• Nenhum resultado encontrado

No domínio dos números naturais, Piaget considerou que formação do conceito de número se faz pela conexão entre a relação de equivalência dos termos que os faz pertencer à mesma classe e a relação assimétrica resultante da enumeração ou contagem (Piaget, 1952). Tomando como referência esta teoria, Nunes e colegas (2004) questionam-se sobre a forma como o conceito de fracção é compreendido pelas crianças, tendo em conta que há classes de fracções equivalentes - 1/3, 2/6, 3/9, etc.- e que estas classes podem ser ordenadas - 1

/3 > 1/4> 1/5, etc.

Atribuem as dificuldades na compreensão da equivalência de fracções essencialmente a dois factores: diferentes símbolos que podem representar a mesma quantidade – 1/2, 3/6; o mesmo símbolo pode não representar a mesma quantidade – 1/2 de oito não representa a mesma quantidade que 1/2 de quatro – portanto, não pertencem à mesma classe de fracções equivalentes. Para melhor se compreender essas dificuldades é de grande interesse conhecer e perceber os argumentos apresentados pelas crianças para justificar a relação de equivalência entre duas fracções e que estratégias usam para solucionarem problemas que envolvem equivalência de fracções.

A ordenação de fracções é outro dos aspectos relevantes na compreensão de fracções. Se ordenar números naturais pode ser facilmente conseguido pela percepção ou por contagem, a ordenação de fracções torna-se um processo bastante mais complexo devido às relações assimétricas destes números. A análise destas assimetrias permite identificar três condições a considerar na ordenação de fracções: para denominadores iguais é maior a fracção com

24

maior numerador; para numeradores iguais é maior a fracção com menor denominador e para denominadores e numeradores diferentes deve estabelecer-se uma relação de proporcionalidade para de seguida comparar (Nunes et al, 2004; Mamede, 2008a). A primeira condição parece mais simples, pois sendo iguais os denominadores apenas pode acarretar alguma dificuldade a comparação dos numeradores o que se confunde com o caso da ordenação dos números naturais. A segunda condição revela-se mais difícil por envolver uma relação inversa entre o denominador e a quantidade representada (Nunes et al, 2004). Estabelecer esta relação inversa constitui uma dificuldade pois os alunos tendem a considerar que a fracção com maior denominador é a que representa a quantidade maior (Hart, 1981; Behr & Post, 1992; Kerslake, 1986). A terceira condição reveste-se de maior complexidade do que as duas anteriores. As crianças tendem a considerar apenas o numerador ou o denominador na comparação de fracções deste tipo, por ser difícil relacionar os dois em simultâneo (Nunes et al, 2004). Os autores consideram a existência de uma relação entre a ordenação de fracções e a identificação de fracções equivalentes, pois a comparação de fracções pode levar à conclusão de que não são equivalentes. Também Stafylidou e Vosniadou (2004), relativamente à compreensão das fracções pelas crianças, sugerem elas consideram o denominador ou ao numerador separadamente, s leva a produzir respostas erradas na comparação de fracções.

Também o NCTM (2007) realça a importância da comparação e ordenação na compreensão do conceito de fracções. Sugere a utilização de rectas numéricas paralelas como modelo para representar as fracções que pretende comparar/ordenar. Valoriza este modelo de representação por permitir que o aluno comece a desenvolver a noção de densidade do conjunto dos números racionais. A representação aparece como outro aspecto relevante do conceito de fracção.

Vários autores têm-se debruçado sobre os modelos de representação das fracções como meio facilitador da compreensão deste conceito. Behr et al (1983) refere uma componente do estudo realizado nos Estados Unidos no âmbito do Rational Numbers Project, com crianças dos 4.º e 5.ºgraus, que tinha como objectivo perceber em que medida a representação de fracções pode ajudar na compreensão da formação do conceito. Os resultados obtidos demonstraram que as representações apresentadas aos alunos, através de figuras, modelos ou diagramas, podem dar-lhes sugestões confusas e constituir elementos

25

de distracção relativamente ao conteúdo dos enunciados, tornando assim, a resolução dos problemas mais difícil, afectando o desempenho em tarefas com fracções. Contudo, aprendendo a superar a influência dos elementos distractores, as crianças desenvolvem estratégias que tornam o conceito de fracção mais estável.

Behr et al (1983) apresenta um modelo com cinco sistemas de representação de fracções a utilizar em simultâneo e todas como mesmo nível de importância (ver figura 2.1).

Figura 2.1 - Esquema de representação adaptado de Behr et al (1983)

Neste modelo está implícito um trabalho simultâneo com os vários sistemas de representações a utilizar pelos alunos na resolução de problemas do mundo real. O modelo sugere que as fracções sejam representadas de cinco formas: contextos da vida real, materiais manipulativos, figuras, símbolos verbais e símbolos escritos. Todas estas formas de representação sugerem que a capacidade de fazer representações diversas de uma situação demonstram uma evolução na compreensão, ao mesmo tempo que desenvolve a capacidade de as relacionar entre si.

Mais recentemente, Mamede (2008a) refere a dificuldade dos alunos na articulação e tradução das diferentes formas de representar uma fracção. Destaca a importância de, em situações de sala de aula, existir a preocupação de articular a representação de fracções através de diferentes sistemas e apresenta um modelo simplificado de representação, mas

Situações do mundo real Materiais manipuláveis Símbolos escritos Símbolos falados Figuras

26

que inclui as formas essenciais de representação: simbólica, pictórica e verbal. A figura 2.2 ilustra esse modelo aplicado à fracção 

.

Figura 2.2 - Esquema de representação de fracções apresentado por Mamede (2008a).

Mamede (2008a) salienta a importância de se trabalharem as representações em simultâneo e interligadas, tanto referidas a situações com quantidades discretas como a situações com quantidades contínuas. A autora apresenta algumas sugestões de modelos de representação para quantidades discretas (A) e contínuas (B), tomando como exemplo a fracção ¼:

Representação de quantidades discretas

Representação de quantidades contínuas

27

Modelos de comprimento

Modelos de outras medidas

Comparado com o esquema de representação de fracções de Behr et al (1983), o esquema e as sugestões para representar quantidades contínuas e discretas apresentado por Mamede (2008a) são mais simples e directivos o que os torna funcionais nas práticas de sala de aula por serem facilmente compreendidos pelos professores e, portanto, mais exequíveis em contexto de ensino/aprendizagem. Este modelo pode ser um contributo muito positivo na compreensão das fracções. Nele são apresentados diferentes exemplos de situações do mundo real que podem ser rentabilizadas no trabalho de fracções a partir de situações mais informais, semelhantes às do modelo, em que os alunos podem explorar as fracções a partir de alguns conhecimentos que possuam da sua vida real.