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1.2 Violência contra a mulher: trama social que envolve uma questão de gênero

1.2.4 Quarto fio da trama: acolhimento possibilidade de romper com o silêncio e

1.2.4.2 Serviço Social no CEVIC

O Serviço Social é uma profissão liberal de nível superior, regulamentada pela Lei n° 8.662/93. Caracteriza-se por ser uma profissão interventora, situada no âmbito da prestação de serviços sociais, incorporados às políticas públicas e privadas. É um trabalho especializado, expresso sob forma de serviços, e sua atuação interfere na reprodução material da força de trabalho e no processo de reprodução sócio-política dos indivíduos sociais.

A intervenção profissional da assistente social perante a questão da violência contra a mulher, obedece aos princípios contidos no Código de Ética da profissão, a defesa intransigente dos direitos humanos e recusa do arbítrio e do autoritarismo, o empenho em democratizar as informações e o acesso aos programas disponíveis no espaço institucional, como um dos mecanismos indispensáveis à participação dos usuários.

Desse modo, a profissional de Serviço Social, é chamada a desenvolver seu trabalho com vistas a contribuir para a construção de uma nova sociedade, onde a violência não exista e trabalhar na garantia dos direitos humanos, junto às mais variadas expressões da questão social. A temática da violência contra a mulher é uma das expressões da questão social, portanto objeto direto do trabalho das profissionais de Serviço Social.

A partir da observação participante e desenvolvimento do Projeto Acolher por parte da acadêmica, foi possível sistematizar a prática do trabalho realizado no CEVIC e posteriormente desenvolver uma proposta de construção teórico-metodológica sobre o acolhimento a mulheres em situação de violência. É válido ressaltar que a categoria acolhimento com escuta social qualificada não era contextualizada anteriormente a proposição do plano de estágio.

As pessoas encaminhadas ao CEVIC são inicialmente atendidas pelo setor de Serviço Social, que inicia o processo de acolhimento.

Este processo se constitui em:

• Num primeiro momento é realizada uma entrevista individualizada, que possibilita a escuta social qualificada e o acolhimento da vítima. Nesse processo, cabe a Assistente Social procurar perceber e respeitar o momento que a pessoa está vivendo. Ela colabora para a pessoa se sentir à vontade, com confiança para falar do problema que a motivou a procurar o serviço.

• Segue com a exposição das informações sobre os serviços oferecidos e o funcionamento da instituição. Explica o trabalho desenvolvido pelo Setor Social, Setor de Psicologia e Setor jurídico.

• Tem-se o momento da escuta da queixa apresentada pela vítima, do motivo que a levou a procurar o serviço; nesse instante, é fundamental a profissional desenvolver um processo que consiste em ouvir e observar. Ouvir o relato, observar seus gestos, suas reações, sentimentos, perguntar caso tenha dúvidas, procurar conhecer de forma abrangente a situação na qual a pessoa está inserida, como são suas relações no ambiente em que convive. Procurar articular o maior número possível de informações sobre o problema apresentado, tudo numa atitude de respeito à pessoa usuária.

• Como forma de facilitar a tipificação da violência e o diagnóstico da situação apresentada, realiza-se o preenchimento de um cadastro do usuário. Solicita-se a apresentação dos boletins de ocorrência e outros documentos. (Anexo A)

• Em caso de conflito familiar, utiliza-se o instrumento do inquérito social10, como forma de melhorar o registro e a coleta de dados sobre a situação problema. (Anexo B)

• A partir do acolhimento, se for necessário, a pessoa usuária é orientada e, caso aceite, é encaminhada ao Setor Psicológico para o desenvolvimento de um processo psicoterápico de acordo com a necessidade de cada situação.

• Caso seja importante a intervenção jurídica, é encaminhada ao setor Jurídico para acompanhamento processual específico a cada situação.

• Durante o processo de acolhimento, são repassadas informações sobre seus direitos e a pessoa é incentivada a encaminhar ações que visam à sua efetivação11.

• Depois de identificada a situação problema, procura-se atuar junto aos familiares, especialmente com o agressor, num processo de mediação familiar. • Em caso de pessoas usuárias de substâncias entorpecentes, procura-se

encaminhá-las para tratamento ou internação em Comunidades Terapêuticas, ou

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O inquérito social foi construído pelas acadêmicas Eva Teresinha dos Santos e Patrícia Nascimento no semestre de 2004/2.

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Recebem orientação sobre questões relativas ao Sistema Único de Saúde, Previdência e outros. Quando o caso não compete a especificidade de atendimento à vítima de crime, orienta-se sobre a Assistência Jurídica Gratuita nos Fóruns da Capital.

para o núcleo de apoio psico-social (NAPS), Instituto Psiquiátrico São José, Alcoólatras Anônimos, AL-ANON (apoio aos familiares de alcoolistas).

• Posteriormente à realização do acolhimento, é efetuado o registro por meio de um relatório e diário de campo.

Ao Serviço Social cabe a tarefa de realizar trabalho social com a vítima e sua família, procurando fazer o acompanhamento sistemático da situação. Outra atividade que requer o olhar e a participação do Serviço Social diz respeito às conquistas de direitos sociais e à articulação com os movimentos sociais da cidade e região.

Cabe à Assistente Social entrar em contato com os demais recursos da sociedade, que possam ser úteis, resolvendo as demandas urgentes, como: informar o Conselho Tutelar quando há crianças ou adolescentes em situação de risco; encaminhar a vítima e sua família para uma casa de passagem, ou casa de amigos, retirando-os do ambiente familiar até cessar a situação de violência; manter contato com a Divisão de Assistência Pública da Prefeitura Municipal, para o fornecimento de cestas básicas, vale de transporte, em casos de emergência.

No período de março a junho de 2005, o Serviço Social do CEVIC realizou 133 acolhimentos e 211 retornos, totalizando 344 atendimentos (acolhimentos, encaminhamentos e acompanhamentos).

Destes, 93 fizeram parte do projeto acolher12, desenvolvido por esta acadêmica, sendo 82 acolhimentos de mulheres e 11 de homens.

O registro criterioso dos dados do projeto Acolher permitiu realizar uma avaliação quantitativa e qualitativa dos atendimentos e comprovar a importância do acolhimento com escuta social qualificada das mulheres em situação de violência.

Com a analise deste quadro, com números tão significativos, é possível perceber que a violência contra a mulher não é prioridade do poder público, pois conta-se com um número reduzido de profissionais atuando na área dos direitos humanos; faltam serviços articulados em rede como suporte para quem realiza o acolhimento e encaminhamento; as condições para o trabalho com o grupo familiar ficam prejudicadas, pois no caso do CEVIC, o quadro reduzido de pessoal inviabiliza um trabalho preventivo e compromete a qualidade e a efetividade do serviço prestado.

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Os acolhimentos foram realizados conjuntamente com a Assistente Social Karolina de Souza e ou com a estagiária Janize Luzia Biella.

Constatou-se também que o acolhimento às mulheres em situação de violência, pelas profissionais de Serviço Social, é realizado com competência, porém os encaminhamentos efetuados dependem da sensibilização gerada na pessoa que atendeu. É a comoção causada pela situação de violência que acaba determinando o empenho de colaborar na resolução do problema. As orientações e encaminhamentos são realizados conforme a experiência, a disposição das profissionais e a rede de relações de amizade ou de pessoas conhecidas, pelo fato de não existir um protocolo de atendimento e especialmente pela falta de políticas públicas que atendam as necessidades das mulheres.