• Nenhum resultado encontrado

Simbolismo da Lua

No documento Download/Open (páginas 36-40)

A lua conecta em várias culturas, a fonte de energia e as mudanças de ci- clos naturais. Ela está submetida à lei universal do devir, do nascimento e da morte,

e também é o próprio homem. Por esta razão, em vários rituais do homem arcaico, vemos na celebração da lua o caráter de astro dos ritmos da vida, sendo considera- da como “um fruto que cresce por si mesmo” (ELIADE, 2002, p. 127). O tempo con- creto foi medido através das fases lunares desde a era glaciária, precedendo a utili- zação do tempo astronômico. No plano cósmico, a lua coloca em ligação o fluxo do devir cíclico: das águas, da vegetação, da fertilidade e das chuvas através da lei de variação periódica deste astro. Dessa maneira, a lua revela a união de fenômenos naturais e de significações no cosmos, criando simetrias e analogias entre estes fe- nômenos.

Segundo Eliade (2002), a consciência do homem arcaico colocou-o frente a sua sede de regeneração/renascimento daquilo que tinha um fim. O reconhecimento da vida no ciclo da lua, fez com que este homem sintetizasse a sua realidade. Este astro revela o sagrado através da força, da vida inesgotável e da regeneração de sua energia.

O símbolo espiritual predileto da esfera matriarcal é a lua, em sua correla- ção com a noite e com a Grande Mãe do céu noturno. A lua representa o lado iluminado da noite; pertence-lhe, é o seu fruto e sua sublimação como luz e essência de sua natureza espiritual (NEUMANN, 2003, p. 59).

No mundo matriarcal, a lua como simbolismo do Grande Feminino retrata o re-nascimento diante as mudanças de suas fases na visão do caráter de transforma- ção do Feminino (NEUMANN, 2003).

Para Marshack (apud POLLACK, 1998, p. 93), o marco fundamental que ca- racterizou os seres humanos não foi a fabricação de ferramentas, mas sim a sua capacidade de contar histórias e marcar o tempo. Estas capacidades ocorreram de- vido o desenvolvimento do cérebro, ou seja, da vivência no campo corporal. As his- tórias iniciais originaram das experiências da menstruação e da gravidez, vinculadas à observação da lua e das vacas, no que tange à capacidade de perceber os ciclos,

buscando sentidos à criação que emerge do corpo da Deusa, enquanto corpo femi- nino vivenciado como divino.

A lua simboliza a mulher diferenciando o feminino do masculino, sendo este último representado pelo sol. O astro lunar revela uma natureza mutável e cíclica remetendo-nos à natureza do princípio feminino, renegado à “noite do instinto e as percepções sombrias do mundo inferior” (HARDING, 1985, p. 47). Como símbolo que emana do inconsciente, a lua exerce um fascínio sobre a humanidade, tornan- do-se um mana, que exige adoração e atenção. E a representação mais primitiva da divindade lunar é a pedra sagrada em forma de cone ou de pilar de pedra.

A adoração da lua é a adoração dos poderes criativos e fecundos da natu- reza e da sabedoria que é inerente ao instinto e à harmonia com a lei natu- ral. Mas a adoração ao sol é a adoração daquilo que conquista a natureza, que organiza a sua abundância caótica e subordina seus poderes, visando à realização das finalidades do homem (HARDING, 1985, p.61).

As qualidades divinas inerentes ao homem foram ligadas ao Logos, ou seja, o princípio masculino. O Logos combate a ignorância e a indolência através da cons- ciência espiritual, entretanto, no séc. XX vimos a elevação dos aspectos intelectuais e da racionalidade como o poder espiritual que subjugou o caráter criativo do divino e esterilizou essa temática espiritual.

Uma investigação sobre a deusa lunar nos aproxima do seu aspecto animal. Seguindo a evolução do pensamento religioso vemos inicialmente a divindade lunar como um animal, para posteriormente como o espírito de deus(a). Depois o deus ou deusa era escoltado por animais e ao prosseguir no percurso da evolução, os hu- manos usavam máscaras de animais para representar a divindade lunar, dançando em rituais e invocando o poder das feras. Esta representação coloca o instinto femi- nino como algo inteiramente animal na qualidade da Grande-Mãe, na qual a sexuali- dade e a fecundação eram reverenciadas à Deusa, o que diviniza a natureza das

mulheres. Os animais evidenciam características da deusa lunar, como os aspectos destrutivos, vorazes, maternais e nutrientes (HARDING, 1985).

A crença mais primitiva sobre a lua é a de que ela seria uma presença ou uma influência fertilizadora. Quando as formas religiosas se tornaram mais organizadas, a lua converteu-se definitivamente em uma pessoa, primeiro um homem, mais tarde um deus, um poder ou divindade masculina fertiliza- dora (HARDING, 1985, p. 125).

A imagem de um rei poderoso era a encarnação da divindade lunar, e em épocas posteriores, o rei viria a ser seu representante, e não mais seu descendente. O deus lunar seria um ser masculino fertilizador e os mitos incorporam a mudança do ciclo lunar à vivência humana, antroporfomizando este astro. Com o advento da adoração ao Sol, ocorre uma transição do deus para a deusa lunar, subjugando as características do feminino no processo de aculturação.

Vemos em algumas culturas o deus lunar como andrógino, ou seja, tanto masculino como feminino. Na última fase de transição do culto à divindade lunar a lua será tida como Mãe, tornando-se a Grande-mãe-de-todos. A mãe do deus lua gera-o e dá a luz, mas também é fertilizada por este, dando referências às suas qua- lidades andróginas. A mãe provedora de tudo, ou seja, dos deuses, dos homens e das criaturas do campo, aparece em diversas mitologias como a Mãe-lua, a Mãe- terra ou a Mãe-Natureza, surgindo através de conceitos entrelaçados. Entretanto, o poder gerador destas entidades traz um ponto em comum entre estas Mães. O fato é que: “em todas as épocas, e por toda parte, os homens têm concebido uma Gran- de-mãe, uma Grande-mulher que zela pela humanidade lá do céu ou do lugar dos deuses” (HARDING, 1985, p.139).

A deusa lunar, em seus aspectos cíclicos claro e escuro, luminosa e negra, foi representada em diversas culturas como duas deusas diferentes. Em diversos luga- res e culturas vemos várias denominações às deusas lunares, entretanto seus atri-

butos e características encontram similaridade com aspectos provedores da vida e da fertilidade (lua luminosa), e também de aspectos que controlam os poderes des- trutivos da natureza (lua negra). No mundo grego, Hécate era considerada o ápice do poder negro da lua escura, por isso, os rituais em sua homenagem eram realiza- dos à noite para apaziguar os seus aspectos maléficos, sendo considerada como a Rainha-dos-fantasmas, que possuía em sua companhia espíritos e cães latindo. Es- ta deusa é representada pela lua minguante e nova, ou seja, em seu lado sombrio, levando à destruição e à morte (HARDING, 1985).

Na produção mitológica de imagens, a lua crescente e a espada em forma de foice representam o poder do feminino. A lua simboliza o desconhecido, como os mistérios das emoções, do amor, e da capacidade de gerar e renovar. No aspecto simbólico, a foice indica a força da lua, bem como a das emoções e a das marés psíquicas, o ir e vir do fluxo da vida (WHITMONT, 1991). Para Pollack (1998), os chifres da vaca e dos touros – o semi círculo – estão ligados ao poder corporal da menstruação. No período do Neolítico, a cabeça e os chifres do touro foram cultua- dos como demonstração da importância da Deusa e há especulações da semelhan- ça entre a cabeça e os chifres do touro com a representação do útero e das trompas de Falópio da mulher.

No documento Download/Open (páginas 36-40)

Documentos relacionados