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2.3 O que dizem as dissertações e as teses sobre a Escola Cabana?

2.3.1 Sobre a formação de professores

Foram quatro os estudos realizados sobre a temática da formação continuada dos professores:

AUTOR (A) ANO TÍTULO SÍNTESE DO ESTUDO

BERTOLO 2004 Formação continuada de professores no Projeto Escola Cabana: contradições e contrariedades de um processo centrado na escola.

A investigação busca compreender quais os avanços e equívocos surgidos a partir da implementação da política de formação continuada desenvolvida pelo Projeto Escola Cabana ao instituir modalidades formativas centradas na escola. Os resultados apresentados indicam discordâncias entre as intenções expressas nos documentos do projeto estudado e as práticas formativas executadas. Os indícios encontrados apontam para uma concepção de formação ainda com aspectos tradicionais: embora o projeto tenha desenvolvido a formação no interior das escolas isto não foi suficiente para levar em conta o saber e a experiência docente. Sendo isto demonstrado pela importância dada a algumas modalidades de formação e pelo caráter regulador da política adotado pela SEMEC.

DELGADO 2005 Formação Contínua docente: um olhar epistemológico sobre a proposta da escola cabana.

O estudo faz uma incursão sobre os pressupostos epistemológicos que orientaram a formulação da proposta de formação continuada da Escola Cabana buscando compreender quais os nexos existentes entre as bases epistemológicas assumidas e as ações

28 É válido ressaltar que se faz necessário maior aprofundamento sobre os estudos, considerando que a análise aqui desenvolvida se baseou nos problemas de pesquisa anunciados pelos estudos, não incorrendo sobre o desenvolvimento dos mesmos.

propostas pelo referido projeto. Aponta como resultado o avanço teórico no processo de formulação da proposta de formação, bem como de algumas medidas para consolidação de uma cultura de formação fundada na experiência docente. Revela também a proposta como uma tendência prescritiva de modelo de formação, isto é, uma tendência em adaptar as práticas pedagógicas dos docentes ao invés de potencializá-las.

FERREIRA 2005 Políticas de Formação Docente do Projeto Escola Cabana: Dilemas e Desafios da Implementação do Programa de Formação Continuada.

O estudo consiste em uma análise acerca das relações existentes entre a proposta Político- pedagógica da Escola Cabana e o Programa de Formação Continuada nele contido. Busca analisar as concepções de formação continuada presentes, assim como a compreensão pelos docentes deste processo. Traz como resultados a formação continuada como importante fator para a consolidação do projeto, tendo na Hora Pedagógica sua principal contribuição. Aponta a necessidade de maior aproximação das formações gerais da realidade escolar potencializando os professores como sujeitos ativos de seu processo de formação. SANTOS 2005 Os cadernos de Educação da Escola Cabana

(1997-2004): Dispositivos Textuais e Materiais para a estratégia de conformação e prescrição de práticas pedagógicas em Belém-PA.

Tem como objeto de estudo os cadernos de educação produzidos pela Escola Cabana, a partir da idéia dos impressos como objeto cultural. Analisa as estratégias elaboradas para formação de professores por meio dos cadernos como processos de conformação de suas práticas pedagógicas assim como a ordem desejada pelos sujeitos que os produziram. Apresenta como resultados os cadernos de educação como a referência para o trato com o projeto político pedagógico da Escola Cabana, os quais serviram de estratégia para aceitação da política educacional pela comunidade intra e extra escolar; a disseminação da idéia de inovação da proposta demonstra o caráter prescritivo da proposta em relação aos docentes; a veiculação da representação do Projeto Escola Cabana como projeto revolucionário provocou a distinção de identidades dos educadores como revolucionários e reacionários.

Quadro 02 – Síntese das dissertações desenvolvidas sobre a Política de Formação Continuada da Escola

Cabana.

Os estudos analisados revelam que houve um caráter prescritivo da política de formação da Escola Cabana em relação às expectativas da gestão sobre as práticas pedagógicas almejadas. Segundo Bertolo (2004), Delgado (2005) e Santos (2005) o processo formativo desenvolvido revela ainda um modelo tradicional de formação, isto é, pouco se avançou na perspectiva de ter a própria prática docente como origem de formação, priorizando-se ainda no projeto a transmissão de conhecimentos por meio dos encontros gerais e representações veiculadas através dos materiais impressos sobre a proposta. Para os autores, as formações gerais desenvolvidas ficaram muito distantes da realidade escolar, ocasionando poucas mudanças concretas nas práticas pedagógicas, mais servindo à adaptação dos professores à referida proposta do que valorizando suas práticas.

No estudo de Bertolo (2004), a principal crítica evidenciada consiste no tipo de formato construído para o processo de formação continuada. A definição dos conteúdos

formativos por meio de eixos relacionados ao Projeto Escola Cabana, na visão da autora, revela o interesse da gestão municipal em conduzir os professores à aceitação e à aplicação da proposta. A autora também enfatiza que a estrutura adotada por meio de encontros gerais, encontros por ciclos e áreas e as horas pedagógicas configurou-se como forma de controle da gestão sobre o processo formativo dos professores, pois, coube aos gestores da SEMEC à gerência sobre todo o processo. Então, a autora aponta contradições da proposta de formação entre o que foi anunciado pela proposta e o que efetivamente se operacionalizou:

Uma delas diz respeito ao modelo de formação de professor que se diz investir na construção de um profissional crítico e reflexivo, tendo como fonte dessa formação a própria prática docente. Mas as estratégias e as condições objetivas em que se desenvolve a política de formação continuada da SEMEC não têm sido suficientes para transformar esse processo em momentos onde os próprios professores pudessem planificar e gerir a oferta da formação. (BERTOLO, 2004, p. 300).

Delgado (2005) é menos incisivo na crítica, dado que ao apontar a questão das dissonâncias entre o projeto formulado e as estratégias de concretização criadas pela SEMEC, as revela como tensão permanente e necessária que gera debates e reflexões sobre a política de formação possibilitando, assim, a experimentação de formas, modelos e metodologias que concentrem a formação docente contínua e comprometida com a inclusão social. Nas palavras do autor:

A análise dos documentos que expressam a política da SEMEC me revelou que há na proposta de formação contínua uma tensão permanente entre o princípio político e epistemológico do respeito e valorização da experiência da professora e do professor e a ansiedade de colocá-las/os no caminho política e epistemologicamente “correto”; entre reconhecer a ação como o espaço propriamente da formação de estruturas de pensamento, de superação de concepções e práticas cerceadoras da criação e ao mesmo tempo vontade de assegurar o quanto antes esse princípio na prática escolar cotidiana.

Essas tensões devem estar presentes em todos aqueles que, como as/os elaboradoras/es da proposta da Escola Cabana, demonstram compromisso de construir uma escola que garanta a inclusão com sucesso de todas as crianças, jovens e adultos a esse bem cada vez mais importante na vida humana, que é a formação escolar (DELGADO, 2005, p.125).

Na pesquisa realizada por Santos (2005) a indicação do caráter prescritivo da proposta de formação desenvolvida pela SEMEC é também marcante. A autora destaca, a partir da análise dos cadernos de educação publicados, que estes se destinaram à conformação das práticas docentes por meio das diferentes orientações teórico-metodológicas divulgadas e exemplificadas, além de servirem ao propósito de propagandear a política educacional em curso. Ressalta que a produção dos textos seguiu uma sequência lógica que tinha por

objetivos, primeiro, “discorrer sobre o Projeto e apresentam sua proposta como democrática e que requer mudanças de práticas” (ibidem, p. 113) e, segundo, “ para trazer algumas fundamentações teóricas e mostrar o professor atuando conforme as prescrições desenvolvidas ao longo destes oito anos” (ibidem, p. 113).

Para a autora os cadernos e textos editados tiveram a única intenção de formatar práticas pedagógicas condizentes com os interesses dos gestores, com isso parece desconsiderar o processo de mediação que se constrói na dinâmica das práticas pedagógicas, como se diante dos textos os professores apenas se sujeitassem a executar tal qual foi escrita a proposta, visão presente também nos estudos de Bertolo (2004) e Delgado (2005). Desconsidera a possível contribuição dos professores à feitura da proposta, que com suas negações, questionamentos, aceitações também acabam por interferir no desenvolvimento da política.

Para Ferreira (2005), tal política de formação surge como importante estratégia e contribuição para a sedimentação da proposta na rede municipal. Embora concorde com os estudos acima citados de que as formações gerais desenvolvidas pela SEMEC pouco se aproximaram das realidades das escolas, seu estudo revelou como maior contribuição da política de formação, a organização das Horas Pedagógicas. Como mostra a autora:

A Hora Pedagógica é compreendida pelos professores entrevistados como um avanço no processo ensino-aprendizagem, o que favorece o fortalecimento dos princípios e diretrizes do Projeto Político Pedagógico “Escola Cabana”. Nesta perspectiva a Hora Pedagógica se apresenta como uma grande contribuição no fazer pedagógico. Os professores enfatizaram, em suas falas, alguns aspectos desta contribuição como o planejamento, troca de experiências e estudo (FERREIRA, 2005, p. 183).

A pesquisa mostrou que a hora pedagógica foi uma ação extremamente importante para o processo de autoformação do educador, o qual é considerado fundamental para a construção da qualidade da educação. Observa-se que, a hora pedagógica apareceu como uma possibilidade de avanço para um processo de formação continuada que parta das experiências e do conhecimento construído pelos próprios educadores e que, desse modo, possibilite a autorreflexão acerca de seus percursos pedagógicos.

É possível identificar nesses estudos o indicativo de que a construção da qualidade social da educação também perpassa pela necessidade de se estabelecer uma política de formação e valorização do professor que considere este como sujeito de sua própria formação.