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O sistema nervoso possui características anatômicas e fisiológicas únicas, quando comparado a outros órgãos, tais como o revestimento protetor ósseo do crânio e coluna vertebral, sistema especializado de autorregulação do fluxo

sanguíneo cerebral, necessidade de substratos metabólicos, ausência de sistema linfático convencional, uma circulação especial de liquido cerebroespinhal (LCE), supervisão imunológica limitada e respostas distintas à lesão e a cicatrização de ferimentos (FROSCH; ANTHONY; GIROLAMI, 1999).

O sistema nervoso dos vertebrados anatomicamente pode ser dividido em duas partes, com diferenças morfológicas e fisiológicas significativas, são elas, (i) o SNC, composto por encéfalo, medula espinhal e partes neurais do olho; e (ii) o SNP, composto por gânglios periféricos, nervos e terminações nervosas que conectam os gânglios ao SNC e receptores e efetores do corpo (KIERSZENBAUM; TRES, 2012).

O SNC, no adulto, é constituído por neurônios e células da glia ou células de sustentação, o chamado tecido conjuntivo do SNC. Ao contrário dos neurônios, as células da glia não recebem nem transmitem sinais elétricos, possuem a função de fornecer suporte estrutural e manter condições locais para a função neuronal (KIERSZENBAUM; TRES, 2012; STEVENS; LOWE, 1995), estando envolvidas em atividades fundamentais para o desenvolvimento, defesa, nutrição e homeostase do parênquima cerebral (BRODAL, 2010).

Quando o SNC é danificado, as células gliais são mobilizadas, realizam a “limpeza geral dos resíduos” e fecham a área local, levando posteriormente a uma cicatriz glial (gliose), a qual interfere na regeneração neuronal. As células da glia incluem astrócitos, oligodendrócitos, e micróglia (KIERSZENBAUM; TRES, 2012).

Astrócitos são divididos em duas categorias, os fibrosos, predominantemente encontrados na substância branca, e os protoplasmáticos, de predominância na substância cinzenta. Formam a glia limitante, que circunda a maioria dos capilares do encéfalo e toda a superfície interna da pia-máter. Possuem um grande número de filamentos gliais denominados de proteína ácida fibrilar glial,

valioso marcador para identificação de astrócitos por imunohistoquímica (KIERSZENBAUM; TRES, 2012; STEVENS; LOWE, 1995)

Oligodendrócitos são células que participam da formação da bainha de mielina que envolve os axônios na substância branca do cérebro (KIERSZENBAUM; TRES, 2012; BRODAL, 2010; STEVENS; LOWE, 1995).

A micróglia é mobilizada normalmente após infecções, lesões ou doenças degenerativas do sistema nervoso, comportando-se como fagócitos (KIERSZENBAUM; TRES, 2012; BRODAL, 2010; STEVENS; LOWE, 1995), seu fenótipo a caracteriza como célula dendrítica apresentadora de antígenos tendo baixo nível de atividade fagocitária.

Quando em estado ativo, em caso de doença, elas aumentam em tamanho e número e geralmente são suplementadas pelos monócitos (STEVENS; LOWE, 1995), assim, as micróglias se caracterizam pela forma ameboide, acompanhada pela regulação positiva de moléculas de superfície celular, como CD14, receptores do complexo principal de histocompatibilidade (MHC) de classe II e os receptores de quimiocinas. Removem as células neurais em apoptose, eliminam debris tóxicos e aumentam a sobrevivência neuronal pela liberação de fatores tróficos e antiinflamatórios, assim como direciona células tronco para o local da inflamação ou lesão. Micróglias podem tornar-se hiperativadas e apresentar efeitos neurotóxicos pela produção excessiva de superóxido, óxido nítrico (NO) e fator de necrose tumoral α (TNF-α) (KIERSZENBAUM; TRES, 2012).

As células da glia respondem as lesões neuronais com mudanças morfológicas e funcionais, fenômeno conhecido por ativação glial (REISCHKE; KRIEGLSTEIN, 1991; JORGENSEN et al., 1993). Essa reação, particularmente da micróglia, é o mecanismo inicial de defesa do sistema nervoso (DIRNAGL et al.,

1999). Em cultura, a micróglia é estimulada a produzir radicais livres, aminoácidos excitatórios, citocinas inflamatórias, bem como fatores tróficos, sugerindo que a atividade microglial tem duplo papel: defesa do organismo e envolvimento nos processos patológicos (ZHANG, 2003; ROZENFELD et al., 2003).

O epêndima, epitélio simples cúbico, reveste a superfície dos ventrículos encefálicos e o canal central da medula espinhal, consiste em células ependimárias e tanicitos. O epêndima limita o espaço ventricular do cérebro dos vertebrados. O plexo coróide é a combinação de células que se diferenciaram em células secretoras, com os vasos sanguíneos das meninges. O epitélio do plexo coróide representa uma barreira entre o sangue e o líquido cerebrospinhal (LCE), que é produzido no plexo coróide do terceiro e quarto ventrículos (KIERSZENBAUM; TRES, 2012).

A unidade funcional do SNC é o neurônio, célula nervosa excitável e altamente especializada. Composto por três regiões principais: corpo celular, os dendritos e o axônio (KIERSZENBAUM; TRES, 2012; BRODAL, 2010; STEVENS; LOWE, 1995). Possuem estrutura e tamanho bastante variável em cada uma das regiões cerebrais, diferem também entre si, em muitas importantes propriedades: seus papeis funcionais, distribuição de suas conexões, neurotransmissores utilizados para transmissão sináptica, necessidades metabólicas e níveis de atividade elétrica. Um grupo de neurônios pode ser selecionado para destruição em dada situação patológica (vulnerabilidade seletiva) por dividir uma ou mais de suas propriedades (FROSCH; ANTHONY; GIROLAMI, 2004).

A sinapse é a junção celular específica que permite a comunicação direta entre células, quando uma substância transmissora é secretada de maneira localizada por uma célula e recebida exclusivamente por outra (STEVENS; LOWE,

1995) para a transmissão da mensagem química em resposta a um potencial de ação o terminal sináptico é especializado, onde terminal pré-sináptico, normalmente um axônio, responsável pela transmissão, e membrana pós-sináptica, normalmente dendrítico ou somático, por vezes axonal, recebem a informação (KIERSZENBAUM; TRES, 2012).

O transporte axonal é importante na patogênese de doenças infecciosas neurológicas, como a raiva, e podem ocorrer em dois sentidos: transporte axonal anterógrado de neurotransmissores, mediado pela quimesina, é o que ocorre do corpo celular aos terminais axonais; e o transporte axonal retrógrado, mediado pela deneína citoplasmática, de fatores de crescimento e para reciclagem de componentes do terminal axônico, ocorre dos terminais axônicos para o corpo celular (KIERSZENBAUM; TRES, 2012;STEVENS; LOWE, 1995).

O SNC é protegido por três elementos estruturais: a barreira hematoencefálica (BHE) com a interface entre o encéfalo eos vasos sanguíneos; a barreira sangue - liquido cerebroespinhal (LCE), formada pelo plexo coróide e a membrana aracnóide com os vasos sanguíneos e o LCE; e a barreira e sangue – aracnóide, que é a interface dos vasos sanguíneos com a camada do epitélio da aracnóide subjacente a dura-máter das meninges. Estas barreiras são estruturas especializadas do SNC que controlam e regulam a homeostase do cérebro, medula espinhal, LCE com o resto dos sistemas (BANKS, ERICKSON, 2010, ROJAS; RITTER; PIZZOL, 2011).

A BHE é composta por um endotélio microvascular, astrócitos, membrana basal, e pericitos, assim como neurônios que estão em proximidade física do endotélio. Todos estes elementos fazem parte da unidade funcional neurovascular(PERSIDSKY et al., 2006), além de diferentes complexos multi-

proteícos, como as junções apertadas ou de oclusão e as junções endoteliais aderentes que são os principais reguladores da permeabilidade celular, estas possuem proteínas de membrana chamadas caderinas, que se unem com a actina via proteínas intermediárias, denominadas cateninas (α,β,Ϫ), para formar contatos adesivos intercelular e atuar conjuntamente as junções de oclusão (figuras 8 e 9) (ROJAS; RITTER; PIZZOL, 2011).

Figura 8 -Representação esquemática das barreiras do cérebro. (Acima) Existem três sítios principais de barreira entre o sangue e o cérebro. (a) É criada ao nível das células endoteliais dos capilares cerebrais por formação de junção de oclusão. (b) A barreira sangue-LCE encontra-se nos plexos coróides nos ventrículos laterais, terceiro e quarto do cérebro onde são formadas junções apertadas entre as células epiteliais na superfície que confronta com o LCE. (c) A barreira aracnóide. encontra- se sob a dura máter. A aracnóide é avascular, mas fica perto do seio sagital superior e está separado dela pela dura máter. A aracnóide é um epitélio de múltiplas camadas com junções apertadas entre as células da camada interior que formam uma vedação eficaz

Fonte: Adaptado de Abbott et al.(2010). (a) Sangue

(b) Sangue

(c) Espaço subdural

Células do endotélio vascular

Células do endotélio vascular f enestrado Células endoteliais do plexo coróide

LCE LCE Célula Célula Célula Junções apertadas Junções apertadas Junções apertadas Pia máter Epêndima villus aracnóide Dura máter Sinus sagital superior Plexo coróide Ventrículo lateral Terceiro ventrículo Quarto ventrículo Canal central

Figura 9 - Representação esquemática das associações celulares na BHE. Corte transversal de um capilar cerebral. A circunferência do lúmen capilar está completamente rodeada por uma única célula endotelial (CE), as membranas basais estão ligadas por JA. Pericitos (PC) estão ligados à superfície abluminal da CE, e estes dois tipos de células estão rodeados por a lâmina basal (MB), que é contígua com as membranas plasmáticas dos astrócitos (AC) e CE que vedam o caminho paracelular de difusão aquosa entre as células. Tanto as células endoteliais cerebrais e os pericitos são delimitados por, a membrana basal local, que forma uma matriz extracelular perivascular distinta (lâmina basal 1, BL1), diferente da composição a partir da matriz extracelular do pé terminal da glial delimitadora do parênquima cerebral (BL2). Alterações nas relações entre células endoteliais e astrócitos que ocorrem de alterações da permeabilidade e a inflamação no SNC na infecção pelo RABV.

Fonte: Adaptado de Ballabh, Braun, Nedergaard, 2004; Hawkins, Davis, 2005; Pardridge, 2007; Fabis et al., 2008; Abbott et al., 2010

As junções de oclusão, por sua vez, são formadas por três proteínas integrais de membrana, denominadas claudinas (asseguram a alta resistência elétrica das monocamadas das células endoteliais e diminuição da permeabilidade paracelular), ocludinas (regulam a seletividade paracelular aos íons pequenos) e moléculas de adesão juncionale um grande número de proteínas citoplasmáticas acessórias (zonulaoccludens, cingulina, proteínas guanilatoquinase associadas

AC JA PC MB Microglia Microglia Astrócito Neurônio Neurônio

Junções apertadas (JA)

Músculo liso Célula endotelial Pericito Capilar CE Células T Infecção pelo RABV

amembrana), que conectamas proteínas de membrana à actina para a manutençãoda integridade estrutural e funcional do endotélio (ROJAS; RITTER; PIZZOL, 2011).

Sob condições fisiológicas, assegura o fornecimento constante de nutrientes (oxigênio, glicose, e outras substâncias) para as células do cérebro e orienta as células inflamatórias para responder às alterações do ambiente local. As células gliais e neurônios podem regular a função dos vasos sanguíneos em resposta às exigências metabólicas (PERSIDSKY et al., 2006).

O transporte em toda a BHE é estritamente limitado através das junções de oclusão, que são barreiras físicas metabólicas. A permeabilidade restrita é fator limitante para a entrada de agentes terapêuticos para o SNC (PESIDSKY et al. 2006). Além das funções de permeabilidade seletiva a BHE possui aspectos importantes como funções neuroimune, incluindo a secreção de citocinas, prostaglandinas e óxido nítrico (ROJAS; RITTER; PIZZOL, 2011).

A característica determinante para que uma substância atravesse a BHE é sua lipossolubilidade; sendo uma estrutura dinâmica que, sob determinadas influências pode modificar suas características de permeabilidade, levando a um aumento no aporte de determinados substratos da periferia para o SNC ou em sentido contrário a fim de remover substâncias do SNC (SARMENTO, 1992). BHE com danos físicos ou alterações nos sistemas de transporte desempenham um papel importante na patogênese de muitas doenças do SNC. Substâncias pró- inflamatórias e proteínas associadas a doenças específicas, muitas vezes mediam tal disfunção da BHE. Apesar de aparentemente diversas causas subjacentes a disfunção da BHE, mediante vias intracelulares comuns, emergem para a regulação da integridade estrutural e funcional(PESIDSKY et al. 2006).

As proteínas virais secretadas por células infectadas também afetam diretamente a expressão e função das junções de oclusão. As interações entre os macrófagos ativados e astrócitos cerebrais amplificam ainda mais as respostas inflamatórias, dando origem a alterações da BHE, por ação direta ou pela maior migração de monócitos (PESIDSKY et al. 2006).

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