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III. Resultados

3.2. Saúde Psicológica e Bem-Estar

Nesta categoria são relatados todos os resultados que, de certa forma, estão relacionados com o impacto que os animais têm na saúde psicológica e bem-estar dos idosos. Em cinco dos manuscritos analisados, abordam-se temas como a solidão e a tristeza, o papel que os animais podem desempenhar no amortizar dos sintomas depressivos dos seus tutores

24 ou idosos que participam em intervenções, a importância e o significado que cuidar de um animal tem para os idosos e os diferentes tipos de interações e significados que podem existir na relação entre idosos e animais.

No que concerne a saúde psicológica, foram vários os estudos analisados nesta revisão que focaram aspetos relacionados com a felicidade, bem-estar, stress e depressão. Através do questionário Pet Attachment utilizado na investigação de Mueller et al. (2018), foi possível determinar que os participantes estabeleciam vários tipos de ligação com os seus animais: 88,3% consideravam o seu animal um amigo, 88,1% falavam com o seu animal regularmente, 92,8% sentiam felicidade no geral com o seu animal, 83,6% brincavam com o seu animal e 81,4% consideravam que o seu animal sabia como eles se sentiam. Estes valores indicam que, de uma maneira geral, a vinculação dos idosos com os seus animais foi alta. Apesar destes valores serem visivelmente significativos, devido às altas percentagens, as análises efetuadas não indicaram diferenças significativas entre os participantes que possuíam animais e os que não possuíam no que diz respeito ao estado de saúde geral, avaliado através de autorrelato sobre sintomas depressivos e alguma atividade física. Contudo, revelaram que a posse de uma animal estava fortemente associada à probabilidade de algum dia o participante ter tido depressão, não se verificando esta probabilidade nos participantes que não possuíam. Esta conclusão remete para um resultado obtido no estudo de Putney (2014) em que duas participantes referem que já tinham sentido vontade de cometer o suicídio e que a responsabilidade de terem um animal foi uma forte influência e motivação para não o fazerem.

Um outro estudo que fez referência ao bem-estar psicológico e a sintomas depressivos nos idosos foi o estudo de Berry, Borgi, Terranova, Chiarotti, Alleva & Cirulli (2012). Esta foi uma pesquisa longitudinal, realizada em contexto institucional ao longo de 5 meses, com a presença de um cão em sessões de socialização (atividades lúdicas) e de fisioterapia com idosos institucionalizados. Os investigadores mediram os níveis de cortisol presentes nas amostras de saliva recolhidas dos participantes e avaliaram sintomas depressivos através da Escala de Depressão Geriátrica. Os resultados obtidos apenas foram significativos nas sessões de socialização, em que houve uma clara queda dos níveis de cortisol no grupo de controlo. A ANOVA revelou um efeito principal das intervenções assistidas por animais: em ambas as sessões a interação com os cães há um efeito na diminuição da depressão em relação aos grupos de controlo, contudo esse efeito não se mantém ao longo do tempo.

25 Além da investigação de Berry (2012), o bem-estar proporcionado pelos animais foi também analisado especificamente no estudo de Putney (2014), através de entrevistas a idosas não institucionalizadas. O artigo enfoca duas temáticas interligadas, definidas como “amor” e “cuidar”. Os subtemas do amor, na ótica da autora, foram companheirismo e família escolhida. Os subtemas para o cuidado correspondem a recompensas, desafios e simetria/assimetria do bem-estar humano e animal. Todas as participantes, exceto uma, usaram a palavra «amor» para descrever o sentimento pelos seus animais. Com a leitura dos resultados deste estudo, percebeu-se a importância e o impacto que cuidar de um animal tem na vida destas idosas. Várias participantes afirmaram que sentem o afeto dos seus animais como não julgador e incondicional e que cuidar do animal está associado a um sentimento de responsabilidade fazendo-as sentirem-se qualificadas e capazes. Ademais, ao cuidar de um animal, sentiam-se recompensadas por saberem que eram as responsáveis por os proteger de condições adversas e/ou educá-los. Estes resultados são comuns aos de Ferreira (2012) em que cinco participantes afirmaram que o motivo que as fazia terem vontade de ter um animal era, de certo modo, para ter quem pudessem cuidar. No entanto, também se percebeu que este cuidar é um trabalho que, algumas vezes, se torna exigente e até impossível nos casos em que existem limitações associadas a condições médicas ou financeiras. Cinco entrevistadas falaram sobre a dificuldade de cuidar dos animais enquanto cuidam de filhos, de um parceiro doente, de pais bastante idosos ou quando têm de trabalhar. Nove referiram que qualquer declínio ou mudanças nos seus recursos financeiros tornaria impossível cuidar de um animal. Após a análise das entrevistas, a autora descreveu estas fases como “período frenético”.

Na perspetiva de algumas participantes da investigação de Putney (2014), as dificuldades associadas ao cuidado variavam de acordo com o tipo de animal. Concluiu-se que cães bebés ou animais mais velhos necessitavam de mais atenção, assim como cães exigiam mais cuidado que os gatos. Apesar deste facto, apenas quatro participantes evidenciaram a sua preferência por felinos, por comparação com cães. A principal razão invocada foi a independência que tipicamente caracteriza um gato. Algumas participantes relataram que cuidar do animal as faz relembrar das experiências de cuidar de uma criança. Contudo, apesar de a maioria incluir os seus animais como membros da família, muitas também afirmaram que os animais não substituem os filhos. Pelo contrário, na pesquisa de Scheibeck (2011), a resposta de uma idosa viúva que havia perdido o seu cão demonstra que nem todos sentem os animais da mesma forma: «quando o meu marido faleceu, ele estava tão triste quanto eu…nunca tivemos filhos, mas tivemos vários cães antes. No entanto, este

26 esteve connosco por quase 20 anos, acompanhou-nos em tempos muito difíceis…tornou-se parte da nossa pequena família…não era um cão para mim. Quando eu comia, ele sentava- se na mesa comigo…quando eu estava doente ele rapidamente notava e ficava muito nervoso…o nosso cão foi um substituto para as crianças que nunca tivemos». No geral, os resultados de Putney (2014) demonstraram que o amor e cuidado, dois aspetos relacionados com a interação humano-animal, têm grandes implicações para quatro das seis dimensões do bem-estar eudemónico: auto-aceitação, relações positivas com os outros, crescimento pessoal e propósito de vida.

No decorrer da leitura dos resultados, foi bastante evidente o impacto dos animais numa outra variável psicológica muito responsável pelo bem-estar dos idosos, a solidão. Scheibeck (2011) obteve algumas respostas ao longo da sua investigação que permitiram confirmar esta influência. Quando questionados «Quão importante é o cão para o dono na sua situação atual de vida?», para além do propósito de vida tal como referido acima «Ele cuida de mim… dá-me um propósito», também se registaram este tipo de resposta «O meu cão percebe se estou bem ou não. Eu falo com ele… há sempre alguém no apartamento, não estou sozinho». No artigo de Putney (2014) 11 entrevistados identificaram o companheirismo como um aspeto particularmente recompensador de ter um animal assim como quatro entrevistados afirmaram que os seus animais atenuavam sentimentos de solidão e isolamento. No artigo de Ferreira (2012) os resultados também remetem para a mesma conclusão pois, através do questionário que avaliou aspetos da posse de animais de estimação, em 267 idosos, 204 escolheram a razão «ter um amigo» como a principal causa para ter um. 13,11% da população deste estudo não tinha animais de estimação, sendo que uma parte desta percentagem atribuiu a razão «ter um amigo» caso viessem a ter. Dos idosos que afirmaram não querer ter um animal, 11 acharam que seria difícil de cuidar e 12 consideraram não ter um estilo de vida que permitisse.

O estudo de Scheibeck et al. (2011) fez também referência aos sentimentos de tristeza associados à perda do animal de estimação e do impacto que este acontecimento pode ter no bem-estar dos seus donos idosos. Na sua pesquisa de campo etnográfica realizada através da observação de pequenas conversas estruturadas realizadas em cemitérios de cães, apurou-se que eram muitos os visitantes que guardavam a imagem dos seus cães nas carteiras, assim como os idosos que não queriam nem conseguiam ter um novo animal. A justificação prende-se com o facto de não quererem desfocar as memórias e as experiências que tiveram com o cão falecido. Quando questionados sobre como lidaram com a morte deste e como superaram esse momento foi clara a semelhança nas respostas dos idosos que referiram o

27 sentimento de tristeza: "claro que fiquei muito triste”, «Levei muito tempo para superar isso e, no começo, vinha aqui quase diariamente”, “quando o meu cão morreu, foi como se o tempo que tivemos passado juntos morresse com ele», «“eu estava de facto triste…Triste como se fosse uma pessoa real a ter falecido». Esta última resposta remete para os resultados do estudo de Putney (2014) descritos mais acima, em que se concluiu que algumas idosas consideraram os seus animais membros de família.

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