o carbono da carbonila do triacilglicerol. O intermediário tetraédrico gerado elimina uma molécula de éster e também outro íon alcóxido, que se combina com o ácido BH+, produzindo um diacilglicerol e regenerando a base B. O processo completo envolve uma seqüência de três reações sucessivas e reversíveis, em que di- e monoglicerídeos são formados como intermediários (Figura 7) (Schuchardt et al., 1998; Zagonel et al., 2000; Kucek at al., 2007). A composição do sistema no equilíbrio da alcoólise pode ser influenciada por diversos fatores, tais como a pureza dos reagentes, a razão molar álcool/óleo e a temperatura de reação, que atuam isoladamente ou em conjunto. O tipo de catalisador também influi na velocidade e no

ajuste do equilíbrio da reação (Schuchardt et al. 1998; Fangrui et al., 1999;

Freedman et al., 1986).

Alternativamente, pode-se adicionar diretamente os íons alcóxidos à reação, mediante a utilização de alcóxidos metálicos, como metóxido, etóxido, propóxido e butóxido de sódio. Estas reações são muito mais rápidas que as realizadas por catálise ácida (Siler-Marinkovi e Tomasevic, 1998). Por outro lado, a metanólise conduzida com carbonatos de sódio e potássio, em frações de 2 a 3 % em base molar, também proporcionam bons rendimentos de reação (Schuchardt et al., 1998;

Bondioli et al., 1995; Demirbas, 2003).

O

Figura 6. Mecanismo de transesterificação em meio alcalino (Schuchardt et al., 1998).

Triacilglicerol + ROH Diacilglicerol + R1COOR Diacilglicerol + ROH Monoacilglicerol + R1COOR Monoacilglicerol + ROH Glicerol + R1COOR

Figura 7. Etapas reacionais durante a transesterificação de óleos vegetais (triacilgliceróis), onde R representa o grupamento alquil do acilglicerol.

A presença de ácidos graxos livres e água na matéria-prima lipídica possui efeito negativo quando a alcoólise é conduzida com um catalisador alcalino (Zhang et al., 2003). A presença de água no meio de reação provoca a hidrólise de monoésteres alquilícos formados na transesterificação e os ácidos carboxílicos, frutos da hidrólise ou presentes no próprio óleo vegetal, reagem com o catalisador alcalino formando sais de ácidos graxos (sabões) que diminuem o rendimento da reação em monoésteres alquilícos (Canacki e Gerpen,1999).

Ácidos de Brönsted-Lowry podem ser utilizados como catalisadores da alcoólise, preferencialmente os ácidos sulfônico e sulfúrico. Na reação de transesterificação de óleos vegetais catalisada por ácidos (Figura 8), a protonação do grupo carbonila do éster leva à formação do carbocátion II que, posteriormente, sofre o ataque nucleofílico do álcool, produzindo o intermediário tetraédrico III, que por sua vez, elimina a glicerina para a formação do éster IV e regenera o catalisador H+, podendo ocorrer a formação de ácido carboxílico através da reação do carbocátion II com a água presente no meio reacional. Devido a isto, a catálise ácida deve ser realizada na ausência de água, para evitar a formação competitiva entre ácidos carboxílicos e monoésteres alquílicos (Schuchardt et al, 1998).

Os catalisadores ácidos fornecem alto rendimento em monoésteres alquílicos, mas, a reação é lenta, exige altas temperaturas, elevadas razões molares e mais de 2 h para conversão completa. Por exemplo, Canacki e Gerpen (1999) obtiveram rendimentos da ordem de 98,4 % em ésteres etílicos utilizando razão molar álcool:óleo de 30:1 e 3 % em massa de ácido sulfúrico como catalisador. A mistura de reação permaneceu em refluxo a 60°C por 48 h.

R1

H R1 = Radical alquila ligado a carbonila.

R = Radical alquila do álcool.

I II

III IV

Figura 8. Mecanismo de transesterificação em meio ácido (Schuchardt et al., 1998).

Muito embora a condução do processo para produção do biodiesel em meio ácido exija condições mais enérgicas e maiores excessos de álcool em relação ao processo conduzido em meio alcalino, para óleos que possuam teores de ácidos graxos livres superiores a 1 % (e. g. os óleos utilizados em frituras), o emprego de ácidos de Brönsted-Lowry como catalisadores pode trazer vantagens (Canacki e Gerpen, 1999). Em função da elevada quantidade de ácidos graxos livres, estes óleos não são transformados em biodiesel via catálise alcalina porque, estando livres, reagem rapidamente com o catalisador, produzindo sabões que inibem a separação entre o éster e a glicerina nas etapas de lavagem com água. Por outro lado, os resíduos de catalisadores ácidos podem trazer problemas para o motor, atacando as partes metálicas e, por isso, devem ser sempre eliminados completamente.

A Figura 9 mostra o mecanismo de esterificação de ácidos graxos, onde R e R1

representam, respectivamente, as cadeias carbônicas hidrofóbicas do ácido graxo e do álcool (Smith e March, 2007). O mecanismo mostra que a protonação do grupo carbonila do ácido que leva à formação do carbocátion II, que posteriormente sofre um ataque nucleofílico do álcool, produzindo o intermediário tetraédrico III que, por sua vez, elimina água e leva à formação do éster IV e à regeneração do catalisador H+.

Figura 9. Mecanismo de esterificação de ácidos graxos (Smith e March, 2007).

Estudos cinéticos da reação de esterificação metílica de ácidos graxos, utilizando o ácido sulfúrico como catalisador, mostraram que o estado de equilíbrio do sistema pode ser atingido em menos de 1 h de reação, variando-se adequadamente as condições experimentais (Pisarello et al., 2007). Sendo assim, a catálise ácida em meio homogêneo poderia ser utilizada como método de pré-tratamento de óleos de elevada acidez, em que os ácidos graxos livres seriam transformados em monoésteres para que, em uma segunda etapa, os triacilgliceróis

fossem convertidos em monoésteres por catálise alcalina tradicional também em meio homogêneo.

Outro tratamento que poderia ser dispensado à matérias-primas de elevada acidez é a hidroesterificação. Neste processo, todo o triacilglicerol é convertido em ácidos graxos e o material assim obtido é submetido a um processo de esterificação via catálise ácida homogênea ou heterogênea (vide abaixo). Com isso, é possível obter altos rendimentos em monoésteres totalmente livres de glicerina, já que este componente é removido na etapa preliminar de hidrólise (Lima et al., 2008).

Devido aos diversos fatores que influenciam na síntese do biodiesel, vários pesquisadores têm desenvolvido planejamentos fatoriais (PF) com o intuito de verificar as melhores condições de síntese dos monoésteres alquilícos. A Tabela 3 apresenta uma compilação de diversos resultados obtidos com o auxílio desta técnica analítica, em que as variáveis consideradas mais relevantes para a maior parte destes estudos foram a razão molar álcool:óleo (RM), a quantidade percentual de catalisador (C) e a temperatura (T). Em alguns trabalhos, a variável tempo (t) também foi estudada.

Os resultados apresentados na Tabela 3 revelam ainda que a melhor condição de síntese é influenciada pelo tipo de matéria-prima e pelo álcool escolhido como agente de transesterificação (metanol ou etanol). A base de Brönsted-Lowry escolhida para geração do catalisador alcóxido in situ também tem influência, considerando que as quantidades de base são usualmente calculadas em função da massa de óleo utilizado no processo e que a quantidade de íons hidróxido fornecida por um mol de hidróxido de potássio (KOH) é diferente da quantidade fornecida por um mol de hidróxido de sódio (NaOH) (Vicente et al., 2004).

Tabela 3. Planejamentos fatoriais utilizados para síntese de biodiesel.

Matérias-primas Planejamento fatorial (PF) Condição ótima R Óleo Álcool C Tipo RM C (%) T (°C) t (min) Legenda: EtOH = etanol, MeOH = metanol, C = catalisador, RM = razão molar álcool:óleo, T = temperatura, t = tempo, R = rendimento em monoésteres alquilícos, Ref. = Referência, OV = óleo de soja refinado, OF = óleo de fritura, OD = óleo de soja degomado, OG = óleo de girassol, OGO = óleo de girassol com alto teor de ácido oléico, OGA = óleo de girassol com alto teor de ácido erúcico, OGB = óleo de girassol com baixo teor de ácido erúcico, ON = óleo de nabo forrageiro, OC = óleo de colza com acidez de 2,29 mg KOH/g amostra.

1 Cordeiro, 2003; 2 Zagonel et al., 2003; 3 Domingos, 2005; 4 Bouaid et al., 2007a. 5 Tashtoush et al., 2003, em que o H2SO4

foi utilizado na concentração de 2,25 mol/L. 6 Antolín et al., 2001; 7 Vicente et al., 1998; 8 Yuan et al., 2008; 9 Vicente et al., 2007; 10 Bouaid et al., 2007a.