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Capítulo 2: A concorrência

2.2. Sistemas de proteção

A forma como é feita a defesa da concorrência deve-se primeiramente à teoria adotada pelo sistema. O valor que este bem assume, frente aos outros valores

52 ALVES, Jorge de Jesus Ferreira. Direito de concorrência nas comunidades européias. 2ª ed. Coimbra: Coimbra editora, 1992. p. 21.

53ROLIM, Maria João Pereira. Direito Econômico da Energia elétrica. Rio de Janeiro:

Forense, 2002, p. 206.

adotados pela legislação influi no sistema de proteção que é dado. Também influi a capacidade de controle do agente regulador.

2.2.1. Sistema de ilicitude, perigo ou prevenção de danos

Neste sistema a regra geral é a ilicitude de acordos de cooperação ou concentração tendentes a causar prejuízo à concorrência. Há ligação entre essa forma de controle com a teoria da concorrência-condição:

Daí estabelecerem uma <proibição genérica e a priori de todos os acordos e práticas susceptíveis de atingirem a estrutura concorrencial do mercado, combatendo-se, portanto, a concentração através da proibição das práticas que a ela possam conduzir>. Este sistema (da per se condemnation) abstrai dos resultados efectivos das restrições à concorrência, para centrar a sua atenção no perigo que estas, por si mesmas, representam.54

Característica do sistema norte-americano é negar legalidade a priori a todos os acordos ou práticas que possam afetar a concorrência. No entanto, como já dito, essa regra é atenuada pela prática jurisprudencial, com a aplicação da regra da razão, buscando punir apenas aquelas práticas que causem danos efetivos à concorrência, ou que, causando dano atual possam aumentar a concorrência no futuro.

Este sistema dá uma resposta rápida aos possíveis danos à concorrência, e tal ação rápida evita que haja danos irreversíveis à economia. Todos os acordos ou práticas potencialmente lesivas devem passar por controle administrativo ou judicial antes da sua realização. Apesar do benefício da resposta rápida, abre-se a discussão sobre a necessidade de flexibilizar o sistema, que certamente necessita de práticas ou acordos que lesem a concorrência, mas tragam outros benefícios para a economia e população (teoria da concorrência-instrumento) ou mesmo que gere mais concorrência no futuro (teoria da concorrência-condição). Estes, para se realizar vão ter primeiramente que passar pelo crivo do sistema, o que pode demorar, atrasando também os efeitos positivos que pode gerar. Entretanto é muito difícil a análise de um ato de cooperação ou concentração econômica enquanto este somente está no plano abstrato. Por vezes o acordo dá forças para gerar lesões à concorrência, mas na prática usam-se estes poderes sobre o mercado para fins aceitáveis e sem nenhuma lesão à concorrência.

54 SANTOS, António Carlos dos; GONÇALVES, Maria Eduarda; MARQUES, Maria Manuel Leitão. Direito Económico. 5.º ed. rev. e actual. Coimbra, Almedina, 2006. p.319.

Outra forte crítica que se faz a este sistema se dá pela imensa quantidade de trabalho que gera ao órgão fiscalizador, o custo e tempo necessário para que este analise todos os casos. Se esta análise for lenta penalizam-se os agentes econômicos que podem perder a oportunidade que se abre e sofrer defasagem frente aos concorrentes, afinal a economia de mercado exige respostas rápidas dos agentes.

2.2.2. Sistema de controle, abuso ou repressão do dano efetivo

Neste sistema toda proibição de acordos ou práticas anticoncorrenciais é feita a posteriori, constatado no caso o dano efetivo para a economia nacional, interesse público ou os demais valores eleitos por aquele sistema normativo. É, portanto um sistema que privilegia o comportamento efetivo dos agentes econômicos. Vê a concorrência como um bem entre outros que pode, em certas circunstâncias, ser afastada em nome da proteção de outros bens ou da realização de outros fins socialmente relevantes. Por isso que este sistema não pretenda abstratamente combater os acordos ou práticas de domínio do mercado com concentração econômica, procura apenas reprimi-los quando concretamente se revelem prejudiciais à concorrência não justificados por outras razões sociais ou econômicas, eleitas pelo sistema.

Neste sistema dá-se mais liberdade aos agentes econômicos para operarem no mercado, cientes de que caso haja dano à concorrência serão reprimidos. Assim os agentes podem com seus atos demonstrar que apesar da potencialidade do dano, não há dano efetivo. O maior problema é que controle a posteriori por vezes condena atos de grande prejuízo e difícil reversão. Principalmente em casos de fusão empresarial é muito difícil separar as empresas e fazê-las voltar ao estado anterior ao da fusão.

Fortemente relacionado com a teoria da concorrência-instrumento, foi adotado na Bélgica, Holanda e países nórdicos.55

55 ALVES, Jorge de Jesus Ferreira. Direito de concorrência nas comunidades européias. 2ª ed. Coimbra: Coimbra editora, 1992. p. 20.

2.2.3. Sistema misto

Essa separação entre sistemas e teorias da concorrência, há de se notar, é mais didática que real. A grande maioria dos países atualmente segue algum tipo de sistema misto, temperado com as duas formas de controle. Não se pode dizer que todos aqueles países que adotam a teoria da concorrência-condição seguem o sistema de ilicitude, muito menos o contrário.

Não é possível definir, anotar as características de um sistema misto. Só é possível dizer o que ele não é e esse seria um ‘conceito às avessas’ que, na verdade, nada conceitua. Não se trata, portanto de nenhum dos sistemas puros acima. Há combinação das duas técnicas de proteção da concorrência, dependendo da situação. Algumas práticas são proibidas a priori, enquanto outras merecem o cuidadoso estudo dos efeitos obtidos concretamente, depois que a prática foi realizada. Sistemas mistos procuram adaptar o controle à realidade do sistema normativo, buscam juntar as qualidades, e evitar os conhecidos defeitos de ambos.

Os sistemas da lei inglesa, alemã, francesa, portuguesa, e comunitária, assim o são.