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SOCIALIZAÇÃO E IDENTIDADE

Podemos nos arriscar a dizer que pertencer ou não a empreendimentos de Economia Solidária pode ser, e acreditamos que é, uma informação importante que irá compor a identidade tanto social como a identidade do eu. Isso porque acreditamos que, ao se apresentar dessa maneira, essa informação já vem carregada de significados, de marcação de status social, de relações de trabalho. O que as pessoas pensam e transmitem sobre isso é determinante para o outro compor sua identificação e o trabalho tem papel de destaque na formação da identidade.

Sendo esse trabalho focado na juventude, consideramos essencial entendermos o processo de socialização e identidade, principalmente quando um dos objetivos é compreender como a prática cotidiana da Economia Solidária é compartilhada com os familiares jovens dos participantes dos empreendimentos.

O papel da família nesse contexto, bem como as demais instâncias sociais, como escola, profissão, grupos, mediando a construção desses significados é essencial.

3.1 Socialização e a Construção Social da Realidade

Nesse percurso, recorremos primeiramente a Berger e Luckmann (1985), que formulam sua teoria para o entendimento de como a realidade é construída e trazem contribuição para o entendimento dos processos de socialização e de identidade.

Para os autores, ―a vida cotidiana apresenta-se como uma realidade interpretada pelos homens e subjetivamente dotada de sentido para eles na medida em que forma um mundo coerente‖ (1985, p. 35). Essa realidade é dividida com as outras pessoas e existem diversos meios de se experimentar essa divisão, sendo o meio mais importante a situação de estar face a face com o outro. Dizem: ―na situação face a face, o outro é apreendido por mim como vívido presente partilhado por nós dois. Sei que no mesmo vívido presente sou apreendido por ele. Meu ‗aqui e agora‘ e o dele colidem continuamente um com o outro enquanto dura a situação face a face‖ (BERGER E LUCKMANN, 1985, p. 47).

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Portanto, segundo esse enfoque, são nos relacionamentos e no contato com a realidade que o homem vai se construindo e construindo seu mundo, tanto o interno como o externo. Para abordar a sociedade como realidade objetiva, lançam mão de dois processos: a institucionalização e a legitimação. Para tratar a sociedade como realidade subjetiva trazem o conceito de interiorização da realidade, constituído pela socialização primária e pela socialização secundária.

Para os autores, conforme já foi dito, os homens produzem-se a si mesmos e, portanto, também produzem a ordem social em que vivem. Conforme afirmam (p. 75): ―A auto-produção do homem é sempre e necessariamente um empreendimento social. Os homens em conjunto produzem um ambiente humano, com a totalidade de suas formações sócio-culturais e psicológicas‖. Dizem isso em contraposição à constituição biológica do homem, que seria responsável apenas em fornecer os limites exteriores da produção humana. Assim, a ordem social é sempre e unicamente resultado da produção humana. Para entender o surgimento, a manutenção e a transmissão dessa ordem social apresentam a teoria da institucionalização. ―A institucionalização ocorre sempre que há uma tipificação recíproca de ações habituais por tipos de atores. Dito de maneira diferente, qualquer uma dessas tipificações é uma instituição‖ (p. 79). Essas são sempre partilhadas e acessíveis a todos os membros do grupo. Lembram os autores:

é importante ter em mente que a objetividade do mundo institucional, por mais maciça que pareça ao indivíduo, é uma objetividade produzida e construída pelo homem. O processo pelo qual os produtos exteriorizados da atividade humana adquirem o caráter de objetividade é a objetivação. O mundo institucional é atividade humana objetivada, e isso em cada instituição em particular. Noutras palavras, apesar da objetividade que marca o mundo social na experiência humana, ele não adquire por isso um status ontológico à parte da atividade humana que o introduziu... a relação entre o homem, produtor, e o mundo social, produto dele, é que permanece sendo dialética, isto é, o homem e seu mundo social atuam reciprocamente um sobre o outro. O produto reage sobre o produtor (BERGER e LUCKMANN, 1985, p. 87).

Segundo os autores, isso é possível graças ao compartilhamento de um conhecimento que, sendo socialmente construído e partilhado, é tomado como verdades válidas para toda a sociedade e que os que dele se desviam são considerados como que se afastando da realidade. É esse conhecimento que ―serve de mediação na interiorização pela consciência individual das estruturas objetivadas do mundo social‖ (p. 94). Nesse sentido, é tal conhecimento que

―programa‖ os canais pelos quais a exteriorização produz um mundo objetivo. Objetiva este mundo por meio da linguagem e do aparelho cognoscitivo baseado na linguagem, isto é, ordena-o em objetos que serão apreendidos como realidade. É em seguida

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interiorizado como verdade objetivamente válida no curso da socialização. Desta maneira, o conhecimento relativo à sociedade é uma realização no duplo sentido da palavra, no sentido de apreender a realidade social objetivada e no sentido de produzir continuamente essa realidade (BERGER e LUCKMANN, 1985, p. 94, grifo do autor).

Ressaltamos que os autores (p. 95) apontam que esse conhecimento é transmitido de geração em geração, sendo apreendido pelas novas gerações como verdade objetiva, portanto interiorizado como realidade subjetiva. ―Essa realidade, por sua vez, tem o poder de configurar o indivíduo‖.

Outro aspecto relevante retratado pelos autores na institucionalização são os papéis. Eles relatam que

[...]as origens de qualquer ordem institucional consistem na tipificação dos desempenhos de um indivíduo e dos outros. Isso implica que o primeiro tem em comum com os outros finalidades específicas e fases entrelaçadas de desempenho e, ainda mais, que são tipificadas não apenas ações específicas, mas formas de ação... As tipificações de formas de ação requerem haver um sentido objetivo, que por sua vez exige uma objetivação linguística. Isto é, haverá um vocabulário que se refere a estas formas de ação. [...] O indivíduo e o outro podem ser compreendidos como executantes de ações objetivas, geralmente conhecidas, que são recorrentes e repetíveis por qualquer ator do tipo adequado (BERGER e LUCKMANN, 1985, p. 101).

Os autores discutem como as instituições podem ser reificadas, ou seja, como de produtor o homem passa a ser produto da sociedade em sua consciência. A atividade humana passa a ser vista como não humana, como sendo produto de outras instâncias, não tendo o homem mais controle sobre ela; seria a ―natureza das coisas‖ que as faz assim. Definem assim a reificação da realidade social:

A reificação é a apreensão dos fenômenos humanos como se fossem coisas, isto é, em termos não humanos ou possivelmente super-humanos. Outra maneira de dizer a mesma coisa é que a reificação é a apreensão dos produtos da atividade humana como se fossem algo diferente de produtos humanos, como se fossem fatos da natureza, resultados de leis cósmica ou manifestações da vontade divina. A reificação implica que o homem é capaz de esquecer sua própria autoria do mundo humano, e mais, que a dialética entre o homem, o produtor, e seus produtos é perdida de vista pela consciência. O mundo reificado é por definição um mundo desumanizado (BERGER e LUCKMANN, 1985, p. 123).

Tanto as instituições como os papéis podem ser reificados. Sobre a reificação de papéis, dizem (p. 125-126):

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O setor da autoconsciência que foi objetivado num papel é então também apreendido como uma fatalidade inevitável, podendo o indivíduo negar qualquer responsabilidade. A fórmula paradigmática desta espécie de reificação é a proposição ―não tenho escolha neste assunto, tenho que agir desta maneira por causa da minha posição‖ como marido, pai, general, arcebispo, presidente da diretoria, bandido ou carrasco, tal seja o caso. Isto significa que a reificação dos papéis estreita a distância subjetiva que o indivíduo pode estabelecer entre si e o papel que desempenha...Finalmente a própria identidade (ou o eu total, se preferimos) pode ser reificada, tanto a do indivíduo, quanto a dos outros. Há então uma identificação total do indivíduo com as tipificações que se lhe são socialmente atribuídas. É apreendido como não sendo nada senão esse tipo (grifo do autor).

O segundo processo que os autores apontam compondo a realidade como realidade objetiva é a legitimação. Definem esse processo dizendo ser esta uma objetivação de ―segunda ordem‖. Explicando, dizem (p. 127): ―A legitimação produz novos significados, que servem para integrar os significados já ligados a processos institucionais dispares. A função da legitimação consiste em tornar objetivamente acessíveis e subjetivamente plausíveis as objetivações de ‗primeira ordem‘ e foram institucionalizadas‖.

Para ser realizada, implica valores e conhecimento, ou seja, informa não somente que deve ser feita uma coisa e não outra, mas também informa o porquê de as coisas serem de determinada maneira e não de outra.

Discutindo o processo de legitimação, trazem o conceito de universo simbólico como um de seus componentes, tendo uma das funções de ordenar as diferentes fases da vida e também a de dar ―exatidão‖ à identidade subjetiva do indivíduo. Nesse sentido, dizem (p. 136): ―Pela própria natureza da socialização, a identidade subjetiva é uma entidade precária. Depende das relações individuais com os outros significativos, que podem mudar ou desaparecer [...] identidade é fundamentalmente legitimada pela colocação dela no contexto do universo simbólico‖. Vemos mais uma vez a influência dos outros no processo de socialização e da identidade do indivíduo e de que forma esse processo está em permanente constituição.

Para explicar como se dá a interiorização da realidade, os autores apresentam os processos de socialização primária e socialização secundária.

Segundo esses autores (p. 174), as pessoas nascem com uma predisposição para a sociabilidade. Na vida de todos existe uma sequência temporal, um curso em que o indivíduo é induzido a participar da dialética da sociedade. O ponto de partida desse processo é a internalização, isto é, ―a apreensão ou interpretação imediata de um acontecimento objetivo enquanto expressa significado, ou seja, enquanto uma manifestação dos processos subjetivos do outro, que, por consequência, se tornam subjetivamente significados para mim‖.

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A internalização seria, então, a condição básica para a compreensão dos nossos semelhantes e para a apreensão do mundo como realidade subjetiva e social. Dizem (p. 174).: a apreensão ―começa com o fato do indivíduo ‗assumir‘ o mundo no qual os outros já vivem. Sem dúvida, esse ‗assumir‘ em si mesmo constitui em certo sentido um processo original para cada organismo humano e o mundo, uma vez ‗assumido‘, pode ser modificado de maneira criadora ou (menos provavelmente) até recriado‖ (grifo do autor). A partir desse momento, compreendem-se as definições e situações que se compartilham com os demais e, ainda mais, participa-se, juntamente com os outros, de suas definições. Quando a pessoa atinge esse grau de internalização, pode-se considerá-la membro de uma sociedade.

Para os autores (p. 175), a definição de socialização é ―uma ampla e consistente introdução de um indivíduo no mundo objetivo de uma sociedade ou de um setor dela‖. E continuam, estabelecendo como ela se desenvolve:

A socialização primária é a primeira socialização que o indivíduo experimenta na infância, e em virtude da qual torna-se membro da sociedade. A socialização secundária é qualquer processo subsequente que introduz um indivíduo já socializado em novos setores do mundo objetivo de sua sociedade (BERGER e LUCKMANN, 1985, p. 175).

Para eles, a socialização primária não envolve somente a aprendizagem cognitiva, mas também grande carga emocional. Sem isso, provavelmente a aprendizagem seria difícil, senão impossível. Relatam:

A criança identifica-se com os outros significativos por uma multiplicidade de modos emocionais. Quaisquer que sejam, a interiorização só se realiza quando há identificação. A criança absorve os papéis e as atitudes dos outros significativos, isto é, interioriza-os, tornando-os seus. Por meio desta identificação com os outros significativos, a criança torna-se capaz de se identificar a si mesma, de adquirir uma identidade subjetivamente coerente e plausível (BERGER e LUCKMANN,1985, p. 176-177).

Querem dizer com isso que a identidade se produz reflexa, isto é, reflete as atitudes adaptadas dos outros significantes, ou seja, o indivíduo é aquilo que os outros significantes o consideram. Esse processo é dialético entre a autoidentificação e a identificação que fazem os outros; entre a identidade que é objetivamente atribuída e a que é subjetivamente assumida.

A realidade se define objetivamente como localização em determinado mundo e pode ser assumida subjetivamente somente com esse mundo, ou seja, todas as identificações se realizam dentro de horizontes que implicam um mundo social específico. Relatam os autores (p. 178): ―A

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apropriação subjetiva da identidade e a apropriação subjetiva do mundo social são apenas aspectos diferentes do mesmo processo de interiorização, mediatizado pelos mesmos outros significativos‖(grifo do autor).

Os autores discutem então o conceito de outro generalizado, que é a abstração dos papéis e atitudes de outros significantes concretos, ou seja, as outras pessoas. Com o desenvolvimento do outro generalizado, o indivíduo se identifica não somente com os outros concretos, mas também com uma generalidade de outros, que é a sociedade e também é uma fase decisiva na socialização. Possibilita a internalização da sociedade, da realidade objetiva nela contida, ao mesmo tempo em que permite o estabelecimento subjetivo de uma identidade coerente e contínua. A formação do outro generalizado sinaliza o término da fase da socialização primária. No entanto, o processo de socialização não termina com ela, dizem os autores: ―Mas esta interiorização da sociedade, da identidade e da realidade não se faz de uma vez para sempre. A socialização nunca é total nem está jamais acabada‖ (BERGER e LUCKMANN, 1985, p. 184).

A partir daí tem-se o que os autores chamam de socialização secundária, ou seja, a internalização de submundos institucionais ou baseados em instituições. A complexidade das divisões do trabalho e da distribuição social do conhecimento é que determinam seu alcance e complexidade. Sobre isso dizem Berger e Luckmann (1985, p. 185): ― ...podemos dizer que a socialização secundária é a aquisição do conhecimento de funções específicas, funções diretamente ou indiretamente com raízes na divisão do trabalho‖.

Os submundos que são internalizados na socialização secundária se apresentam como realidades parciais que se contrapõem com o ―mundo de base‖ formado na socialização primária e, como esta, também necessitam serem legitimados por meio de símbolos rituais e matérias.

Dubar (1997), discorrendo sobre o processo de socialização secundária na visão de Berger e Luckmann, aponta para a importância dos saberes ou o conhecimento nesse processo:

Antes de mais nada, trata-se da incorporação de saberes especializados - que chamaremos de saberes profissionais – que constituem saberes de um novo gênero. São maquinismos conceptuais que têm subjacentes um vocabulário, receitas (ou fórmulas, proposições, procedimentos), um programa formalizado e um verdadeiro ―universo simbólico‖ veiculando uma concepção de mundo (Weltsanschauung) mas que, contrariamente aos saberes de base da socialização primária, são definidos e construídos por referência a um campo especializado de actividades e são, portanto, ―situados diversamente no interior do universo simbólico enquanto globalidade‖ (Berger e Luckmann, p. 191) (DUBAR, 1997, p. 96, grifo do autor).

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Pode, por consequência, haver tanto continuidade quanto descontinuidade entre esses processos de socialização. Se na socialização primária as crianças apreendem o mundo dos pais como sendo o mundo, na socialização secundária apreendem outras realidades, o que pode gerar crises e descontinuidade, como exemplificam: ―a criança de mais idade chega a reconhecer que o mundo representado pelos pais, o mesmo mundo que anteriormente considerava com certeza como a realidade inevitável, é de fato o mundo de gente rural do sul, sem educação, de classe inferior‖ (BERGER e LUCKMANN, 1985, p. 189). Um ponto importante é o papel da educação nesse quadro. Para esses autores (p. 195), ―O desenvolvimento da educação moderna é evidentemente a melhor ilustração da socialização secundária realizada sob os auspícios de organizações especializadas‖.

Família, educação, organizações de trabalho e sociais, todas essas instâncias relacionadas diretamente com o processo de socialização também compõem a tessitura social que não podemos deixar de considerar para compor a análise desse trabalho. São elementos que nos dão suporte na tentativa de desvelar como os jovens constroem e significam a realidade do trabalho e, num recorte mais específico dentro dele, a realidade do trabalho na Economia Solidária. As mudanças e transformações sociais transitam nesse cenário.

Na visão de Dubar (1997), uma das contribuições da teoria de Berger e Luckann é que ela possibilita ver a socialização como portadora de mudanças sociais e não apenas de reprodução da ordem social estabelecida. A relação entre as socializações primária e secundária é que permite tal possibilidade. Diz Dubar (1997, p. 98):

Essa possibilidade de mudança social ―real‖ – isto é, não reprodutora das relações sociais e das identidades anteriores – depende, antes de mais, das relações entre os aparelhos de socialização primária e secundária, ou seja, depende das relações entre as instituições de legitimação dos saberes ―gerais” (de base) que asseguram a construção de ―mundos sociais‖ na infância e os sistemas de utilização e de construção de saberes ―especializados‖ que legitimam a reconstrução permanente dos ―mundos especializados‖ (grifo do autor).

Dubar (1997, p. 99) credita à socialização secundária a possibilidade de contestação dos valores e saberes adquiridos na socialização primária, gerando novos valores, novos saberes, novos mundos. Esta é, segundo o autor, a base para mudanças sociais. Através de interação das instâncias de socialização primária com as da socialização secundária, ocorrem ―crises de legitimidade de diversos saberes e das transformações possíveis do ‗mundos legítimos‘‖.

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A relação objetividade e subjetividade está entrelaçada, como vimos anteriormente. Para Dubar (1997, p. 99): ―Subjetivamente, a mudança social é, portanto, inseparável da transformação das identidades, isto é, simultaneamente inseparável dos ‗mundos‘ construídos pelos indivíduos e das ‗práticas‘ que decorrem desses ‗mundos‖.

Essa citação de Dubar corrobora o que encontramos em Berger e Luckmann ao apontarem estes o papel da identidade na relação estabelecida entre a realidade e a subjetividade e como pode ser modificada ou transformada. Dizem: ―A identidade é evidentemente um elemento-chave da realidade subjetiva, e tal como toda realidade subjetiva, acha-se em relação dialética com a sociedade. A identidade é formada por processos sociais. Uma vez cristalizada, é mantida, modificada ou mesmo remodelada pelas relações sociais‖ (BERGER e LUCKMANN, 1985, p. 228).

A visão da identidade como estando em constante transformação, mesmo quando aparece como sempre a mesma, é o próximo item que tratamos nesse tópico.

3.2 Identidade

Recorremos a Ciampa (1989, 1990) para discorrermos sobre essa visão de identidade. Sua contribuição para o entendimento da formação e transformação da identidade humana através da atividade, isto é, da ação do homem no mundo, é de grande valia, quando escolhemos o trabalho como um dos focos desta tese. Sua afirmação: ―O indivíduo não é algo: ele é o que faz‖ (CIAMPA, 1990, p. 135) sintetiza o que acreditamos ser um olhar esclarecedor para a compreensão de como o trabalho – uma das muitas possibilidades do fazer - numa sociedade complexa como a em que vivemos, com o capitalismo como modo dominante de produção, reflete na identidade e, portanto, na vida dos jovens, alvo deste estudo.

Tendo por base a identidade como um processo de metamorfose, histórico e inseparável de um projeto político, defende que o estudo da identidade não pode ser independente do estudo da sociedade. Está sempre a ela atrelado, pois, comenta o autor (1989, p. 72): ―... é do contexto histórico e social em que o homem vive que decorrem suas determinações [de alternativas de identidade] e, consequentemente, emergem as possibilidades ou impossibilidades, os modos e as alternativas de identidade‖. Para o autor, o fato de vivermos sob o modo capitalista de produção e a complexidade da sociedade impede-nos de sermos sujeitos, uma vez que esse sistema coisifica

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o homem, tornando-o somente um suporte do capital que o transforma em mercadoria. Nas suas palavras (1989, p. 72)., ―deixa de ser verbo para se tornar substantivo‖.

Vejamos alguns pontos essências de sua abordagem teórica, que nos ajudam a entender a constituição da identidade. A primeira noção a que se refere é de igualdade e diferença. Vamos nos igualando e nos diferenciando dos demais à medida que vamos participando de diversos grupos sociais, sendo o primeiro deles a família. Esse pertencimento aos grupos não se encerra nunca no decorrer de nossas vidas.

O impacto desse aspecto para o próprio conhecimento é dessa forma dimensionado por Ciampa (1989, p. 64): ―O conhecimento de si é dado pelo reconhecimento recíproco dos indivíduos identificados através de determinado grupo social que existe objetivamente, com sua história, suas tradições, suas normas, seus interesses, etc.‖. Ele ressalta a importância de entendermos como o grupo existe objetivamente para compreendermos a dinâmica que apresenta. Para o autor, o grupo se constitui pelas relações entre seus membros e com o meio no qual estão inseridos. Diz: ―pela sua prática, pelo seu agir (num sentido amplo, podemos dizer que pelo

trabalho); agir, trabalhar, fazer, pensar, sentir, etc., já não mais substantivo, mas verbo‖

(CIAMPA, 1989, p. 64, grifo nosso).

Ao introduzir a dinâmica do verbo ao invés do substantivo, o autor quer enfatizar a identidade como dinâmica, nunca estática ou imutável. É o agir que nos identifica, somos identificados de determinada forma porque agimos como tal, desempenhamos um papel que se enquadra em tal definição.

A aparente constância de sermos sempre os mesmos, segundo Ciampa (1989), é resultado de a identidade ser reposta, de agirmos de acordo com o esperado para aquele papel. Ao sempre

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