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SOBRE A HISTÓRIA DO DESENVOLVIMENTO DE CONHECIMENTOS ESTATÍSTICOS NO BRASIL

2 PESQUISAS PERTINENTES EM FOCO

2.2 SOBRE A HISTÓRIA DO DESENVOLVIMENTO DE CONHECIMENTOS ESTATÍSTICOS NO BRASIL

Relativamente ao segundo foco – a história do desenvolvimento de conhecimentos estatísticos no Brasil –, buscamos trabalhos que tratam desses conhecimentos, que chegaram ao Brasil fortemente influenciados por Portugal e foram aqui explorados.

Nesse sentido, como investigação inicial, temos a tese de Papança (2011), que tem como título A

Matemática, a Estatística e o ensino nos estabelecimentos de formação de oficiais do exército português no período 1837-1926: uma caracterização. O objetivo da tese foi estudar o

desenvolvimento da formação de oficiais do exército português no período referido, focando a formação matemática e estatística. Uma das importantes conclusões desse trabalho é que a Estatística acompanhou a formação de oficiais do exército português desde os estabelecimentos que precederam a Escola do Exército Português, fundada em 1837, até a atualidade, revelando-se elemento essencial da gestão do ensino. Temos, na tese de Papança, o interesse relacionado ao período evidenciado, a importância do ensino da estatística na educação, a influência de Portugal nos ditames governamentais do Brasil.

Filipe José Loureiro Lopes Papança nasceu em Lisboa, em 1966. É matemático com doutorado em Ciências de Educação. Em sua tese, efetuou uma análise baseada em fontes documentais obtidas em bibliotecas do exército, encontrando dados sobre o ensino, regulamentos, estatísticas variadas, organização curricular, professores, cerimoniais, visitas de estudos, livros e manuais escritos por docentes, naquele período em que ocorreu a reestruturação da formação do oficial, com a extinção da Academia de Fortificação, Artilharia e Desenho e a criação da Escola do Exército, até o final da Primeira República. Papança (2011, p. 10) afirmou que ―um melhor conhecimento do ensino militar nesse período, de certo, contribuirá para uma melhor visão da evolução da sociedade portuguesa e, ao mesmo tempo, ajudará a perspectivar o futuro‖, com a Estatística desempenhando um papel importante como fator organizativo. O trabalho realça a mudança para o ensino prático, desde os tempos da Academia de Fortificação, Artilharia e Desenho, visando à aplicação das matérias lecionadas na teoria, com a realização de trabalhos de

projetos pelos alunos. De modo semelhante, foi estabelecida, na colônia brasileira, a Real Academia de Artilharia, Fortificação e Desenho, cujos elementos de estatística vieram a ser ensinados posteriormente. A respeito dessa educação, comentaremos no Capítulo 4. Tal estratégia de aliar o teórico ao prático, no nosso entender, faz parte da realidade, ainda hoje, como uma maneira didática motivadora para os nossos alunos.

No caso do Brasil, Oliveira (2005), em seu livro D. João VI Adorador do Deus das Ciências?, descreveu a importância da vinda da família real para o Brasil em relação às transformações ocorridas na Colônia, no período, 1808-1821, antes da Independência. Essas transformações, realizadas com a promulgação de decretos, leis, alvarás, decisões, resoluções, cartas régias, foram instituídas por D. João VI, com a finalidade de desenvolvimento da educação científica no Brasil. Foram inauguradas, por exemplo, instituições de ensino superior, escolas técnicas, laboratórios, museus, revistas científicas, a imprensa régia, a academia de artes. Afirma o autor:

Contudo, afirma-se que as medidas de D. João criaram condições para a introdução de um novo pensar sobre a ciência e que a cultura científica em gestação, mesmo marcada por uma orientação pragmática, estimulou o estudo da ciência, algo ausente no Brasil colonial (OLIVEIRA, 2005, p. 106).

José Carlos de Oliveira é formado em engenharia eletrônica pelo Instituto Tecnológico de Aeronáutica – ITA e doutor em História Social pela USP. Atua em História da Ciência e História da Ciência no Brasil. A obra acima citada é organizada em três partes, a saber, a cultura científica e história das ciências no Brasil, a política científica de D. João, e, por último, a cultura científica no período joanino.

O autor conclui que, no campo da cultura científica, houve de fato um salto relacionado à qualidade e à quantidade das atividades científico-educacionais, tais como a criação de instituições, de cursos e a divulgação da ciência; a emancipação da cultura científica, com a liberdade de expressão; o intercâmbio de ideias; novas instituições de ensino e de cultura; uma imprensa atuante e divulgação das produções educacionais. A principal atividade científica no período foi a absorção de conhecimentos vindos do exterior, com um aumento do número de pessoas dedicadas à ciência. Para esse desenvolvimento, o país contou com membros da Academia de Ciência de Lisboa e com intelectuais que estudaram em Portugal e em outros países

europeus. Porém, muitos desses intelectuais se dedicaram mais às tarefas governamentais do que às atividades científicas para as quais tinham sido treinados. A obra de Oliveira permite, de modo geral, compreender as condições em que se deu o processo de institucionalização de uma ciência luso-brasileira e dos conhecimentos que com ele foram sendo constituídos, como os matemático-estatísticos.

Relacionado ao desenvolvimento da Estatística no Brasil, temos o trabalho de dissertação de Barreto (1999), que apresentou interessante panorama histórico do desenvolvimento da Estatística no Estado de São Paulo. Sua dissertação, defendida em 1999, foi elaborada junto ao Curso de Pós-Graduação em Educação Matemática, área de concentração em Ensino e Aprendizagem da Matemática e seus Fundamentos Filosófico-Científicos, do Instituto de Geociências e Ciências Exatas da Universidade Estadual Paulista, tendo como título Uma

Abordagem Histórica do Desenvolvimento da Estatística no Estado de São Paulo. Em seu

trabalho, o autor coloca a Estatística em evidência como uma manifestação cultural, relacionada às práticas diárias, com aplicações nas áreas médica, agronômica, econômica, educacional, sociológica, psicológica, entre outras, com destaque para a área médica e agronômica. A dissertação retrata a evolução histórica da Estatística em um contexto global, principalmente nos séculos XIX e XX, investiga suas origens no Brasil e centraliza sua atenção no Estado de São Paulo.

Antonio Rodolfo Barreto é professor com atuação no Ensino Fundamental, Médio e Superior, com experiência em Matemática, Educação Matemática e Física.29 O seu trabalho de dissertação está constituído basicamente em quatro capítulos: introdução; panorama histórico do desenvolvimento da Estatística e um breve olhar sobre alguns colaboradores; o panorama histórico da Estatística no Estado de São Paulo; e as considerações finais. O autor teve como um dos seus objetivos o de que o seu trabalho viesse a ―contribuir, despertar e estimular o interesse de outros pesquisadores para trabalhos futuros, tendo em vista que estudos históricos sobre a Estatística no Brasil são praticamente inexistentes‖ (BARRETO, 1999, p. 89).

29 Disponível em: <http://www.bv.fapesp.br/pt/pesquisador/39451/antonio-rodolfo-barreto/>. Acesso em: 24 jul.

A dissertação de Barreto evidencia a importância da utilização da Estatística em outras áreas, abrindo-se possibilidades de sua aplicação. A Estatística, desenvolvida a partir do século XIX, teve como necessidade conhecimentos básicos de matemática desenvolvidos nessa época. De modo semelhante, em nosso trabalho, temos como um dos objetivos avaliar os conhecimentos de Estatística que estavam presentes quando da realização dos primeiros censos demográficos brasileiros, articulados aos conhecimentos matemáticos que também se desenvolviam no âmbito educativo.