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4. POTENCIAL ENERGÉTICO DO PROCESSO DE PIRÓLISE APLICADO AO

4.3.2. Segunda etapa: Simulação de cenários

No presente trabalho, em cada configuração desenvolvida, foi avaliado o potencial de geração de energia elétrica do processo aplicado ao tratamento de RSU de duas formas distintas: a partir do calor gerado no processo pelo fluido térmico circulante, utilizando o ciclo orgânico de Rankine, bem como através do encaminhamento do produto carbonizado para uma central termoelétrica, para utilização em substituição aos combustíveis tradicionais. A Figura 37 apresenta o fluxograma para a primeira configuração proposta para a planta de pirólise, para atendimento a um município com 10 mil habitantes.

Na primeira configuração, integrou-se um módulo ORC (Organic Rankine Cicle) a uma planta de pirólise, possibilitando assim a geração de energia a partir da troca de calor do fluido térmico com o fluido orgânico do módulo ORC, para o auto suprimento de energia elétrica da planta. O cenário contempla o aproveitamento do excedente de energia térmica no trecho percorrido pelos gases de exaustão entre a serpentina de fluido térmico e as torres de lavagem de gases posicionadas antes do duto de lançamento (chaminé). O prolongamento da tubulação de fluido térmico poderá suprir a energia necessária para vaporização do fluido orgânico no trocador de calor do módulo ORC. Os combustíveis utilizados na planta de pirólise são biomassa, em forma de cavacos de madeira (eucalipto) e o próprio RUC produzido na planta, com a combustão sendo realizada em uma fornalha, em conjunto com os gases de pirólise.

O módulo ORC é composto de um trocador de calor (fluido térmico/fluido orgânico), uma turbina, um condensador e uma bomba, sendo assim possível a conversão de calor excedente em eletricidade. Diferente do ciclo de Rankine convencional, o ORC utiliza um fluido orgânico de alta massa molecular em que a transição líquido-vapor ocorre a uma temperatura menor do que a da água. Isso permite que o módulo funcione em temperaturas e pressões inferiores às temperaturas e pressões usuais, quando o fluido utilizado é a água.

Na segunda configuração, foi avaliado o potencial de geração de energia elétrica de uma planta de pirólise tratando os RSU gerados em um município com 30 mil habitantes. O RUC produzido na planta de pirólise é destinado como combustível à geração de energia elétrica em uma termoelétrica, em local distinto da planta de pirólise. O combustível auxiliar a ser utilizado na planta consiste de biomassa na forma de cavacos de madeira (eucalipto). A modificação proposta da configuração 1 para a configuração 2 consiste apenas na substituição do módulo ORC que foi integrado à planta na configuração 1 por mais dois reatores de pirólise, mantendo-se os outros componentes da planta sem alterações nos dimensionamentos, apesar do aumento da capacidade de processamento de RSU da planta. A Figura 38 apresenta o fluxograma para a segunda configuração proposta para a planta de pirólise, para atendimento a um município com 30 mil habitantes.

Para os cálculos de combustão de biomassa, gases não condensáveis da pirólise de RSU e resíduo urbano carbonizado (RUC) utilizou-se o software AComb 5, desenvolvido pelo Instituto de Pesquisas Tecnológicas – IPT.

4.4. Resultados e discussão

4.4.1. Caracterização do RUC quanto aos parâmetros da legislação internacional para utilização do produto como RDF

O produto obtido apresentou-se em forma de material orgânico carbonizado. O rendimento gravimétrico obtido no processo de pirólise foi de 33%, considerando-se os dois ciclos de produção de RUC. A Tabela 21 apresenta os resultados obtidos com a análise do resíduo urbano carbonizado (RUC) produzido nos ensaios na planta de pirólise.

Tabela 21 – Parâmetros analisados no RUC

Parâmetro Unidade Resultado

Umidade % 3,8

Poder Calorífico Superior MJ.kg-1 25,5

Poder Calorífico Inferior MJ.kg-1 24,7

Enxofre % m/m 0,15 Manganês % m/m 0,02 Alumínio % m/m 0,25 Cloro mg.kg-1 < 5,20 Chumbo mg.kg-1 76,8 Cobre mg.kg-1 39,8 Cromo mg.kg-1 21 Níquel mg.kg-1 7,3 Arsênio mg.kg-1 < 1 Cádmio mg.kg-1 1,41 Mercúrio mg.kg-1 < 0,05

De acordo com o Relatório Final da Comissão Européia sobre RDF (EUROPEAN COMISSION, 2003), Itália e Finlândia são países membros da comunidade européia que estabelecem padrões de qualidade tabelados para utilização de RDF como combustível auxiliar, em substituição a combustíveis fósseis, em processos industriais. A Tabela 22 apresenta os limites estabelecidos para qualidade dos RDF produzidos na Itália.

Tabela 22 – Parâmetros de qualidade para RDF na Itália

Parâmetro Valor Limite

Umidade 25%

Poder calorífico > 15 MJ.kg-1

Cinzas 20% (em massa)

Cloro 0,9% (em massa)

Enxofre 0,6% (em massa)

Chumbo 200 mg.kg-1 Cobre 300 mg.kg-1 Manganês 400 mg.kg-1 Cromo 100 mg.kg-1 Níquel 40 mg.kg-1 Arsênio 9 mg.kg-1 Cádmio e Mercúrio 7 mg.kg-1

A Tabela 23 apresenta os limites estabelecidos para qualidade dos RDF produzidos na Finlândia.

Tabela 23 - Parâmetros de qualidade para RDF na Finlândia(1)

Parâmetro Unidade Precisão da

análise Classe de qualidade I II III Cloro % m/m 0,01 < 0,15 < 0,50 < 1,50 Enxofre % m/m 0,01 < 0,20 < 0,30 < 0,50 Nitrogênio % m/m 0,01 < 1,00 < 1,50 < 2,50 Sódio e potássio (5) % m/m 0,01 < 0,20 < 0,40 < 0,50 Alumínio % m/m 0,01 (2) (3) (4) Mercúrio mg.kg-1 0,1 < 0,1 < 0,2 < 0,5 Cádmio mg.kg-1 0,1 < 1,0 < 4,0 < 5,0

1) O valor limite é referente a uma quantidade de combustível menor ou igual a 1000 m³ ou quantidade de combustível produzida ou entregue durante um mês, e ele deve ser verificado pelo menos na freqüência mensal 2) Alumínio metálico é aceito dentro dos limites de precisão da análise (resultado censurado)

3) O alumínio metálico é removido por separação na fonte e pelo processo de produção do combustível 4) A concentração de alumínio metálico pode ser estabelecida previamente

5) Concentração total (K+Na) solúvel em água em massa proporcional à base seca.

Comparando-se os resultados obtidos com as análises da amostra do RUC na Tabela 21 com os parâmetros de qualidade estabelecidos para RDF na Itália (Tabela 22) observa-se que todos os parâmetros avaliados encontram-se em conformidade com os limites estabelecidos na norma italiana. Na comparação com os limites estabelecidos para RDF na Finlândia (Tabela 23), observa-se que os resultados obtidos para alumínio e cádmio encontram-se em conformidade apenas para as classes de qualidade II e III de RDF. Em relação aos outros parâmetros analisados, os resultados encontram-se em conformidade com os limites das três classes de qualidade de RDF da Finlândia.

Apesar da amostra obtida de RUC nos ensaios realizados não poder ser considerada representativa, frente à heterogeneidade dos RSU produzidos e do reduzido número de amostras produzidas, a comparação entre os resultados obtidos nas análises do RUC produzido na planta com os parâmetros de qualidade para RDF em países europeus pode ser tratada como uma simulação de um lote de produto. De qualquer forma, a proposta de se utilizar um produto proveniente do processamento térmico de resíduos de composição heterogênea, como os RSU, impõe critérios de verificação de qualidade por lote de produto, de maneira similar ao critério adotado na Finlândia para combustão de RDF.

Outro critério a ser observado diz respeito ao controle das emissões atmosféricas provenientes da combustão do RUC. Para as fontes estacionárias elegíveis para combustão desse novo modal energético, no caso da proposta apresentada, as termoelétricas, terão que

ser observados novos parâmetros para controle das emissões, frente ao risco potencial de formação de poluentes diferentes daqueles formados na queima dos combustíveis tradicionais. Em Minas Gerais, a deliberação normativa COPAM Nº 187 (COPAM, 2013) estabelece as condições e os limites máximos de emissão de poluentes atmosféricos para as diversas fontes fixas relacionadas. No anexo I da referida deliberação normativa encontram-se relacionados os limites dos poluentes atmosféricos nas emissões provenientes dos processos de geração de calor a partir da combustão externa de óleo combustível, gás natural, biomassa de cana de açúcar ou de beneficiamento de cereais e derivados de madeira. No anexo II, encontram-se relacionados os limites dos poluentes atmosféricos nas emissões provenientes de turbinas geradoras de energia elétrica movidas a gás natural ou a combustíveis líquidos, em ciclo simples ou combinado. Os poluentes atmosféricos relacionados nos dois anexos são: material particulado, óxidos de nitrogênio, óxidos de enxofre e monóxido de carbono.

Para a combustão de RUC em plantas de geração de energia termoelétrica, uma alternativa para o estabelecimento de critérios para adoção de limites de poluentes seria a adoção dos mesmos limites estabelecidos na resolução CONAMA nº 316 (CONAMA, 2002), a qual estabelece procedimentos e critérios para o funcionamento de sistemas de tratamento térmico de resíduos. Além dos poluentes atmosféricos listados na deliberação normativa COPAM Nº 187 (COPAM, 2013), a resolução CONAMA nº 316 determina o controle dos seguintes parâmetros:

 Cádmio e seus compostos, medidos como cádmio (Cd);  Mercúrio e seus compostos, medidos como mercúrio (Hg);  Tálio e seus compostos, medidos como tálio (Tl);

 Arsênio e seus compostos, medidos como arsênio (As);  Cobalto e seus compostos, medidos como cobalto (Co);  Níquel e seus compostos, medidos como níquel (Ni);  Telúrio e seus compostos, medidos como telúrio (Te);  Selênio e seus compostos, medidos como selênio (Se);  Antimônio e seus compostos, medidos como antimônio (Sb);  Chumbo e seus compostos, medidos como chumbo (Pb);  Cromo e seus compostos, medidos como cromo (Cr);

 Cianetos facilmente solúveis, medidos como Cianetos (CN);  Cobre e seus compostos, medidos como cobre (Cu);

 Fluoretos facilmente solúveis, medidos como flúor (F);  Manganês e seus compostos, medidos como manganês (Mn);  Platina e seus compostos, medidos como platina (Pt);

 Paládio e seus compostos, medidos como paládio (Pd);  Ródio e seus compostos, medidos como ródio (Rh);  Vanádio e seus compostos, medidos como vanádio (V);

 Compostos clorados inorgânicos, medidos como cloreto de hidrogênio;  Compostos fluorados inorgânicos, medidos como fluoreto de hidrogênio;  Dioxinas e Furanos, expressos em TEQ (total de toxicidade equivalente).

Além do controle desses poluentes, um critério relevante determinado pela resolução CONAMA nº 316 (CONAMA, 2002) é o monitoramento contínuo das concentrações de monóxido de carbono e oxigênio, parâmetros fundamentais para o controle da combustão.

No Brasil, a legislação ambiental é omissa em relação à qualidade de combustíveis derivados de resíduos, verificando-se o estabelecimento de limites apenas para as emissões atmosféricas provenientes de fontes estacionárias diversas. Em Minas Gerais, a atividade de coprocessamento de resíduos em fornos de clínquer é regulamentada pela deliberação normativa COPAM nº 154/2010 (COPAM, 2010), a qual estabelece limites para alguns parâmetros de qualidade dos resíduos a serem coprocessados. Não se verifica, na legislação, outra forma de regulamentação para substituição de combustíveis, bem como o uso de combustíveis derivados de resíduos como combustíveis auxiliares.

A utilização do RUC em centrais termoelétricas depende portanto de regulamentação específica no Brasil, para que se possibilite a utilização do produto como um novo modal energético, em substituição aos combustíveis tradicionais.

4.4.2. Simulação de cenários para plantas de tratamento de RSU por pirólise com