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A segurança como um desígnio do Estado

2.1. Conceito de segurança interna

“É clássico considerar que a existência do Estado se justifica para atingir três grandes fins últimos: bem-estar, justiça e segurança”

(Alves A., 2008, p. 49).

O Estado é uma entidade soberana que não encontra “ (…) igual ou semelhante na ordem interna nem superior na ordem supranacional ou internacional” (Bodin apud Fontes, 2010, p. 22). Enquanto estrutura máxima no interior de um território, é também sua a incumbência de garantir a segurança, ou seja, permitir a convivência pacífica entre os cidadãos e evitar perturbações à ordem e à tranquilidade públicas, estabelecendo, para o efeito, um conjunto de regras, bem como mecanismos de correção para quem o infringe (Dias M., 1998) e (Dias M., 2001).

O conceito de segurança interna “(…) é relativamente recente, quer na legislação, quer na jurisprudência quer na doutrina” (Dias M., 1998, p. 207). Este apenas terá surgido pela primeira vez na nossa Constituição após a revisão constitucional de 19827 e surge na LSI como “(…) a actividade desenvolvida pelo Estado para garantir a ordem, a segurança e a tranquilidade públicas, proteger pessoas e bens, prevenir e reprimir a criminalidade e contribuir para assegurar o normal funcionamento das instituições democráticas, o regular exercício dos direitos, liberdades e garantias fundamentais dos cidadãos e o respeito pela legalidade democrática”8

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Para levar a cabo esta atividade, o Estado socorre-se da polícia9. A Polícia é “(…) um modo de actuar da autoridade administrativa que consiste em intervir no exercício das actividades individuais susceptíveis de fazer perigar interesses gerais, tendo por objecto evitar que se produzam, ampliem ou generalizem os danos sociais que as leis procuram

7 Cfr. o disposto na Lei Constitucional n.º 1/82, de 30 de setembro. 8

Vide o previsto no art.º 1.º, n.º 1, da Lei n.º 53/2008, de 29 de agosto. 9 Vide o previsto no art.º 272.º, n.º 1, da CRP.

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prevenir” (Caetano, 2008, p. 1150). Em Portugal, entre as polícias, forças e serviços de segurança com responsabilidades pela segurança interna10, encontramos a GNR, que tal como consta da sua própria Lei Orgânica11, tem por missão “(…) no âmbito dos sistemas nacionais de segurança e protecção, assegurar a legalidade democrática, garantir a segurança interna e os direitos dos cidadãos, bem como colaborar na execução da política de defesa nacional, nos termos da Constituição e da lei”.

2.2. Políticas públicas de segurança

“Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades (…)” (Camões, 2002, p. 48)

Ao longo das últimas décadas, uma acelerada evolução da realidade social e criminal portuguesa fez repensar as questões da segurança. Em Portugal, até 1974, vivíamos num regime autoritário, em que a segurança interna era garantida por uma polícia política (Simão, 2009). Com a chegada da democracia, deparámo-nos com uma maior abertura e desenvolvimento económico. Porém, também “(…) problemas de urbanismo, ligados ao excesso de população em áreas restritas, à toxicodependência, ao desemprego e à pequena e média criminalidade”, a partir dos anos 80, começaram a assolar o país (Simão, 2009, p. 11). Contudo, à data, a segurança não era ainda planeada e a ação da polícia era baseada numa lógica que se limitava a reagir aos incidentes que iam tendo lugar. Atuava-se para resolver aqueles que provocavam grande alarmismo público, descorando a pequena e a média criminalidade (Simão, 2009). Percebe-se, então, que o tradicional modelo de policiamento meramente repressivo, em que apenas importava o número de autos, não era mais suficiente para dar resposta aos novos padrões de criminalidade. Por outro lado, aliado ao ritmo alucinante de desenvolvimento tecnológico e a um maior acesso à informação, o cidadão estava mais esclarecido sobre os seus direitos e tornava-se a cada dia mais exigente para com as Forças de Segurança, vistas como último garante dos seus direitos, liberdades e garantias (Copeto, 2011 a, p. 48) .

Exigia-se a adoção de um modelo inovador. Em função dos novos desafios que afetavam a segurança das sociedades modernas, também as Forças de Segurança tinham,

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Cfr. o disposto no art.º 25.º, n.º 2, alínea a), da Lei n.º 53/2008, de 29 de agosto. 11 Cfr. o disposto no art.º 1.º, n.º 2, da Lei n.º 63/2007, de 6 de novembro.

Capítulo 2  A Segurança como um desígnio do Estado

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sob pena de serem rejeitadas, de evoluir para acompanhar a sociedade e desenvolver novas respostas à sua altura (Alves A., 2008, p. 93). O Estado reage no sentido de dar resposta à “(…) manifestação social dos problemas (de insegurança): as estatísticas, as taxas de vitimação, as pressões populares, o sentimento de insegurança e o próprio crime” (Simão, 2009, p. 8). Surge, assim, uma “política pública de segurança”.

2.3. Governance da segurança

No início deste século, em função das referidas mudanças, estava a dar-se corpo a um novo paradigma da segurança em Portugal  a governance da segurança. Este conceito está associado a uma “co-produção de segurança”, que não deve ser uma responsabilidade exclusiva da polícia, mas de todos os cidadãos, que, como tal, devem ser envolvidos neste processo (Silva N., 2010, p. 10) e (Moleirinho, 2009). Não significa, porém, que o Estado abdique da sua função primordial de segurança, pois este continua a ter o papel central (Teixeira, 2006). No entanto, a fim de promover esse envolvimento global, desenvolve-se uma “rede de actores” (Simão, 2009, p. 9) que, para além do Estado, entram em palco e que, desde o início, trabalham em conjunto na hora de “pensar, estruturar, desenvolver” medidas de segurança (MAI, 1999 a, p. 16). Esta rede, materializada com “(…) parceiros institucionais públicos e privados, individuais e coletivos”, permite, de forma integrada, identificar e criar soluções para os problemas existentes; favorecendo, ainda, a partilha de informações e de recursos, bem como a coesão social (Oliveira J., 2006, p. 16). A complexidade criminal exige que tenhamos conhecimento de outras instituições ou organizações que estejam envolvidas na nossa comunidade alvo, pois “ninguém melhor que as próprias comunidades para identificarem os seus próprios problemas e contribuírem para soluções eficazes e duradouras no sentido de devolver a tranquilidade e aumentar a qualidade de vida” (Leitão, 1999, p. 9). Deste modo, para suprimir os focos de instabilidade e garantir a segurança de uma comunidade, é importante que façamos uma aproximação à mesma, a fim de poder auscultar as suas necessidades (Oliveira J., 2006). A insegurança trata-se, assim, de um problema que se “(…) combate em duas frentes simultâneas e complementares (…)” para além da tradicional repressão das consequências é necessário prevenir as suas causas” (Teixeira N. , 2002, p. 10).

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Ainda que, em Portugal, não exista uma conceptualização sistemática no domínio da governance da segurança, têm sido dados alguns passos importantes, como aos níveis da “descentralização e territorialização da segurança”, da “cooperação internacional”, da “privatização da segurança” e da própria “participação dos cidadãos” (Teixeira, 2006, p. 26).

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