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SINTOMAS E SINAIS CLÍNICOS

No documento Síndrome de Fanconi em cães (páginas 44-48)

A sintomatologia é variável de acordo com a gravidade da doença que depende da extensão da deficiência da reabsorção tubular. Os cães gravemente afectados geralmente apresentam poliúria e polidipsia intensas, desidratação, perda de peso, mau estado do pêlo, letargia, redução no apetite e fraqueza (Mainka, S. A., 1985; Bovee, 2003; Tilley & Smith, 2003; Ettinger & Feldman, 2005). Já os cães moderadamente afectados apresentam poliúria moderada e a perda de peso é gradual ao longo de vários anos. Alguns cães podem apresentar apenas ligeira poliúria ou mesmo ser completamente assintomáticos, sendo por isso, dificilmente diagnosticados (Bovee, 2003).

Contudo, em animais sem insuficiência renal os sintomas mais evidentes são, geralmente, a poliúria/polidipsia causada pela diurese osmótica resultante da deficiente reabsorção tubular renal (Kirk, 1989; Dunn, 1999; Ettinger & Feldman, 2005). Existe poliúria quando ocorre uma excreção diária de urina superior a 50 ml/kg, e polidipsia quando a ingestão diária de água é superior a 100 ml/kg (Schoeman, 2008).

Outros sintomas que podem ocorrer são a má condição corporal e crescimento reduzido ou anormal (raquitismo) em animais jovens (Tilley & Smith, 2003). A ocorrência de alterações no metabolismo ósseo que levam a osteomalácia é comummente observada em humanos, no entanto, não é frequente observar-se este fenómeno em cães (Yerley et al., 2004; DiBartola, 2006). Em canídeos de raça Labrador Retriever tem sido descrita a ocorrência de rigidez e dor articular cuja associação com a síndrome não é totalmente compreendida, mas que podem estar associadas à reabsorção crónica de minerais a partir dos ossos, sobretudo cálcio e fósforo, como consequência das perdas renais excessivas destes minerais (Villier & Blackwood, 2005).

Muitos são os casos em que o estímulo iatrotrópico é apenas a presença de poliúria e polidipsia, ou apenas a presença de sintomas resultantes de infecção do tracto urinário (Gonto, 2003), uma vez que os cães com esta síndrome estão predispostos a este tipo de infecção. Alguns pacientes

podem apresentar incontinência ligeira secundária à poliúria/polidipsia, devida ao grande volume urinário produzido, ou como resultado da ITU (Mainka, S. A., 1985; Gonto, 2003).

Os cães com ITU podem ou não apresentar sintomas de doença no tracto urinário, como polaquiúria, estrangúria, disúria e incontinência (Bartges, 2004; Giguère et al., 2006). O exame físico destes animais pode não revelar qualquer alteração. Contudo, a infecção pode estar associada a uma bexiga pequena, firme, espessada e dolorosa à palpação. A ITU superior pode causar febre, dor abdominal na zona renal, rins aumentados de tamanho ou de tamanho normal, e hematúria (Dunn, 1999; Bartges, 2004; Giguère et al., 2006).

A infecção, quando confinada ao tracto inferior, não causa sinais sistémicos de doença. Assim, as ITU inferior não alteram os resultados das análises laboratoriais de rotina (hemograma e perfil bioquímico) a não ser quando outro processo se encontra presente. Já no que respeita às ITU superior, as análises bioquímicas podem estar normais ou indicar insuficiência renal, e caso esteja presente septicémia o hemograma pode revelar leucocitose com desvio à esquerda (Bartges, 2004; Giguère et al., 2006).

No caso da síndrome primária, a idade média ao diagnóstico é muito variável, e pode ir desde as 10 semanas aos 11 anos de idade (Gonto, 2003). Os primeiros sintomas podem surgir precocemente em cães jovens, ou ocorrerem cerca dos 9 anos de idade. A idade média no caso

das fêmeas é de 7 anos, e 4,2 anos no caso dos machos (Bovee, 2003). Os Basenji afectados pela doença encontram-se assintomáticos até ao início da poliúria, polidipsia e glicosúria, que surgem aproximadamente entre os 2 e os 4 anos de idade (Kirk, 1989; Lees, 1996). É portanto uma doença cujo início clínico ocorre sobretudo na idade adulta, sendo raramente diagnosticada em cães muito jovens. Este facto contrasta com a maioria das doenças genéticas cujos sinais clínicos surgem geralmente numa fase precoce da vida dos animais (Sewell, Haskins & Giger, 2007). Os sinais laboratoriais também variam, dependendo da gravidade dos defeitos tubulares e das perdas de solutos, bem como do possível desenvolvimento de insuficiência renal (Kirk, 1989; Tilley & Smith, 2003). Alguns animais são capazes de manter os perfis bioquímicos séricos normais, enquanto que outros desenvolvem alterações como a hipocalemia (em cerca de 1/3 dos animais), hipofosfatemia, hipocalcemia e ARTP. O hemograma de cães afectados é geralmente normal (Latimer et al., 2003; Tilley & Smith, 2003; Yerley et al., 2004).

A hipocalemia devida a perda urinária de potássio, pode contribuir para os sinais clínicos de fraqueza. A fosfatúria pode resultar em osteomalácia nos animais adultos e em raquitismo nos animais jovens, sobretudo se houver concomitantemente perda urinária de cálcio, embora esta situação seja rara (Kirk, 1989). No entanto, existe a possibilidade de se desenvolver hipofosfatemia, dependendo da gravidade da deficiência na reabsorção tubular e consequentes perdas urinárias (Yerley et al., 2004).

A glicosúria, com níveis normais de glicemia, é encontrada em quase todos os cães afectados pela doença (Yerley et al., 2004). A glicosúria na ausência de hiperglicemia, encontrado

frequentemente nos casos de síndrome de Fanconi, muitas vezes é a primeira sugestão da existência da síndrome no paciente (Tilley & Smith, 2003).

Os cães com síndrome de Fanconi apresentam caracteristicamente proteinúria moderada, podendo desenvolver hipoproteinemia ligeira a moderada, resultante da incapacidade de reabsorção normal de proteínas e aminoácidos pelos túbulos renais proximais (Bonagura & Kirk, 1995; Yerley et al., 2004). A aminoacidúria é, portanto, juntamente com a proteinúria, um achado consistente (Yerley et al., 2004). A existência de glicosúria associada a aminoacidúria é sugestiva de síndrome de Fanconi (Bovee, 2003). A aminoacidúria e glicosúria são normalmente consideradas benignas, visto que raramente afectam as concentrações plasmáticas desses solutos (Kirk, 1989), não estando normalmente associadas a outros sinais clínicos para além da poliúria e polidipsia (Tilley & Smith, 2003). A hipoglicemia é raramente observada nos casos de síndrome de Fanconi, embora seja uma hipótese teórica possível devido à ocorrência de glicosúria (Kirk, 1989). Como foi anteriormente dito, as alterações na reabsorção tubular de aminoácidos varia de

indivíduo para indivíduo, no entanto, estas quase sempre incluem uma insuficiência na reabsorção de cistina (Ettinger & Feldman, 2005). Este é o aminoácido que mais consistentemente aparece em quantidades aumentadas na urina de cães com síndrome de Fanconi. Outros aminoácidos como a alanina, a glicina, a lisina e a metionina podem também encontrar-se na urina destes cães em quantidades aumentadas.

Todos os cães vão ter numa fase inicial uma urina diluída e alcalina, devido ao grande volume de água ingerida e à perda de bicarbonato pela urina (Gonto, 2003). A densidade urinária varia normalmente entre 1000 e 1018 (Dunn, 1999; Ettinger & Feldman, 2005). É comum a ocorrência de isostenúria ou de hipostenúria, contudo, a maioria dos cães doentes parece ser capaz de concentrar a urina quando são privados de água, uma vez que a perda de água não vai acompanhar a continua perda de solutos nessas situações de privação hídrica (Mainka, S. A., 1985; Yerley et al., 2004).

Quando se estabelece a acidemia, devido à bicarbonatúria (ARTP), a urina passa a ser ácida, devido aos baixos níveis plasmáticos de bicarbonato que permitem a reabsorção completa deste no túbulo renal proximal, e à contínua excreção de iões H+ nos túbulos renais distais. Portanto, inicialmente estes cães têm uma urina alcalina resultante da bicarbonatúria, mas que mais tarde se torna ácida. Na fase de diagnóstico é mais provável que o cão já apresente urina ácida.

Quando a ARTP ocorre como resultado das perdas excessivas de HCO3- na urina destes cães,

verifica-se um pH sanguíneo baixo e os níveis plasmáticos de bicarbonato encontram-se diminuídos (Bovee, 2003). A hipercloremia está associada a este tipo de acidose metabólica resultante da disfunção renal tubular proximal (Yerley et al., 2004). Portanto, níveis elevados de Cl- podem também ser observados no ionograma destes animais.

A insuficiência renal pode ocorrer. É frequente na forma hereditária da síndrome de Fanconi em Basenjis e Norwegian elkhounds e na doença renal aguda adquirida associada à administração de gentamicina, e outros agentes nefrotóxicos. Nestes casos os defeitos na reabsorção tubular proximal existentes vão exacerbar os sinais de insuficiência renal (Kirk, 1989). Os cães com síndrome de Fanconi que desenvolvem insuficiência renal aguda, podem apresentar sintomas inespecíficos como letargia, anorexia, vómito, diarreia e desidratação. Ocasionalmente pode estar presente hálito urémico e úlceras na cavidade oral (Thoresen & Bredal, 1999; Nelson & Couto, 2003). Já nos casos de insuficiência renal crónica, os sintomas incluem geralmente perda de peso, poliúria/polidipsia, também característica da síndrome de Fanconi, má condição corporal e membranas mucosas pálidas (Thoresen & Bredal, 1999; Nelson & Couto, 2003). É também possível a ocorrência de úlceras orais e estomatite (Nelson & Couto, 2003).

No documento Síndrome de Fanconi em cães (páginas 44-48)

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