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Após a transmissão vetorial do T. cruzi ao humano, é comum a observação de sinais clínicos no local da entrada do parasito, que pode ocorrer no local da picada (chagoma de inoculação), ou no olho (sinal de Romaña). O sinal de Romaña ocorre quando a pessoa se infecta após coçar a região da picada contendo as fezes do inseto e leva a mão até o olho, permitindo a entrada do parasito através da mucosa.

No caso do paciente vir a desenvolver o sinal de Romaña, ele apresentará edema na região do olho, bipalpebral, unilateral, indolor, acompanhado por conjuntivite não purulenta e adenopatia satélite.

Porém, se o paciente apresentar sinal de inflamação bastante evidente no local de picada do vetor, este desenvolverá uma reação de hipersensibilidade tardia em resposta a saliva e aos antígenos do inseto vetor. O chagoma de inoculação foi descrito pela primeira vez por Mazza e Freire (1940), e caracteriza-se como uma lesão cutânea redonda avermelhada, endurecida, indolor ou pouco dolorosa de 2 a 5 cm de diâmetro e que pode ou não ulcerar.

A infecção aguda se inicia de 6 a 10 dias após a entrada do T. cruzi no hospedeiro, podendo durar de 6 a 8 semanas. Esta fase é caracterizada pela alta parasitemia do T. cruzi no paciente (Burleigh, 2011; Steverding, 2014).

Nesta fase da doença, mais de 99% dos casos é inaparente, ou seja, os pacientes não conseguem identificar qualquer sintoma. Este fato faz com que o paciente não procure o atendimento médico (Bern, 2011). Um estudo realizado com 544 indivíduos expostos a infecção natural pelo T. cruzi, indicou que apenas um terço das pessoas infectadas apresentou sintomas compatíveis com a doença aguda (Teixeira et al.,1997).

Ainda que raros, os sintomas mais comuns na fase aguda da doença compreendem febre de pequena intensidade, dores no corpo, hepatomegalia, esplenomegalia, adenomegalia, edema no rosto, membros inferiores ou generalizados, conjuntivite e diarréia. Análises laboratoriais podem evidenciar anemia, aumento na concentração de enzimas do coração e do fígado, e trombocitopenia (Tanowitz et al.,2009). Os linfonodos quando aumentados

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apresentam-se isolados, indolores, móveis e sem sinal de inflamação. O baço tem consistência normal, liso e indolor. A esplenomegalia não costuma ser acentuada e a hepatomegalia não é dolorosa à palpação. A miocardite e/ou a meningoencefalite pode aparecer durante a fase aguda em crianças com menos de cinco anos de idade, e neste caso, é indicativo de prognóstico ruim da doença e geralmente fatal (Steverding, 2014).

Segundo Rassi et al., (2010), existem diferenças no tempo do início do aparecimento dos sintomas se o T. cruzi for contraído por diferentes meios de transmissão. No caso das pessoas que adquirem a infecção por meio do vetor, os sintomas geralmente começam a aparecer em cerca de 1 a 2 semanas após a infecção. Mas se a infecção tiver origem pela doação de sangue infectado, os sintomas aparecerão mais tardiamente, alguns meses mais tarde.

Após a passagem da fase aguda, a doença evolui para a fase crônica, e é caracterizada por baixa parasitemia no paciente, assim como elevação dos títulos de anticorpos IgG e diminuição de IgM.

1.10.2 Fase indeterminada da doença de Chagas

Os pacientes que evoluíram para a fase crônica, mas não possuem qualquer sintomatologia clínica, são considerados pacientes na fase indeterminada da doença. Esta fase pode durar a vida inteira para 60 a 70% dos pacientes infectados. Outros 30 a 40% dos pacientes infectados, após permanecerem cerca de 10 a 40 anos na fase indeterminada da doença, desenvolverão sintomatologia clínica, cardíaca ou gastrointestinal (Nunes et al., 2013; Gobbi et al., 2014). O critério utilizado atualmente para se definir um paciente que está na fase indeterminada da doença depende de resultados de teste sorológico positivo para IgG anti-T. cruzi, ou demonstração do parasito. Porém, esses pacientes não possuem sinal clínico cardíaco (sem anormalidade ao eletrocardiograma) ou digestivo da doença, e tem tamanho regular do coração, esôfago e cólon demonstrado em radiografia. Os achados histopatológicos de biópsia de pacientes durante essa fase demonstram presença de lesões inflamatórias no coração, trato digestivo e tecido muscular similar aos encontrados em pacientes durante a fase crônica da doença, mas em grau muito menos intenso (Teixeira et al., 2006b).

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1.10.3 Infecção crônica

A fase crônica, ou sintomática da doença, começa com o início do aparecimento das lesões teciduais provocadas pela infecção com o T. cruzi. Ainda que a grande maioria dos indivíduos infectados permaneça na fase indeterminada ao longo de toda sua vida, em aproximadamente 30% dos pacientes ocorre o aparecimento de lesões teciduais, principalmente no coração e no sistema digestivo (Steverding, 2014). Esta fase inicia-se aproximadamente 10 a 40 anos após a infecção vetorial por T. cruzi (Gobbi et al., 2014).

Dos pacientes que apresentam sintomatologia da infecção por T. cruzi, 94,5% desenvolvem lesões no tecido cardíaco, contra apenas 5,5% que desenvolvem a forma digestiva da doença (Teixeira et al., 2011a). Assim, se considerarmos que existem aproximadamente cinco milhões de brasileiros infectados com T. cruzi, esti- ma-se que um milhão e meio de pessoas têm ou virão a ter comprometimento cardí- aco em decorrência desta doença.

Dentre as formas de apresentação clínica durante a fase crônica da doença de Chagas, a cardíaca representa a mais importante, dada sua prevalência e gravidade no paciente (Nunes et al., 2013). Os fatores responsáveis pela evolução dos sinto- mas para a forma cardíaca da doença não são ainda completamente elucidados, mas sabe-se da participação de mecanismos autoimunes na fisiopatologia da doen- ça (Hecht et al., 2010; Teixeira et al., 2012; Guimaro et al., 2014).

A miocardiopatia no paciente chagásico crônico é semelhante a miocardiopatia dilatada idiopática e tem como característica um processo inflamatório de células mononucleares multifocal. Pacientes com miocardiopatia chagásica crônica têm prognóstico pior quando comparado com pacientes com miocardiopatia dilatada idi- opática (Nunes, 2013). Nesta fase da infecção, não existem evidências de que o pa- rasito esteja envolvido no aparecimento dos sinais clínicos (Villas-Boas et al.,2004). A inflamação crônica, de baixa intensidade mas persistente, acaba por provo- car destruição tissular progressiva e fibrose extensa no coração (Andrade et al., 2011; Falchetto et al., 2015). Os achados mais comuns de pacientes com cardiomi- opatia chagásica crônica são: hipertrofia do miocárdio, dilatação das cavidades car- díacas, presença de fibrose, formação de trombos, afinamento do ápice ventricular do ventrículo esquerdo e que pode culminar para formação de aneurisma apical

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(Coura, 2007). Com isso, o coração aumenta de tamanho e surgem arritmias e blo- queios atrioventriculares, além de tromboembolismo e miocardiopatia que antecipa a insuficiência cardíaca, considerada a forma mais grave de manifestação da doença (Coura e Borges-Pereira, 2010; Rassi et al., 2012).

O único achado comum a todos os casos de pacientes chagásicos é a presen- ça de infiltrado de células mononucleares nos tecidos alvo, pois em apenas 10% desses casos são encontrados os parasitos no local da inflamação (Teixeira et al., 2006b).

Outros achados clínicos de pacientes que podem estar presentes na cardiopa- tia chagásica crônica são descritos por Bern (2011), e inclui bloqueio átrio- ventricular, taquicardia ventricular persistente, disfunção do nodo sinoatrial - culmi- nando em bradicardia severa, formação de trombos no ventrículo esquerdo, e dilata- ção progressiva do ventrículo esquerdo seguido por falência cardíaca congestiva.

Depois de mais de 100 anos da descoberta da doença, a compreensão pato- genia da doença de Chagas ainda requer estudos físicos-químicos sobre a sinaliza- ção entre as células efetoras e células-alvo da resposta autoimune. Atualmente, pesquisadores buscam explicar o que exatamente exacerba o processo inflamatório no tecido cardíaco.

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