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O setor externo: acúmulo de reservas a partir das exportações e do IDE

PARTE I – A LÓGICA DO DESENVOLVIMENTO CHINÊS: reflexão sobre as mediações

CAPÍTULO 4 – O DESENVOLVIMENTO CHINÊS E SEUS RESULTADOS: a ascensão

4.2 O setor externo: acúmulo de reservas a partir das exportações e do IDE

A análise do comportamento da conta capital e das transações, bem como do saldo final do balanço de pagamentos da China mostrou como essa estratégia – de impulsionar exportações e atrair fluxos de IDE – explicou o fim da restrição externa que a nação enfrentou até os anos 1970. Entre 1978 e o início dos anos 2000, conforme se observa na Tabela 6, o saldo do balanço de pagamentos era reduzido, atingindo, inclusive, valores negativos em alguns anos. No entanto, desde 1993, o resultado geral do balanço passou a ser positivo, em virtude, especialmente, da ampliação do saldo em transações correntes173.

(173) Nesse ponto, é importante lembrar que o crescimento das exportações – que liderou a ampliação do superávit nas transações correntes, como é observado a seguir –, embora também tivesse sido puxado por empresas estatais, respondeu à grande entrada de IDE oriundo das empresas estrangeiras, principalmente da Ásia. Desse modo, como já sugerido ao longo do trabalho, o dinamismo da conta correte, ou melhor, das exportações foi produto também de uma articulação entre a política comercial e os fluxos de IDE. Em última instância, portanto, a entrada de recursos via conta capital auxiliou o acúmulo de superávits da China em conta corrente. Nessa direção, “a contribuição das empresas estrangeiras no dinamismo das exportações da China deve ser destacada. (...) As exportações chinesas cresceram a uma taxa anual de 15%, entre 1989 e 2001. Em 1989, as filiais estrangeiras contabilizavam menos de 9% do total das exportações e, em 2002, respondiam por metade do total. Na indústria de transformação, a participação das filiais estrangeiras no total das exportações no ano de 2000 foi de 91%, particularmente em alguns setores de alta tecnologia, como eletrônicos, automação e processamento de dados e telefonia móvel” (ACIOLY, 2005, p. 30).

Tabela 6 – China: evolução do balanço de pagamentos

1982-2008 (em US$ milhões)

Conta corrente Conta Capital Erros e Omissões Saldo

1982 5.674 338 293 6.305 1983 4.240 -226 128 4.142 1984 2.030 -1.003 -889 138 1985 -11.417 8.971 6 -2.440 1986 -7.034 5.944 -958 -2.048 1987 300 6.001 -1.518 4.783 1988 -3.802 7.133 -957 2.374 1989 -4.317 3.723 115 -479 1990 11.997 3.255 -3.205 12.047 1991 13.272 8.032 -6.767 14.537 1992 6.401 -250 -8.211 -2.060 1993 -11.609 23.474 -10.096 1.769 1994 6.908 32.645 -9.100 30.453 1995 1.618 38.674 -17.823 22.469 1996 7.243 39.966 -15.504 31.705 1997 36.963 21.016 -22.122 35.857 1998 31.472 -6.322 -18.902 6.248 1999 21.115 5.178 -17.641 8.652 2000 20.518 1.923 -11.748 10.693 2001 17.401 34.778 -4.732 47.447 2002 35.422 32.291 7.504 75.217 2003 45.875 52.726 17.985 116.586 2004 68.659 110.660 26.834 206.153 2005 160.818 62.964 -16.441 207.342 2006 253.268 6.662 -13.075 246.855 2007 371.833 73.509 16.349 461.691 2008 426.107 18.965 -26.080 418.992 Fonte: International Financial Statistics – IMF (2008); World Development Indicators; Global

Development Finance – World Bank (2009). Elaboração Própria

A partir de 2001 e até 2004, por sua vez, verificou-se a elevação simultânea dos saldos das contas corrente e capital permitindo, nesse último ano, que o balanço de pagamentos chegasse a um superávit de quase 11% do PIB. Desde então, mesmo com a redução do saldo da conta capital, o aumento considerável das transações correntes permitiu que o superávit do balanço de pagamentos crescesse ainda mais, alcançando em 2008 um valor de 16% do PIB.

Foi devido a esse crescimento que a China conseguiu acumular um importante volume de reservas internacionais, principalmente a partir da década passada. Em 2000, o total de reservas internacionais acumulado pela China foi de “apenas” US$ 166 bilhões. Num período de três anos, esse valor mais do que dobrou, totalizando US$ 406 bilhões em 2003. Desde então, a taxa de crescimento das reservas foi se expandido velozmente, resultando num aumento de mais de US$

1,5 trilhão entre 2003 e 2008. Nesse último ano, as reservas internacionais já eram de US$ 1.966 bilhões (ver Gráfico 12).

Gráfico 12 – China: evolução das reservas internacionais

1978-2008 (em US$ bilhões)

200 400 600 800 1.000 1.200 1.400 1.600 1.800 2.000 1978 1980 1982 1984 1986 1988 1990 1992 1994 1996 1998 2000 2002 2004 2006 2008

Fonte: World Development Indicators; Global Development Finance – World Bank (2009). Elaboração própria.

A principal responsável pelos acúmulos dessas reservas internacionais na China foi a conta corrente. Nesta década, cerca de 70% do superávit do balanço de pagamento respondeu aos saldos positivos da conta corrente (entre 2000 e 2008, o resultado total do balanço de pagamentos foi de US$ 1.791 bilhões e o em transações correntes foi de US$ 1.400 bilhões). Na década anterior, esse cenário não foi muito diferente, pois os resultados acumulados na conta corrente representaram 77% dos saldos acumulados o balanço de pagamentos.

Como destaca o Gráfico 13, o componente que mais contribuiu para a expansão da corrente foi a balança comercial. Com exceção dos anos de 1985 e 1988, quando a conta corrente apresentou valores negativos, ao longo de todo período a balança comercial foi a conta que teve maior participação nos superávit das transações correntes. Desde o início da década de 1990, o saldo comercial representou mais de 50% dos superávits da conta corrente. Nos últimos quatro anos, essa participação cresceu e alcançou em média 85% das transações correntes.

Gráfico 13 – China: Participação das contas no saldo das transações correntes

1982-2008 (anos selecionados) (em %)

-100% -75% -50% -25% 0% 25% 50% 75% 100% 1982 1985 1988 1991 1994 1997 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008

Serviços e Rendas Transferências Unilaterais Balança Comercial

Fonte: International Financial Statistics – IMF (2008); World Development Indicators; Global

Development Finance – World Bank (2009). Elaboração Própria

Esse aumento da participação da balança comercial nas transações correntes, por sua vez, refletiu também um significativo crescimento dos fluxos de comércio, como mostra o Gráfico 14, que traz a evolução das exportações, das importações e do saldo comercial.

Entre o final da década de 1970 até 1984, o crescimento dos fluxos de comércio foi tímido, cerca de US$ 16 bilhões de exportações e importações, o que fez com que o saldo da balança comercial fosse quase nulo ao longo do período. Já entre 1985 e 2000, o crescimento das exportações e importações, muito elevado, aumentou cerca de US$ 200 bilhões em todo o período, enquanto a balança comercial viveu dois momentos: um primeiro, de déficits constantes que atingiu o valor total de US$ 45 bilhões, entre 1985 e 1989 e, um segundo, de ampliação do superávit comercial, nos anos seguintes, que registrou US$ 181 bilhões em todo o período. Todavia, nos últimos oito anos o crescimento dos fluxos comerciais e do saldo comercial foi espetacular. Se, em 2001, as exportações e as importações chinesas totalizavam, respectivamente, um valor de US$ 266 bilhões e US$ 244 bilhões, o que se traduzia num superávit comercial de US$ 23 bilhões, em 2007 esses valores eram de US$ 1,4 trilhão e US$ 1,1 trilhão, fazendo com que o superávit comercial atingisse a cifra de US$ 295 bilhões.

Gráfico 14 – China: evolução do comércio internacional.

1978-2008 (em US$ bilhões)

-100 100 300 500 700 900 1.100 1.300 1.500 1978 1980 1982 1984 1986 1988 1990 1992 1994 1996 1998 2000 2002 2004 2006 2008

Saldo Exportações Im portações

Fonte: Handbook of Statistics – Unctad (2009). Elaboração própria.

Embora a conta corrente tivesse sido o principal instrumento para ampliar o saldo do balanço de pagamentos, a conta capital também contribuiu positivamente nesse sentido. No entanto, a contribuição dessa conta se deu a partir dos ingressos do IDE e não dos investimentos em portfólio. Conforme aponta o Gráfico 15, a principal modalidade de capital estrangeiro recebida pela China, desde a década de 1980, foi o IDE.

Gráfico 15 – China: Participação dos fluxos líquidos de capital recebidos por tipo

1982-2007 (anos selecionados) (em %)

-20% 0% 20% 40% 60% 80% 100% 1982 1985 1988 1991 1994 1997 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007

Investim ento em Portfolio Outros Investim entos IDE

Embora nos anos 1980 outras modalidades de investimento rivalizassem com o IDE, já em 1991 essa modalidade de investimento se tornou o principal responsável pelo ingresso de recursos externos no país via conta capital. Naquele ano, quase metade de todo o capital recebido pelo país era na forma de IDE. Até 2003, esse valor foi só aumentando, atingindo quase 100% em 2002. Apesar da queda de participação no período posterior, o IDE continuou sendo o principal capital recebido pela conta financeira. Essa predominância pode ser confirmada pela acelerada expansão dos seus valores correntes, como indica o Gráfico 16.

Gráfico 16 – China: fluxos e estoques de IDE recebido

1980-2008 (em US$ bilhões)

50 100 150 200 250 300 350 400 1980 1982 1984 1986 1988 1990 1992 1994 1996 1998 2000 2002 2004 2006 2008

IDE (estoque) IDE (fluxo)

Fonte: Handbook of Statistics – Unctad (2009). Elaboração própria

Se entre 1985 e 1991, já se presenciou um salto considerável nos volumes recebidos de IDE que, em termos de estoque, alcançou a cifra de US$ 36 bilhões, desde 1992 esse crescimento foi ainda mais impressionante. Num primeiro momento, até 2000, a China recebeu fluxos de IDE na ordem de US$ 323 bilhões (sendo que no ano 1998 esses fluxos alcançaram o valor de US$ 46 bilhões) ampliando o estoque total naquele último ano de US$ 203 bilhões. Num segundo momento, ainda ocorreu uma aceleração no ingresso desses investimentos que, em termos de estoque no ano de 2008, chegou ao valor de US$ 378 bilhões.

Na próxima seção, busca-se mostrar que o êxito do desenvolvimento chinês em termos de crescimento do produto e das contas do balanço de pagamentos também se refletiu em avanços consideráveis da área social.

4.3 As transformações sociais: aumento dos salários, redução da pobreza e melhora do