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Mapa 3 Territorialidades e conflitos socioambientais em Itacuruba – PE

3.3 SEGUNDO ESPAÇO-TEMPO: terras tradicionalmente inundadas

Fonte: Povo indígena Tuxá Campos.

O que problematizo como terras tradicionalmente inundadas faz referência ao que na literatura antropológica conceitua-se como terras tradicionalmente ocupadas, para compreender os processos de territorialização de movimentos sociais que expressam uma diversidade de formas de existência coletiva em suas relações com os recursos da natureza,

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estando entre estes, grupos sociais que notadamente incorporam fatores étnicos na forma de organização social e de encaminhamento de demandas aos poderes públicos.

Os novos limites territoriais que cada grupo irá estabelecer num espaço compulsoriamente reconfigurado pela ação da Barragem de Itaparica será um dos grandes propulsores dos conflitos que se referem à sobreposição de áreas, como também de interesses diferentes sobre tais áreas, conflitos que irão permear as novas relações dos complexos étnicos na nova Itacuruba.

Parte dos conflitos é canalizada por instituições e relações de agenciamento, engendrados num ininterrupto contexto de descaso planejado ao qual se situam os agentes sociais desde a chegada do Sistema Itaparica. O Estado, principal estimulador dos desajustamentos sociais para os povos e comunidades tradicionais, mantém uma postura ignorante e desatenciosa quanto à compreensão dos conflitos que configuram os complexos étnicos na nova Itacuruba, reduzindo-os a uma leitura de “briga de índio com quilombola”, tensionando gradativamente as relações, sem direcionar medidas efetivas de reparação aos danos por ele ocasionados.

A inundação dos territórios tradicionalmente ocupados por esses grupos corresponde a um drama social e a uma série de consequências que, em Itacuruba, sinalizam-se nos dados da saúde coletiva: altas taxas de sofrimento mental e suicídio. Em outra direção, o momento posterior ao realocamento forçado será de criativas reordenações sociais e mecanismos de sobrevivência, é nesse contexto que se insere uma sublevação étnica em Itacuruba que passa a configurar-se ainda no início dos anos 2000, e que se estende aos dias atuais.

Meu argumento é de que a emergência étnica em Itacuruba irá se configurar como um “fato social total”, no sentido Maussiano (2003, p. 187):

Existe aí um enorme conjunto de fatos. E fatos que são muito complexos. Neles, tudo se mistura, tudo o que constitui a vida propriamente social das sociedades que precederam as nossas – até às da proto-história. Nesses fenômenos sociais „totais‟, como nos propomos chamá-los, exprimem-se, de uma só vez, as mais diversas instituições: religiosas, jurídicas e morais – estas sendo políticas e familiares ao mesmo tempo –; econômicas – estas supondo formas particulares da produção e do consumo, ou melhor, do fornecimento e da distribuição –; sem contar os fenômenos estéticos em que resultam estes fatos e os fenômenos morfológicos que essas instituições manifestam.

Refiro-me à totalidade do processo de etnização nessa região não somente em razão da inteira reconfiguração socioespacial em que os grupos percorrem na nova Itacuruba, mas também porque na antiga cidade, nenhum desses fora reconhecidos enquanto grupos étnicos no processo de reassentamento, fazendo com que nesse segundo espaço-tempo a etnização

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aglutine uma série de fatos sociais que reordena totalmente as relações sociopolíticas após a Barragem de Itaparica.

A estrutura que a gente tinha na época da velha cidade não existia ainda grupos formais, como índio nem quilombola, a gente vivia assim de uma forma geral. Ninguém era reconhecido enquanto índio, ninguém era reconhecido enquanto quilombola, mas a gente tinha as nossas culturas, as nossas tradições.

(Valdeci Ana - Quilombo Poço dos Cavalos, em entrevista realizada em Itacuruba em 31 jul. 2018).

O único grupo indígena brasileiro diretamente atingido pela Barragem de Itaparica foi o dos Tuxá, de Rodelas, na Bahia, totalizando 1.200 pessoas, ou seja, cerca de 3% do total atingido. Acima do nível de inundação, mas também muito próximo à área, e com locais sagrados no próprio rio, os índios Pankararu também sentiram seus efeitos. Em algumas poucas ilhas do Rio São Francisco e nas margens do rio, comunidades negras cujas origens remontavam aos tempos de escravos fugidos, ainda conservavam uma identidade própria e, apenas posteriormente se tornaram referências para a atuação dos grupos de quilombolas na região. Mas a grande maioria da população, em geral, não se percebia etnicamente diferenciada de modo a conseguir estabelecer uma base para distintas identidades internas à área. Foi sua localização na beira do rio que criou uma diferenciação socio-ecológica entre elas: „os beiradeiros‟ e os outros, „os caatingueiros‟ das terras secas do interior. Internamente, as distinções mais frequentemente reconhecidas eram as de origem por comunidade e por propriedade agrícola. Assim, algumas comunidades se denominavam „Fazenda...‟, enquanto outras não carregavam nenhum nome de propriedade específica. A população estava bastante dispersa nos sete municípios, e as pessoas se identificavam, sobretudo, através de suas comunidades de residência (SCOTT, 2009, p. 63-4).

Em Itacuruba podemos ver expressivamente o movimento histórico que compreende desde um processo integracionista desses grupos étnicos a categorias mais genéricas de agricultores, trabalhadores rurais, e, posteriormente de reassentados e atingidos por barragem; a um momento sociopolítico favorecido pelos dispositivos constitucionais de 1988, que reconhece povos e comunidades tradicionais e os atributos identitários e de autodefinições, estabelecidos e vistos por seus próprios membros como uma unidade social peculiar, constituída por um processo histórico e uma tradição inventada, e não unicamente uma comunidade camponesa analiticamente definida.

A “tradição inventada” refere-se ao que Hobsbawm (1984) afirma em que certamente as tradições são verdadeiras, embora inventadas e, em linha geral, expressam uma identidade política construída em determinada situação histórica. O que faz com que esses grupos sejam

não apenas e tão somente grupos étnicos, mas, sobretudo, unidades de mobilização87, o que

reforça a ideia de que o acesso aos direitos sociais, sobretudo ao território, se dá não apenas através das estruturas intermediárias do grupo étnico – dos grupos de parentes, da família, do

87 Considero significativa a ideia de unidades de mobilização de Almeida (2004) por considerar a aglutinação de

interesses específicos de grupos sociais não necessariamente homogêneos, que são aproximados circunstancialmente pelo poder nivelador do Estado ou de ações por ele incentivadas ou empreendidas, tais como as chamadas obras de infraestrutura.

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povoado ou da aldeia –, mas também por certo grau de coesão e solidariedade obtido em face de antagonismos e em situações de extrema adversidade e de conflitos (ALMEIDA, 2004).

É importante sublinhar esse movimento de integração dos grupos étnicos ao rótulo de trabalhadores rurais para entender como se desemboca o processo de luta por direitos específicos e diferenciados que ressaltam a distinção étnica. Considero que o fato destes não terem sido tratados a partir de uma sócio distinção no processo de reassentamento, levando-os a serem realocados apenas e simplesmente como agricultores, favoreceu com que os grupos familiares, e consequentemente os povos e comunidades tradicionais, se repartissem em diferentes projetos oferecidos pela CHESF.

Quadro 3 – Separação das famílias dos povos e comunidades tradicionais de Itacuruba

Fonte: o autor.

Mesmo que existissem destinos comuns, as unidades familiares que compõem hoje os povos e comunidades tradicionais em Itacuruba estavam esfaceladas nos diferentes destinos e

projetos após o drama social ao qual foram submetidas. É um período de delay88 entre as

88 Expressão que indica a diferença de tempo entre o recebimento e o envio de um sinal.

SEPARAÇÃO DAS FAMÍLIAS DOS POVOS E COMUNIDADES TRADICIONAIS DE ITACURUBA

Povos e Comunidades Tradicionais Destino das famílias separadas Povo Indígena

Pankará no Serrote dos Campos Nova Itacuruba (PE); Projeto Brígida (Orocó – PE); Projeto Caraíbas (Sta. Mº da Boa Vista – PE).

Tuxá Campos Ibotirama (BA); Rodelas (BA); Nova Itacuruba (PE); Curaça; Pirapora (MG); Banzaê (BA).

Tuxá Pajeú

Inajá (PE); Projeto Brígida (Orocó – PE); Projeto Caraíbas (Sta. Mº da Boa Vista – PE); Projeto Fulgêncio

(Sta. Mº da Boa Vista – PE); Remanso (BA); Pedra Branca (BA); Floresta (PE); Belém do São Francisco

(PE); Petrolina (PE).

Comunidade Quilombola

Negros de Gilu Nova Itacuruba (PE); Xique-Xique (BA); Jeremoabo (BA); Petrolina.

Poço dos Cavalos

Vila de Nossa Sra. Aparecida em Remanso (BA); Ibotirama (BA); Projeto Brígida (Orocó – PE); Projeto Caraíbas (Sta. Mº da Boa Vista – PE); Projeto Maniçoba;

Projeto Pedra Branca.

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temporalidades dos grupos sociais e as políticas de reconhecimento identitário, que passam a existir, concomitantemente, a partir de 1988.

[Perguntei, em seguida, se a Barragem de Itaparica implicou em alguma outra relação ou articulação entre os grupos que hoje conhecíamos. Repeti o que ela havia me colocado mais cedo de que, naquele período, os grupos não eram reconhecidos tendo em vista que juridicamente não existia a possibilidade de tal feito. Perguntei em seguida no que a Barragem implicou para os grupos hoje].

Pronto... o que implicou, principalmente na questão da identidade desse povo que hoje é reconhecido. Aí de que forma? Alguns perderam seus territórios totalmente, onde dificulta sua forma de viver, de desenvolver sua cultura. Outros perderam pela metade e as famílias se dividiram. Então, o que acontecia na comunidade com aquele grupo grande... então os mais velhos se foram para outros municípios, então a cultura deixou de acontecer. O que pra nós, cada um tinha o seu pedacinho, num era o pedaço próprio da terra, mas aquele senhor que dizia: „pronto tá aqui! tá alugado, tá arrendado‟. E aí a gente fazia, desenvolvia nossa cultura. Hoje a gente não dança mais, por exemplo, Poço dos Cavalos não dançou mais o toré. Por que não dançou mais o toré? Porque a família ficou dividida e os mais velhos que sabiam é o que estão em outros territórios e hoje, a gente tenta resgatar toda essa história. Toda essa questão de tentar, novamente, desenvolver nossas atividades.

(Valdeci Ana - Quilombo Poço dos Cavalos, em entrevista em Itacuruba em 31 jul. 2018).

Compreendo, então, que o agenciamento da identidade étnica em Itacuruba é um processo de ajuste desse delay e uma resposta ao processo de descaso planejado. Nesse sentido, é um fato social total por reportar, justamente, ao conglomerado de assédios resignados desde o caminho da boiada ao fluxo do Rio São Francisco, que, planejados a partir de uma perspectiva desenvolvimentista, foram ao longo de todo o primeiro espaço-tempo congregando diversas formas de violências aos povos e comunidades tradicionais nessa região, sendo a UHE Itaparica uma desses danos. A Central Nuclear do Nordeste, nessa direção, já se apresenta de forma perversa à mesma população:

[Perguntei onde foi veiculada a notícia de que em Itacuruba seria instalada a central nuclear. Adriano disse que teria sido em um blog e que tinha tido repercussão por terem chamado as pessoas de „almas‟, já que tal termo já dá a sensação de que estão mortos. Todos riram na hora e José Jailton olhou pra mim e disse: „é cada coisa, né?‟. Supondo, comentei: „e se fosse necessário outro realocamento?‟].

José Jailton: Aí meu Deus, quer matar o resto?

Grosso complementa: O que eu mais sinto hoje é eu não voltar ao local de minha origem, onde vivi minha infância. E hoje acontecer novamente, pra mim é um impacto que eu não sei não...

[Grosso fala da tristeza que é não poder voltar à sua infância, o lugar onde correu, brincou, e se acontecesse o processo de saírem novamente para procurar outro lugar, eles ficariam „sem chão‟. José Jailton diz preferir a morte a ser reassentado novamente. Disseram, ainda, que o Governo os trata como retirantes, coloca aqui e sai, coloca ali e sai. Fala que se a usina nuclear chegar eles perdem tudo. E que é uma dor muito grande].

(Adriano João, José Jailton e Manoel Francisco Alves (Grosso) - Povo Tuxá Pajeú, em entrevista realizada em Itacuruba em 28 jul. 2018).

No processo da pesquisa, pude registrar no caderno de campo bem como observar variadas formas de violência: a construção do novo município longe do Rio e também da

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rodovia federal; a disponibilidade de um lago de águas paradas para a população reassentada, ao invés do rio de águas correntes como era antes; a impossibilidade de trabalho na

agricultura, em razão da infertilidade do solo na nova cidade89; o insucesso dos projetos de

lotes irrigados da CHESF; a produção de uma ociosidade e a extinção das VMTs sem um planejamento sistemático de assistência à população reassentada; a poluição da água devido aos projetos de criação de peixes em tanque-rede; entre tantas outras belicosas situações observadas a olho nu, quando visita-se o município que hoje depende quase que exclusivamente dos empregos temporários na Prefeitura Municipal e de um comércio local, que não dispõe de força econômica para gerar renda aquela população.

Entendo que a separação das famílias é o efeito mais perverso, justamente por desestruturar a dimensão afetiva dos indivíduos e impossibilitar uma reestruturação social saudável. Das pessoas em Itacuruba, de maneira geral, tiraram o direito de escolherem os seus próprios destinos bem como de se reestabelecerem, por não ter as condições materiais, afetivas e sociais necessárias para tal. A separação das famílias, no âmbito dos complexos étnicos em Itacuruba, é o espelho da nequícia do megaprojeto energético consorciado pelo Estado. Por outro lado, é a reconfiguração de um projeto de futuro compartilhado por essas famílias que possibilitará uma série de emergências de movimentos sociais que incorporarão fatores étnicos para a reordenação social na nova Itacuruba.

Num panorama histórico, o desponte desse movimento começa ainda na década de 1990, quando treze famílias de Negros de Gilu reassentadas em Jeremoabo, retornam para a nova Itacuruba, entre 1993 e 1998. Dona Gilu, que se encontrava reassentada na casa de sua filha, em Floresta, voltou à Itacuruba para juntar-se a eles, com essa atitude, o etnônimo Gilu ganhou força ao se associar ao início do processo de reconstrução do grupo e da retomada da identidade, como diz-nos Bezerra (2006).

Um novo processo de territorialiazação é realizado pelos Negros de Gilu, agora em um novo espaço, o Alto da Caixa D‟água, bem como em um novo contexto social. Esse é o gargalo do movimento de agenciamento da identidade étnica em Itacuruba: se convencionalmente o processo de reconhecimento étnico segue na direção de insurgência de lutas pela garantia da posse ou titulação dos territórios tradicionalmente ocupados, em Itacuruba se dá na luta por uma (re) territorialização, no contexto dos territórios tradicionalmente inundados. O direito ao território apresenta-se como a pauta prioritária dos

89 Barbosa Neto et. al. (2015) aponta que os solos do município estão vulneráveis à degradação, pois predomina

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povos e comunidades tradicionais, justamente por ser essa a possibilidade que os grupos têm para reorganizarem as vidas.

No ano 2000, as orientações acerca do direito constitucional e da necessidade de ingressar no movimento nacional de articulação dos quilombolas representaram a tábua de salvação, no momento crítico de grandes ameaças às famílias Gilus e à perpetuação do grupo étnico. Mais cedo ou mais tarde, o direito constitucional de titulação territorial teria chegado ao conhecimento dos Gilus, mesmo se não houvesse existido a Hidrelétrica, mas a formação do lago e o consequente abandono compulsório das antigas terras fizeram com que os Gilus se inserissem de imediato no movimento quilombola estadual e nacional, na luta pela emergência étnica e pela titulação do território. Se os Gilus perderam o território de uso comum na antiga Itacuruba para a Hidrelétrica, há que lutar pela (re) territorialização, que lhes dê a condição de autossuficiência produtiva coletiva, sem submissão aos proprietários da terra. O território coletivo, presumido como de direito, entrou na pauta das prioridades e das lutas do grupo (BEZERRA, 2006, p. 69).

Considero instigante a afirmação de Bezerra (2006) de que mais cedo ou mais tarde a informação do direito constitucional chegaria aos Gilus, mesmo se não houvesse a UHE de Itaparica. Longe de trabalhar com hipóteses, entendo que, a partir do panorama histórico apresentado, os povos e comunidades tradicionais em Itacuruba tinham potencialidades de emergências étnicas quando fora reconhecido o direito constitucional em 1988, mas a dessincronização temporal e espacial provocada pelo Estado acarretou em uma série de desajustamentos que até hoje refletem no plano das relações cotidianas de tais grupos.

Em 2002, Negros de Gilu fundam uma associação quilombola no intuito de serem

representados jurídica, política, social e culturalmente90. Esse momento revela-se como um

divisor de águas não só para os negros aquilombados de Gilu, mas para toda uma população étnica que passa a enxergar as possibilidades de acesso a direitos juridicamente assegurados. Existe todo um processo de ebulição da emergência étnica a partir do movimento de reagrupamento familiar, que possibilitará com que esses acessem ou contatem instituições e agências para elucidarem informações e, certamente, de prestarem assistência no difícil processo de acesso aos direitos específicos e diferenciados. É o caso de Negros de Gilu, quando acionam a FCP, ou do contato de Poço dos Cavalos e Ingazeira com a Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial.

Poderemos visualizar as potencialidades e problemas dos trabalhos das instituições de agenciamento nessa região analisando, por exemplo, a atuação posterior do CIMI e da CPT, que irá repercutir em relações de interação e conflito com os grupos, ou na provocação de tensões entre estes. Notam-se tais conflitos, sobretudo, nas discussões referentes à questão territorial, seja no plano local de disputas por território em áreas que existem sobreposições,

90 Para a titulação e posse de um território quilombola a mesma tem que estar juridicamente organizada e

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seja em outra esfera, a exemplo da disputa dos grupos com o empreendimento energético proposto para o município.

A partir do momento que Negros de Gilu deflagra um processo de politização identitária do grupo materializa a potencialidade de emergência dos outros, que na perspectiva do acesso aos direitos sociais específicos instauram uma rede de emergências quilombolas no município. É nesse campo que Ingazeira e Poço dos Cavalos deflagram, concomitantemente, seus processos de emergência étnica no ano de 2004. Ingazeira nas margens da BR 316, a 25

km da sede municipal da nova Itacuruba91, e Poço dos Cavalos num território que compõe a

Fazenda Pereiro, o Pau Caído, o Coité, a Lagoa Cercada e o Riacho do Caruá.

Interessante ressaltar que a comunidade quilombola Poço dos Cavalos – que em 2019 registrava um número de aproximadamente 181 famílias, divididas na zona urbana e rural da nova Itacuruba – tem uma peculiar relação com a comunidade de Ingazeira, seja de uma memória comum do trabalho na Fazenda Fortaleza, seja do período simultâneo em que essas se organizam etnicamente; Assim como tem uma singular relação com as famílias que passarão, em 2006, a reconhecer-se como indígenas Pankará, incluindo pessoas que antes integravam a comunidade quilombola.

91 A problematização da localização geográfica em que está a comunidade quilombola de Ingazeira será

importante para entender a ausência ou distância desta nos movimentos organizados em Itacuruba, entre eles as mobilizações antinucleares. As dinâmicas dessa comunidade se darão sobremaneira no município de Floresta, com quem faz divisa geográfica, estando a poucos quilometros de seu centro urbano. Há que ressaltar que a comunidade ainda faz divisa geográfica com o município de Belém de São Francisco, o que complexifica ainda mais as relações territoriais e de acesso à políticas públicas. A distância de Ingazeira das atividades municipais de Itacuruba dificultou o acesso a esta no período da pesquisa de campo, o que me impossibilitou de realizar análises mais aprofundadas da conformação dessa comunidade e da importância da mesma no campo dos complexos étnicos.

Figura 3 – Sítio da comunidade quilombola Poço dos Cavalos

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Os Pankará em Itacuruba irão se territorializar em uma área que abrange o Serrote dos Campos e suas proximidades, sendo território vizinho ao de Poço dos Cavalos, o que provocará conflitos entre esses grupos no momento de delimitações das fronteiras territoriais de cada um. Por outro lado existe uma intrínseca relação entre estes, vista por exemplo quando quilombolas em determinados momentos se reconhecem como quiloíndios, a exemplo de Evanildo, liderança quilombola, que trabalha suas correntes religiosas nos rituais indígenas dos Pankará. Os quiloíndios de Poço dos Cavalos, num caminho paralelo, irão estabelecer uma relação afetiva, de solidariedade e apoio político ao grupo indígena que, em 2016,

deflagrará seu processo de partogênese92, os Tuxá Campos, nas Fazendas Malagueta, Inveja e

Cachoeirinha.

Figura 4 - Entrada da área de retomada dos Tuxá Campos, ao fundo da

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