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Síntese do evoluir histórico da civilização romana desde meados do século II a.C até à Guerra Sertoriana.

No documento A guerra sertoriana (80-72 a. C.) (páginas 50-122)

A Guerra Sertoriana pode ser contextualizada como um dos episódios integrando o ciclo de conflitos civis que assolam o mundo romano ao longo do período de mais de um século balizado pela ascensão dos Gracos e a transição da República aristocrática

senatorial censitária para o Principado104. Uma adicional complexidade é-lhe conferida

quando cruzamos o fenómeno de lutas internas entre facções políticas com a revolta provincial dos Lusitanos contra o jugo dos optimates na Península Ibérica. O expandir do antagonismo para o distante anfiteatro do Mediterrâneo oriental, com a aliança firmada entre o Estado de Osca e o reino do Ponto, consiste noutro elemento de problematização que devemos ter em conta no apurar da sua significância.

Sumarizarmos os contornos de uma guerra com esta multiplicidade de intervenientes, cada qual com os seus respectivos motivos e interesses, envolve uma explanação inevitavelmente redutora. Uma viagem retrospectiva pelos acontecimentos preenchendo as décadas que antecedem o seu eclodir, consiste no melhor método para nos inteirarmos das suas causas.

3.1.1 – Os factores de crise da segunda metade do século II a.C..

Segundo Políbio, a criação do império romano resulta, essencialmente, dos

proventos adstritos a um sistema de governo de Estado105, firmado numa constituição

mista onde se harmonizam princípios monárquicos106, aristocráticos107 e

democráticos108. Na orgânica da Res publica109, o exercício da soberania ramifica-se por

três precípuos polos de emanação: os funcionários executivos, o Senado e as assembleias do povo. Até à Segunda Guerra Púnica, o elemento aristocrático fora

104 LANÇON, Bertrand – O Estado Romano – Catorze Séculos de Modelos Políticos, Publicações

Europa-América, Lisboa, 2003.

105 Polyb., 6, 18, 1. 106 Polyb., 6, 11, 12. 107 Polyb., 6, 11, 12. 108 Polyb., 6, 11, 12.

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preponderante na estrutura da República romana110, na medida em que o voto popular se

encontrava condicionado pelas prerrogativas das classes cimeiras do census e os magistrados electivos anuiam à vontade do corpo senatorial.

A aristocracia regente era constituída pelo núcleo de cidadãos com assento no Senado colectivo que, na prática, exercia o poder num sistema republicano estruturado pelo sobrepujar da importância dos critérios de distrinça social sobre a igualdade de direitos cívicos e políticos. Uma acentuada estratificação comunitária havia originado um costume de atritos limitados entre patrícios e plebeus sem que, contudo, uma beligerância declarada rompesse os vínculos de concerto que elevam Roma à senhoria

do Mediterrâneo111. A gestão desse imenso espaço coloca, por fim, em evidência o

arcaísmo das instituições tradicionais, concebidas séculos passados para uma realidade geográfica que tinha o Lácio por referência, doravante incapazes de harmonizar a iniciativa privada individual e de grupos de interesse com o bem colectivo.

O prenúncio do tempo de conflagração civil até uma solução política capaz de providenciar ordem e prosperidade, consiste no assassínio de Tibério Semprónio

Graco112, defensor de um programa de reformas visando adaptar as características do

regime republicano às profundas mudanças que acompanham a evolução de um federalismo itálico para um império ultramarino. Eleito tribuno da plebe no ano de 133 a.C. empenha-se, sobretudo, contra o que considera a origem dos outros males que acometem a romanidade, consistindo na concentração de poder e riqueza nas classes favorecidas, à custa do empobrecimento das demais. Por via da aquisição massificada de mão-de-obra escrava composta pelas populações submetidas no decurso do crescimento territorial do império, os aristocratas garantem o sucesso produtivo do latifúndio, condenando à ruína o pequeno proprietário, o agricultor-soldado que

constituíra a espinha dorsal dos exércitos milicianos durante o século III a.C..113

Acompanhando os crescentes privilégios da nata da sociedade romana representada pela ordem senatorial, os equestres obtêm as suas próprias fontes de receitas através de uma multiplicidade de práticas monopolistas ou corporativas de controlo dos florescentes negócios estabelecidos com as províncias conquistadas pelas

110 Polyb., 6, 13. 111 App. B Civ., 1, 1-2.

GARCÍA MORÁ, Felix – Quinto Sertorio, Tesis doctorales, Universidade de Granada, Granada, 1990, página 49.

112 App. B Civ., 1, 1-2. 113 App. B Civ., 1, 7, 1.

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armas legionárias114. Com a terra e o tráfico mercantil sob o firme domínio das duas primeiras ordens do census, um fosso entre a classe cimeira e o restante colectivo

incrementa-se com o decorrer do tempo115, na estratigrafia social.

Regressado da guerra no Ultramar à pequena propriedade que havia deixado entregue à gestão da família, o antigo combatente vê-se esmagado pela concorrência com a força humana esclavagista ao dispor dos grandes terratenentes na própria Itália e

com o fluxo de novos produtos advindos das colónias116. Perdida a sua fonte de

rendimento e independência que constitui o património agrícola, tipicamente adquirido pelo latifundiário vizinho que, desta forma, aumenta o seu domínio por parcelas

sucessivas, o comum romano abandona a ruralidade para tentar sobreviver na cidade117.

A integração nos mesteres urbanos fá-lo engrossar a lista dos proletarii, cidadãos detentores de propriedade apreciável no valor de 11,000 asses, cuja função no contexto social romano consiste, para além do produto da sua própria força laboral, na de gerar a prole que colonizará os novos territórios do império, onde esperam encontrar a oportunidade para deter a terra que constitui o fundamento para a riqueza e status no mundo antigo. Numa categoria inferior a esta encontram-se ainda os capite censi, ou seja, cidadãos abaixo do critério mínimo de riqueza para figurar no census para além de

uma simples conta de cabeças118, tipicamente sujeitos a uma vida de indignidade e

mendicância, perspectivados pelo resto da sociedade romana como compondo o

submundo da urbanidade, um antro de miséria, doença, crime e prostituição119.

O acréscimo da importância do mercantilismo na economia romana que, até às Guerras Púnicas, se compusera a partir de uma essência agrícola num perímetro itálico, tem por efeito o crescimento das cidades litorais, para além de uma planificação. A migração dos antigos agricultores desapossados da sua terra resulta no grémio de proletários nas imediações dos centros de poder, elemento fulcral para compreendermos o contexto do antagonismo fracturante na direcção aristocrática do regime. Assegurar o fornecimento de cereais a baixo preço à plebe carenciada de Roma, torna-se numa preocupação transversal às várias tendências políticas do período: para os líderes da facção popular, visa cativar o apoio das massas que constitui a principal plataforma para

114 ROSS-TAYLOR, Lily – La politique et les partis à Rome au temps de César, Elizabeth & Jean-Claude

Morin (trad.), François Maspero, Paris, 1977, página 41.

115 ROSS-TAYLOR, Lily, op. cit., página 42. 116 Ibidem.

117 Plut. Vit., Ti. Gracch., 8, 1-3. 118 Gell., NA, 16, 10.

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a sua ascenção pessoal enquanto, para os optimates, consiste num artifício necessário

para reduzir a contestação ao poder vigente120.

A vulnerabilidade para o Estado romano que representa o alienar de uma vida cívica produtiva de parte significativa da sua população, regista-se no domínio mais caro para uma civilização orientada por uma política expansionista: no decurso do século II a.C., as legiões começam a sofrer com a falta de poder humano por motivo do

empobrecimento dos cidadãos para níveis abaixo do requerido para o serviço militar121.

Antes pertença de trabalhadores rurais, o solo da Itália encontra-se entregue ao trabalho

de escravos estrangeiros que asseguram as fontes de rendimento ao latifundiário122, cada

vez mais propenso a distanciar-se dos tradicionais valores de integridade romanos e a

favorecer uma existência hedonista123.

Afectando, por fim, o domínio que exterioriza o poder e a superioridade de Roma, o valor marcial das legiões declina nos campos de batalha do Mediterrâneo e a expansão nitidamente abranda por motivo das carências de fornecimento humano para a máquina de guerra. Com efeito, uma antinomia relativamente ao desenvolto impulso militar da primeira metade do século II a.C. constitui o período de cerca de trinta anos

intercalando a travessia do rio Minho por Décimo Júnio Bruto Calaico (137 a.C.)124 e a

conquista de parte da Numídia na conclusão vitoriosa da guerra Jugurtina (112-106 a.C.). A inércia das forças armadas constitui o registo mais evidente da consequência no domínio da política externa do compêndio de vulnerabilidades com que se debate o regime aristocrático na própria Itália.

3.1.2 - A reforma agrária dos irmãos Gracos. A cisão dentro da aristocracia dirigente romana. A constituição do movimento popular e conservador.

Dotado com o dom da palavra numa Roma que se familiariza com as técnicas helenísticas do discurso eloquente, difundidas pelos círculos da alta cultura em

continuidade com o patrocínio inaugural de Cipião125, o Africano, o tribuno Tibério

Semprónio Graco empenha-se no combate à desigualdade na distribuição da riqueza

120 Plut. Vit., C. Gracch., 5, 1.

121 LIGT, Luuk de – “Roman Manpower and Recruitment”, in A Companion to the Roman Army, Paul

Erdkamp (Ed.), Blackwell Publishing, Oxford, 2007, página 128.

122 Ibidem.

123 Diod. Sic., 37, 3 ; Sall., Iug., 4, 7. 124 Strabo, 3, 3, 1.

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fundiária. Em defesa de um programa de concertação social, propõe uma legislação agrária determinando uma redistribuição mais equitativa do ager publicus, elevando o estatuto às classes pobres que haviam perdido a sua propriedade por cúmulo de dívidas, enquanto impondo limites à concentração de terra por indivíduos singulares. Apesar do tom cordato da sua oratória visar um compromisso entre as distintas representações de interesses em torno de reformas que considera impreteríveis para a resolução das debilidades internas responsáveis pela atrofia do poder militar de Roma, a influência que exerce sobre a multidão que assiste aos seus discursos, representa uma ameaça para os grandes terratenentes, decididos a defender os seus privilégios126. Por fim, o brutal assassínio do tribuno às mãos dos senadores e seus apoiantes que falsamente o acusam

de almejar a coroa monárquia, contribui para modelar a postura combativa127 do seu

irmão, Gaio Semprónio Graco128, que, quando empossado do cargo de tribuno da plebe,

faz derivar o discurso a partir do rostra que domina com a sua presença exibicionista e

intimidante, o seu estilo agressivo e injurioso129, para uma radical demagogia130.

Em antinomia com a forma gentil e serena com que o seu irmão cativava o seu público, visa o tom incendiado da poderosa eloquência do mais novo dos Gracos, introduzir uma ousada legislação capaz de forçar uma maior igualdade. Os métodos de confrontação de Gaio resultam no acentuar da fractura na empatia entre os aristocratas e

a plebe131, assim como no âmago da própria nomenclatura dirigente132.

Com efeito, as medidas propostas na qualidade de tribuno visam diluir as assimetrias na sociedade romana, mediante o amparo dos desfavorecidos e a retracção dos privilégios das classes cimeiras: uma lei agrária divide a terra pública entre os cidadãos pobres, enquanto outra procura reabrir-lhes as portas do serviço militar através do fornecimento do vestuário aos soldados às despesas do Estado. Para além do reconhecimento, aos aliados itálicos, de iguais direitos de sufrágio com os cidadãos romanos, a mais ousada legislação de Gaio Graco concerne à extensão do exercício da jurisprudência em casos criminais também aos cavaleiros, até aí prerrogativa dos integrantes da ordem senatorial. A sua acção tribunícia faz acrescentar aos trezentos

126 ROSS-TAYLOR, op. cit., páginas 38-39. 127 Plut. Vit., Ti. Gracch., 2, 2.

128 Plut. Vit., C. Gracch., 3, 3. 129 Plut. Vit., C. Gracch., 4, 3-4. 130 App. B Civ., 21, 1.

131 Plut. Vit., C. Gracch., 3, 2. 132 Plut. Vit., C. Gracch., 1, 5-6.

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membros do Senado, outros trezentos homens provenientes da ordem equestre, e torna o

serviço como juízes atributo da totalidade dos seiscentos133.

Exibindo através do gesto a sua intenção de servir o interesse do povo

transformando o formato constitucional romano de aristocrático em democrático134,

Gaio Graco passa a proceder à sua oratória no Fórum com as costas voltadas para o Senado, quando sempre até aí os tribunos da plebe haviam dirigido o seu semblante para

a Cúria135. A feroz contestação ao abuso de poder por parte daqueles que, no seu

entendimento, representam uma oligarquia corrompida pelo luxo e vício, soçobra com o seu assassínio, mas as suas ideias frutificam numa facção organizada de tendência popular e reformista, que disputa o poder com os aristocratas conservadores.

Para fazer frente aos factores de crise que enunciam as piores consequências para a viabilidade do regime republicano, debatem-se entre a classe dirigente, dois modelos de atendimento, um que propõe adaptar o sistema vingente aos novos tempos

mediante urgentes mudanças legislativas136, outro que procura preservar a integridade

das regalias das classes superiores, cerrando fileiras diante das adversidades. Os membros da primeira facção, apelidados de populares ou democráticos pela pretensa luta que empreendem em favor da plebe, abraçam o legado dos Gracos e representam a cisão do corpo aristocrático que a outra parte da elite procura evitar. Conhecidos estes últimos pelo termo de optimates ou conservadores, opõem-se à mudança pelos riscos evidentes que reconhecem para os seus interesses com a promoção de uma maior igualdade social, reagindo ao perigo da insatisfação dos desfavorecidos, através do incremento dos meios de controlo de multidão, tanto repressivos como apaziguadores, procurando adiar mudanças signicativas pelo espaço das suas vidas e apoiar-se nos símbolos e instrumentos de poder. O prestígio associado à linhagem de sangue nobiliárquico, reforçado pelo superior conhecimento que lhes advém de uma educação providenciada por pedagogos privados, compõem os apetrechos basilares para legitimarem a sua superioridade na hierarquia social.

A denúncia por parte dos chefes populares dos males de um sistema que destrói a vitalidade da civilização romana ao sujeitar o povo à exploração de um grupo de privilegiados, é acompanhada por um programa de medidas reformistas destinado a uma resolução de maior equidade social. A parte aristocrática do regime cimentar-se-ia na

133 Plut. Vit., C. Gracch., 5, 1-2. 134 Diod. Sic., 34-35, 25, 1. 135 Plut. Vit., C. Gracch., 5, 3. 136 App. B Civ., 1, 11, 1.

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virtus pessoal, abrindo espaço para a ascenção do homo novus, integrando-o entre a elite de linhagem. O cidadão romano seria restabelecido na sua propriedade e prestígio através da contenção do crescimento do latifúndio na Itália e distribuição de terra nas colónias137.

Contra este projecto aparentemente razoável de saneamento das chagas que debilitam o tecido social romano, opõem os conservadores o argumento da necessidade de estabilidade, invectivando o radicalismo dos tribunos da plebe que destrutura as tradições ancestrais romanas em proveito da sua ascenção pessoal. O discurso demagógico revolvendo as massas plebeias residentes no epicentro do império ameaça, nesta lógica, a ordem interna de que depende Roma para o sucesso das lutas contra a miríade de inimigos que se opõem aos seus desígnios de conquista.

No concebimento dos optimates, a ineptidão das gentes comuns para conscientemente determinar o seu destino, recomenda a continuidade de um sistema que, apesar de tudo, concede a Roma o exercício do poder sobre todo o mundo

mediterrâneo138. O estreitamento do colectivo em torno das tradições romanas

representa a melhor conduta frente às exigências que se colocam a uma sociedade aspirante ao domínio universal. Para a facção conservadora, os problemas que atingem Roma advêm, justamente, da permeabilidade dos mos maiorum a ingerências nocivas de conceitos exógenos, motivo porque se recomenda o preservar da ancestral tecedura de

ordenação139 em detrimento do salto no desconhecido que representam as reformas

postuladas pelos populares.

Escorando-se nos atributos que ostensivamente definem a sua superioridade na estratigafia do regime, os oligarcas zelam sobretudo pelos seus interesses, enquanto classe favorecida. A resposta para o ambiente de clivagem social que enuncia as grandes contendas civis do século I a.C., consiste no distanciamento físico da nata da República em relação à populaça, resumindo o seu quotidiano a actividades no habitáculo senatorial e ao conforto nas villae, os seus estados latifundiários privados, onde olvidam a noção dos problemas do tempo no conforto luxuoso.

Para os optimates, a conduta dos seus pares no cume do census integrando a facção democrática, representa uma fractura no estrato liderante que põe justamente em causa as suas condições de vida privilegiadas, motivo porque uma aversão pessoal

137 Ver: BROADHEAD, Will – “Colonization, Land Distribution, and Veteran Settlement”, in A

Companion to the Roman Army, Paul Erdkamp (Ed.), Blackwell Publishing, 2007.

138 Sall., Hist., 2, 44, 13-14. 139 Polyb., 6, 18.

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depressa se desenvolve entre os membros das respectivas militâncias. Acusam, também, os seus rivais de pretenderem usar a sua influência sobre as massas com o emprego do discurso demagógico e outros métodos de manipulação de multidões, para as conduzirem a uma desordem que ocasione o derrube da República aristocrática e sua

substituição por uma tirania ou monarquia140.

No seguimento do perigoso precedente que constitui a sucessão ilegal de consulados de Gaio Mário, os passos dados por Júlio César consubstanciam, justamente, as várias fases do assalto ao poder através da preliminar cativação de popularidade, distinção na arena marcial contra inimigos externos, guerra civil e apresentação de uma solução para devolver a tranquilidade ao todo social. Por conseguinte, a manutenção do status quo alicerçado na autoridade do Senado constitui, nos selectivos argumentos usados pelos optimates, na melhor blindagem do regime republicano contra a usurpação

intencionada dos pretensos arautos dos desfavorecidos141.

A inexistência de verdadeiras ideologias estruturando e distinguindo as facções romanas no ocaso da República, claramente as desprovam de parte da essência dos

contemporâneos partidos políticos142, motivo porque o emprego deste termo suscita

dúvidas de autenticidade em face dos particularismos do fenómeno epocal143. Esta

indefinição ideológica favorece o surgimento de nichos mais ou menos exclusivistas no seio das latas agremiações, determinando uma multiplicidade de vias políticas para objectivos pouco esclarecidos. Tal como na facção popular se distinguem tendências reformistas dispostas ao compromisso entre as partes e revolucionários apelando à acção violenta da plebe contra a oligarquia regente, entre os optimates uma ala moderada propõe uma contenção do processo de mudanças através de cedências calculadas, enquanto um sector ultra-montano visa um simples aniquilamento dos focos de discórdia.

O antagonismo entre as elites evolui para uma verdadeira confrontação armada algumas décadas após os irmãos Graco terem sido assassinados perante a inacção da plebe pela qual se bateram, em os defender. Com o primeiro sangue derramado, o sistema político romano caminha para a crise que o sentenciará no século subsequente.

140 Diod. Sic., 34-35, 25. 141 App. B Civ., 1, 23, 1.

142 ASTIN, A. E – “Sources”, in The Cambridge Ancient History. Volume 8: Rome and the

Mediterranean to 133 BC, Second Edition, Astin, A.E. ; Walbank, F.W. ; Frederiksen, M.W. ; Ogilvie, R.M. (Eds.), Cambridge University Press, 2008, página 67.

143 ASTIN, A. E – “Sources”, in The Cambridge Ancient History. Volume 8: Rome and the

Mediterranean to 133 BC, Second Edition, Astin, A.E. ; Walbank, F.W. ; Frederiksen, M.W. ; Ogilvie, R.M. (Eds.), Cambridge University Press, 2008, página 67.

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Episódios de inaudita violência civil na História de Roma registam-se quando Gaio Mário e Lúcio Cornélio Sula, antigos companheiros de armas transformados em inimigos figadais, tomam à vez o poder na Cidade Eterna, implementando regimes de terror que, embora de curta duração, se caracterizam pelo desabrido revanchismo contra os seus adversários ou suspeitos de menor fidelidade.

3.1.3 – Os vícios da prática política do regime. A corrupção do sistema eleitoral no acesso às magistraturas. O clientelismo e outras fórmulas de vínculação pessoal e grupal.

Apesar de ter constituído a estirpe para a divergência de projectos entre populares e conservadores, a reforma agrária é apenas um dos fundamentos do complexo fenómeno de confrontração civil entre facções políticas que enunciam a crise

do regime144. Num modelo de organização social altamente estratificado, no contexto do

qual as pessoas estão organizadas em categorias de acordo com um census, o ambiente entre a escol que constituiem as classes superiores liderando a política romana,

caracteriza-se por uma feroz competição145. Cada membro singular que integra este

corpo exclusivista é avaliado com uma profunda atenção e frio cálculo pelos seus pares, que escrutinam elementos positivos e negativos a partir de uma miríade de critérios de destrinça, incluindo a linhagem, riqueza, cumprimento do cursus honorum, serviços públicos, condecorações, homenagens, idade, influência, ideias, ambições e talentos,

No documento A guerra sertoriana (80-72 a. C.) (páginas 50-122)

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