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2.4 CONSEQUÊNCIAS PARA O ASSEDIADOR

2.4.1 Sindicância e Processo Administrativo Disciplinar (PAD)

Quando o assédio moral é praticado em ambiente organizacional público deve ser investigado mediante sindicância e/ou instauração de processo administrativo disciplinar a fim de se apurar responsabilidades decorrentes de tal conduta. O Manual de Processo Administrativo Disciplinar/CGU expressa que, além da Constituição Federal, e como principal regulamento a Lei nº 8.112/1990, a base legal do processo administrativo disciplinar no âmbito da Administração Pública Federal é formada pela Lei nº 9.784/1999 (lei de processo administrativo); Lei nº 8.429/1992 (lei de improbidade administrativa); o Decreto nº 5.480/05, que regulamentou o Sistema de Correição do Poder Executivo Federal, bem como o Decreto nº 5.483, de 30 de junho de 2005, que instituiu a sindicância patrimonial. (BRASIL, 2017, p. 14)

Sindicância é conceituada por Cretella Juníor (1960, p.429) como meio sumário de que se vale a Administração Pública para apurar ocorrências anômalas no Serviço Público de forma sigilosa ou pública, com indiciados ou não, as quais, se confirmadas, proporcionarão elementos concretos necessários a viabilizar a abertura de processo administrativo contra o responsável. Portanto, a sindicância pode dar ensejo à abertura de processo administrativo disciplinar com vistas à uma apuração de conduta de maneira mais aprofundada.

Segundo Bandeira de Mello (2009, p.480) “procedimento administrativo ou

processo administrativo é uma sucessão itinerária e encadeada de atos

administrativos que tendem, todos, a um resultado final e conclusivo”. O autor destaca que no ordenamento jurídico-positivo brasileiro podem ser identificados 12 princípios obrigatórios, com fundamento implícito ou explícito na Constituição Federal, sendo que os nove primeiros se aplicam a todo e qualquer procedimento: (I) princípio da audiência do interessado; (II) princípio da acessibilidade aos elementos do expediente; (III) princípio da ampla instrução probatória; (IV) princípio da motivação; (V) princípio da revisibilidade; (VI) princípio da representação e assessoramento; (VII) princípio da lealdade e boa-fé; (VIII) princípio da verdade material; (IX) princípio da celeridade processual; (X) princípio da oficialidade; (XI) princípio da gratuidade; (XII) princípio do informalismo. (MELLO, 2009, p.494-495)

O art. 148 da Lei n.º 8.112/1990 define processo disciplinar como: “o instrumento destinado a apurar responsabilidade de servidor por infração praticada no exercício de suas atribuições, ou que tenha relação com as atribuições do cargo em que se encontre investido” (BRASIL, 1990).

A Lei nº 9.784/1999 estabelece normas básicas sobre o processo administrativo no âmbito da Administração Federal direta e indireta, visando, em especial, à proteção dos direitos dos administrados e ao melhor cumprimento dos fins da Administração, prevendo, ainda, a obediência da Administração aos princípios da legalidade, finalidade, motivação, razoabilidade, proporcionalidade, moralidade, ampla defesa, contraditório, segurança jurídica, interesse público e eficiência (BRASIL, 1999).

O art. 52 da Lei n.º 9.394/1996 (LDB) define universidades como “instituições pluridisciplinares de formação dos quadros profissionais de nível superior, de pesquisa, de extensão e de domínio e cultivo do saber humano” (BRASIL, 1996). Via de regra, o ambiente organizacional público, além de características como estrutura

hierarquizada, observância à legalidade, estabilidade de emprego, é permeado por intensa atividade política. As universidades públicas, além disso, apresentam ambiente peculiar, composto por docentes, discentes, servidores técnicos e administrativos, estagiários, profissionais terceirizados, dentre outros. Num cenário tão diversificado é possível vislumbrar, ainda que hipoteticamente, a ocorrência de assédio moral em suas modalidades vertical, horizontal e misto.

Na ocorrência de denúncia por assédio moral em universidades federais e instauração do PAD respectivo, há que se investigar a conduta e buscar pela produção de provas e ampla defesa com vistas ao alcance da verdade material, máxime pelo fato de que eventual denúncia infundada desta natureza pode acarretar prejuízo moral de difícil reparação ao acusado. Portanto, a comissão disciplinar deve buscar apurar “o que realmente teria acontecido, não se contentando apenas com aquela versão dos fatos levada ao processo pelos envolvidos. Não se admite, deste modo, a “verdade sabida” no processo administrativo disciplinar” (CGU, 2017, p. 17). O princípio da verdade real ou material

Consiste em que a Administração, ao invés de ficar restrita ao que as partes demonstrem no procedimento, deve buscar aquilo que é realmente verdade, com prescindência do que os interessados hajam alegado e provado, como bem diz Héctor Jorge Escola. Nada importa, pois, que a parte aceite como verdadeiro algo que não o é ou que negue a veracidade do que é, pois no procedimento administrativo, independentemente do que haja sido aportado nos autos pela parte ou pelas partes, a Administração deve sempre buscar a verdade substancial. O autor citado escora esta assertiva no dever administrativo de realizar o interesse público (MELLO, 2009, p.497).

Segundo o Manual de Processo Administrativo Disciplinar/CGU é com base neste princípio é que se justifica o poder-dever da Administração em tomar emprestado e de produzir provas a qualquer tempo, atuando de ofício ou mediante provocação, a fim de formar sua convicção sobre a realidade dos fatos em exame. “Ainda que aquele que figura como acusado não tenha pedido a produção de determinada diligência que poderia lhe beneficiar, afastando, por exemplo, sua autoria, cabe à comissão buscar a produção de tal prova”. (CGU, 2017, p. 17)

Contudo, é pertinente considerar a possibilidade de desvirtuamento do instrumento do processo administrativo disciplinar (PAD) visando a prática do assédio moral. Ou seja, a inversão da sua finalidade justamente pela abertura indevida e proposital de PAD com o intuito de impor terror e perseguição por parte do assediador contra assediado de forma ascendente, descendente ou mista. Tanto isto é possível

que o TRF 4ª Região já enfrentou a questão em julgamento de recurso de apelação discutindo a abertura indevida de PAD pela chefia contra determinado servidor público conforme se verifica pela ementa e trecho do acórdão abaixo transcritos.

ADMINISTRATIVO. INDENIZAÇÃO POR ASSÉDIO MORAL NO TRABALHO. COMPROVAÇÃO DO DANO MORAL. FIXAÇÃO DA INDENIZAÇÃO.

1. Convencionou-se chamar de assédio moral o conjunto de práticas humilhantes e constrangedoras, repetitivas e prolongadas, às quais são submetidos os trabalhadores no exercício de suas funções usualmente quando há relação hierárquica em que predominam condutas que ferem a dignidade humana, a fim de desestabilizar a vítima em seu ambiente de trabalho

2. Para o reconhecimento do assédio moral deve ser comprovada a ocorrência de situações no trabalho que efetivamente caracterizem o dano moral, tais como hostilidade ou perseguição por parte da chefia, hipótese dos presentes autos.

3. Restou suficientemente comprovado o assédio sofrido pelo autor, pois, ao que se percebe, o comportamento de sua chefia tinha o intuito de constrangê- los psíquica e profissionalmente.

4. Na quantificação do dano moral devem ser sopesadas as circunstâncias e peculiaridades do caso, as condições econômicas das partes, a menor ou maior compreensão do ilícito, a repercussão do fato e a eventual participação do ofendido para configuração do evento danoso. A indenização deve ser arbitrada em valor que se revele suficiente a desestimular a prática reiterada da prestação de serviço defeituosa e ainda evitar o enriquecimento sem causa da parte que sofre o dano.

(...)

O autor teve instaurado contra si 04 PADs

(...) divulgaram no âmbito interno da Polícia Federal todas as imputações administrativas a que o autor esteve submisso, mesmo antes de haver comprovação de algum ilícito pelo demandante e, por fim, submeteram o autor 04 PADs, sendo que todos foram arquivados.

Com efeito, verifico que restou suficientemente comprovado o assédio moral sofrido pelo autor pois, ao que se percebe, o comportamento dos seus chefes tinha o intuito de constrangê-lo psíquica e profissionalmente (BRASIL, TRF4, 2017).

O processo administrativo disciplinar (PAD) é instrumento hábil para se apurar responsabilidades de servidores públicos por infrações praticadas no exercício de suas funções. Contudo, a sua abertura não pode se dar sem nenhum critério, tampouco pode ser usado com finalidade persecutória.

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