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Sem tempo e meios para o género nobre do jornalismo

PARTE II – DIMENSÃO OPERATÓRIA

5. Predominância de fontes não identificadas e dependência de outros meios

5.3. O jornalismo online em metadiscurso

5.3.1. Sem tempo e meios para o género nobre do jornalismo

A resposta à pergunta quais os géneros jornalísticos mais utilizados? revela já uma tendência que a seguir se procura explicar quando se observa o nível de investimento em conteúdos informativos resultantes da iniciativa dos próprios media analisados. A hegemonia do indicador breve/notícia não constitui surpresa, perto dos 80% do volume de peças analisadas no âmbito dos três sites, também explicado pela natureza de um tipo de jornalismo – o online – que vive muito da constante atualização e da instantaneidade noticiosa.

O elemento que é mais revelador do carácter do jornalismo desportivo online reside na dimensão da supremacia dos géneros opinião e fait-divers em relação a géneros informativos como a reportagem, entrevista e perfil/retrato. Esta inferência surge mais reforçada quando se analisa a variável caracterização da assinatura, designadamente os indicadores correspondente e enviado especial. Isto é, os meios estudados não apresentam registos de peças assinadas por enviados especiais e, no caso do Bancada.pt e Zerozero.pt, por correspondentes. Apenas o Maisfutebol regista um número inexpressivo de 13 peças provenientes de correspondentes, fruto da sua mais valiosa e extensa rede de captura.

Estes resultados permitem concluir que é baixo o nível de conteúdos que sugerem um maior investimento dos próprios media, do ponto de vista financeiro, técnico, de recursos humanos e até editorial. Trata-se de uma realidade que encontra correspondência, como se referiu anteriormente, no conceito de jornalismo sentado, permeável às práticas de mimetismo mediático. Sendo já elucidativos da resposta à pergunta como se carateriza o volume de peças jornalísticas de caráter informativo

resultante da iniciativa do próprio media, como entrevistas e reportagens?, os resultados

em questão permitem introduzir um conjunto de perceções provenientes dos ciberjornalistas, recolhidas através das entrevistas realizadas.

Luís Rodrigues admite que “o ideal seria poder realizar peças de raiz, indo diretamente aos locais e contactando com as fontes”. Mas esse propósito, refere, é inatingível num mundo marcado pela velocidade e instantaneidade da informação, a que se junta a escassez de recursos para colocar em prática esse tipo de ações. Rodrigues afirma que o Zerozero.pt tem feito um esforço para reduzir o chamado jornalismo de

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acrescentando: “Embora estejamos a reduzir essa dependência, a verdade é que ela ainda é considerável nos tempos que correm” (L. Rodrigues, entrevista, dezembro, 2018).

A questão da constante reformulação de notícias a partir de outros meios deriva, como se disse, do carácter instantâneo do jornalismo online, que valoriza muito a notícia na hora, no preciso momento em que acontece. Além disso, a escassez de meios é um denominador partilhado por muitos órgãos de informação online, que privilegiam o trabalho dentro das redações em detrimento da ida para o terreno.

O poupado recurso a reportagens e entrevistas, na ordem dos 2% no caso do

Bancanda.pt e Zerozero.pt, é justificado por um conjunto de fatores que os próprios

entrevistados confirmam. O facto de os recursos humanos e financeiros serem limitados em ambas as redações torna mais difícil a cobertura sucessiva de eventos, assim como a livre criação de conteúdos sob a forma de entrevistas ou reportagens de campo.

António Tadeia assegura que fazia uma gestão dos recursos humanos por forma a ter sempre um jornalista com liberdade criativa para gerar uma peça de iniciativa própria. No entanto, como o próprio confessa, “tentávamos ter sempre uma reportagem diária, mas era apenas uma” (A. Tadeia, entrevista, fevereiro, 2019).

O trabalho de constante atualização noticiosa é descrito por Tadeia como um processo simples quando se recorre a um agregador de notícias, “apesar de algo aborrecido para os jornalistas incumbidos da tarefa”. O ex-diretor do Bancada.pt defende, ainda, que “quem fica todo o dia fechado na redação não pode fazer bom jornalismo”. No caso do site desportivo fundado em 2017, o jornalista lembra que “usava apenas os recursos humanos estritamente necessários para cobrir as notícias brancas a toda a hora, sendo que aqueles jornalistas que não estivessem incumbidos dessa tarefa teriam liberdade criativa para encontrar as suas próprias peças”26.

O diretor de informação do Zerozero.pt justifica, por sua vez, esta realidade com a “necessidade de se proceder a uma gestão do equilíbrio do site e daquilo que os leitores procuram”. Luís Rodrigues reconhece que “num mundo ideal seria fantástico passar todo o tempo em reportagens e entrevistas, com trabalho de campo nos próprios locais e em contacto com as pessoas” Ainda assim, considera que o Zerozero.pt tem dado passos

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firmes no sentido de aumentar a presença nos diversos locais (L. Rodrigues, entrevista, dezembro, 2018).

O facto de o Maisfutebol ter outro tipo de mobilização e capacidade logística permite-lhe ter um número superior de reportagens (5,1%), reforçando a ideia de que o ainda género nobre do jornalismo exige meios humanos e materiais que, por vezes, se podem tornar demasiado dispendiosos para alguns sites de jornalismo desportivo exclusivamente online. Confirmando que o Maisfutebol possui uma cobertura mais ampla de eventos ao nível nacional, Sérgio Pereira acredita que as pessoas estão “mais predispostas para ler reportagens na imprensa escrita, enquanto no online buscam a informação imediata, as notícias do momento, e não perdem muito tempo a ler peças mais extensas” (S. Pereira, entrevista, fevereiro, 2019).

O site desportivo da Media Capital disponibiliza, mesmo assim, uma revista digital semanal onde a aposta nas reportagens é clara. Sérgio Pereira não tem dúvidas em afirmar que a redação do Maisfutebol possui a forte convicção de que “são as reportagens, as análises e as peças mais extensas que fazem a diferença face à concorrência, pois as notícias comuns de atualidade, mais cedo ou mais tarde, chegam a todo o lado”27.

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