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4 O MATERIAL DIDÁTICO AUDIOVISUAL NO ESPAÇO EDUCATIVO DE

4.4 O seriado de TV Modern Family e suas potencialidades

O seriado de TV americano– Modern Family – foi criado pelos produtores executivos Christopher Lloyd e Steven Levitan e teve sua origem a partir das histórias das suas próprias famílias. É filmado no estilo de documentário e trata do cotidiano da família Pritchett e suas ramificações. Essa série de TV traz filmagens que acontecem, principalmente, em Los Angeles, Califórnia, mostrando o cotidiano de três núcleos familiares: o pai Jay, com a esposa Gloria e o filho Manny. O segundo casal é composto por Phil e Claire, com seus filhos Alex, Haley e Luke, modelo da família tradicional. O último casal é constituído por Mitchell e Cameron que são homossexuais e Lily, sua filha. Jay é o patriarca, um homem bem sucedido nos negócios, pai de Claire e Mitchell. Claire é uma dona de casa insegura, mãe de duas crianças: Haley, adolescente e Alex, a filha do meio, considerada muito inteligente e o pré- adolescente Luke, um filho de comportamento estranho. Claire é casada com Phil, um agente imobiliário que sempre tenta se relacionar com seus filhos de maneira amistosa, cedendo aos caprichos dos filhos. Já Mitchell é um advogado conservador que mantém uma relação homoafetiva com Cameron e que lutam para superar os desafios de educar a bebê vietnamita por eles adotada. Gloria, a nova esposa de Jay, é uma bela colombiana que vem morar nos EUA e tem que lidar com o machismo e a xenofobia do marido e do filho pré-adolescente Manny, um simpático menino precoce de 11 anos, romântico, intelectual e poeta. Nesse seriado, os personagens são estereotipados. Por exemplo, na família de Claire, ela e suas filhas são vistas como incapazes de usar um comando de TV, atividade que deve ser desenvolvida por um homem, enquanto que o filho Luke é hábil em eletrônica, apesar de sua limitação em relação a outros tipos de conhecimentos e situações do cotidiano da família. As mulheres, por sua vez, não têm empregos, ou seja, reforçam o papel de donas de casa que cuidam do lar e dos filhos e são subservientes aos seus maridos.

Além disso, este seriado de TV apresenta inúmeras situações envolvendo imigrantes ilegais, homossexuais, pobreza de países subdesenvolvidos, divórcio, adoção de criança, preconceitos e diferentes relações familiares com suas diferenças culturais que se configuram como o foco da série de TV. Em relação ao seu potencial como material didático, podemos afirmar que esse recurso, além da possibilitar a abordagem de questões linguísticas comuns a qualquer outro seriado de TV, também permite a discussão de temáticas culturais geralmente consideradas tabus. O tema das relações homoafetivas, por exemplo, é contemplado quando os idealizadores do seriado concebem outro núcleo familiar composto por um casal homossexual. Este movimento revela um avanço substancial no trato de questões culturais

dessa ordem, é uma ação que provoca uma reflexão sobre outras possibilidades de constituição familiar e que contempla a existência da diferença.

Além disso, a questão dos vários estereótipos de gênero também confere a esse seriado de TV um material didático de excelência para a reflexão dessas temáticas culturais, sobretudo em relação ao papel atribuído à mulher na sociedade contemporânea. O fato de ele ser um material didático autêntico faz com que supere em qualidade e potencial o livro didático que, na maioria das vezes, não contempla a diferença cultural, reproduzindo um modelo de sociedade idealizado e único. No tocante à temática família, o que se vê é o modelo de família americana composta por um homem, uma mulher, geralmente brancos, e seus filhos felizes e em harmonia, que não apresentam os conflitos característicos das famílias modernas. Por outro lado, esse seriado além de seu caráter humorístico traz, por exemplo, uma postura inovadora em relação ao significado de família em um mundo imprevisível, além de permitir, também, a instauração de um diálogo intercultural, desencadeado por suas temáticas culturais. É um tipo de material que engendra uma ação que evita a forma superficial como as temáticas culturais têm sido oferecidas pela maioria dos livros didáticos de língua inglesa.

Outro benefício do uso de seriado de TV como o Modern Family é que ele traz questões que fazem parte da cultura local do aprendiz de língua inglesa, fato que oportuniza uma discussão e reflexão sobre a realidade cultural do aluno, permitindo que ele se volte para sua própria matriz cultural a partir de uma reflexão crítica. Dessa forma, esse material didático contribui para que o aprendiz, ao confrontar a sua cultural local com a cultura alvo, possa repensar seus valores culturais e suas atitudes. É mais um recurso que traz amostras de língua- cultura cheias de representações do mundo, mais uma oportunidade para se desenvolver uma consciência sensível aos aspectos culturais que permeiam as relações humanas no seu contidiano. Nesse sentido, no que tange a sala de aula de língua inglesa, por natureza multicultural, o seriado de TV Modern Family pode servir como ponto de partida para a formação de aprendizes de língua inglesa mais interculturamente competentes, a partir de um posicionamento de respeito, de tolerância e de diálogo com a diferença.

O seriado ainda permite uma formação capaz de superar preconceitos linguísticos, culturais e atitudes etnocêntricas. Para o professor, é um recurso que serve para viabilizar, em sala de aula, o diálogo intercultural, sobretudo, entre sujeitos culturalmente diferentes.

Significa, em outras palavras, que esse material corrobora para que o professor provoque discussões sobre preconceitos, leituras diferentes de mundo, questões de alteridade etc.

A partir dessa reflexão, podemos concluir que o professor deve ter um cuidado maior quanto ao material didático que usa em sala de aula. Ele deve não só eleger aspectos gramaticais da língua, mas enveredar para aspectos culturais que permitam que o aprendiz tenha contato com a língua alvo em sua dimensão sociocultural, política e histórica, a fim de que possa desenvolver uma competência intercultural. Considerando o mundo globalizado, o professor tem também a função de imprimir uma prática crítico-reflexiva que o direcione para uma postura interculturalista e, assim, valorizar e aceitar as diferenças culturais. Segundo Mendes (2012, p. 375), devemos compreender que "a cultura é a língua e, vice-versa, e não apenas uma parte dela. Por isso, tudo o que fazemos quando interagimos com o mundo através da linguagem é um modo de produzir cultura". Agrega-se a isso, a ideia de que ensinar e aprender a língua inglesa pressupõe um olhar mais atento para a alteridade a ser desenvolvida. Nas palavras de Alvarez (2012, p. 500):

A visão de língua como cultura, fenômeno fundamental da comunicação entre pessoas ou grupos sociais e culturalmente diferentes, pressupõe um ensino e aprendizagem sensíveis à pessoa humana, ao seu momento histórico de vivência e às relações que estabelece com o mundo e com as pessoas à sua volta. A prática de reflexão intercultural pode ser desenvolvida em qualquer metodologia de ensino de línguas, não somente no ensino comunicativo, visto que é possível se promoverem reflexões culturais a partir de qualquer prática pedagógica de ensino. (ALVAREZ, 2012, p. 500)

Considerando, então, língua como cultura, a adoção de uma perspectiva intercultural na sala de aula, um professor interculturalista, aquele competente em mediar relações socioculturais, um aprendiz mais sensível às várias matrizes culturais, aquele que possui uma postura crítica, analítica, reflexiva sobre outros códigos culturais, entendo que o seriado de TV Modern Family pode corroborar para essa perspectiva. Vale ressaltar, no entanto, que apesar dessa potencialidade do seriado Modern Family discutida acima, ele também traz um repertório de cenas em que atitudes preconceituosas e estereótipos são reforçados, ou seja, essa série de TV, material autentico,é extremamente preconceituosa e impulsionadora para a construção de imagens estereotipadas. No próximo capítulo, apresentarei a análise dos dados.