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A SALV AGUARDA DO PATRIMÓNIO ARQUITEC TÓNICO E ARQUEOLÓGICO Paulo DUARTE 4 ,

Na presente comunicação procurarei esclarecer alguns aspectos relacionados com a legislação do património cultural imóvel, nomeadamente da Lei de Bases (Lei n.º 107/2001), da regulamentação da Lei de Bases (D.L. n.º 140/2009), dos Procedimentos de Classificação e das regras a que as Zonas de Protecção / Zonas Especiais de Protecção (D.L. n.º 309/2009) e das Operações de Reabilitação Urbana (D.L. n.º 307/2009)

A salvaguarda do património imóvel foi, na última década, efectuada em termos processuais por parte da tutela do património classificado, com o apoio da Lei de Bases (Lei n.º 107/2001), com recurso complementar a um ou outro Decreto-Lei, como o D.L. n.º 555/2009 ou o D.L. n.º 120/97 (atribuições e competências do IPPAR).

Só muito recentemente este quadro legislativo se alterou com significado, nomeadamente com a reforma do PRACE que levou à extinção dos organismos existentes (DGEMN, IPPAR e IPA), reorganizando-os no IGESPAR, I. P. e nas Direcções Regionais de Cultura (DRC). Complementarmente tem vindo a surgir nova legislação, nomeadamente o D.L. n.º 140/2009 (que estabelece a necessidade de haver relatórios prévios e intercalares aquando de qualquer intervenção em património classificado ou em vias de classificação, para além da obrigatoriedade do relatório final já previsto na Lei de Bases), o D.L. n.º 309/2009 (que define o procedimento de classificação de bens culturais imóveis, o regime das zonas de protecção e o estabelecimento das regras para a elaboração dos planos de pormenor de salvaguarda), e o D.L. n.º 307/2009 (que estabelece o regime jurídico da reabilitação urbana), no que se revela um esforço legislativo digno de nota, tendo em vista o clarificar das decisões ao nível dos planos e processos de obra com implicação na área do património imóvel.

PRACE ( a re formulação dos org anismos da Administração Pública) – articulaç ão e ntre o IGESPAR e as DR C. Isto não obsta a que não continue a haver problemas e lacunas. O caso mais evidente é o da repartição de competências entre as D.R.C. (que acompanham e instruem os processos) e o IGESPAR (que decide na fase final do processo). Esta duplicação de pareceres em que só uma das entidades decide tem levantado problemas mas, acreditamos, que nos dois anos e meio entretanto decorridos, muito trabalho tem sido feito no sentido de articular as decisões entre os dois organismos, sendo actualmente pontuais as discordâncias.

4Arquitecto

Chefe de Divisão de Salvaguarda do Património Arquitectónico IGESPAR, I.P.

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Pat rimónio – u m co nce ito e m contínua e volução – o al arg ar do conce ito e m te rmos tipológicos/cronológico/ge ográfico Actualmente todas as tipologias edificatórias são alvo dos interesses da sociedade no sentido da sua protecção/classificação, desde o monumento no sentido tradicional do termo até uma simples levada, moinho, caminho, etc. Isto implica um aumento da dificuldade face à quantidade, à diversidade e à especificidade da sua conservação (ver por exemplo o património industrial ou o património do Século XX, que levantam problemas extraordinariamente complexos na sua gestão / manutenção, face às extensas áreas frequentemente abrangidas e aos sistemas construtivos facilmente perecíveis como é o ferro e o betão armado, até porque chegam aos nossos dias sem qualquer prática continuada de conservação.

O conceito estendeu-se, pelo menos desde a Carta de Veneza (1964), não apenas aos monumentos (enquanto entidades individuais) mas também aos conjuntos, isto é, aos ambientes que os enquadram. Este conceito surge na nossa legislação através das figuras das Zonas de Protecção (ZP) e Zonas Especiais de Protecção (ZEP).

Crité rios de ap re ciação Face a esta realidade, quanto mais se alarga o conceito de património, quanto mais se quer proteger, quanto mais se estuda, quanto mais se especializa e maior é a interdisciplinaridade, mais se alargam, necessariamente, os critérios de intervenção; isto é, é cada vez mais difícil generalizar soluções.

E daqui derivam os problemas, quer para as entidades públicas que lidam com a gestão do património, sejam elas locais, regionais ou nacionais, quer, e com especial acuidade para os proprietários, requerentes, gestores e técnicos. Surge o fantasma da discricionariedade na apreciação.

Para combater a aleatoriedade é necessário legislar e regulamentar no sentido de estabelecer um conjunto de regras básicas para que todos os intervenientes saibam quais os princípios pelos quais se devem orientar e assim avancem, sem grandes receios, para o jogo cientes do caminho que terão de percorrer. É assim que o DL n.º 140/2009 prevê a apresentação de relatórios prévios e intercalares (para além do final já previsto na Lei de Bases) para evitar surpresas e eventuais arbitrariedades na apreciação. É assim que as classificações se fazem acompanhar, à partida das respectivas ZEPs, não bastando agora a sua delimitação (como antes acontecia) exigindo-se maior rigor nos critérios da sua delimitação, caracterização e regras de actuação (como por exemplo o que deve ser mantido, alterado ou demolido). É assim que as câmaras municipais, em articulação com as DRC e o IGESPAR, deverão proceder à a elaboração de Planos de Pormenor (PP), nomeadamente de Salvaguarda e/ou Valorização de conjuntos, sítios e monumentos, definindo desde logo as regras e fazendo, a partir da sua aprovação, a gestão directa, sem necessidade de consultar as diferentes entidades e a flutuação das vontades políticas que sucedem à frente dos destinos das autarquias (veja-se o recente caso do PPS da Baixa Pombalina).

No que à elaboração de pareceres respeita, e cuja elaboração é da competência das DRC, o IGESPAR tem procurado sensibilizar os técnicos para a necessidade da sua correcta

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fundamentação, quer no sentido de explicitar o que não pode ser feito e aceite, quer, principalmente, caso o parecer seja negativo, de precisar com o rigor possível, quais os limites da intervenção, isto é, apontar de caminhos para que os intervenientes (requerentes e projectistas) vislumbrem soluções para a resolução do seu problema. Nesse sentido, temos chamado a atenção para a necessidade da justificação do parecer técnico atender à natureza da classificação (sua importância relativa, grau de proximidade e/ou relação visual com o bem classificado, impacto da intervenção face ao monumento, nível qualidade patrimonial do ambiente em que se intervém, etc.). Nesse sentido, o DL n.º 140/2009, refere a necessidade de vistoria técnica no caso de se tratar de uma intervenção num imóvel classificado, como forma de assegurar uma correcta apreciação da proposta e orientar o projecto no sentido de poder vir a merecer sentido de aprovação, obviando custos de tempo e dinheiro.

Parece-nos também que o alargar do conceito de património leva a que a análise tenda progressivamente a ter em conta outros valores que não somente o valor artístico do objecto a intervencionar, entrando aqui aspectos como o seu valor tipológico e o seu carácter construtivo. Esta visão deve, em igual sentido, atenuar a importância da habitual sobrevalorização da imagem, exterior e urbana, em detrimento da autenticidade e integridade do bem a intervencionar. Assim, e progressivamente desde os finais da década de 90, tem vindo a recusar-se as intervenções com demolição integral dos interiores com preservação das fachadas, a não ser em casos excepcionais e devidamente justificados. Isto é, entende-se que, independentemente das alterações que se demonstrem necessárias, só valerá a pena manter determinado bem imóvel se o mesmo permanecer com dignidade e isso implica, por norma, a preservação, no essencial, das suas características construtivas.

E aqui joga a engenharia uma cartada decisiva. Neste particular, interessa realçar a evolução significativa, ao longo da última década, ao nível da diversificação das soluções técnicas apresentadas, procurando a melhor solução caso a caso, abandonando-se a postura invariável de construir em B.A., independentemente das características de origem do edifício.

Problema pertinente e cada vez mais na ordem do dia é a questão da adaptação dos regulamentos de segurança (nomeadamente anti-sísmica), mas também da térmica dos edifícios, quer ao nível dos sistemas passivos (em que os materiais tradicionais voltam a ter uma palavra a dizer), quer dos sistemas activos (climatização e produção de energia eléctrica), mas também das questões da introdução das redes de abastecimento e respectivos sistemas de leitura dos contadores que têm um impacto físico e visual significativo. Há que estudar novas soluções, de modo a fazer convergir os interesses tendo em vista o fim último que é o bem comum, no presente caso a salvaguarda do património cultural imóvel.

Para terminar, convém ter cada vez mais em mente que o património, para além da sua importância fundamental como factor de identidade cultural surge, cada vez mais, como factor de potenciação da economia, nomeadamente através do turismo, como bem o demonstra a recente Convenção de Faro. Isto aumenta a responsabilidade na sua conservação, mas também na sua gestão, e isto implica intervir, seja através de operações de manutenção e restauro, seja em operações de reconversão, para voltar a

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usar, logo alterar – por vezes com coragem – para valorizar. Basta atentar ao que se faz por essa Europa fora, só para usar o nosso termo de referência cultural.

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O REGISTO E A IN V ENTARIAÇÃO NO PATRIMÓNIO REL IGIOSO