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2.8 SISTEMAS AGRÍCOLAS NUMA VISÃO DE COMPLEXIDADE E DO CONCEITO DE AGRODIVERSIDADE

3 SEÇÃO III – FORMULAÇÃO DO PROBLEMA.

3.1 - QUESTIONAMENTOS BÁSICOS.

Ao iniciar-se um trabalho de pesquisa é indispensável que procure expor o fenômeno em cognição. Entende-se que a melhor fórmula para identificar as buscas explicativas numa investigação científica é a formulação de questionamentos.

Os instrumentos analíticos que são estruturados nesta formulação buscam responder as seguintes questões básicas:

1. Como podemos estruturar uma explanação baseada em uma formulação sistêmica e em fatos colimados em um ambiente agrícola em transição para identificar os diferentes estados (estruturas) dos sistemas agrícolas ?

2. Quais as relações existentes entre o desempenho ambiental, energético-material e desempenho econômico das unidades de produção?

3. Como o conceito de agrodiversidade contribui para entender a dinâmica dos sistemas agrícolas em transição, especialmente para explicar a resiliência e susceptibilidade dos pequenos produtores?

4. Como a análise da agrodiversidade permite entender a dinâmica agrária e a tomada de decisão em busca da atividade produtiva sustentável ?

3.2 - FORMULAÇÃO ANALÍTICA.

Nesta seção III são expostos os principais instrumentos analíticos utilizados para responder aos questionamentos da pesquisa. Utiliza-se uma formulação própria para análise dos fluxos materiais, energéticos e econômicos nas unidades produtivas e recorre-se a três

abordagens anteriormente elaboradas: A metodologia FAO/INCRA (Garcia Filho et al., s/d); Um esboço explicativo da Guanzirolle et al (2001) e uma formulação de Costa (2000a), do Núcleo de Altos Estudos Amazônicos - UFPA.

O modelo elaborado nesse estudo é o de um sistema aberto – com troca de matéria e energia com o seu entorno – o qual se divide em compartimentos e se calcula o valor das trocas de materiais e energia entre os compartimentos entre estes e o meio. A configuração mais simplificada é aquela onde uma unidade produtiva apresenta dois compartimentos, ou subsistemas: campo agrícola, ou simplesmente cultivos + casa, ou compõe-se de três compartimentos (campo agrícola + pecuária + casa). Esquema 1.

CULTIVOS CASA SAFRA INSUMOS input output CULTIVOS CASA SAFRA INSUMOS input output PECUÁRIA CARNE + LEITE

Aproximando o modelo mais para a realidade dos sistemas agropecuários em Igarapé- Açu, outro compartimento deve ser introduzido, representado as capoeiras que são as bases do shfiting cultivation da Região. Esquema 2.

Erro!

CAPOEIRA

CULTIVOS PECUÁRIA

Esquema 2 – Representação ampliada de modelos para sistemas agrícolas tradicionais.

Observa-se que nesse terceiro modelo um novo elemento surge, além da capoeira, ou seja, os resíduos das atividades agropecuárias que não são reciclados num compartimento específico, ou dentre compartimentos. Isso é uma característica não apenas dos sistemas locais / regionais, mas tem uma extensão generalizada nas práticas agrícolas de todas as regiões do mundo. Caso ilustrativo é o dos sistemas de pecuária suína no Estado de Santa Catarina. O inconveniente do grande volume de excrementos poderá passar a ser um benefício, na medida em que se lhes submeter a um processo de reciclagem. Outro exemplo, na realidade local, é o da importação de esterco de gado não aproveitado no Estado do Maranhão, o qual vem sendo utilizado como adubo nos plantios da pimenta-do-reino em Igarapé-Açu.

CASA

input output

Resíduos agropecuários não reciclados

Nas duas últimas décadas vêem ganhando impulso estudos voltados para a eficiência de agroecossistemas com base na análise dos fluxos energéticos de seus compartimentos (Ponte & Van Dyne, 2000; Svirezhev et.al., 1995; Tiezzi s/d). Há uma preocupação em se dar uma finalidade aos resíduos agroindustriais, tomado-se por parâmetro os processos nos agroecossistemas naturais onde resíduos de um compartimento é fonte energética para outro.

No estudo de Tiezzi et. al., s/d, seus autores fazem uma comparação entre modelos de sistemas agrícolas “extremados” (agricultura de subsistência versus agricultura industrializada) e apontam para a definição de um modelo ideal, denominado ecossistema agro-industrial integrado. Na primeira situação o sistema se caracterizaria por assegurar a reciclagem de todos os resíduos tendo como base a energia solar e de combustíveis fósseis sob baixo consumo. Na segunda situação a produtividade fotossintética é acrescida pelo ingresso de energia fóssil, e o sistema é altamente especializado. Essa especialização e a distância física entre os compartimentos de produção e consumo dificultam a reciclagem dos resíduos. (esquema 3.3).

Alto consumo fóssil

Energia solar AGRO- INDÚSTRIA PECUÁRIA CULTIVOS Resíduo pecuário Resíduo agrícola Resíduo agro- industrial

3.3 - MODELAGEM DO PROBLEMA.

A presente formulação objetiva explicar como os fluxos energéticos e materiais ocorrem nos sistemas agrícolas e quais os efeitos destes na eficiência energética/material e econômica do sistema. Foram identificados todos os fluxos de materiais e energia e os valores agregados a estes.

Há um interesse particular, no presente trabalho, para que a formulação seja capaz de revelar os efeitos de provimento interno de materiais (capoeira etc) e força de trabalho (mão- de-obra familiar), bem como ponderar o efeito do consumo interno. Desta forma estar-se-á expressando o grau de dependência local de recursos naturais e de força de trabalho e do comprometimento da produção com o consumo interno.

As formulações matemáticas, expressões dos fluxos energético-materiais e monetários nos processos de produção agropecuária, foram a principal ferramenta para modelar os sistemas de produção. Com elas resultaram os valores das eficiências desses sistemas, e, dessa maneira, ponderaram-se os seus graus de sustentabilidade. As unidades-padrão para os fluxos energético-materiais e monetário são o kcal e o R$, respectivamente. Esses parâmetros obtidos são adimensionais, isto é, eles expressam as eficiências de cada unidade produtiva com ela própria, de acordo com os desempenhos das estruturas que lhes são peculiares. Dessa forma, foi possível classificar eficiências entre unidades produtivas com naturezas heterogêneas.

Para revelar os efeitos de consumo interno e da atividade extrativa interna, a abordagem assumiu duas configurações:

(1o) Sistema analisado como a unidade produtiva em seu conjunto, representado por “P” (esquema 4).

(2 ) Sistema como sendo o conjunto dos cultivares e criações, (representado pelo índice “C”); ou seja, ampliando-se o prisma, consideram-se os fluxos “gratuitos” do meio ambiente da UP (recursos naturais, mão-de-obra familiar etc), somados aos insumos de mercado (off-farm) no processo produtivo (esquema 4).

Os termos que expressam os fluxos energético e materiais apresentam extensões .em e quando representam fluxos monetário apresentam extensão .m. Os procedimentos de cada uma dessas vias com as simbologias correspondentes são apresentados em seguida.

inP

Esquema 4 - Representação dos termos da formulação matemática. Sugere o “movimento” dos fluxos dentre os compartimentos, e destes com o entorno.

Assim, para a propriedade considerada como o sistema sua eficiência (

η

P) é: ηP =outP / inP (3.1)

Quando apenas as culturas C (conjunto dos cultivos e criações) representam o sistema, sua eficiência (

η

C), é:

“C” = central de produção, ou o conjunto dos cultivos

e criações (local da carga máxima ingressada) CASA InC = inP+∑∑ffii ∑ ∑ffii Regeneração ∑cci i outC outP

ηC =outC / inC (3.2)

inC = inP + ∑∑ffi ∴ ini P = inC - ∑∑ffi i

outC = outP + ∑∑ccii ∴ outP = outC - ∑∑cci i

ηP = (outC - ∑∑ccii)) / (inC - ∑∑ffii)) (3.3)

Dividindo os termos por inC tem-se:

ηP = (outC / inC - ∑∑ccii / inC ) ⁄ (1 - ∑∑ffi / ini C)

ηP = (ηC - ∑∑ccii / inC ) ⁄ (1 - ∑∑ffi / ini C) (3.4)

Termos operacionais complementares com respectivos significados:

Tendo-se que

inP = insumos de mercado: tudo o que é adquirido de fora da porteira (off-farm), mas não necessariamente comprado;

∑ffii = fluxos internos ou “contribuição” da up para o processo produtivo;

inC = total dos insumos consumidos no processo produtivo, ou a soma do que entra via porteira (inP) com a contribuição da U.P (∑∑ffi); i

outC = produção total ou bruta, incluídas as perdas.

O destino da produção bruta poderá ser:

ii. auto-consumo + exportação; iii. toda para exportação;

∑cci = parcela da produção bruta consumida internamente (retida na up); i

∑ppi = parcela da produção bruta perdida e/ou reciclada; i

outP = parcela da produção bruta exportada;

Definiu-se, ainda os seguintes parâmetros:

• • CCooeeffiicciieennttee mmeettaabbóólliiccoo,,éé rraazzããoo eennttrree oo qquuee éé ccoonnssuummiiddoo iinntteerrnnaammeennttee ee oo ttoottaall ddee i innssuummooddeessttiinnaaddooààpprroodduuççããoo.. φm = ∑∑ccii//iinnCC ((55))aa • • CCooeeffiicciieenntteemmeettaabbóólliiccoo--ddiiffeerreenncciiaal,l,éérraazzããooeennttrreeooqquueeééccoonnssuummiiddooiinntteerrnnaammeenntteeee a appaarrcceellaaddeerreeccuurrssoossccoonnssuummiiddoossnnaapprroodduuççããoo,,eexxttrraaííddoossddaapprroopprriieeddaaddee,,mmaaiissaaffoorrççaa d deettrraabbaallhhoo.. φmd= ∑∑ccii//∑∑ffii ((55))bb •

Coeficiente de depredação da unidade produtiva. Isto é a parcela de recursos naturais consumida na produção, extraídos da propriedade, incluindo a força de trabalho familiar, dividida pelo total de insumos de mercado

φd = ∑∑ffii//iinnPP ((33..66))

• Razão da parcela da produção bruta útil (consumida e/ou exportada) com o total produzido;

φu = (outC -∑∑ppii))//oouuttCC (7)a Ou, alternativamente,

φpi =∑∑ppii//oouuttC (7)b C

• Mão de obra especifica, que representa a quantidade de mão de obra necessária para produzir uma renda agrícola igual ao VCO (valor de custo de oportunidade). É o produto do VCO pela total de homens-dia trabalhadas ao ano, dividida pela renda agrícola

φ t= VCO.T/Ra (8)

• Superfície agropecuária específica, que representa a superfície agropecuária necessária para produzir uma renda agrícola igual ao VCO. É o produto do VCO pela superfície agropecuária útil, dividida pela renda agrícola

φsau =VCO.SAU/Ra (9)

.

Para análise dos fluxos monetários e eficiências em cada propriedade analisada, a estrutura dessa formulação tem uma similaridade com a anterior, pois se trata do seu correspondente-valor monetário.

3.4 - METODOLOGIA FAO/INCRA PARA AVALIAÇÃO ECOLÓGICA-ECONÔMICA DAS UNIDADES PRODUTIVAS

Fez-se uma adaptação da metodologia aplicada ao diagnóstico de sistemas agrários do convênio FAO/INCRA (Garcia Filho, s/d).

As principais variáveis utilizadas na análise ecológico-econômicas dos sistemas foram:

VA - Valor Agregado;

SAU - Superfície Agropecuária Útil; RA - Renda Agrícola;

T - Força de Trabalho expressa em dias homem por ano; PB – Produção Bruta ;

CI – Consumo Interno; D – Depreciação.

A metodologia usa um critério linear para cálculo de depreciação:

D = (Vi – Vf) / n, (10)

Onde Vi é o valor de compra do bem (valor inicial),

Vf é o valor final do bem (valor de venda ou residual no final de sua vida útil),

n são os anos de utilização do bem no sistema de produção.

onde:

VA = PB – CI - D (produção bruta menos consumo interno e menos depreciação). (11)

Do ponto de vista social, um valor agregado maior significa um melhor aproveitamento dos recursos disponíveis.

Assim, pode ser definido um valor agregado específico, por unidade de superfície agropecuária, que reflete a eficiência de manejo dos recursos naturais:

φs=VA/SAU (valor agregado por superfície agropecuária útil SAU) (12)

Da mesma forma pode-se definir um valor específico relativo a mão de obra

φt = VA/T (valor agregado sobre o total de dia-homem durante o ano) (13)

A Renda Agrícola deve ser expressa por:

Ra = VA – S – I – J – RT; (14)a

Ra = PB – CI – D + Sub – S – J – RT, (14)b

S representando os salários, I os impostos, J os juros, RT a renda da terra (arrendamentos) e Sub, os subsídios.

3.5 - TIPOLOGIA DOS AGRICULTORES FAMILIARES COM BASE NA RENDA

Para se definir a tipologia dos agricultores familiares brasileiros no estudo de Guanziroli et al. (2001) tomou-se como critério básico de estratificação do universo familiar a variável de corte renda total. Os tipos de agricultores familiares foram discriminados com base na diária média estadual pois, segundo seus autores, “ao se optar por um valor para cada unidade da federação, procurou-se garantir a compatibilidade dos valores estabelecidos regionalmente, reduzindo assim as possíveis distorções analíticas decorrentes da variabilidade dos níveis de remuneração e renda entre os Estados brasileiros”. Ao valor da diária média estadual foram acrescidos 20%, multiplicando-se o resultado pelo número de dias úteis do ano (calculado no referido estudo em 260), obtendo-se o Valor do Custo de Oportunidade (VCO). Dessa forma, o VCO foi o “valor limítrofe para a classificação dos tipos de agricultores familiares para cada Estado da federação, de acordo com a sua diária média estadual”. De acordo com essa metodologia, seus autores encontraram quatro tipos de agricultores familiares brasileiros:

1o) Tipo A, com renda total superior a três vezes o valor do VCO; 2o) Tipo B, com renda total superior a uma vez até três vezes o VCO; 3o) Tipo C, com renda total superior à metade até uma vez o VCO; 4o) Tipo D, com renda total igual ou inferior à metade do VCO.

A adoção da diária média estadual como base de cálculo-referência para a classificação dos agricultores familiares brasileiros, visando reduzir distorções analíticas, criou, em contrapartida, um “estamento” paradoxal, em que um agricultor familiar para ser do Tipo A no Ceará ou da Bahia basta ter uma renda total anual superior a R$ 3.959,28, enquanto que um outro agricultor familiar desse mesmo Tipo A em Santa Catarina precisa ter uma renda total anual superior a R$ 9.481,68.

3.6 - ANALISE DE DESEMPENHO DA ATIVIDADE AGROPECUÁRIA, SEGUNDO COSTA (2005, INFORMAÇÕES PESSOAIS)

Para ponderar a participação dos sistemas agrícolas segundo o número de estabelecimentos, as terras apropriadas, o pessoal ocupado e o valor da produção agropecuária para cada categoria de agente produtivo (camponês, empresário e fazenda), Costa (2000) classificou tais sistemas em função da sua posição relativamente à média do valor da produção bruta VPB do Município.

Na presente análise, os sistemas de produção agropecuários do Município foram definidos a partir da composição do valor bruto da produção (VBP) gerado pelos principais grupos de culturas e atividades apresentados no Censo Agropecuário, quais sejam, as culturas temporárias (“Tmp”) e permanentes (“Prm”), a pecuária de grande (“PGrd”) e pequeno (“PPeq”) porte, a horticultura (“Hort”) e o extrativismo (“Ext”).

Ao final, foram obtidos cinco padrões, ou conjuntos, contendo cada um deles cinco sistemas produtivos sob análise, ordenados em função dos respectivos desempenhos frente a referida media:

(1o) Ext-PGrd+PPeq+Prm+Tmp-, (2o) Ext-PGrd-PPeq+Prm+Tmp-,

(3 ) Ext-PGrd-PPeq+Prm-Tmp-, (4o) Ext-PGrd-Ppeq-Prm+Tmp+, e (5o) Ext-PGrd-Ppeq-Prm+Tmp-.

Os instrumentos analíticos de Costa são considerados complementar aos resultados obtidos através das análises dos dados primários: Enquanto os instrumentos daquele autor têm mais a ver com a gestão ampliada, mais organizacional, as análises dos dados primários adequam-se à gestão mais interna.

4 SEÇÃO IV – PESQUISA DE CAMPO: PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS E