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Capítulo 4 – O mercado de trabalho do dentista

4.3 Setor privado: a Odontologia Suplementar

Os números relativos à Odontologia Suplementar exigem ainda mais cuidados de interpretação, uma vez que os bancos de dados somente disponibilizam informações sobre o número de beneficiários ou aspectos contábeis. Podemos supor que o aumento do número de beneficiários tenha relação com o número de dentistas credenciados aos planos, mas nada nos permite afirmar que esta seja uma relação imediata. Ademais, embora o discurso das operadoras de planos seja de que sua atuação esteja permitindo que um público que não costuma ir ao dentista agora o faça, esta também não é uma premissa que possa ser tomada gratuitamente. O estudo qualitativo de Cartaxo e Rangel (2007) realizado em Salvador demonstra que os planos odontológicos atuam em dois fronts: para os consumidores de menor poder aquisitivo eles se mostram como alternativa para acessar a odontologia privada, que de outra forma teriam dificuldade em usufruir. Porém, para aqueles de maior renda, eles se apresentam como uma forma de redução de custos em relação à odontologia liberal, ou seja, não teria havido a criação de um novo campo de trabalho, mas a transmutação de prática liberal típica em prática liberal atípica, via de regra com menor remuneração ao dentista.

Os números da tabela 16 mostram percentuais elevados de crescimento, porém em patamar menor que a expansão do PSF. O crescimento do setor no ano de 2010 foi

substancialmente menor do que nos anos anteriores15. Contudo, não se observa

ainda a configuração de um platô.

Além do expressivo aumento de beneficiários dos planos odontológicos, a tabela 16 traz outra informação valiosa: a evolução do número de operadoras de planos odontológicos com beneficiários. Percebe-se que o número de operadoras cresceu em uma proporção bem inferior à do número de beneficiários, resultando em um forte aumento da proporção beneficiários / operadoras. Este é um dos argumentos que nos permite supor que esteja em curso uma concentração do setor. Tal concentração ainda não se completou, motivo pelo qual ainda se costume afirmar (VIEIRA, 2008) que este é um setor pulverizado. Contudo, a tendência não é a de uma maior pulverização, antes o contrário. E parte desta concentração não se deixa registrar nos dados disponíveis no portal da ANS, como será visto mais adiante.

TABELA 16 – Número, variação percentual anual e acumulada de beneficiários de planos exclusivamente odontológicos, número de operadoras exclusivamente odontológicas com beneficiários e proporção número de beneficiários/operadora, segundo competência, 2000-2010, Brasil.

Competência Beneficiários Operadoras Beneficiários/operadora

N ∆ % anual dez/00 2.761.608 0 311 8.879,8 dez/01 3.234.364 17,1 331 9.771,5 dez/02 3.788.701 17,1 334 11.343,4 dez/03 4.447.374 17,4 346 12.853,7 dez/04 5.456.603 22,7 354 15.414,1 dez/05 6.353.206 16,4 324 19.608,7 dez/06 7.529.785 18,5 331 22.748,6 dez/07 9.133.205 21,3 340 26.862,4 dez/08 10.771.827 17,9 359 30.005,1 dez/09 13.167.701 22,2 371 35.492,5 dez/10 14.669.586 11,4 373 39.328,6

Fonte: Elaboração a partir de BRASIL, 2011c

Embora já existisse a comercialização de planos odontológicos antes da criação da ANS, o grande crescimento do setor se deu após o início do funcionamento da

mesma. Faremos uma apresentação dos principais conceitos no campo da Saúde Suplementar de interesse à nossa pesquisa.

De acordo com a lei nº 9.656, de 03 de junho de 1998,(BRASIL, 2011g) define-se plano privado de assistência à saúde como:

[...] prestação continuada de serviços ou cobertura de custos assistenciais a preço pré ou pós estabelecido, por prazo indeterminado, com a finalidade de garantir, sem limite financeiro, a assistência à saúde, pela faculdade de acesso e atendimento por profissionais ou serviços de saúde, livremente escolhidos, integrantes ou não de rede credenciada, contratada ou referenciada, visando a assistência médica, hospitalar e odontológica, a ser paga integral ou parcialmente às expensas da operadora contratada, mediante reembolso ou pagamento direto ao prestador, por conta e ordem do consumidor (BRASIL, 2011g).

Também é nesta lei que se conceitua o termo “operadora de plano de assistência à saúde”:

...pessoa jurídica constituída sob a modalidade de sociedade civil ou comercial, cooperativa, ou entidade de autogestão, que opere produto, serviço ou contrato de que trata o inciso I deste artigo [reproduzido acima] (BRASIL, 2011g).

Estes esclarecimentos são necessários porque algumas vezes os atores utilizam a expressão “planos odontológicos” de forma inespecífica, referindo-se a qualquer empresa privada de serviços odontológicos.

De acordo com a resolução RDC nº 39, de 27 de outubro de 2000 (BRASIL, 2011i) há dois tipos de atenção prestados pelas Operadoras de Planos de Assistência à Saúde: médico hospitalar e odontológico. No primeiro caso, tais operadoras podem ou não prestar assistência odontológica em acréscimo aos serviços médicos hospitalares, mas no segundo grupo enquadram-se apenas os que operam planos exclusivamente odontológicos.

Esta mesma resolução classifica as operadoras nas seguintes modalidades:

I – administradora: “empresas que administram planos ou serviços de assistência à saúde, sendo que, no caso de administração de planos, são financiados por operadora, não assumem o risco decorrente da operação

desses planos e não possuem rede própria, credenciada ou referenciada de serviços médico-hospitalares ou odontológicos”

II - cooperativa médica; “sociedades de pessoas sem fins lucrativos, constituídas conforme o disposto na Lei n.º 5.764, de 16 de dezembro de 1971, que operam Planos Privados de Assistência à Saúde”

III - cooperativa odontológica; “sociedades de pessoas sem fins lucrativos, constituídas conforme o disposto na Lei n.º 5.764, de 16 de dezembro de 1971, que operam exclusivamente Planos Odontológicos”

IV - autogestão; entidades que operam Plano Privado de Assistência à Saúde destinado, exclusivamente, a oferecer cobertura aos empregados, aposentados e dependentes

V - medicina de grupo; “empresas ou entidades que operam Planos Privados de Assistência à Saúde”

VI - odontologia de grupo; “empresas ou entidades que operam exclusivamente Planos Odontológicos”,

VII - filantropia. “entidades sem fins lucrativos que operam Planos Privados de Assistência à Saúde e tenham obtido certificado de entidade filantrópica” (BRASIL, 2011i) .

Mais tarde, em 2001, a Lei 10.185 acrescentou mais uma modalidade: a seguradora especializada em saúde (BRASIL, 2001f).

A importância relativa de cada uma destas modalidades pode ser vista na tabela 17. Mais da metade dos beneficiários de planos exclusivamente odontológicos estão vinculados a operadoras da modalidade Odontologia de Grupo:

TABELA 17 - Número e percentual de beneficiários de planos exclusivamente odontológicos segundo modalidade, Salvador-BA e Brasil, setembro de 2010.

Modalidade Salvador Brasil

N % N %

Autogestão 1.221 0,2 55.154 0,4

Cooperativa Médica 186 0 150.807 1,1

Filantropia 1 0 83.217 0,6

Medicina de Grupo 28.891 5,3 1.544.643 11,1

Seguradora Esp. em Saúde 5.005 0,9 302.598 2,2

Cooperativa Odontológica 4.872 0,9 2.402.731 17,3

Odontologia de Grupo 504.095 92,6 9.339.836 67,3

Total 544.271 100 13.878.986 100

FONTE: BRASIL, 2011a

As 20 maiores operadoras de plano odontológico do país representam 70% do mercado. O que a análise dos dados do banco da ANS não permite observar é que várias dessas operadoras sofreram processos de fusão, associação, aquisição, etc.

Apenas através da pesquisa documental na internet foi possível, por exemplo, tomar conhecimento da associação entre as duas primeiras do ranking, que passaram a responder por quase um terço do mercado.

Através de documentos online pudemos tomar conhecimento dos seguintes processos:

• incorporação das ações da Bradesco Dental pela Odontoprev (EXAME,

2011a),

• aquisição da carteira de associados do plano odontológico Interdont pela

Intermédica (ODONTOSITES, 2011b),

• aquisição da Odonto empresa, Unidonto e Gama pelo grupo Tempo (TEMPO

PARTICIPAÇÕES, 2010 e VALOR ONLINE, 2011b),

• compra da Medial Saúde pela Amil (SEGS, 2011a),

• aquisição da Dental Plan pela Sul América (AGÊNCIA ESTADO, 2011 e

MONITOR MERCANTIL, 2011)

Desta forma, o resultado deste processo de concentração pode ser visualizado no gráfico 1, apresentado na seção de apêndices deste tese.

Para melhor ilustrar o processo de concentração do setor, elegemos dois casos para análise: a Odontoprev, por ser a maior do país, e a Prevdonto, por ter forte expressão em Salvador. Aliás, o contraste destes dois casos também ajuda a distinguir diferenças entre o setor de Odontologia Suplementar em âmbito nacional e local.

Se em âmbito nacional as 20 maiores operadoras concentram 70% dos beneficiários, em Salvador as 10 maiores operadoras respondem por 90% dos consumidores. A maior operadora detém, sozinha, mais de 40% do mercado, embora seja uma operadora de atuação mais restrita ao Nordeste. Para evidenciar essas peculiaridades, organizamos a tabela 18, que traz as dez maiores operadoras do mercado soteropolitano e compara seus desempenhos locais com o nacional. Assim, fica evidente qual a importância das empresas regionais e das nacionais no

mercado local. A segunda maior operadora em Salvador, por exemplo, ocupa a 17ª posição nacional, demonstrando que as empresas de atuação regional ainda são muito importantes no cenário soteropolitano. Consultamos no cadastro da ANS o município em que fica a sede de cada operadora, para facilitar essa compreensão.

TABELA 18 – Ranking das operadoras de planos exclusivamente odontológicos, Salvador e Brasil, segundo número e percentual de beneficiários, 2010.

Operadora Salvador Brasil

N % Posição N % Posição

ODONTO SYSTEM PLANOS ODONTOLOGICOS LTDA

Fortaleza 227.916 42,8 1 565.309 4,2 5

PLANO DE ASSISTENCIA ODONTOLOGICA UNIDONTO

Salvador 86.288 16,2 2 136.728 1,0 17

BRADESCO DENTAL S.A.

Rio de Janeiro 56.440 11,0 3 1.385.312 10,4 2 ODONTOPREV S/A Barueri (SP) 30.676 5,8 4 2.311.547 17,3 1 INTERODONTO - SISTEMA DE SAÚDE ODONTOLÓGICA São Paulo 21.706 4,1 5 963.635 7,2 3

MEDIAL SAÚDE S/A.

São Paulo 16.652 3,1 6 345.763 2,6 8 ADCON - ADMINISTRADORA DE CONVENIOS ODONTOL Salvador 13.806 2,6 7 14.575 0,1 92 GOLDEN CROSS ASSISTENCIA INTERNACIONAL DE S Rio de Janeiro 10.892 2,0 8 312.764 2,3 9

ATEMDE ODONTO SAÚDE CLUBE DE BENEFÍCIOS Salvador 10.542 2,0 9 19.615 0,1 70 J.A.R. ASSISTÊNCIA ODONTOLÓGICA LTDA Salvador 7.928 1,5 10 11.496 0,1 114 Subtotal 482.846 90,6 - - - Outras 50.285 9,4 - - - Total 533.131 100 - - - Fonte: ANS. 2010b

Entre as dez maiores operadoras de Salvador, cinco têm sede no Nordeste e cinco no Sudeste. As empresas com sede no Sudeste têm, em âmbito nacional, coberturas que variam entre 2,3 milhões e 312 mil beneficiários. Dentre as empresas com sede no Nordeste, a única com expressão nacional é a Odonto System, com 500 mil usuários em todo o território nacional. As demais têm cobertura variando entre 11 mil e 136 mil. Como as demais operadoras não listadas neste quadro correspondem a menos de 10% do total de beneficiários de Salvador, julgamos que a análise apenas das 10 maiores operadoras já nos leva a conclusões importantes. O mercado de planos odontológicos em Salvador não é dominado nem totalmente por empresas nacionais nem regionais. Infelizmente, a base de dados que tivemos acesso revela apenas o quadro atual e não permite comparações temporais. Supomos que o crescimento dos planos nacionais neste mercado é algo que vem crescendo ao longo do tempo: no passado a participação de empresas locais deve ter sido maior. Pesquisas futuras que continuem a monitorar este mercado podem colocar à prova tal hipótese.

O que esta tabela também não revela são os movimentos de aquisição e fusão. Atualmente, a segunda colocada no ranking local foi adquirida por um grupo nacional e este tipo de informação somente foi possível obter mediante a busca de notícias na internet.

A tendência à concentração do setor é reconhecida pelo próprio setor empresarial. Um analista especializado no setor de saúde afirmava em 2009: “Houve uma onda de fusões e aquisições. Essas consolidações eliminam o que chamamos de piratas do mercado” (SEGS, 2011a).

Este é o motivo pelo qual realizamos o estudo de caso de duas operadoras: a maior a nível nacional e a segunda maior em âmbito local.

Odontoprev: administração profissional desde a origem

A Odontoprev foi fundada em 1987 por dentistas, mas se orgulha em afirmar, em seu material de divulgação, que a empresa desde o início teve uma administração profissional e nunca teve uma família na gestão (FILGUEIRAS, 2011). Em 1998 se associou a um fundo de private equity16 (ODONTOPREV, 2010), relação que

perduraria até o ano de 2007. Em 2006, completou sua Oferta Pública Inicial (IPO) na Bovespa e, segundo seu site, mais de R$ 500 milhões foram vendidos em ações (ODONTOPREV, 2010). Matéria divulgada em 2008 afirma que os acionistas respondiam por 60% do capital da empresa (FILGUEIRAS, 2011). Uma reportagem de 2010 noticiou que os acionistas eram oriundos de 15 países diferentes (SEGS, 2010c). A mesma fonte citou o diretor de Relações com Investidores da OdontoPrev: “Para cada R$ 1,00 investido, o acionista OdontoPrev tem hoje cerca de R$ 2,50, claramente um dos IPO de maior sucesso no mercado de capitais brasileiro nos último anos” (SEGS, 2010c).

Em seu site, a Odontoprev relata uma extensa lista de aquisições: Unidont (1999), Clidec (2000), Dental Corp (2007), Care Plus Dental (2008), Sepao (2008) e Protodent (2008) (ODONTOPREV, 2010). A empresa tem também buscado atingir mercados externos: em 2009 foi anunciado um acordo com o grupo Iké, “líder em serviços para seguradoras no México, que possui operações também na Argentina, Venezuela, Colômbia e Brasil (EXAME, 2011c).”

16 “Venture capital e private equity (VC/PE) são segmentos do mercado financeiro que consistem

fundamentalmente em aporte temporário de capital, realizado por um fundo de VC/PE, por meio de participação no capital de empresas com potencial de crescimento e expectativa de grande valorização. A valorização da empresa permitirá ao fundo de VC/PE obter retorno com a venda da participação (desinvestimento) a médio ou longo prazo.” (MEIRELLES; PIMENTA JUNIOR; REBELATTO, 2008, p. 13)

Em 2009, alcançou grande repercussão a associação da Odontoprev com o Bradesco: “as ações da Bradesco Dental serão incorporadas pela OdontoPrev, de quem a operadora do banco passará a ser subsidiária” (EXAME, 2011a). O que há de mais significativo neste evento é que a Odontoprev e a Bradesco Dental são as duas maiores operadoras de planos odontológicos do Brasil – somadas, a participação do mercado será em torno de 30% (EXAME, 2011a).

A trajetória acima revela uma tendência de concentração de capital no setor de Odontologia Suplementar. Excetuando o episódio da reação dos dentistas de Salvador à Prevdonto, descrita a seguir, é uma história que tem vários elementos comuns ao caso da Tempo, como as aquisições em série, a participação de um fundo de Private Equity e o lançamento de ações na Bovespa.

Prevdonto: uma empresa genuinamente baiana comprada por um grupo de

private equity

O surgimento da Prevdonto figura somente em um documento (SITE DE FRANQUIAS, 2010). Criada em 1990, à época com o nome Unidonto17, ela foi

anunciada como “uma empresa genuinamente baiana”. Este documento detalha a trajetória da empresa – seus sócios dentistas e não-dentistas, as mudanças de sede, expansão da estrutura. Afirma-se que em 2003 fora “dada a grande largada para o crescimento nacional”, através de uma unidade franqueada em Aracaju. Contudo, o que os demais documentos revelam (TEMPO ASSIST, 2010, VALOR ONLINE, 2011b) é a aquisição da mesma pelo grupo Tempo em 2008 – a 5ª aquisição do grupo em um período de 12 meses. As empresas do grupo Tempo no setor de planos odontológicos recebem a denominação Odonto Empresas. Em seu site são listadas as operadoras que lhe deram origem: “Odonto Empresa, Fleming Odontologia, Gama Odonto, Oraltech e Prevdonto; bem como da aquisição de várias carteiras de clientes, dentre elas da Associl” (ODONTO EMPRESAS, 2011).

A Tempo Participações iniciou seus negócios em 2000 (TEMPO PARTICIPAÇÕES, 2010) e atua nos segmentos de administração de planos de saúde, odontológicos e de assistência especializada. Um de seus acionistas é a GP Investimentos, um dos maiores grupos de private equity) – a mesma que investiu na Imbra (VALOR ONLINE, 2011b e INVESTNEWS 2011).

A história narrada por esses documentos mostra como, num espaço de duas décadas, passa-se de uma pequena empresa de administração ainda pouco profissionalizada, “sediada na Avenida Joana Angélica”, onde a atividade era “conduzida pelos sócios [...] com a ajuda de alguns colaboradores” (SITE DAS FRANQUIAS, 2010) a uma operadora de planos odontológicos cujo acionista é “um dos maiores grupos de private equity da América Latina” (INVESTNEWS, 2011). A trajetória deste plano odontológico nos faz acreditar estarmos diante de um caso emblemático de concentração de capital e financeirização do setor de prestação dos serviços odontológicos. Em release divulgado em sua página na internet, a Tempo Participações anuncia ter obtido receita líquida de R$739 milhões no ano de 2009. Somente no setor odontológico a expansão da receita líquida divulgada foi de 77,8% creditada à anualização das aquisições ocorridas em 2008 (TEMPO ASSIST, 2011). Os sites de operadoras de planos de saúde têm um selo indicando seu número de registro na ANS. Isto torna possível a triangulação com as informações fornecidas nos sites com as do sistema ANS TABNET, o que nos permitiu obter as informações referentes à Prevdonto e à Odonto Empresas que constam na tabela 19. Não encontramos um site institucional da Gama Odonto, mas no site Odonto Empresas, é dito “Usuário Gama Odonto, bem vindo ao novo site”. No portal da Gama Saúde, o número de registro da ANS é 40701-1, mas, no banco de dados da agência, este número corresponde à GAMA SAUDE LTDA, que não apresenta beneficiários exclusivamente odontológicos. Por isso, os dados referentes à Gama Odonto são

originários somente do sistema da ANS. Não foi possível obter informações referentes às demais operadoras adquiridas pelo grupo Tempo.

TABELA 19 - Número de beneficiários das operadoras Prevdonto, Odontoempresas e Gama Odonto, Salvador, Brasil, março de 2010.

Operadora SalvadorBeneficiáriosBrasil

Prevdonto, (ANS 35729-4: PLANO DE ASSISTENCIA

ODONTOLOGICA UNIDONTO) 86.288 136.728

Odontoempresas (ANS 31098-1: ODONTO EMPRESA

CONVENIOS DENTARIOS LTDA) 7.111 605.732

Gama Odonto (ANS 40919-7: GAMA ODONTO S/A) 2.402 162.745

Total 95.801 905.205

Fonte: BRASIL, 2010a.

Em âmbito nacional, a Odonto Empresas é a 4ª maior operadora exclusivamente odontológica em número de beneficiários, ficando a Gama Odonto em 15ª colocação e a Prevdonto em 17ª. Contudo, em Salvador, a Prevdonto ocupa a 2ª posição, enquanto a Odonto Empresas está em 11º lugar e a Gama Odonto em 18ª. Isto demonstra que a Prevdonto, mesmo tendo expressão nacional pouco significativa, está em destaque no mercado soteropolitano, ao passo que as demais empresas do grupo, não obstante a proeminência nacional, têm ou tiveram dificuldades de acessar o mercado local. Estes números sugerem uma transição de um mercado caracterizado por empresas de atuação regionalizada para outro mais concentrado. O que há de mais rico no caso Prevdonto é que permite fazer a articulação entre os movimentos do capital e o dia-a-dia dos dentistas credenciados. Analisaremos a seguir uma consequência da aquisição da operadora baiana por outro grupo maior: a redução da remuneração dos dentistas e a mobilização destes para revertê-la18.

18 O processo de mobilização dos dentistas contra a redução dos valores das tabelas de remuneração

foi estudada através das notícias nos sites institucionais, blog de dentistas, observação de uma das assembleias realizadas e entrevista com um dos organizadores do movimento. Para preservar o

Em janeiro de 2010, uma dentista de Salvador relatou em seu blog o anúncio, por parte de um plano com muitos associados na cidade, da unificação da tabela de honorários decorrente da fusão com empresas menores (APUROS, 2011b). O desdobramento concreto desta ação foi a redução dos valores dos procedimentos. Segundo informações do site do CROBA, alguns procedimentos tiveram queda de 57% (CROBA, 2010b).

Segundo nosso entrevistado, foram cinco meses de negociação entre as entidades odontológicas e representantes da empresa, sem obter avanços. Nos meses de abril e maio, surgiram nas páginas do Sindicato dos Odontologistas do Estado da Bahia (SOEBA) e do Conselho Regional da Bahia (CROBA) as primeiras chamadas de assembleia para tratar da questão (SOEBA, 2010b e CROBA, 2010a).

Há registros de convocação para as assembleias de 30 de março (SOEBA, 2010b) e 13 de abril (CROBA, 2010b), na qual foi deliberada a suspensão do atendimento ao plano no período de 3 a 7 de maio de 2010.

Um aspecto que nos intrigou foi não apenas termos encontrado o auditório cheio na assembleia de abril, mas também o elevado grau de adesão à mobilização. O entrevistado relatou um intenso trabalho de divulgação através de internet, rádio, outdoor, jornal e contato com canais de televisão. Durante a semana de paralisação, a tática de mensuração do grau de paralisação foi a de ligar para as clínicas tentando marcar atendimento pelo convênio, ao que os atendentes respondiam estar suspenso naquela semana.

Na opinião do entrevistado, o elemento diferenciado desta mobilização em 2010 em comparação à outra que ocorrera em 2004 foi o fato de que a anterior decidira pela suspensão do atendimento a todos os planos odontológicos, cortando assim uma grande parte das receitas dos dentistas. Em 2010, o fato de ter sido suspenso o anonimato do entrevistado, não divulgaremos o nome, nem o número da entrevista.

atendimento a um único plano não apenas tornou mais fácil a adesão dos dentistas, como também provocou uma cisão momentânea entre os empresários do setor.

[Referindo-se à mobilização de 2004]... então se você corta tudo, se você corta sua receita, você não, você não permite a sobrevida do seu consultório, da sua clínica, tal, então a estratégia agora foi um dos erros, o outro erro foi que a gente botou os planos pra conversarem entre si, certo, nós unimos os inimigos...

[Referindo-se à mobilização de 2010] A estratégia nossa foi, além de não unir os inimigos, dividir os inimigos, (...) então, ao invés de unir os inimigos, nós dividimos, botamos (...) os outros convênios pra falarem mal da Prevdonto.

Como resultado, obteve-se o retorno à tabela anterior e 6% de aumento, além da instalação de mesa de negociação para tratar de data-base e novo reajuste de 4% (SOEBA, 2010a e CROBA, 2010d). Todavia, esses ganhos foram perdidos alguns meses depois, como será descrito no capítulo 6.