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Sistematização da amostra de obras de Amadeo a selecionar

CAPÍTULO 1 – CONSTRUÇÃO DA PROBLEMÁTICA E DESENHO DA

1.3. Sistematização da amostra de obras de Amadeo a selecionar

CAPÍTULO 1 – CONSTRUÇÃO DA PROBLEMÁTICA E

DESENHO DA PESQUISA

1.1. O percurso metodológico

Procurando atender ao percurso metodológico percorrido, numa matéria que se sabia, à partida, ser heterogénea, entendeu-se como mais adequado um método de trabalho de cariz antropológico, por este possuir maiores pontos de encontro com a própria metodologia de base da Convenção 2003.

Atualmente, e numa mudança de paradigma face aos quadros normativos anteriores à Convenção 2003, são as próprias comunidades e detentores do PCI que são olhadas como representando o foco e o início do processo de salvaguarda. Sendo metodologicamente exigida a sua participação ativa no processo de identificação, exploração e inventariação das práticas, representações, expressões, conhecimentos e aptidões, procurei assumir o mesmo método, dialogando com os atores locais 19.

19 Neste processo de seleção do caso de estudo, em consonância com os propósitos definidos

pelo regime jurídico de salvaguarda do PCI, reiteram-se os princípios fundamentais que o norteiam, entre os quais o reconhecimento da importância e diversidade do PCI enquanto fator essencial para a preservação da identidade e memória coletivas das comunidades, grupos e indivíduos; do papel de especial importância que desempenham as autarquias locais na promoção e apoio ao conhecimento, defesa e valorização das manifestações do PCI das respetivas comunidades; do papel determinante que desempenham as direções regionais da cultura, enquanto administração cultural de proximidade, no apoio às comunidades, grupos ou indivíduos para a proteção legal do respetivo PCI; da importância de que se reveste o Inventário Nacional do Património Cultural Imaterial como enquadramento técnico e metodológico de referência a nível nacional para a identificação, estudo e documentação de uma manifestação de PCI, assim como para a implementação das respetivas medidas de salvaguarda. No decurso do percurso, foi também a atenção a tais Princípios que se procurou atender: se, e em que medida, as comunidades consultadas consideravam as manifestações de PCI em causa como fazendo parte do seu Património Cultural. Tal resolução revelou-se positiva sempre que as comunidades e os indivíduos de imediato reconheciam as manifestações pelas quais eram chamadas a partilhar memórias, completando-os entusiasticamente com relatos, histórias de família, pistas e indicações locais que permitiam retroceder e ir adicionando elementos ao seu trajeto, permitindo desenvolver o processo metodológico do momento presente para o passado.

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Após identificar os objetivos globais da investigação, delimitei o complexo percurso metodológico que me permitiu conduzir aos seus resultados, sabendo a priori que aquele implicaria uma postura interpretativa e que não há investigação sem uma pesquisa documental. Abarcando a documentação realidades tão diversas, tornou-se necessário estabelecer um método que tivesse em conta várias dimensões: por um lado, a cultura científica de que já dispunha, por outro, o quadro teórico no qual a investigação se insere, por fim estabelecendo uma conexão com os resultados da pesquisa efetuada.

Tabela 1 - Esquema da metodologia seguida

O presente trabalho de investigação foi sendo construído com recurso a uma pesquisa documental, como método de recolha e de verificação de dados, em bibliotecas e centros de documentação (recorrendo essencialmente a documentos escritos (livros, artigos de revista, relatórios, entre outros) e a técnicas de mapeamento cultural, considerando este como a coleta de informações culturais significativas, que localizam as pessoas nos seus lugares e no mundo (Cabeça, 2018: 1).

Assim, foram atendidas fontes de documentação escritas – documentos oficiais (documentos de matéria jurídica, tais como as leis, decretos-leis e outros instrumentos normativos, emitidos e consultados nos sites oficiais das autoridades públicos, na Torre

do Tombo e no Diário da República), e também documentos não oficiais (imprensa, revistas e publicações periódicas, repertórios, catálogos, livros, designadamente livros técnicos e obras especializadas). Neste domínio, foram ainda consideradas algumas obras de expressão literária e estética relevantes para compreender o ambiente sociocultural da época que se determinou delimitar, e ainda fontes não escritas. Estas últimas foram compostas por objetos e vestígios materiais, iconografia, fontes orais, imagem e sons registados, atendendo a que:

O conhecimento científico repousa em grande parte no procedimento empírico. Portanto, em matéria de ciências sociais é necessário observar como se passam as coisas na sociedade e os sentidos que nela assumem para compreender os seus mecanismos e alcance. E aí, ou existem dados ou é preciso suscitá-los (Albarello et al, 1997: 16)

Neste ponto, foram ainda considerados os elementos obtidos através das redes sociais e plataformas colaborativas de acesso livre (Youtube, Facebook e ferramentas do Google como Blogs). De facto, a pesquisa documental e o recurso ao YouTube como uma base de dados da qual se pode retirar significados não é uma técnica nova, tendo já sido considerada e abordada sob o ponto de vista dos estudos culturais (Gehl, 2009). O crescimento exponencial de vídeos no Youtube que registam manifestações de Património Cultural em todo o mundo tem sido alimentado pelos próprios utilizadores, por razões que se resumem, muitas vezes, à mera vontade de partilha. Assim, e quanto utilizadores-produtores de conteúdos espontaneamente colocam, descrevem, comentam, etiquetam por meio de palavras-chave e os relacionam com outros já existentes, de uma forma ativa e colaborativa que não se quis deixar de valorizar no âmbito desta investigação.

Foi o recurso a estas fontes diversas que, em conjunto, permitiu, então, fazer um levantamento e situar as manifestações culturais encontradas: o mapeamento cultural – é

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um poderoso instrumento para as comunidades, tornando o intangível visível e revelando uma parte importante de como um lugar é sentido. (Cabeça, 2018: 1).

Este processo metodológico, não sendo exclusivo, encontra maior enquadramento numa abordagem de tipo qualitativo (Creswell,2009; Denzin e Lincoln, 2013; Quivy e Campenhoudt, 2003). Foram considerados alguns testemunhos locais e os registos e observações decorrentes da realização de entrevistas e conversas informais com cerca de trinta interlocutores, bem como atendidos documentos históricos, dos textos e espólios relativos ao Património Cultural de Amarante e à obra de Amadeo. Sobre este tentou passar-se em revista a sua obra, o seu local e método de trabalho, os seus escritos) analisando-os e situando-os. Aquela análise e interpretação foram complementadas com a pesquisa documental já referida e realizada em bibliotecas, centros de documentação e arquivos.

Foi no confronto de todos estes elementos com o contexto geográfico e sociocultural contemporâneo que se pôde identificar o registo dos elementos que compõem o mapa cultural de Amarante, ou, em concreto, algumas das suas manifestações de PCI nas obras de Amadeo. As próprias obras de Amadeo de Souza-Cardoso, as quais se pretendia observar sobretudo após a fase de pesquisa, acabaram por se revelar elas próprias, também, de fontes de documentação não escrita para a investigação que se pretendia desenvolver.

Da observação local e identificação das práticas, representações, expressões, conhecimentos e aptidões - e do seu correlativo reflexo presente nas obras de Amadeo de Souza-Cardoso – passou-se a uma sistematização visando criar uma amostra de obras de Amadeo mais representativas em relação às manifestações de PCI nelas registado.

Na procura de apoio procurei também estudos realizados no domínio da Museologia, nomeadamente, relacionados com o processo de produção artística, dos

quais destaco a Tese de T. Azevedo (2018), onde tomei conhecimento de um recurso de investigação intitulado crítica de processo, trazido pela autora Cecília Sales. Esta autora questiona e coloca em evidência a relevância do contexto e das histórias da construções de objetos artísticos para a sua mais ampla compreensão, tomando aqueles como uma rede complexa de interações e sempre em estado potencial de transformação (Sales, 2012).

Aceitando que, também na produção artística, os elementos tangíveis e intangíveis, objetivos e subjetivos, materiais e imateriais, são todos relevantes, o objetivo de identificar e dar visibilidade ao imaterial reforçou a importância de me apoiar em técnicas de pesquisa cultural que são, por natureza qualitativas e, nalguns casos, apoiar- me também em técnicas de cariz etnográfico e artístico.

O documentário por mim realizado a partir do trabalho de campo e da recolha audiovisual e que designei Amadeo e a festa do Corpo de Deus, incluído como Apêndice 1, torna evidente a essência do percurso metodológico realizado neste estudo.

Esta fase de pesquisa acabou por concretizar parte dos objetivos da Tese, na medida em que as próprias obras de Amadeo acabaram por se revelar “meios de prova” da proposta que se tinha traçado.

1.2. Fontes de pesquisa e mapeamento cultural

Como ficou exposto, recorri, numa primeira fase, ao método de pesquisa documental bibliográfica. Atendendo ao tema em estudo que conjuga disciplinas diferentes, o percurso metodológico para atingir os objetivos propostos passou por uma pesquisa bibliográfica tanto no domínio do Direito (em particular, do Direito do Património Cultural), como da Arte, aqui dando primazia aos estudos e publicações

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dedicados à obra de Amadeo de Souza-Cardoso em bibliotecas e arquivos, antes de partir para a observação e recolha de informações diretamente junto das comunidades e grupos identificados20 e traçar um mapa cultural.

A emergência do conceito de PCI reclama uma renovada atenção, abrindo-se assim perspetivas novas de aplicação deste conceito, mormente a outros campos de estudo que extravasam o domínio jurídico. Verificou-se durante a investigação que as publicações e produções académicas no domínio do Direito do Património Cultural, além de muito escassas são, na sua maioria, estudos de introdução a um tema emergente. Verifica-se igualmente que tendem a acompanhar a evolução do próprio conceito de Património Cultural nos instrumentos normativos, isto é, focando-se até ao surgimento da Convenção 2003 no Património natural e construído e respetivas vias de classificação que fundamentam a proteção (atribuída ao património de interesse nacional, interesse público ou interesse municipal)21.

20 À qual fui juntando também a participação em Encontros, Conferências e outros eventos dedicados

ao tema do PCI e a Amadeo de Souza-Cardoso, dos quais destaco os seguintes: Políticas Públicas para o Património Imaterial na Europa do Sul: percursos, concretizações, perspetivas, realizado a 27-28 de Novembro de 2012, em Lisboa, organizado pela Direção-Geral do Património Cultural em colaboração com o Centro Interdisciplinar de História, Culturas e Sociedades (CIDEHUS) da Universidade de Évora; a Conferência Património como Identidade - 10 Anos da Convenção para a Salvaguarda do Património Cultural Imaterial realizada no dia 24 de maio de 2013 no museu do Fado em Lisboa; o I Congresso Internacional Amadeo de Souza Cardoso - Centenário da Exposição de Pintura (Abstraccionismo) Porto 1916, organizado pelo DCTP - Departamento de Ciências e Técnicas do Património - História da Arte e CITCEM, em colaboração com o Museu Nacional de Soares dos Reis, realizado nos dias 4 e 5 de novembro de 2016 na Faculdade de Letras da Universidade do Porto e no Museu Nacional Soares dos Reis; a Bienal Ibérica de Património Cultural, realizado no Centro Histórico de Amarante nos dias 13 a 15 de outubro de 2017.

21 Se, mesmo anteriormente, apenas se identifica uma coletânea intitulada Direito do Património

Cultural (Integrando estudos de vários autores, coordenado pelo Professor Jorge Miranda e editado pelo INA - Instituto Nacional de Administração em abril de 1996), desde então, em Portugal, conhecem-se apenas duas obras neste domínio, uma introdutória (Nabais, 2010) e uma compilação de textos jurídicos (Ramos, Claro, 2018). Ora, se o Direito do Património Cultural já é um ramo especial do Direito, o PCI, por sua vez, representa apenas um setor, não lhe cabendo mais do que breves referências escassas nos estudos existentes. Como tal, merece destaque a Tese de doutoramento Carla Maria Marques Ribeiro A tutela jurídico-administrativa do Património Cultural, em especial os museus, 2014, Universidade de Coimbra).

Por outro lado, se os aspetos específicos das tradições locais, como o saber-fazer, o artesanato, a música ou as línguas e dialetos sempre foram objeto de observação e registo, desde logo etnográfico, constata-se porém que estes não encontram enquadramento numa disciplina autónoma no âmbito das ciências sociais que os destaque como área de estudo a autonomizar e desenvolver, encontrando-se apenas estudos dispersos e desligados entre si, de que Leite de Vasconcelos e Michel Giacometti são exemplos cimeiros em Portugal pela recolha exaustiva que levaram a cabo neste domínio. Na verdade, muito embora a o conceito de PCI seja relativamente novo, desde pelo menos o início do século XX que é estudado e produzido conhecimento sobre as “culturas populares e tradicionais”, que hoje denominamos PCI (Costa, 2013; Leal 2000, 2009).

Não se conhece, porém, nenhum estudo científico que vá para além de uma abordagem à Convenção 2003 ou ao conceito de PCI e meios de salvaguarda, ou seja, não se conhece uma outra e nova abordagem que olhe para a produção artística à luz de uma perspetiva jurídica e as valorize enquanto registos de elementos de PCI – lacuna que esta Tese pretendeu colmatar.

Quanto a Amadeo de Souza-Cardoso, aqui apresentado como caso de estudo22, antes de partir em busca daquelas manifestações de PCI do seu contexto geográfico refletidos na sua obra, procurou conhecer-se numa primeira análise os estudos existentes sobre a sua produção artística e os critérios que estiveram na base das exposições que lhe foram dedicadas23.

22 Na verdade, foram vários os artistas que se apropriaram de facetas culturais imateriais enquanto

matéria criativa, podendo o mesmo exercício de utilização da Convenção 2003 como instrumento, seguido nesta Tese, ser aplicado nessas análises. Desde logo Paula Rego e os contos tradicionais, apoiada na recolha de Leite de Vasconcelos; como também Eduardo Viana ou Sarah Afonso, entre tantos outros.

23 De facto, vários momentos de relevância se sucederam no centenário que passou desde a sua morte

em 1918, destacando-se aqueles ocorridos a partir dos anos 50 quando o Professor José Augusto-França lhe dedica o estudo que em muito contribuiu para o redescobrimento da sua obra. A esta publicação, seguiu- se a exposição na Casa de Portugal em Paris, em 1958, e no Secretariado Nacional de Informação no Palácio Foz, em Lisboa no ano seguinte. Em 1987 uma retrospetiva na Fundação Calouste Gulbenkian confere um

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Pretendeu-se, com essa pesquisa bibliográfica prévia, conhecer melhor o percurso e contexto artístico de Amadeo de Souza-Cardoso, servindo assim de mapa ao caminho que se pretendia traçar. Entre a análise documental levada a cabo o longo desta pesquisa, destaco a observação presencial e análise do espólio de Amadeo de Souza-Cardoso, doado à Fundação Calouste Gulbenkian em 198724.

Além de documentos impressos, também foram tidos em conta registos áudio e vídeo, como os materiais de apoio nas exposições visitadas e DVDs ou curta-metragens produzidas nesse âmbito. Destaco os filmes dedicados a Amadeo (Máscara de Aço Contra Abismo Azul, de Paulo Rocha, 1988; Crime, Abismo Azul, Remorso Físico, Edgar Pêra, 2009; Amadeo, e Depois, Um Filme de João Mário Grilo, 2014; Amadeo de Souza Cardoso: O último segredo da arte moderna, de Christophe Fonseca, 2017; e o documentário O último Oleiro em Vila Seca, de Duran Cartaxo e Helena Lemos.

novo entusiasmo à obra de Amadeo, que veio ainda a ser exposta em Washington em 1999, e em Chicago, em 2000.

O grande marco na consolidação de Amadeo e do seu lugar no modernismo em Portugal deu-se, porém, a partir de 2006 com a exposição Diálogos de Vanguardas, no Centro de Arte Moderna da Fundação Calouste Gulbenkian, comissariada por Helena de Freitas e Catarina Alfaro. Já em 2016 e 2017 acontece a grande retrospetiva de 2016 no Grand Palais, em Paris, e a reconstituição das exposições de 1916 e 1917, no Museu Nacional Soares dos Reis e no Museu do Chiado, estas últimas exposições com a curadoria das historiadoras Raquel Henriques da Silva e Marta Soares.

Em paralelo, também em novembro de 2016, aconteceu o I Congresso Internacional Amadeo de Souza Cardoso - Centenário da Exposição de Pintura (Abstraccionismo) Porto 1916 organizado pelo DCTP - Departamento de Ciências e Técnicas do Património - História da Arte, da Faculdade de Letras da Universidade do porto (FLUP) e pelo CITCEM - Centro de Investigação Transdisciplinar Cultura, Espaço e Memória. No entanto, nesses momentos, à exceção da presença na Exposição O que há de português na arte moderna portuguesa, as obras de Amadeo foram analisadas de um ponto de vista que enalteceu o seu valor artístico e o debate em torno do posicionamento do artista português na história de arte e à luz das vanguardas e do modernismo europeu, deixando de fora uma abordagem ao seu valor do ponto de vista do registo e salvaguarda das tradições que as mesmas obras representam.

24 Composto por 36 dossiers (2.489 documentos), 8 objetos pessoais, 196 monografias e 27

manuscritos, recortes de imprensa, fotografias, livros e publicações periódicas, testemunhos escritos e fotográficos preservados pela sua viúva, Lucie de Souza Cardoso

Sendo um dos objetos de estudo desta Tese um instrumento normativo (a Convenção 2003), foi esse o texto estudado e aprofundado, como conceito operativo que serviu de ponto de partida à análise. A abordagem à Convenção 2003 exige uma perspetiva de análise doutrinal dos requisitos normativos subjacentes. Perante a multiplicidade de abordagens possíveis, optou-se por seguir uma análise em três níveis, ou camadas, que potenciasse a observação das dimensões empírica, normativa e analítica desse objeto de estudo.

Numa dimensão analítica a preocupação foi a de elucidar os conceitos base e fundamentais à investigação, identificando, clarificando e distinguindo os diversos conceitos e institutos jurídicos.

Na dimensão normativa foram consideradas as questões sob o prisma essencialmente do direito positivo e fontes primárias do Direito (isto é, as leis e normas jurídicas escritas) e o conteúdo da interpretação que delas é feita, permitindo-se classificar certos fatos e fenómenos como subsumíveis a determinadas normas legais. Nesta dimensão, foram selecionadas e interpretadas as leis, decretos-lei, tratados e convenções a um nível nacional, comunitário (da União Europeia) e internacional, aplicáveis ao tema aqui em análise – o Património Cultural e, em especial, o PCI.

Numa dimensão empírica, por sua vez, foi tida em conta a realidade e os aspetos práticos da aplicação do objeto ao caso de estudo. À luz da norma selecionada, aplicou- se a mesma a determinado fenómeno que acontece no tempo, no espaço, e que se projeta de forma expressa e concreta, como as vivências observadas e verificáveis do PCI aqui identificado, com vista à construção de uma linha de significado coerente.

Nesta dimensão, presenciou-se as manifestações enunciadas no local em que as mesmas ocorrem e relevante para o projeto (Amarante). Ali, pode recolher-se os testemunhos dos seus intervenientes e detentores, como os participantes, artesãos,

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músicos e habitantes locais; bem como todas as pessoas cujo testemunho se revelou enriquecedor para compreender os fenómenos aqui descritos, nomeadamente os próprios familiares de Amadeo de Souza-Cardoso e em especial pessoas contemporâneas do mesmo (nascidas antes de 1918, em Amarante).

Foi a análise do seu espólio que me permitiu recolher as diversas moradas de Amadeo em Paris, locais esses percorridos durante as várias visitas feitas ao longo do percurso. Dentro deste espólio, especial atenção mereceu a boneca de pano minhota e alguns postais escritos e recebidos por Amadeo, um deles alusivo à procissão, tema na qual então já me encontrava a trabalhar. A troca de correspondência com o casal Delaunay e os planos para a Corporation Nouvelle, da qual Amadeo rapidamente se demarcou, foi outro assunto que despertou a minha atenção ao longo da pesquisa. Nesse âmbito, desloquei-me também a Vila do Conde em busca da casa referenciada na Avenida Bento de Freitas e designada por Sonia como La Simultanée, onde o Casal Delaunay residiu mais de um ano, depois de convidados por Amadeo, Almada Negreiros e Eduardo Viana para o lançamento da revista que Fernando Pessoa ia dirigir (Orpheu) e também por ocasião da Primeira Guerra Mundial, que os motivara a sair de Paris.

Antes, porém, foquei a minha atenção no contexto artístico e nas obras marcantes na época de Amadeo e, em especial, nos anos de Paris25, período crucial na produção das obras aqui selecionadas como amostra.

25 A obra Em busca do tempo perdido, escrita por Marcel Proust em Paris entre 1908 e 1922 e

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